The Dark Tower



Os dias tornaram-se escuros em Imladris. Elrod estava impaciente e irritado, o que ficou ainda pior com a absurda carta de Calion a ele. Não deu resposta, nem falou nada a respeito. Amassou com as próprias mãos e jogou no fogo de sua lareira o papel, como se fosse a coisa mais asquerosa que já tocara. Legolas surgiu logo depois, viu o bilhete queimar mas não disse nada. Ao menos não a esse respeito.

Elrond bufou e sentou-se em uma poltrona estofada. Estava cansado e sentia-se tentado a contatar Galadriel para que lhe desse alguns conselhos. Claro que ela o xingaria de todos os nomes malditos de Arda por ter conseguido a proeza de "perder" sua neta. Como se fosse algo muito difícil. Arwen e Celebrian sempre foram muito parecidas, irredutíveis como a tempestade e imprevisíveis como o vento. Quem poderia prever que ela se apaixonaria por Aragorn? Mas agora que não a tinha consigo, as palavras de Elrohir ressoavam em sua cabeça. Talvez devesse ter sido menos duro com ela.

Durante aquela noite, entretanto, os pensamentos de Aragorn, que dormia profundamente, tornaram-se em um sombrio pesadelo. Estava na floresta novamente, com Arwen, apostaram corrida à cavalo. O sonho mudou e a floresta, outrora iluminada pelos raios do fraco sol do outono, tornara-se sombria e escura. Ele já não estava à cavalo, e Arwen desaparecera de sua visão. Chamou-a por diversas vezes, mas não encontrou nada, senão Elessar, a pedra élfica que ela levava como pingente em seu pescoço. Sua visão ficou turva como as águas de um agitado riacho e ele viu uma torre, que se erguia à margem da água, mas desapareceu na escuridão.

Então sobressaltou-se e abriu os olhos, tateou o corpo em busca de sua espada e nada encontrou. Olhou ao redor e viu Legolas e Elrond, que o encaravam com alguma preocupação.

— O que aconteceu? — Indagou preocupado. — Onde está Arwen?

— É a primeira coisa em que pensa? — Legolas fez um gesto fingindo indignação.

— Eu a vi. Estava na floresta, e depois, tinha uma torre e um rio e um colar, aquele que ela usa com o formato de águia, com a pedra verde...

— Elessar. — Elrond franziu o rosto para isso. Levantou o colar e mostrou a ele. — A pedra élfica. Ela a perdeu na floresta, quando Herenvar a capturou.

Aragorn levantou-se da cama, ainda não estava no auge de sua força, mas conseguia manter-se de pé. Olho de um lado a outro procurando sua espada.

— Preciso encontrá-la. Ela precisa de mim.

— Ela disse a você? — Elrond enrijeceu o olhar. Era a primeira vez que aquilo acontecia. Ao menos com Arwen. Sabia que sua família possuía alguns dons peculiares, tais como os de ver o futuro ou comunicar-se com outros por outro plano, mas até então Arwen não havia manifestado tais habilidades. Aragorn assentiu. — Está se comunicando com ele. — Disse Elrond a Legolas.

— As visões não são claras. Mas eu me lembro da torre. Era escura e ficava perto de um rio.

— É no limite de Trevamata. — Anunciou Legolas. — Eu ia para lá quando era criança, mas precisaremos de ajuda. Eles provavelmente nos verão a milhas de distância.

— Levem Lindir com vocês. — Decidiu Elrond. E me mantenham informados. Estarei com uma tropa de Elfos preparados se for preciso.

Eles partiram pela manhã. Cavalgando para longe. Ainda precisavam viajar muito se quisessem chegar à Mirkwood com pressa. Legolas poderia viajar sem descanso por alguns dias, mas não pediria o mesmo a seu parceiro. Ainda precisariam atravessar as montanhas sombrias e um pouco mais de terra até finalmente entrarem na floresta das trevas. O caminho pelas montanhas era árduo e dificultoso, e tiveram a sorte de não topar com um ou dois grupos de Orcs. Mas considerando que os guardas de Imladris, os cavaleiros de Rohan e o povo de Trevamata os aterrorizavam, aquela passagem, pelo menos, ficaria livre das crianças abissais por um bom tempo.

Ao quarto dia de viagem, finalmente chegaram ao campo Legolas podia avistar as árvores ao longe e seguiria a caminhada, se não soubesse que Aragorn ainda precisava descansar, por mais que esse insistisse que não. Às vezes a impressão que dava era de que seu amor por Arwen o movia, a despeito de qualquer limitação humana.

— Mais um ou dois dias e estaremos no coração da floresta.

— Não temos um ou dois dias. — Ele levantou-se após pegar fôlego, avançou em frente e o elfo o seguiu.

E graças a sua disposição, no meio do dia seguinte, conseguiram uma boa caminhada para dentro de Trevamata. Estava silenciosa, tal como Legolas lembrava-se de tê-la deixado há vinte anos atrás. Mantiveram o ritmo, até mesmo após o anoitecer e quando chegaram perto dos limites da floresta, Legolas teve a sensação de estar sendo seguido. Deu apenas mais um passo e quando pensou em voltar, ouviu o som como o da corda de um arco sendo puxada.

— Já foi mais cuidadoso que isso, Mellon.

Seus olhos brilharam ao ouvir aquela voz e ele virou incrédulo.

— Tauriel?! — A elfa baixou o arco e sorriu para ele, sendo surpreendida por um abraço saudoso de seu amigo. — Pelos Valar! Meu pai disse que havia viajado para o Oeste.

Aragorn franziu o cenho, mas ficou em silêncio. De fato, Thranduil lhes dissera sobre a viagem da tal elfa ruiva para Valinor, mas aparentemente era tudo conversa. Ele não a conhecia, claro e aquela era a primeira vez que a via. Possuía cabelos longos, como a maioria das mulheres élficas, ruivos como o sol que se põe por detrás de uma colina verdejante, mais lisos que ondulados, contrastavam com sua pele alva, onde se podia ver mesmo à distância alguns pontos avermelhados na região do rosto, onde - de acordo com Legolas - ela ostentava algumas sardas vermelhas, pouquíssimas. Era exatamente como ele a descreveu, mas se Aragorn suspeitou desde o início que seu amigo estivesse apaixonado ou algo do tipo, aquele momento apenas confirmava suas suspeitas.

— Seu pai já mentiu melhor. — Ela afastou-se timidamente do abraço, sorriu mas logo em seguida voltou à sua postura. Revirou os olhos. — Mas apenas fez isso para tranquilizá-lo.

— E você nem uma mensagemzinha me escreveu.

Ela sorriu zombeteira.

— Mais de seiscentos anos e continua um exagerado. — Disse, e então virou-se para Aragorn, que parecia divertir-se em ver Legolas em uma situação tão deplorável. Ele o havia infernizado por meses quando soube se seu romance com Arwen, logo, nada mais justo. — E você deve ser Aragorn.

— Sim, e acredito que seja a namorada que deixou Legolas na fila de espera. — Ela olhou indignada para o elfo loiro.

— Aragorn! — Ele reclamou. — Isso foi... Um devaneio da juventude.

— Foi há exatos vinte e um anos. — Riu Aragorn e Tauriel fez o mesmo.

Legolas negou com a cabeça com se quisesse fugir do assunto.

— Daeron e os gêmeos estão aqui?

— Chegaram na noite anterior. Vasculhamos toda a floresta e não há vestígios dos seres peçonhentos.

— Literalmente peçonhentos. — Concordou Aragorn.

— Os elfos de Lórien também receberam avisos e vigiarão suas fronteiras, mas a floresta é consideravelmente distante daqui. Acreditamos que estejam abrigados em algum ponto próximo da ruína de Dol Guldur. O rei Thranduil nos proibiu de ir até lá.

— E desde quando você obedece?

— Legolas provocou a amiga.

— Para que direção? — Indagou Aragorn.

— Ao sul daqui. Se forem rápidos, poderão chegar antes do anoitecer. Avisarei a Daeron, Elladan e Elrohir que encontrei vocês.

Legolas a abraçou mais uma vez e segurou uma de suas mãos.

— Fique bem. — Disse ele. — Estou feliz que ainda esteja aqui.

Tauriel sorriu para ele.

— Tente não morrer. Estarei esperando seu retorno.

Arwen abriu os olhos devagar, tentando acostumar-se com a claridade que entrava pela janela. Moveu-se, tentando tatear e descobrir onde estava, notando para sua infelicidade que não era o seu quarto, na casa de seu pai. Na verdade, era um quarto, mas não o seu. E ela estava em uma cama macia, mas não era a sua. Da janela conseguia ver um rio largo, que descia para o Sul, mas não sabia exatamente para o sul de quê, ou que rio era aquele. Poderia ser o grande Anduin, o qual ela conhecia apenas por mapas e de vistas longínqua de quando estivera em Lórien. Mas não estava em Lórien, e Valfenda provavelmente estava a milhas dali. Sentiu um certo desconforto acometer sua mente. Olhou ao redor. E pensou ter ouvido vozes exaltadas por detrás da parede de pedra.

As vozes cessaram e a porta rangeu antes de abrir-se. Calion pôs o rosto para dentro e pareceu contente ao vê-la despertar.

— Fico feliz que esteja bem, minha amada. — Arwen franziu o rosto para ele, mas manteve-se em silêncio. — Esteve desacordada por todo o trajeto, mas não há problemas, cuidei de tudo enquanto dormia.

— Que lugar é este? — Disse finalmente.

— Um refúgio. — Calion entrou para dentro do quarto e fechou a porta atrás de si, encarando-a com gravidade. — Ficaremos aqui, e após o casamento cortaremos caminho pela floresta das trevas.

Arwen não disse uma palavra. E Calion avançou alguns passos na direção, mas manteve sua postura, ela ficou onde estava, próxima à cama, na direção adjacente à janela. Ele se aproximou como se estivesse analisando, e o silêncio que ficou naquele quarto enquanto fazia isso a deixou nervosa. Seu coração parecia que iria saltar pela boca, mas Calion não pareceu notar. Ou se notou, não deu a entender. Ele esticou a mão e tocou em seu ombro, acariciando seu braço como quem admira um tesouro há muito perdido. Arwen se manteve em silêncio e ele tornou a olhar em seus olhos, passando o toque gelado para seu rosto, e agora ficou ainda mais próximo dela, como jamais havia estado, nem mesmo quando ainda eram amigos íntimos.

— Eu sei que está irritada. Mas tudo o que fiz é porque te amo. E com o tempo, talvez... Você também pode me amar.

E sem avisar, ele a beijou. Seu toque era áspero, frio e urgente, mas dava para ver a paixão dentro dele. Ela se sentiu estranha quando isso aconteceu, algo diferente, diferente de como se sentiu na primeira vez que beijou Estel. Ela o empurrou com um pouco de força e deu um tapa no rosto dele com ainda mais força. Surpreso com a rejeição, Calion colocou a mão na área do rosto que havia sido atingida. Ela cerrou os dentes e olhou para ele com olhos marejados.

— O único homem que amei,

Você o matou! — Disse alto o suficiente para ele ouvir. — Então esqueça, Calion, filho de Caranthir! Eu nunca poderei amar outra pessoa.

O olhar de Calion tornou-se sombrio. Estava furioso por suas palavras. Ele agarrou seu pescoço com uma das mãos e a prendeu contra a parede, aproximou seu rosto do dela e sussurrou:

— Lute enquanto puder. De um

modo ou de outro, você será minha. — Arwen tentou desviar-se do olhar cortante de seu agressor, mas ele pressionou seu rosto para mantê-la presa — Já enviei mensageiros a seu pai, assim que ele der seu consentimento...

— Boa sorte então! — Ela o provocou com determinação. — Meu pai preferiria ir ao meu enterro antes de concordar que eu me case com você.

Ele sorriu malicioso.

— Eu não sei se ele continuará

pensando dessa forma, quando souber que você espera um filho de Aragorn. — Arwen o olhou com espanto. — Quero dizer, não é difícil deduzir, você e ele viviam escapando para a mata.

— Meu pai não é idiota. — Ela

retrucou. — Não vai acreditar em suas mentiras.

— E quem está contando

mentiras? Quero dizer, Aragorn está morto, você mesma disse, então não pode fazer mais nada. Agora a parte da criança pode ser arranjada. — Riu. — E não precisamos dele para isso, não é?

— Se afaste! — A voz dela soava

ameaçadora, mas só fez o filho de Caranthir rir. Seus olhos também eram negros como breu e seu rosto continha uma malícia negra que ela nunca tinha visto antes. Ele enterrou o rosto no pescoço branco da elfa, respirou fundo, mordeu a pele dela, deixando alguns hematomas — Calion, não! O que você está fazendo?! — Ela implorou com a voz estrangulada. Seus olhos claros começaram a lacrimejar constantemente, com medo do que estava para acontecer. Porém, Calion ignorou completamente seus apelos, movendo seu beijo para seus lábios, e quando Arwen virou o rosto para longe dele, Calion, furioso a empurrou para a cama, impedindo-a de lutar. Ele capturou o corpo dela em suas mãos. Seu toque era rude e machucava, conforme apertava sua pele, deixava mais hematomas. Ele levou as duas mãos até a abertura do vestido de Arwen e segurou como se preparasse para rasgá-lo de seu corpo. — Calion! Espere! Por favor! Não... — Pediu, debateu-se por debaixo dele, mas era forte demais para que ela pudesse movê-lo. — Me solta!

A porta abriu-se subitamente, como que por ironia do destino.

— Adiantando a noite de núpcias? — Era Herenvar. Calion a soltou, e voltou-se contrariado para o companheiro. — Temos problemas. Cementárion viu Daeron cavalgando para o norte. Provavelmente Thranduil já sabe que viemos para cá.

— Eu deveria tê-lo matado. —

Respondeu-lhe. — Montem guarda junto à torre. Qualquer coisa que se aproximar demais, pode matar. Não vou deixar que eles atrapalhem meu casamento.

— Ainda não houve resposta de

Elrond. — Continuou ele. — Receio que o seu festim deverá se iniciar sem a presença dele.

Calion olhou para Arwen, que ainda estava na cama, agora sentada e os encarava, imóvel e silenciosa como se não estivesse realmente presente. Mas ela os ouvia e seu rosto empalideceu-se ao ver um sorriso indecifrável surgir nos lábios de Calion.

— Uma pena. Terei de dar-lhe

más notícias e talvez isso o incentive. Diga a Cementárion para escrever o que combinamos.

— Sim, senhor!

Herenvar concordou e saiu. Calion foi na direção da porta e olhou novamente por cima do ombro, a elfa, que continuava onde estava.

— Descanse, meu amor. O casamento será ao amanhecer.

E então saiu e fechou a porta. E Arwen pôde ouvi-la sendo trancada pelo lado de fora. Finalmente soltou a respiração e seus olhos tornaram a encher-se de lágrimas. Agora não sabia se por medo, ou pelo luto de ter visto Aragorn ser morto na sua frente. Apenas quando Calion lembrou-se do ocorrido foi que ela constatou que toda a confusão na floresta, que ela julgava inconscientemente ter sido um sonho macabro de sua imaginação, na verdade não o fora.

Um nó se formou em sua garganta e ela deixou o corpo escorregar até o chão. Abraçou os próprios joelhos e chorou até que seus pulmões começassem a doer e isso provavelmente demorou algum tempo. Tempo. Pensou. O sol já estava desaparecendo por detrás das árvores e ele provavelmente retornaria. Não deixaria que ele a tocasse novamente. Decidiu. Preferiria a morte a deixar-se submeter aos sombrios desejos de Calion.