Hope


Quando o dia finalmente amanheceu, Herenvar foi até o quarto onde mantinham Arwen trancada. Calion preparou tudo para a tal "cerimônia" que na verdade nada mais seria do que ele mesmo dizer que agora estava casado com a filha do senhor Elrond. Na verdade, Herenvar, imaginava que tudo aquilo era tolice, iniciando com a ideia de sequestrar Arwen, mas ele não se opunha a isso. Na verdade, nenhum ato de crueldade parecia suficiente para ele se sentir cansado. Calion poderia ser rude e maquinar coisas perversas em sua mente, mas há um abismo enorme entre o pensamento e a ação e este abismo ele raramente ousava atravessar. Uma das raras vezes, fora quando movido pelo ódio, enterrou sua espada no corpo de Estel, matando-o. Após isso, suas palavras foram vazias e sem significado. Herenvar começava a pensar que ele se arrependia de tudo isso.

— Não diga bobagens. — Disse sério. — E agora, vá buscar minha noiva.

Ele concordou em silêncio e subiu até o ponto mais alto da torre. Destrancou a porta e paralisou quando olhou para dentro do quarto. A luz do sol penetrava radiante pela janela aberta e ele viu uma figura feminina flutuar desde o telhado do quarto, sustentada por uma corda no pescoço.

— Droga! Calion! — Correu escada abaixo, quase tropeçando e quando chegou diante de seus amigos, estava pálido. — Ela se matou. Tirou a própria vida, de alguma forma... Venham, vejam se minhas palavras não são verdadeiras?

Calion e Cementárion o seguiram e ficaram imóveis ao ver a mesma cena que Herenvar havia visto. O Elfo mais velho franziu as sobrancelhas, pensando se entrava ou não, temendo de fato constatar que Arwen desistira de viver. Ela o havia avisado, afinal. Preferia a morte a se tornar sua esposa, e imaginou que nada fosse senão teimosia. Por fim, decidiu aproximar-se, a luz tornou-se menos intensa e sua visão então constatou o que realmente havia ocorrido.

— Maldita... — Sussurrou. Arwen havia escapado. Montou aquele cenário para distraí-los, simulando um corpo com alguns cobertores e pendurando-os por alguma corda que achara no quarto.

— Ela pode estar em qualquer lugar.

— Então procurem-na! — Esbravejou. — E ela terá sorte se os Orcs de Dol Gul Dur a encontrem antes de mim.

Na verdade, Arwen não havia ido muito longe. Não julgou que fosse uma ideia inteligente descer de seu esconderijo até que todos os três estivessem distraídos com a pequena pegadinha que inventaram para eles. Sorriu satisfeita ao ouvir o grito de Herenvar ao pensar que estava morta e só desceu quando soube que ele havia ido chamar os outros. A Torre era alta e cilíndrica, feita de pedras negras e alguns tijolos tortos que surgiam em sua extensão. Utilizaria-os como auxílio para sua escalada. Ao menos até onde desse. Se fosse depressa, poderia correr para longe antes que eles a vissem. Os tijolos negros circundavam a torre e terminaram em certa altura antes do solo. Então precisou saltar para alcançá-lo. Qualquer pessoa comum se quebraria com a queda, e provavelmente faria um barulho absurdo. Mas Arwen era um elfa, descendente dos Noldor, que um dia viveram em Valinor. Não era uma queda e a droga de uma dor no tornozelo quando aterrissou que iriam fazer com que desistisse.

Havia um rio grande e caudaloso, de onde podia ver e o terreno ao redor era uma praia de areias negras. Ela não soube exatamente em que lugar estava. Aquele poderia ser Anduin, o grande rio, ou o Bruinen próximo das montanhas sombrias. Não poderia estar perto de Valfenda, ou provavelmente já teriam sido encontrados. Fosse uma ou outra opção, julgou estar muito longe de sua casa. Seguiu na direção oposta do rio, com rapidez, afastando-se em direção norte. Caminhou algum tempo a céu aberto na praia, utilizando pedras como esconderijo, se ouvisse algo suspeito, mas raramente parava para descansar. Não sabia para onde aquele caminho a levaria estivesse próxima ao Anduin, a direção Sul seria a mais certa para ela, poderia chegar à Caras Galadhon e refugiar-se em Lothlorien. Mas não fazia ideia de que ponto do curso era aquele, ou se realmente era o grande rio. Até onde sabia, poderia ser qualquer outro da terra média, até mesmo Harnen, o rio que ficava ao sul de Mordor, ou o próprio mar de Nurnen, dentro da terra de Mordor. Mas duvidava que Calion e os outros fossem estúpidos o bastante para se enfiar lá, considerando que o ar maligno da terra sombria era sufocante para os elfos.

Ao anoitecer, finalmente uma mata de árvores retorcidas ficou visível aos seus olhos, cansados e pesados. Ouviu, porém o som de cascos, que se aproximavam, olhou para trás e viu três cavaleiros no escuro. Correu com pressa na direção da floresta. Eles passaram por ela e Arwen parou, mudou de direção. Herenvar conduziu o cavalo atrás dela e ambos entraram na floresta. Os passos da elfa tornaram-se inaudíveis a ele, e ela escondeu-se por detrás de uma das árvores escuras. Subiu na mesma em absoluto silêncio, vendo-os passar por debaixo.

— Arwen! — Gritava Calion. — Vai acabar se matando! — Apenas o silêncio e o eco de sua própria voz lhe responderam. — Não há como sair daqui. E se não a encontrarmos, os Orcs a encontrarão.

— Ela não pode ter ido longe. — Cementárion vasculhava cada canto escuro da floresta. — E se foi, provavelmente achará uma morte trágica. — Riu.

Calion o encarou irritado.

— Cale essa boca! E trate de procurá-la. — Olhou para Herenvar, que manteve-se em silêncio. — Vocês dois! Nem que eu precise incendiar essa maldita floresta, a encontrarei, e ela irá desejar ter tido mesmo uma morte trágica.

Os elfos se afastaram, e Arwen pode finalmente soltar a respiração. Seus olhos começaram novamente a lacrimejar, mas ela espantou as lágrimas. Ao menos, poderia ficar ali até o amanhecer, ou até que a paciência de Calion se esgotasse e ele resolvesse realmente incendiar a floresta. Tateou a pele do pescoço em busca de Elessar e só então percebeu que a havia perdido, e junto com ela, sua esperança. Talvez devesse mesmo ter tirado a própria vida ao invés de fingir fazê-lo, pois em algum momento, Calion a encontraria.

Respirou fundo, prendeu a respiração e a soltou, fechando os olhos por alguns instantes, deixou que os sons da floresta fluissem até seus ouvidos, até finalmente desaparecerem. Ela ouviu o som de uma cascata e o canto de pássaros. Abriu os olhos e viu-se em Rivendell, na varanda da casa de seu pai.

— Arwen. — A voz de Estel chamava-lhe com serenidade, ela o olhou surpresa.

— Está vivo! — Ele concordou com um sorriso. — Eu estava há poucos instantes em uma floresta. Como...?

— Seu pai diz que você pode falar comigo quando dorme. Já tinha feito isso antes, quando eu estava ferido.

Ela concordou. Lembrava-se vagamente do breve e sombrio sonho que tivera antes de acordar na torre sombria.

— Então... Isso é um sonho?

— Não, eu acho que não. — Estel levantou-se e foi ao encontro dela. — Na verdade, eu realmente acredito que esteja se comunicando comigo, ou ao menos quero acreditar. — Arwen manteve-se em silêncio. — Os seguimos até a floresta das trevas, estão ao Sul, próximos de Dol Guldur. Os elfos de Thranduil partiram ao cair da noite na sua direção. Estarei indo com eles.

— Eles vão me encontrar. — O desespero era nítido nos olhos dela. — Não faz ideia do quão maligno Claion é. O que ele pretende fazer...

— Precisa ser forte. — Ele acariciou seu rosto. — Seja forte por mim. Eu prometo que não vou deixar nada acontecer com você.

— Não pode prometer isso.

— Eu posso. — Segurou seu rosto próximo ao dele. — É uma das poucas promessas que ainda posso cumprir.

Então encostou seus lábios nos dela e o sonho se desfez naquele exato momento. Estava claro. Estel olhou ao redor e viu Legolas parado, de pé com os olhos fixos em um determinado ponto da floresta.

— Há quanto tempo adormeci?

O elfo o olhou.

— Há pouco tempo. Mas para a nossa felicidade, você fala mais quando dorme do que acordado. Disse que Arwen fugiu de Calion. Ou ele é extremamente incompetente, ou ela é extremamente esperta.

— Acho que as duas coisas. — Um sorriso involuntário se formou em seus lábios. Legolas pensou em comentar, mas o som de cavaleiros se aproximando chamou sua atenção.

Elladan, Elrohir e Daeron foram os primeiros a surgir por entre as árvores. Logo atrás deles, vinham Lindir, de Rivendell, Tauriel do reino da floresta e mais três guardas de Thranduil.

— As saídas estão bloqueadas. — Disse a capitã da guarda. — Haldir espalhou guardiões ao longo do Anduin até Caras Galadhon e o restante de minha guarda tomou o norte da floresta.

— Sua guarda. — Provocou Legolas, e sua amiga apenas revirou os olhos.

— Enfim, eles não terão para onde fugir, a menos que se enfiem em Dol Guldur, e precisam reunir uma quantidade exorbitante de coragem para fazer isso.

— Ótimo. — Estel desembainhou sua espada. — Então vamos pegar esses infelizes.