Promised

Como já foi contado em capítulos anteriores, Calion, filho de Caranthir (que na verdade era neto deste, mas seu o avô o criara após a morte de seu pai), desobedecendo os conselhos da Senhora Galadriel, decidiu que ficaria em Rivendell até que lhe fosse aprazível retornar à terra onde fora criado. Este, por sua vez, possuía mais três amigos vindos da cidade dos Elfos em Lothlórien e mandou que algum mensageiro lhes mandasse notícias de onde estava. Ainda não havia desistido de andar pela floresta, mas só o fazia quando Arwen estava por lá, e evitava aproximar-se pois sabia que ela fugiria se o fizesse. Mas na noite do Solstício de outono, a viu novamente trilhar por um caminho diferente ao habitual. Não parara na clareira, no centro da floresta, ao invés disso, seguiu para a trilha que levava à cascata, logo abaixo da casa de Elrond.

Calion conhecia aquela passagem, uma vez que a seguira duas ou três vezes até lá. Mas ao invés disso, apressou-se para a ponte e de lá esperou vê-la chegar do outro lado. Após alguns minutos, a viu. Seus cabelos negros brilhavam à luz do sol poente e seu rosto alvo continha uma expressão alegre, como na maioria das vezes que a vira. Mas teve a impressão de que o motivo de sua alegria naquela noite era no mínimo suspeito. Calion a vira sorrir e virar-se para trás, para algo que estava vindo por entre a mata. Então Estel, o irmão adotivo de Elladan e Elrohir, que por acaso era... Humano, chegou através da trilha. Deveria ter vindo após ela, ele não o vira entrar na floresta também.

Ficou ainda algum tempo observando-os, até que Arwen o envolveu em um abraço caloroso e Estel a beijou apaixonadamente. E o que era pior, à sua visão, ela o correspondeu, e parecia feliz em estar alí. Sentiu-se traído, seus olhos deixaram escapar uma única e solitária lágrima, antes de queimarem com a fúria que lhe acometeu. Então... Aquela era a razão pela qual Arwen não o correspondera. E o motivo de ela o estar evitando desde a noite do banquete das estrelas. Que seja! Piscou os olhos e expulsou as lágrimas. Não iria sofrer por uma pequena estupidez de uma Eleth. Até porque, Estel, era um reles mortal, não poderia ter nada sério com ela. E mesmo que tivesse, assim como ele, o sentimento certamente seria passageiro e em poucos anos ela o esqueceria. Se pudesse esperar por esse tempo.

Seus companheiros chegaram pela manhã, à cavalo e o encontraram vagando pela floresta, acertando com a espada, uma grande árvore que se erguia próxima à clareira. Estes, eram descendentes dos elfos da floresta, e passaram parte de sua infância nas aldeias de Trevamata, antes da proliferação dos orcs. Calion conhecera o primeiro deles, Herenvar,) a quem chamavam guarda da prosperidade pois sua família era detentora de muitos bens ), em sua juventude em Lothlorien, apesar de Galadriel constantemente censurar sua amizade ao dizer-lhe que Herenvar e os irmãos, Thargon, o senhor comandante ( mas não era comandante de coisa alguma ), e Cementárion, ( que recebera este nome em homenagem a Yavanna ), só não eram mais perniciosos que o próprio Fëanor.

— Salve, Calion, filho de Caranthir! — Eles puxaram as rédeas e pararam diante do elfo, que agora parou de agredir a árvore. — Elrond irá ficar furioso se vir marcas nestas árvores.

Ele os olhou com irritação.

— Por que demoraram meio século só para chegar ao Vau?

— Cementárion, envolveu-se numa estúpida briga de taverna. — Resmungou Herenvar, o mais velho e mais pernicioso dos três. — Precisamos matar o dono do lugar, ou não conseguiríamos provisões para a viagem. Simplesmente odeio as lembas.

Eles riram.

— Então, Calion. — Cementárion desmontou e observou o companheiro. — O que pode ser tão urgente para você nos arrastar para esse vale. Não vai me dizer que Elladan e Elrohir o estão apavorando. — Riu, mas expressão grave de seu amigo o fez calar-se.

— Não, meus amigos. Eu os chamei para o meu casamento.

Os três pararam estupefatos o encarando desacreditando à sua palavra. E após alguns instantes de silêncio, suas vozes explodiram em altas gargalhadas.

— Casar?! Você?! — Herenvar, estava apoiado no outro amigo, já com o estômago doendo de tanto rir. — E quem foi o Orc que se encantou pela sua beleza, meu amigo?

Outra explosão de risos. Calion revirou os olhos e calmamente apenas lhes deu uma resposta à altura.

— Arwen Undómiel.

E novamente o silêncio sufoca a floresta. Thargon, franziu o rosto.

— A filha de Elrond, o semi-elfo? — Ele concordou. — Como? E que bruxaria você fez pra ela se interessar por você?

— Eu não fiz bruxaria alguma. Arwen e eu somos prometidos um ao outro. — Outro de seus amigos abriu a boca para contestar, mas ele interrompeu. — Somos apaixonados desde a infância, então, meus amigos, sim. Eu irei me casar, não é com um orc e eu não fiz nenhuma... Bruxaria.

Ficaram em silêncio novamente, até que Herenvar chamou a atenção para si.

— Imaginei que não fosse com um Orc. Eles têm muito maior gosto.

E novamente a explosão de risadas.

Deveriam ir andando se sua pretensão fosse de chegar à casa de Elrond antes do pôr do sol. Aquele seria um dia animado. O meio-elfo estava de um ponto alto da casa, aparentemente falando sozinho, algo que não era incomum para ele, mas Lindir, um dos elfos de Valfenda, aguardou do lado de fora da porta até que ele finalmente terminasse sua meditação.

— Senhor, Herenvar, Thargon e Cementárion, vieram de Lothlórien para cá.

— Bem sei. — Ele não estava surpreso. — Galadriel me preveniu quanto a esta quadrilha, Lindir. Me disse que normalmente arranjam confusão e arrastam Calion para ela.

Lindir mordeu a língua. Não conhecia muita coisa sobre Calion, filho de Caranthir, mas o pouco que viu dele ali naqueles meses não lhe deu uma boa impressão. E bem sabia Elrond, que Lindir possuía um senso crítico quase impecável.

— Tentarei mantê-los afastados, senhor. E avisarei aos senhores Elladan e Elrohir para não criar discórdia.

— Não será preciso. — Avisou o senhor de Valfenda, oferecendo-lhe uma taça de vinho. — Meus filhos irão para as fronteiras com o príncipe Legolas, creio eu. E talvez com Estel, que se eu não enviar dessa vez, ele pode ter um surto e jogar-se de uma ponte. — Riu. — Sim... Creio já ser hora de deixá-lo cumprir seu propósito como guardião.

Lindir concordou.

— Mas... E quanto aos outros quatro?

— Calion busca minha aprovação para casar-se com Arwen, a qual eu não darei. E ela não o quer ver nem mesmo banhado a ouro. Ele se cansará e retornará a Lothlorien, com os outros três idiotas.

Não era o que parecia, mas Lindir não lhe disse nada. Elrond era o retentor das visões do futuro, não ele. Talvez estivesse certo. E torcia para que sim. Lá pelo cair da noite, vira Arwen e Estel voltando juntos de algum louco passeio pela floresta dos pinheiros. Dessa vez, com Legolas, Elrohir, Daeron e Elladan e era a primeira vez que vira os seis juntos sem que a elfa estivesse xingando os irmãos de todas as maldições da Terra-Media.

— Lindir. — E claro, Elladan tinha bafo de vinho e trazia consigo uma garrafa escura com um líquido duvidoso em seu interior. Precisaria conversar seriamente com Elrond sobre o fato de os rapazes estarem contrabandeando bebidas suspeitas para o Vau. — Vai juntar-se a nós?

— Não, na verdade. O Senhor Elrond quer que mantenha a guarda essa noite.

Elladan bufou.

— Meu pai... Está velho e ranzinza. — Riu.

— Elladan! — Arwen repreendeu o irmão. — Deixe-o em paz. Vá desgastar o que resta do seu fígado para lá!

Ele a olhou indignado e depois para Estel e Legolas que seguravam-se para não rir. Então antes que dissesse qualquer coisa, Daeron o abraçou e o puxou para outra direção.

— Vamos primo! — Chamou-o e Elrohir os seguiu. — Deixe os velhos ranzinzas para lá. O mundo está acabando, bebamos enquanto ainda podemos.

— Não criem confusão! — Arwen suplicou em alto som, uma vez que eles já estavam longe e
só pode ouvir Elrohir fazer um sinal positivo com as mãos e gritar.

— Está bem, mamãe!

— Eles vão sim. — Avisou Legolas.

— Eu sei. Nem mesmo dois mil anos são suficientes para pôr juízo na cabeça desses três.

Eles despediram-se de Lindir, e no salão de entrada da casa, despediram-se uns dos outros. Legolas, precisou praticamente arrastar seu amigo para que deixasse Arwen e fosse dormir, repetindo que os dois ficaram grudados por todo o dia, então ele não tinha nada a mais a dizer a ela. A elfa ficou ainda um pouco na sala, assistindo-os desaparecer para dentro do corredor leste, que era por onde ficavam os muitos quartos de hóspedes.

O reflexo da Lua já enchia toda a sala, deveria ser tarde, ela deduziu. Seguiu para o lado oposto ao que Legolas e Estel seguiram. O corredor estava escuro, e apenas havia poucos pontos iluminados pela luz prateada da lua, mas a maior parte do caminho até seu quarto era feito no breu e fora num desses pontos que sentiu seu corpo bater em algo que estava postado no meio do corredor.

— Está um pouco tarde para caminhadas, não? — A voz de Calion ecoou pelo corredor vazio e ela afastou alguns passos para trás.

— Calion?! O que faz aqui?

O ponto logo atrás era perto de uma janela aberta de onde se podia ver com mais claridade. Ela ficou parada ali e Calion se aproximou, finalmente deixando que seu rosto fosse iluminado.

— Digamos que... Senti a sua falta. — Disse. — Não terminamos nossa conversa na outra noite, e nem na noite em que nos vimos na floresta.

— Bem... — Arwen manteve certa distância. Ainda sentia calafrios na presença dele, embora tentasse não demonstrar, ou poderia soar extremamente rude. — O que exatamente precisamos conversar? Está tarde. Podemos falar sobre isso outro dia.

— Eu duvido. — Calion andou em sua direção, e para cada passo que ela dava para trás ele dava dois para frente, até que chegaram a um ponto escuro e ela não quis mais avançar. — Está ocupada normalmente com seus irmãos e... Com aquele sujeito mortal. Ele em especial.

— O que tem Estel? — Sua expressão se fechou por alguns instantes.

— Nada. Não quero estragar o restante da noite falando dele. — Agora muito mais próximo. — Quero falar de você, Arwen. Sobre minha proposta de casamento. Diga-me se pretendes aceitá-la, peço-te. E não te esqueças de que nos prometemos um ao outro quando jovens, de que isso deveria ocorrer.

— Ouviu o que meu pai disse. — Lembrou ela. — Ele não vai concordar com isso.

— Quem se importa com o velho ranzinza? Estou falando de você. — Calion segurou em seus dois braços e fez com que ela olhasse direito em seus olhos. — Ma vestuvalyen [Case-se comigo]. Cumpra sua promessa.

Os olhos acinzentados de Arwen o encararam com espanto e ela precisou fazer alguma força para apartar-se de seu alcance.

— Éramos crianças! — Justificou. — E eu não posso me casar com você, Calion, independente da bênção de meu pai ou não.

— Então, por que?! — Ela abriu os lábios para responder, mas Calion a interrompeu. — Por causa de Estel?! — Estava exaltado, irritado com sua resposta e agarrou novamente os antebraços da elfa, empurrando-a contra a parede. Mas ela apenas o olhava espantada com a constatação. Quer dizer, como ele poderia saber sobre aquilo? — Você se acha muito inteligente, não é? Mas eu sei o que anda fazendo. Eu a vejo fugir para a floresta ao crepúsculo com aquele... Aquele bastardo!

— Não fale assim!

— Ou o quê? — Pressionou com um pouco mais de força. — Vai dizer ao seu pai que falei mal do seu namorado mortal? Como se Elrond fosse admitir que você se envolvesse com ele. Ou não chegou a pensar nisso também?!

— Calion!

Ele a soltou. Virou-se de costas para ela e agarrou os próprios cabelos, com raiva de si mesmo.

— Não se engane, Arwen Undómiel. — Disse agora com a voz mais branda, quase como se fosse outra pessoa. — Estel é apenas um mortal. E como todos os mortais, ele é passageiro. E vai desaparecer com a mesma velocidade que se esvairá o amor que sente por ele.