Immortal Star

Guerra em menor escala - Parte 3


Sim, foi desesperador. Aquele dia, tudo estava indo ao contrário do que os moradores de Riven poderiam chamar de "Normal". A cidade era barulhenta sim. Ter um Coliseu bem no centro da cidade te dava como bônus o fato de não conseguir dormir em época de apresentação.

Mas o que o povo ouvia agora não era nem perto da animação das torcidas que perdiam a voz nas lutas. O som de gritos de morte e pedidos de ajuda em vozes chorosas fez aquele povo pensar, pela primeira vez em toda sua vida, se realmente existiria algum lugar seguro no mundo.

Imagino que você ainda está pensando na "coincidência" que houve nessas últimas partes que eu te contei, certo? Eu espero que sim. Ao mesmo tempo em que todos os nobres e famílias importantes de Riven foram reunidas no Castelo: houve uma tentativa de espionagem e um ataque de um exército rebelde. Coincidência... DEMAIS, você não acha?

Já sabemos o que os espiões estavam fazendo e para quem trabalhavam. Agora está na hora de saber quem eram os "Rebeldes".

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— Já fazem quase dois meses que tudo começou.

Peeh tinha começado a falar bem antes do grupo sequer ter chego no local de entrada para o castelo. De acordo com ela e seu exército, eles tinham criado um "buraco" na parede.

É muito importante lembrar que a grossura dos muros que protegem esse castelo foram feitos especialmente para aguentar balistas e catapultas. Então para que esse exército rebelde, que nem sabiam se organizar direito, consiga destruir uma parede daquelas, significa que tinha alguém por trás dos panos dando suporte para eles. Isso, ou alguém que tenha se juntado à eles que tem algum tipo de poder especial ou um equipamento mágico poderoso o bastante para tal.

Mana não estava pensando nisso, pois estava mais focada em prestar atenção no que a Líder dos rebeldes falava. Já San, estava pensando nisso desde quando os soldados apareceram e falaram aquilo.

— Nessa data, todo o exército real de Riven se mobilizou. Eles se separaram e levaram um ordenado direto do rei para todas as cidades e vilas do reino. — continuou Peeh. Ela parecia bem mais calma agora. Falava em um alto tom enquanto corria em velocidade média, ainda atrás do esquadrão de rebeldes, mas à frente de Jimmy e dos dois novos possíveis companheiros. — O ordenado foi estranho. Nele, o Rei comandava que todo homem de mais de vinte anos que estivesse saudável deveria comparecer à Capital como um regime militar obrigatório. Era necessário uma pessoa por família. Todos no reino conhecem bem a lei e teoricamente, não haveria nenhum problema nesse ordenado.

— Teoricamente, você diz... — disse Mana, interrompendo a garota. — O Exército de Riven é gigantesco. Esse ordenado só deveria acontecer se o reino estivesse preste a entrar em uma guerra de proporções mundiais.

— Exatamente. — afirmou Peeh, olhando rapidamente para trás. Não era de se estranhar que Mana soubesse de algo como isso, já que ela trabalhou para um reino durante um bom tempo. — É por isso que eu disse "teoricamente". Pois nenhum alerta de guerra foi emitido. Claro, isso poderia significar que o próprio reino estivesse preste a declarar uma guerra contra outro reino... Mas não havia nada disso. As tropas não estavam se locomovendo para nenhum ponto estratégico ou algo parecido. Inicialmente, as famílias não se preocuparam com tal fato. Até se passarem duas semanas e NENHUMA das pessoas que foi para o regime obrigatório mandou notícias à seus familiares. E os familiares que foram até a Capital procurar seus maridos ou filhos, simplesmente não os encontraram em lugar algum.

— Espere... Nenhum? Isso é praticamente impossível, já que o número de pessoas recrutadas nesse regime deveria ser enorme! — comentou San.

— Sim, é nesse ponto que eu queria chegar. — continuou a Líder. — Foi como se todos os recrutados tivessem simplesmente desaparecido. Como não obtiveram nenhuma notícia deles, as famílias começaram a perder o controle e muitos deles não paravam de pedir audiência para o Rei. E foi aqui que tudo começou a ficar desastroso: o Rei não estava mais recebendo audiências. — Peeh não viu, mas San e Mana fizeram exatamente a mesma expressão após ter ouvido a notícia. Não era novidade para ninguém que Riven era um reino próspero por ter os mais bondosos e acolhedores reis de toda a história da humanidade. — As coisas ficaram agitadas quando um grande número de familiares, nervosos pela falta de consideração do reinado, se juntaram e foram para esse Castelo ao mesmo tempo. Por medo, os soldados reagiram e expulsaram o povo na base da força. Sem terem como reagir, os familiares saíram da Capital e se reuniram em um outro lugar. A conclusão deles foi óbvia: pedir a ajuda de alguma Guilda para eles investigarem o caso.

— Pagar uma Guilda para investigar um dos maiores centros do mundo? Quem aceitaria esse trabalho? — perguntou Mana, diretamente.

— Ninguém aceitou. — falou Jimmy, que estava quieto até agora. — As guildas se recusaram a fazer uma loucura como essa.

— Mas ao invés de desistirem... — era Peeh de novo, continuando a explicação. — Eles voltaram a se reunir, com ainda mais gente. Decidiram agir por eles mesmos. Mas antes de poderem fazer qualquer coisa, um raio de esperança apareceu: um dos Capitães da Guarda Real do Castelo de Riven foi até esses familiares, os alertando que as pessoas que foram convocadas para o regime estavam todas presas nos calabouços do próprio castelo, proibidos de sequer verem a luz do dia. É claro que isso gerou ainda mais confusão entre essas pessoas. Isso as fez querer invadir o castelo como rebeldes e resgatarem essas pessoas de qualquer forma. O próprio Capitão disse que iria ajudar, tentando organizar algo menos perigoso para aqueles pobres cidadãos. Foi quando eu, Jimmy e mais alguns outros fomos notificados. Além disso, a quantidade de pessoas que decidiram querer nos ajudar foi muito acima do esperado. Muitos deles nunca tocaram numa arma antes, mas decidiram ariscar suas vidas para salvarem seus familiares presos.

— Menos de dois meses... Então sua Guilda já havia se desfeito e você não estava afiliada com nenhum grupo ou nenhum outro compromisso. Foi notificada de um trabalho grande que pudesse te beneficiar financeiramente, mesmo que fosse perigoso. — disse San, que olhou para Jimmy logo em seguida. Peeh olhou para trás de novo e quase tropeçou na calçada. "Como ele adivinhou tão rápido?", pensou ela. — E você também estava em sua peregrinação de treinamento. Como se envolveu nessa?

— Ahm? Ah! Caraca! — disse Jimmy, sem saber o que dizer. — Eu entrei nessa faz apenas quatro dias. Estava sem saber o que fazer por ter ficado sem Guilda também, e daí uma conhecida minha me pediu ajuda e eu acabei fazendo parte desse exército aqui.

— Simples como sempre. — disse Mana. Jimmy a olhou com nervosismo, mas a assassina retribuiu o olhar com uma cara de puro sarcasmo.

— Desde quando você aprendeu a ler mentes, San? — perguntou Peeh, sem olhar para trás dessa vez.

— Desde o dia que eu descobri que as pessoas tem mais medo delas mesmas do que de outras pessoas. — respondeu o Garoto Maluco. Dessa vez, foi Mana que quase tropeçou enquanto corria por querer olhar para o lado. Foi uma resposta profunda demais vinda dele. Jimmy não entendeu absolutamente nada, então só continuou correndo. Peeh tentou não demonstrar nenhum sentimento quanto aquilo, pois ela sabia que era bem verdade. — E então? O plano é invadir o castelo para chegar até o calabouço e liberar os cidadãos presos?

— Resumidamente falando, sim. — respondeu Peeh, por fim. — Nós separamos todo nosso exército em esquadrões, e cada um desses esquadrões tem missões específicas, mas com um objetivo igual: tirar a atenção dos Soldados Reais do calabouço, que é uma entrada bem ao fundo do castelo. Inicialmente, nosso ataque era pra acontecer somente a noite, mas o Capitão disse que o último batalhão que sairia para a guerra no sul teve que sair mais cedo, e dentro do castelo estaria acontecendo uma importantíssima reunião com o Rei nesse mesmo horário. Então não poderíamos escolher hora melhor para o ataque.

— Acreditamos que os soldados serão movimentados e instruídos à proteger o local onde essa reunião será efetuada, então vamos aproveitar essa deixa para correr até o calabouço. — disse Jimmy, complementando a explicação de Peeh.

A conversa não durou mais tempo porque eles tinham chegado em seu destino inicial. Era uma parte do grande muro do castelo e realmente estava destruído. Não era só um buraco, mas sim, o muro havia sido aniquilado, como se um touro gigante batesse com tudo nele. Havia bastante fumaça e resquícios de magia no ar, o que fez San e Mana acreditarem que aquele buraco tinha sido feito com alguma magia destrutiva de alto nível.

Os soldados rebeldes passaram pela abertura do muro e gritaram ao começarem a correr contra o castelo. Eles precisavam dessa empolgação para irem até o campo de batalha preparados para morrer. Com a visão que eles tinham dali, era possível ver que a situação do ataque andava estranhamente favorecida aos rebeldes.

Quase não haviam lutas pelos arredores, pois os soldados do reino tinham sido empurrados para dentro do castelo pela enorme quantidade de rebeldes. Peeh sorriu quando terminou sua própria análise da situação. Com os soldados lutando dentro do castelo, ela teria tempo mais do que o suficiente para completar sua missão.

— Jimmy, nós vamos aproveitar essa deixa para correr para os fundos do Castelo! — disse ela, apontando para o lado esquerdo. O lutador se virou e fez "sim" com a cabeça. — Mana, San. O que vocês farão?

— Eu estou sentindo uma aura muito ameaçadora vindo de algum lugar, mas não consigo dizer de onde exatamente. — disse Mana, procurando algo com os olhos. Ela não tinha respondido a pergunta de Peeh, mas a ouviu alto e claro. Além disso, essa aura era bem mais preocupante, porque não era algo comum e não poderia vir de nenhum daqueles rebeldes. — Eu espero que seja uma das pessoas que foram contratadas assim como vocês.

— Os dois outros membros do nosso time do Coliseu estão aqui, em algum lugar. — respondeu a Líder. — Eles são poderosos. Pode ser a aura de um deles que você está sentindo.

— De qualquer forma, não podemos ficar aqui parados. — respondeu San. — Eu e Mana vamos tentar entrar no Castelo para procurarmos nossos companheiros. Não se preocupe, não vamos atrapalhar seu exército e nem nos meter nas batalhas. Bom... Vamos TENTAR, pelo menos.

Eles já estavam sem tempo. Peeh e Jimmy deram um rápido aceno de mão para a dupla e começaram a correr em direção aos fundos do Castelo. San olhou para Mana e viu que ela tinha uma expressão congelada no rosto. Isso não era normal. Havia preocupação em seus olhos e ela continuava procurando por algo. Ou alguém.

O garoto fez o mesmo que a parceira, e olhou para os lados procurando algo que pudesse ser perigoso. Ele encontrou algo, mas foi mais estranho do que perigoso: alguém estava correndo contra o muro e depois pulando para cima dele como se não fosse nada.

San forçou a visão e viu que era uma pessoa com uma vestimenta negra de ninjas. Pelo cabelo e, obviamente, o tamanho dos seios que eram destacados por causa da roupa apertada, se tratava de uma mulher. Era habilidosa. A velocidade de corrida e o impulso no pulo demonstravam que ela era uma invasora com grande experiência. Mas ela não exibia uma aura forte, então não era ela que Mana tinha sentindo.

— Mana, precisamos ir encontrar Kula e Mulkior. E Regi, se possível.

— Ah sim. — respondeu a assassina, saindo de um tipo de transe temporário. — Por onde devemos entrar? Todo o lugar está um caos!

— Eu tive uma ideia. Me siga.

Regi se defendeu de uma investida feita por dois dos soldados rebeldes que estavam lhe rodeando. Havia outros ainda. Um era arqueiro e atirou uma flecha alta na direção de sua cabeça. A ferreira rolou no chão, se esquivando. "De quem foi a ideia de lutar com toda essa gente ao mesmo tempo?", pensou ela. "Ah, foi minha mesmo.", pensou ela, de novo.

A situação era ruim para as duas garotas. Os soldados rebeldes a cercaram e decidiram atacar tudo ao mesmo tempo. As duas saíram do centro da investida, pulando cada uma para um lado diferente. Foi aí que Regi ouviu Kula gritar algo como "Regi, consegue cuidar desses aí? Essa mulher com a lança é muito mais forte e mais perigosa!". Na hora, a ferreira nem pensou direito. Respondeu "Claro, pode deixar.". Loucura.

Kula Chikigane tinha um excelente motivo para ter falado aquilo: ela tinha sentido e medido a aura da inimiga em sua frente. Não era ninguém fraco. Ao mesmo tempo, ela tinha sentido que nenhum daqueles outros soldados rebeldes tinham sequer uma aura de combate em seus corpos. A maga tinha certeza que sua parceira conseguiria dar conta daqueles soldados, se não fosse encurralada, claro.

Não que ela tivesse tempo para pensar no bem estar de outra pessoa. A mulher de naginata avançou contra a maga em uma velocidade impressionante. Ela atacou com um corte vertical curto, vindo de cima. Ela era rápida, mas não o suficiente para pegar Kuchi em um balanço tão simples.

A maga deu um passo para trás se livrando do golpe completamente. Ou foi o que ela pensou. Kula sentiu uma leve dor no peito, perto do ombro direito. Olhou rápido e viu que sua roupa tinha sido rasgada e ela havia levado um corte pequeno na pele. Quando? Foi com o primeiro movimento de sua inimiga? Impossível! O golpe não tinha sido rápido o suficiente para tê-la pego em plena esquiva.

E lá foi a mulher de novo. Dessa vez, ela jogou a naginata para trás e a trouxe na direção de Kuchiki em um golpe horizontal aberto e muito baixo. Mais uma vez, o golpe não tinha sido rápido o suficiente para que a maga não pudesse ter escapado. Pulou para trás e deixou a arma de sua oponente atingir o nada. Dor. Olhou para baixo e viu que havia um leve corte em sua perna esquerda. "De novo!", pensou a garota recém ferida. Como aquilo poderia estar acontecendo? Sua esquiva tinha sido perfeita! A não ser que...

— Essa sua arma é mágica! — gritou a maga.

— Perceber isso não vai te ajudar a sair viva dessa luta.

A mulher nem tentou puxar um assunto mais amigável. Ao ver a clara cara de impressionismo de sua oponente, a mulher com a naginata partiu para cima mais uma vez, atacando com um golpe de ponta. Essa arma não era boa para esse tipo de ataque, mas um golpe bem mirado poderia criar uma ferida bem feia na carne do oponente.

Dessa vez, Kula não mediu esforços para dar um pulo longo para o lado. A primeira coisa que ela fez foi verificar o corpo para ver se tinha recebido um novo corte, mas por sorte, sua esquiva tinha sido perfeita dessa vez. Pela pressa no avanço de sua oponente, Kuchi previu que essa batalha seria de vida ou morte. Aqui não havia regras. Era matar ou morrer.

LANÇA-CHAMAS INCANDESCENTE!

Esse foi um inicio bem diferente para a maga. Kuchi sempre usava a estratégia de começar com sua magia mais básica e com um gasto menor de energia mágica para testar as habilidades do oponente. Era possível calcular a velocidade de reação, força, agilidade e até mesmo a tática usada pelo seu oponente, apenas atirando uma esfera de fogo nela.

Isso só não funcionava direito em duas situações: uma batalha contra monstros irracionais, que sempre surpreendiam todo mundo com uma batalha usando apenas instintos de uma besta. Ou em uma batalha contra alguém desesperado. Pessoas assim eram perigosas, pois elas usariam qualquer meio para ganhar, sem se importarem com os ferimentos que elas mesmas receberiam.

Kuchi sabia que sua oponente não estava desesperada, mas a pressa dela mostrava que uma batalha longa seria desvantajosa para ela. E para falar a verdade, também seria desvantajoso para a maga de fogo, pois ela não conseguia parar de se preocupar com Mulkior. Aquele lugar onde ele havia ficado era importante demais para ser deixado de lado pelos rebeldes. Uma prova disso era a quantidade de corpos que Raziel havia empilhado naquele corredor que dava para o Grande Salão.

Foi isso que a fez concentrar mais energia nas mãos e disparar suas chamas retas em direção da oponente.

ESCUDO DE VENTO!

A mulher de kimono branco segurou a naginata em frente ao corpo e a girou rapidamente, liberando uma grande quantidade de energia mágica enquanto criava um tipo de tufão lateral em sua frente. As chamas de Kuchi bateram nesse tufão e foram dispersadas para todos os lados, deixando a oponente intacta. Uma habilidade de defesa magnífica. E problemática.

Quando as chamas terminaram de soprar das mãos de Kula, foi a vez da mulher de branco atacar. Pegou impulso com as pernas e deu um salto para frente, na direção da maga. Dessa vez, ela forçou mais os braços e deu um corte vertical em uma velocidade bem maior que os golpes anteriores. Kula não tinha nenhuma arma para poder bloquear, então tudo o que podia fazer era pular para o lado para se esquivar. Esse tipo de oponente era o mais difícil para a garota de vermelho.

A esquiva falhou dessa vez. A naginata da mulher atacante cortou o braço direito de Kuchi, fazendo o sangue surgir imediatamente. A maga colocou a mão na ferida e começou a correr para trás, tentando ganhar mais espaço. Não que a sua oponente fosse deixar.

Assim que Kula começou a correr, a mulher a seguiu de perto, preparando um outro golpe rápido. Um corte horizontal, mirado no peito. A maga de fogo viu que não teria escapatória daquele golpe, mas mesmo assim, jogou o corpo para trás. Ela levou o corte, mas o pulo para trás tinha feito com que o ferimento não fosse profundo.

Kuchi caiu de costas no chão por perder o equilíbrio. Essa seria a chance de sua oponente de criar outro ataque sem defesa. SERIA... Se a garota acuada já não estivesse concentrando energia mágica nas mãos.

MÍSSIL DE FOGO!

Apontando a mão aberta para frente, Kuchi criou seu míssil de chamas que disparou rápido na direção de sua oponente. A mulher de kimono, vendo que estava em uma posição ruim para se esquivar de uma magia a queima roupa, colocou sua arma na frente do corpo, recebendo o míssil com tudo.

A explosão não foi grande, mas fez a mulher recuar mais de quatro metros, arrastando os pés no chão de terra. Ela não parecia muito ferida, mas para Kuchi, isso não importava muito. Aproveitou para ficar em pé novamente e dar mais um passo para trás. Agora ela tinha o que queria: distância.

CÍRCULO DE FOGO!

Fazendo um circulo com o dedo indicador logo após ter concentrando um pouco de energia mágica, Kula cria sua característica magia de aprisionamento com suas chamas. Sua oponente ficou em volta daquele fogo, sem ter por onde escapar.

A maga deixou escapar um leve sorriso. Não importava se aquela arma tinha um grande alcance, nunca alcançaria uma pessoa a mais de cinco metros de distância. E a ideia de Kula era ficar um pouco mais afastada ainda, para poder ter tempo de se concentrar em uma magia mais poderosa. Uma que sua oponente não conseguisse se defender usando aquela magia de um minuto atrás.

Foi quando ela pensou em se concentrar, que a maga percebeu que sua oponente já havia concentrado uma certa quantidade de energia mágica. Ela iria usar uma magia dali? De dentro do círculo de fogo? A resposta foi "sim".

LINHA DE VENTO CORTANTE!

Toda a energia concentrada foi passada para a grossa e afiada lâmina da naginata. A mulher levantou a arma com um só braço, deixando ela reta para os céus. Nesse momento, a lâmina brilhou rapidamente, e então, a mulher desceu a arma, criando um golpe vertical para frente. Claro, a sua arma não atingiria nada. E essa não era a intenção.

Quando a lâmina desceu, uma espécie de vácuo foi criado e uma onda de energia unilateral foi disparada em direção de Kuchi. Foi o golpe mais rápido que a maga já tinha visto. E sentido.

A onda de energia atingiu a maga em cheio, fazendo-a soltar um grito de dor quando caiu de costas no chão, mais uma vez. Agora tudo tinha virado de cabeça para baixo.

Kula levou a mão no peito, no novo corte, e viu que era profundo. Não era ferida de ferro. Então por que estava doendo tanto? Se virou para o lado, tentando encontrar forças para se levantar. Ouviu Regi gritando por seu nome, mas a adrenalina estava tão alta e sua mente estava tão focada na oponente, que a maga não respondeu pelo apelo da parceira. Forçou as pernas e ficou em pé de novo, levando a mão direita no machucado mais uma vez. A dor era intensa demais. Aquilo não era normal.

Olhou para frente. O circulo de fogo estava desaparecendo e a oponente continuava intacta. Essa batalha estava sendo mais difícil do que ela havia imaginado. Como os rebeldes tinham conseguido alguém tão forte assim? Quem eram esses rebeldes? E o mais importante: como Kuchi sairia viva desse combate? Foi entre essas dúvidas que sua oponente, dando um passo para frente, falou:

— Você teve mesmo azar de me encontrar aqui e não na Arena do Coliseu.

— E quem é você?

Mulkior Musubi estava em frente a grande porta dupla, substituindo o lugar de Raziel, que já tinha ido pro campo de batalha há cinco minutos atrás. Quando ele viu alguém explodindo uma parede do corredor e aparecendo como se nada tivesse acontecido, ele levou à mão até sua bolsa de esferas, retirou duas e as transformou em uma espada e um escudo imediatamente.

Aquela pessoa era problemática. Tinha uma aura intensa saindo do seu corpo e ele parecia estar pronto para atacar a qualquer momento. Além disso, Mumu já o tinha visto no Coliseu. Ele era de um dos times finalistas, ainda por cima. O que estava fazendo ali?

— Você é Mulkior da Garra de Ferro, não é? — disse a pessoa, dando mais um passo à frente. Mumu não abaixou a guarda. — Ah, é você mesmo! Sabia que é falta de respeito perguntar o nome de alguém antes de falar o seu nome? — disse ele, sorrindo levemente.

— Você já sabe o meu nome, então podemos pular essa parte, certo? — respondeu o mago, ainda em posição defensiva.

— Ahahahahah! — riu o homem. Ele levou as duas mãos para trás, estralando os dedos. Mulkior colocou o escudo na frente do corpo e segurou a espada firmemente. — Desculpe, mas eu não sou bonzinho o suficiente para entrar nesse código de honra dos nobres. Eu descobri o seu nome, então você vai ter que descobrir o meu!

Foi uma ação e uma contra reação imediata. Quando o homem de sobre-tudo trouxe as duas mãos para frente, ele estava segurando duas armas, uma em cada mão. Mulkior não teve tempo para ficar impressionado.

Mas explicando melhor, se tratava de duas pistolas GLOCK 17 nas cores preto e prata. Duas armas de fogo. Essas armas eram exclusividade dos reinos distantes do Noroeste, onde o grande Império Haoriano comanda cada centímetro de terra em uma área ainda maior do que Riven. Foi lá que essas armas foram criadas e a comercialização delas para outros reinos é estritamente proibida. Isso porque, além de ser as armas usadas pelo Exército Imperial, elas necessitam de muito treino e aperfeiçoamento para manejá-las sem que elas matem seus usuários.

Mumu era de uma família de ferreiros, então ele já tinha visto todo o tipo de arma, por mais estranha que ela fosse. Então não era a primeira vez que ele via uma arma daquelas. Mas era a primeira vez que uma dessas era apontada para sua cabeça.

O homem disparou duas vezes, uma bala de cada arma. A reação do mago foi extraordinária. Ele levantou o escudo, defendendo os dois tiros. Nesse ponto, Mulkior teve várias conclusões.

A primeira delas era que, pelo barulho feito em seu escudo na hora do impacto, essas armas não disparavam projéteis físicos, e sim, energia mágica. Isso também era visto quando se olhava para as pistolas, pois elas emanavam uma certa aura própria. A outra conclusão importante que ele teve foi a velocidade dos ataques. Os projéteis mágicos voavam em uma velocidade próxima a do som, o que fazia com que Mumu teria que tentar se defender não usando sua visão, mas sim, sua percepção.

Mas ao invés de ficar planejando algo, ele avançou contra o seu oponente. O atirador não deu descanso. Começou a disparar em locais específicos para parar o avanço do mago. Mumu jogou o escudo para os lados e para frente, defletindo todos os tiros. Por mais que eles fossem rápidos, eles não continham tanto poder de impacto assim.

O homem não identificado mirou na perna do seu atacante e disparou duas vezes a mais, sabendo que ele não conseguiria se defender direito daquilo. E Mulkior realmente não defendeu. Ao invés disso, colocou força nas pernas e deu um salto para frente, escapando dos projéteis e atacando ao mesmo tempo.

Foi um golpe diagonal usando a espada. O homem não tentou esquivar. Ele sabia que recuar não seria vantajoso ali naquela situação, e mais importante que isso, recuar não fazia seu estilo. Ele levantou o braço esquerdo e defendeu a espada de Mumu com uma das pistolas. O baque das duas armas não criou um som muito poderoso.

Ainda no ar, Garra de Ferro sentiu dor na perna e quando caiu, perdeu o equilíbrio. Isso porque ao defender o corte do mago, o atirador levou sua mão direita para o lado cego de Mulkior e depois atirou em sua perna. O tiro foi certeiro, mas não tinha causado tanto dano. Mas isso com certeza afetaria a movimentação do mago dali em diante.

E o atirador não parou. Mirou para baixo e disparou de novo. Dessa vez, Mumu foi mais rápido e bateu na GLOCK com sua espada, fazendo a arma de fogo ir para cima. Buscando forças do além, Mulkior joga o seu corpo para o lado e dá uma rasteira no atirador. O homem perde o equilíbrio e cai também, não levando nenhum dano significativo. Agora os dois estavam no chão.

E foi a vez do mago de ferro começar o ataque. Ele girou a espada na mão e tentou atravessar o estômago do oponente com um golpe de ponta. Com medo, o atirador rola para trás, evitando ser empalado pela espada do inimigo, mas não escapando de um corte leve na barriga.

O homem de óculos escuros se levanta rápido, dá um grande passo para trás e mira de novo no oponente, atirando mais três vezes. Mumu, de joelhos, defende dois dos tiros. O último escapou de seu escudo e raspou seu braço direto, quase no mesmo lugar de um corte que um dos soldados rebeldes tinha lhe infligido há uns minutos atrás. O atirador ainda iria disparar mais, mas Mulkor não o deixou:

TIRO DE METAL - FACA!

Mulkior concentrou energia mágica em sua espada e, sem esperar, a atirou contra o oponente. Ele não estava muito longe, então a arma não voaria tanto assim. Mas ela transmutou logo que saiu da mão do mago, então pode se dizer que a surpresa foi grande.

O motivo de Mumu escolher uma faca para arremessar foi por causa da velocidade de giro. Como a arma era menor, ela girou muito mais vezes, voando até o ombro do atirador e lhe acertando em cheio.

O homem atingido soltou um palavrão em tom alto e deu mais três passos para trás, levanto a mão direita até a faca enterrada em seu ombro esquerdo. Segurou a lâmina e a retirou, sentindo mais dor ainda. No segundo seguinte, a faca desapareceu, se tornando mais uma vez a pequena e inofensiva bolinha de metal.

Foi então que o atirador inimigo ficou bravo. Ele sabia que não podia brincar com aquele cara ali na sua frente. Aquele mago controlador de metais era forte o suficiente para ser campeão de chave do torneio regido pelo Coliseu dessa cidade. Além disso, ele ASSISTIU as lutas de Mumu, então sabia muito bem do que ele era capaz.

Mas o Líder da Immortal Star também deveria ter em mente que ele não era o único campeão ali. O homem riu mais uma vez, tentando ignorar a dor no ombro. Concentrou energia mágica nas duas pistolas, o que fez o mago ficar em pé imediatamente e pegar mais uma esfera de metal em sua bolsa. Mas ele não teve tempo para transformar em outra arma, pois seu oponente agiu primeiro.

TRANSFORMAÇÃO DE ARMAMENTO - SHOTGUN!

Foi mais incrível do que soou. As duas pistolas do atirador brilharam forte, fazendo com que Mulkior colocasse o escudo em frente ao rosto por um segundo. Depois disso, as armas fizeram exatamente o mesmo que as esferas de Mumu: se transmutaram. Quando o brilho cessou, o homem de sobre-tudo negro estava segurando uma perigosa SPAS-12, uma shotgun tática de alto calibre e uma força destrutiva impressionante.

O mago de ferro abriu os olhos o máximo que pode. Era magia de transmutação, igual a sua! Claro, isso não era impossível e muito menos raro de se ver. A academia que ele frequentou era conhecida mundialmente e lá, não eram só dadas aulas de transmutação de metais. Será que esse cara frequentou a mesma academia? Era possível. Será que era por isso que ele o reconheceu? Ou foi porque esse cara... ISSO! Mas é claro!

Mumu tinha lembrado de algo óbvio demais. Aliás, duas coisas óbvias demais. Ta... Na verdade três. Mas essa última, ele teve que lembrar na marra.

O atirador carregou a arma puxando o cilindro do cano, mirou para o oponente e atirou. Foi barulhento. Um só tiro daquilo já bastava. O tiro bateu no escudo de Mulkior, mas nem aquele acessório o protegeu de ser violentamente jogado contra a parede a cinco metros dali.

O mago bateu com as costas no muro, ficando sem ar por um segundo. Depois, ele caiu e ficou de joelhos, tossindo. Olhou para o próprio escudo e se assustou quando o viu totalmente dobrado para dentro. A força daquela arma era horripilante.

— Agora eu me lembrei de você... — disse Mulkior, ainda recuperando o fôlego. — Você é Lelouch Maximolf, também conhecido como "Cem Gatilhos"!

— Eheheh... Agora você deve saber o porque eu ganhei esse Título Único. — disse Lelouch, carregando a arma mais uma vez.

— Você era líder do Batalhão das Forças Armadas de Prestes, a Cidade de Prata! — Mumu falou aquilo enquanto ficava de pé. Conversar daria tempo para ele reganhar o fôlego. — O que um soldado condecorado como você está fazendo aqui, trabalhando para um Exército Rebelde?

— Opa, opa. Isso é informação demais pra você. — disse Lelouch, apontando mais uma vez para seu oponente espertinho enquanto se aproximava vagarosamente. — Digamos apenas que "nossos interesses se cruzaram".

Shiro se jogou contra a porta de madeira desastrosamente, criando um grande barulho por todo o corredor. Ele estava cansado e machucado. Irritado e fora de si. Onde ele estava agora? Havia pouca luz onde ele se encontrava, mas era possível ver que estava em um dos quartos dos empregados. Seu braço doía. Ele não conseguia se concentrar em uma só coisa. Estava nervoso e com sangue fervendo. Traição! Como ele iria se segurar depois de ver seus dois companheiros o largarem lá para morrer?

O ninja sabia que ele seria capturado e torturado até o infinito antes deles acabarem com sua vida. Que coisa foi aquela de "Nossa missão em primeiro lugar"? "Tomar no cú com isso, porra!", pensou ele. Na verdade ele não "pensou", ele falou em voz baixa mesmo. Não estava se contendo. Queria matar todo mundo que visse pela frente.

Mas não fez nada desde que saiu de cima daquele candelabro, bem da frente da porta de entrada daquele grande salão. O ninja machucado sabia que ficar perto daquele General iria fazer seu tempo de vida diminuir drasticamente, então logo depois de tomar fôlego, Shiro usou sua magia de pular nas sombras de novo e apareceu em um outro lugar. Era um corredor mais ao fundo. Shiro não sabia pra onde aquilo daria, mas com certeza seria melhor do que ficar no corredor esperando para ser empalado de novo.

Então ele correu com todas as forças que ainda lhe restavam. Correu e correu. O braço não parava de sangrar e a raiva não parava de aumentar. Ser abandonado tinha criado um vazio dentro do coração dele. Um vazio que ele nunca tinha sentido.

A vida de Shiro sempre foi muito agitada. Ele sempre era cercado por muita gente, e ele sempre tentava ficar amigo de todo mundo. Desde pequeno, ele sempre tentou ser o centro das atenções, e geralmente conseguia. Então pode se dizer que ele só estava realmente vivo quando ficava na Guilda rindo com o pessoal enquanto comiam, bebiam e jogavam papo fora.

Mas aqueles dias haviam terminado. Que tipo de guilda abandona o seu MELHOR ninja assim, sem mais nem menos? Que ordens eram essas que White tinha passado? E o mais importante: por que nada disso tinha sido dito a ELE?

Não haviam respostas. Só a lógica dele funcionava naquele momento. Traição. "Traidores!!". A mulher que ele pensava tanto tinha lhe virado as costas na pior hora de sua vida! Como ele sobreviveria aquilo? O desespero tinha começado a corromper a mente do pobre ninja quando ele ouviu um barulho vindo do próprio cômodo que ele tinha entrado.

— Você... Quem é você?

Quase paralisado, Shiro virou a cabeça para o lado só para encontrar uma mulher vestida com seu pijama rosa simples, sentada na cama segurando o lençol contra o peito. Não era nenhuma guerreira. Isso era fácil de se notar pela falta de aura em seu corpo, mas também dava para perceber porque os olhos daquela pessoa não carregavam nenhum peso da batalha. Eram olhos puros demais. E continham medo.

— Ai caralho... — disse Shiro, ainda encostado à porta fechada. Ele não tinha prestado atenção onde tinha entrado e como dito anteriormente, ele não fazia ideia de onde estava. Os quartos dos empregados eram localizados muito à esquerda e aos fundos do castelo. Mas o Salão do Rei era na frente! Então como ele chegou ali? Será que ele tinha caminhado tanto assim? Ele não lembrava. Não estava raciocinando bem quando tentava fugir daquele Raziel de uma figa.

— Você está sangrando! — disse a mulher, jogando o lençol para o lado e indo para a borda da cama.

— Estou. — respondeu ele, sem querer. — Olha, você tem como ficar em silêncio? Eu juro não te machucar se... EI! O que você pensa que vai fazer? — a mulher tinha feito Shiro mudar de tonalidade na voz porque ela estava rasgando o próprio lençol em uma só tira comprida. Ela se levantou e caminhou até o ninja acuado. Shiro continuou no mesmo lugar. — O que você quer fazer com isso aí?

— Eu vou enfaixar o seu braço! — respondeu ela, com autoridade. — Ande logo! Seu ferimento parece grave. Sente aqui na minha cama e puxe essa manga ensanguenta da sua camisa estranha!

— Mas que cacete, mulher! Você endoidou? Nunca me viu na vida e quer me enfaixar mesmo depois de invadir seu quarto?

— Eu não to preocupada com isso. Sou filha de uma médica e sei fazer primeiros socorros. Além disso, minha mãe me ensinou a nunca dar as costas para alguém ferido! Agora pare de perder tempo e sente logo na cama!

A cena foi mais cômica do que séria. Shiro se viu sem reação perante a mulher que estava com a mão apontada em sua direção, para que ela pudesse ajudá-lo a levantar. Filha de uma médica? E isso era motivo para você querer ajudar um cara que invade sua privacidade enquanto você dorme?

O mais estranho era que o ninja, sem perceber, esqueceu de toda a raiva que sentia um minuto antes do ocorrido. Ele segurou a mão da mulher e foi puxado para cima, ficando em pé. Foi quase que empurrado para a cama, se sentando nela. A mulher, em seu lado, pegou na manga da vestimenta negra do ninja e a puxou com força, rasgando aquela parte e depois jogando no chão. Ela pediu que Shirou segurasse seu braço em linha reta, e depois, ela começou a enfaixar o mesmo com a tira de lençol branco rasgado. Shiro sentiu uma forte fisgada na carne quando ela apertou o enfaixe para fazer o sangue estacar de uma vez.

O trabalho tinha sido feito em uma grande velocidade e uma perícia sem erros, demonstrando que a mulher poderia ser mesmo uma médica ou pelo menos uma enfermeira. Shiro já tinha perdido as contas de quantas vezes tinha sido enfaixado da cabeça aos pés, então ele saberia reconhecer uma boa enfermeira. Além disso, ele sempre dava em cima de TODAS as enfermeiras que lhe atendiam, então essa é uma parte onde ele paga as dores que está sentindo com suas cantadas falhas.

Mas naquele momento, ele não se sentiu na vontade de paquerar. Por mais que a raiva tivesse desaparecido, o sentimento ruim de ser abandonado continuava ali, pregando sua mente. Ele precisava fugir do Castelo... Mas então ele lembrou do barulho das explosões.

— O que você estava fazendo aqui? O que é toda essa barulheira que está vindo lá de fora? — perguntou a mulher, sentada na cama ao lado do ninja.

— Eu não sei o que é esse barulho. E não posso te dizer o porque eu estou aqui.

— Eu ouvi os soldados gritando algo como se estivéssemos sendo atacados. Isso não pode ser verdade, não é? Afinal estamos no Castelo Real de Riven! É um dos lugares mais protegidos do mundo!

— É, precisa ser muito burro pra invadir esse lugar. — disse Shiro, pensando logo em seguida "Bem dessa, burro que nem EU". Ele quase riu da própria conclusão. Os dois ouviram outra explosão e essa parecia mais próxima. — Escuta, valeu aí pelo curativo, mas eu preciso dar o fora daqui e...

A porta explodiu. Sim. A porta de madeira do quarto da pobre mulher filha de médica explodiu em mais de cem pedaços pequenos de farpa que voaram para todas as direções, fazendo os dois se jogarem na cama, protegendo a cabeça.

Antes que a mulher curandeira pudesse soltar um grito de desespero, Shiro já tinha ficado de pé e puxado uma kunai. O seu braço poderia estar enfaixado, mas isso não quer dizer que estava curado. Além disso, ele fez essa ação de ficar em pé em modo de combate porque ele sabia que "alguém" tinha causado essa explosão.

E esse alguém provavelmente estaria procurando por ele. O que apareceu pela ex porta deixou o ninja com um olho mais aberto do que o outro. Era uma mulher. Mas não estava de pijamas. Estava usando uma clássica armadura de combate no peito e uma vestimenta de guerra usada por magos por baixo. A armadura era cinza brilhosa e a vestimenta por baixo, que se tratava de um roupão totalmente fechado de cima a baixo com um capuz, era na cor amarelo claro.

"Perigo" era o que a mente de Shiro estava querendo o alertar. A aura dessa mulher não era de um soldado qualquer. Shiro observou bem o peitoral da armadura e viu o brasão da bandeira de Riven, mostrando que de fato, era um soldado do exército real. Mas uma maga? Aliás... Uma mulher? Um soldado? "Mas que porra?".

— Ah! Te encontrei, espião! — disse ela. A voz dela não era tão fina, mas era tão irritante quanto. Com a poeira da explosão desaparecendo, Shiro ainda pode dar uma melhor analisada no rosto da pessoa. Ela tinha cabeços compridos até depois do ombro, com fios bem ondulados e castanhos, olhos na cor de mel, um rosto um pouco redondo e uma cor de pele bem pouco escura. Shiro não conseguia ver beleza em uma mulher vestindo uma armadura. Nem em uma que quisesse lhe matar. — Eu sabia que tinha visto alguém suspeito vindo para os estabelecimentos dos empregados e olha só quem eu encontrei!

— Não devia ter vindo pra cá, moça. Vai acabar perdendo a vida. — disse Shiro, em uma tentativa alucinante de intimidar a mulher.

— Consegue fazer piada até mesmo agora? — disse a mulher, colocando um pé para dentro do quarto. Mas ela parou ali. A conversa boba iria acabar. Ela olhou para o ninja e viu que ele tinha mudado a expressão. Estava pronto para atacá-la para valer, mesmo naquele pequeno espaço. Ela tinha sido avisada pelo General Raziel que os três invasores não poderiam ser subestimados. Ela não era teimosa o suficiente para ignorar o aviso. Além da aura assassina do invasor, havia outra coisa que estava tomando sua atenção. — Você está enfaixado. — ela olhou para a empregada dona do quarto, que nesse momento, estava espremida contra a parede embaixo da única janela do quarto. — Isso foi obra sua? Não sabia que ele é um invasor?

— Capitã Minnds, mil perdões! — chorava a filha de médica. — Ele entrou no meu quarto já machucado e eu não sabia o que fazer!

— Silêncio! — disse a Capitã, concentrando energia mágica na mão direita. — Você ajudou um inimigo do Reino! Vai ser eliminada junto com ele! — a mão da mulher brilhou intensamente. Era um brilho amarelado e não dava a impressão de ser qualquer coisa menos espalhafatosa do que seja lá o que tinha destruído a porta do quarto. — ESFERA EXPLOSIVA!

MERGULHO DAS SOMBRAS!

A descrição do que houve aqui pode ser estranha. Mas o que aconteceu foi o seguinte: em primeiro lugar, Minnds criou uma esfera bem pequena em sua mão direita depois de concentrar toda aquela energia. A esfera era cristalina, como se fosse um globo de vidro. Dentro, havia uma pequena onda de energia que parecia sedenta para sair. E ela realmente saiu.

Minnds atirou a esfera exatamente no meio do quarto, que era bem do lado esquerdo de Shiro e bem à frente da mulher curandeira. Havia muitas possibilidades para a conclusão desse encontro, mas o que realmente aconteceu superou todas as expectativas.

A conclusão foi determinada pela triplicação da velocidade de reação do ninja. Quando a esfera saiu da mão da mulher, Shiro já estava com a adrenalina fazendo todo o seu corpo se movimentar o mais rápido que ele podia. Isso porque o ninja sentiu que aquela pequena esfera concentrada seria o bastante para matá-lo, junto com a pobre mulher que teve o azar de ter o quarto invadido.

O que ele fez? Não foi simples, por mais que pareça. Ele virou 180° e pulou na direção da mulher acuada na parede, a abraçando fortemente. Ele iria se sacrificar pelo bem da mulher? Não exatamente.

Ao abraçá-la, ele usou sua energia para abrir um portal nas sombras e mergulhar nas trevas, junto com a mulher. E então veio. A explosão. Aquela pequena esfera caiu no chão e com esse impacto, liberou toda a energia mágica contida de uma vez só, explodindo o cômodo inteiro. Foi como usar uma granada de energia.

Minnds viu a fútil tentativa do ninja de salvar a mulher, mas a esfera tinha consumido tudo no quarto, deixando apenas as cinzas dos móveis. Mas...

Onde estava o corpo dos dois? Era pra ter sobrado pedaços dos corpos deles para todos os lados... E sangue! Então... Onde? Minnds sentiu algo atrás de si e se virou assustada. Fora do quarto, bem atrás dela no corredor, estavam Shiro e a mulher, intactos.

O ninja invasor estava de joelhos respirando tão rápido que parecia que ele tinha acabado de se afogar em uma banheira. A mulher estava no chão, chorando em total desespero. Ela não sabia o que tinha acontecido e demoraria algum tempo para ela poder se recuperar.

Mesmo no chão, Shiro deu um giro com o corpo e atacou com um corte horizontal usando sua kunai. Minnds poderia estar impressionada, mas não tinha abaixado a guarda. Ela pulou para o lado contrário do golpe, fugindo do corte sem ser acertada.

Shiro ainda estava no chão e arfava sem parar. Não havia o que ser feito. Ele sabia muito bem que era problemático afundar nas sombras carregando outra pessoa. Ele já tinha feito isso antes. Funcionava sim, mas consumia três vezes mais energia mágica do que normalmente necessitaria. E ele não poderia "teleportar" por grandes distâncias. Mas foi a única solução que ele encontrou de salvar ele e a mulher daquela situação. Ele tinha escolhido a maneira mais certa.

— Como você conseguiu escapar da minha explosão? — perguntou Minnds, claramente irritada.

— Vai à merda! — respondeu o ninja, tentando ficar em pé. — Você ficou maluca? Você ia matar uma civil sem mais nem menos!

— Ela não é uma civil! É uma traidora do nosso reino! Ela não tem escapatória!

— Ahhhh ela tem sim. — disse Shiro, liberando sua energia mágica pelo corpo. Fazia tempo que ele não ficava tão bravo contra um oponente específico. Ele olhou diretamente para os olhos da Capitã. Foi uma vontade assassina tão grande, que Minnds não conseguiu NÃO recuar um passo por medo. — Eu não vou deixar você encostar um dedo nessa mulher. E não vou deixar você falar para mais ninguém sobre o que ela me fez. Então eu vou precisar acabar sua vida aqui e agora!

Nem mesmo Shiro sabia, naquele momento, o que tinha feito ele ficar com tanta raiva. Ele tinha uma ideia, e pode-se dizer que o que ele pensava, tinha seu tanto de razão. Shiro ainda estava sentindo o peso de ser abandonado pelos seus camaradas. Esse foi um dos motivos que o fez querer salvar a mulher que tinha lhe ajudado. Por mais que ele nunca tivesse visto a mulher, abandoná-la e deixá-la para morrer ali o faria ser igual a Kuro ou Ravidel. Isso ele se recusava prontamente.

Ele iria provar para aquela guilda miserável e traidora. Iria provar que eles cometeram o pior erro da vida deles por terem abandonado o melhor ninja do mundo. Shiro sorriu. "Melhor ainda, eu vou mostrar pra todo mundo como eu sou foda!", pensou ele.

Seu objetivo tinha ficado mais claro do que a luz do sol. Iria matar a tal Capitã maluca em sua frente e depois sumir desse castelo e planejar uma rebelião ele mesmo. A White Lotus tinha acabado de ganhar um inimigo terrível, e a primeira pessoa que sentiria tamanha ira não era nem membro dessa guilda. Minnds sabia bem disso quando o ninja começou a andar em sua direção.

Mana estava correndo tão rápido, que nem os dois empregados carregando medicamentos pelos corredores conseguiram vê-la. San tinha dado um ideia boa, mas como sempre, doida.

A tal "ideia" dele era usar a sua força aumentada graças à energia vital e ATIRAR a pobre assassina para o segundo andar. Sim. Ele disse que seria mais fácil invadir o castelo por cima, já que todas as tropas estavam no primeiro andar, combatendo os rebeldes. E ele estava certo mesmo.

Mas não havia como chegar nas janelas dos segundo andar do castelo, pois elas estavam em uma altura absurda, e mesmo com as habilidades de escalada dela, ela não chegaria lá e só acabaria caindo no chão. Seria diferente se ela tivesse trazido seu equipamento para escalar. Foi quando San disse "Relaxa, eu vou fazer você chegar lá".

San correu para a parede do castelo, colocando as costas contra ela. Abriu as pernas e juntou as mãos na frente do corpo. Mana deu um tapa na própria cara quando entendeu o que ele queria. Dar o "pézinho"? Era isso que ele tinha em mente?

Ele sempre teve ideias estranhas, mas essa tinha superado as expectativas da razão. "São mais de dez metros de altura, San!", disse ela. E foi quando ele sorriu. Ele SEMPRE fazia isso. "Eu sei medir distâncias, obrigado. Agora corre na minha direção e pule com sua perna direita nas minhas mãos e deixe que eu faço o resto." foi o que ele respondeu imediatamente.

Mana pensou em reclamar mais uma vez, mas do que adiantaria? Ele não iria mudar de ideia. Ela calculou a distância e a própria força de pulo. Quantos metros ela alcançaria em um pulo correndo? Três metros? Isso já era muito, na verdade. San teria que ter a força o suficiente para fazer ela adicionar no mínimo mais sete metros ao pulo. Era loucura!

Mas não era isso que os olhos de San estavam dizendo. Ele estava preparado e concentrado. Mana viu sua aura se fortalecendo, dando indícios que sua convicção seria imutável. A assassina sentiu que perdeu para aquela demonstração de força de vontade. De novo.

Ela balançou a cabeça tentando esvaziar a mente e se concentrando no pulo. Deu mais quatro passos para trás tomando uma boa distância para a corrida. Se preparou e correu com tudo o que tinha. San forçou as pernas e passou energia vital para os braços, deixando eles perfeitamente balanceados para levantar a garota. Mana colocou o pé em cima das mão de San e... Foi literalmente jogada.

Ela não pulou. Não precisou disso. Só a força do garoto foi o suficiente para ela alcançar a janela. Ela olhou para baixo e viu que sua conta estava certa. Era realmente mais de dez metros dali até o chão. "Loucura.", pensou ela.

Mana ficou na janela esperando para ver o que ele faria agora. Pular até ali ele não conseguiria. Foi então que San gritou "Você procura nossos companheiros aí dentro enquanto eu limpo a área para a nossa fuga aqui fora!".

A assassina tinha entendido o recado. Lá fora ainda haviam alguns soldados combatendo, e eles não deixariam um grupo de quarto ou cinco pessoas estranhas saírem do castelo como se nada tivesse acontecido. E eles precisavam de velocidade. Foi isso que a fez sair da janela e começar a correr com tudo o que tinha.

"Desde quando eu comecei a confiar tanto nele?", se perguntou. Foi aquela luta em dupla? Tinha que ser. A luta dele contra Mochizuki também tinha feito Mana ver a verdadeira face de San. E a história dele sobre o pergaminho. A vontade de esconder. O peso que ele carregou. Tudo.

Mana já tinha descoberto que San carregava muitos segredos nas costas, e mesmo com tudo aquilo, ele continuava correndo para frente. Qual era o objetivo dele? Onde ele queria chegar? "Comprar uma fazenda e viver o resto da minha vida como uma pessoa normal." foi o que ele tinha dito antes do Torneio começar. Mentira! Como ele conseguiria viver tranquilamente com todo aquele peso? Com tantas pessoas atrás de sua cabeça!

Mana era uma assassina por muito tempo, então ela sabia bem como era ter que viver se escondendo e lutando por sua vida o tempo inteiro. Ele tinha passado pelo mesmo! Então como? O que estava fazendo ele continuar em frente? Da onde vinha tanta determinação, tanta confiança em si mesmo? E por que diabos ele não estava saindo de sua cabeça numa hora daquelas?

A garota não teve respostas para nenhuma de suas perguntas. Ela fez o mesmo de antes, tentando limpar sua mente para se concentrar no objetivo verdadeiro. O castelo era imenso e ela não iria conseguir achar seus companheiros apenas com sua percepção extra sensorial. Ela não era tão boa quanto Kula para sentir auras de longe. Então precisava rastreá-los com suas habilidades básicas de espionagem e perseguição.

Ela ainda estava no segundo andar e não tinha encontrado quase ninguém pelo caminho. O barulho das explosões continuavam lá fora e ela conseguia ouvir os gritos dos soldados batalhando no andar de baixo. Eles não estavam muito longe, então era possível dizer que ela não estava longe da entrada principal.

Foi quando ela sentiu aquilo de novo. Parou de correr. O corredor estava vazio. Olhou para trás. Nada. A sensação continuava. O que era aquilo? Insegurança? O que poderia fazer isso com ela no meio daquilo tudo? Olhou para o lado esquerdo. Ali, o corredor se dividia. O lado esquerdo levava para uma grande porta dupla de madeira entalhada artesanalmente. Era bonita. Até demais, para falar a verdade. Era de lá. Era daquele lugar que estava passando uma sensação ruim para ela.

Mana engoliu saliva quando sentiu uma aura grande por trás daquelas portas. Mas porque só sentiu agora? Ela deu um passo à frente. A aura estava "chamando" por ela. Isso não fazia sentido! Deu outro passo. A garota não conseguiu se livrar daquilo. Parecia uma rede invisível. Aquilo era controle de aura! Deu outros dois passos, ficando bem na frente das portas. "Não!", gritou seu cérebro. Mas o corpo não estava obedecendo. Levou a mão na maçaneta e abriu a porta devagar.

Antes de entrar com tudo, ela analisou o local olhando pela greta. Uma sala de jantar. Era uma grande sala, na verdade. Retangular, com uma mesa da mesma forma geométrica da sala no meio, mas por mais que a mesa fosse grande, só haviam seis cadeiras em volta dela. Duas do lado direito, duas do lado esquerdo e uma em cada ponta da mesa. Havia um bonito candelabro bem no meio da sala e a mesa estava com uma toalha dourada bem no centro. A toalha tinha o símbolo da Família Real de Riven.

A sala tinha mais coisas. Duas mesas de canto ligeiramente largas. Mais de dez quadros pendurados ao redor da sala, todos com desenhos de pessoas idosas. Duas estátuas de gesso no canto superior esquerdo, ao lado de uma outra porta de madeira.

Havia ainda uma outra porta localizada no canto superior direito, que tinha os mesmos entalhes da porta dupla. A sala era bem iluminada e todo o chão tinha um carpete verde oliva. Era macio de se pisar. Quando Mana pensou nisso, ela já estava dentro da sala de jantar, fechando a grande porta atrás de si.

— Bem vinda ao digníssimo Castelo Real de Riven.

Faltou descrever uma última coisa que tinha naquela sala. Uma pessoa, parada do outro lado da sala, sentada na ponta da mesa. Era dela que saia aquela aura intensa.

Era um homem. Estava bem vestido. Vestimentas nobres. Uma camisa roxa escura de manga cumprida cheia de botões e cordões dourados. Uma calça justa de cor preta e um sapato de couro fino da mesma cor. Usava luvas brancas, um brinco de ouro na orelha esquerda e um relógio, também de ouro, no pulso do braço direito.

Seu rosto era perfeito. Sem nenhuma espinha, nenhum arranhão, nenhuma falha na pele. Seus olhos verdes chegavam a ser convidativos. Cabelo cheinho, liso e penteado para trás. Loiro. Não que Mana fosse atraída por esse tipo de coisa, mas ela precisava admitir que ele era realmente bonito.

— Você não sabe da alegria que meu coração está sentindo ao te ver aqui. — disse o homem, ainda sentado com as pernas cruzadas. Sua voz era forte e muito clara.

— Quem é você? — a pergunta dela não poderia ter sido mais óbvia. Por mais que ele estivesse falando tranquilamente, aquela aura gigantesca não havia sido dissolvida.

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— Você não sabe quem eu sou? Isso me deixa um pouco entristecido... Mas não vou culpá-la. — disse ele, se levantando lentamente da cadeira. — Afinal de contas, você ouviu minha voz, mas não viu meu rosto.

— Sua voz? Do que você... — Mana sentiu um arrepio passando pela sua espinha. Era isso! Ela tinha uma estranha sensação de saber quem era aquela pessoa, mesmo tendo certeza que nunca a viu na vida. A voz! Era isso mesmo! — Não... Não pode ser!

— Ah, você descobriu agora? — disse o nobre, abrindo um meigo sorriso. — Sim, é exatamente o que você está pensando. Eu sou o Comentarista do Torneio desse ano, regido no Coliseu dos Deuses! Meu nome é Bart Evans, Membro Oficial do Planetarium. — disse Bart, se curvando educadamente para a assassina. — Estamos na Sala de Jantar da Família Real, mas eu gostaria de me desculpar por não poder lhe oferecer nada para vossa degustação.

— Bart! Então você é Bart... — Mana apertou as mãos. Elas estavam suadas. Havia muita pressão sendo atirada contra ela. Agora fazia sentido. Era por isso que ela se sentia tão insegura. — O que você quer comigo? Por que você usou sua aura para me puxar até aqui?

— Ah, então você notou! PERFEITO! — gritou Bart, batendo palmas um segundo depois. Ele demonstrava uma verdadeira felicidade naquele momento. — Você é mesmo a pessoa que eu pensei ser! Não só suas habilidades de combate fazem você a minha favorita para o Torneio, como sua beleza, seu olhar afiado, sua percepção antecipada... TUDO! — ele abriu os dois braços, olhando para cima. Parecia em êxtase. — Você é perfeita demais, Lâmina Sanguinária! Eu sabia que tinha escolhido certo!

— Escolhido? Perfeita? O que você quer dizer com tudo isso?

— Eu fiquei triste quando te vi entrando aqui junto com os rebeldes. — Bart totalmente ignorou as três questões da garota e continuou falando. — Imagine como eu me senti quando percebi que eu não poderia mais salvá-la de um destino cruel! Rebelião contra Riven significa morte. Então por que, Mana? Por que você teve que fazer isso?

— Eu não sei o que você está pensando, mas eu não sou uma rebelde. — disse ela, com mais força na voz. Ela não estava gostando de onde aquela conversa estava indo. A garota poderia dizer qualquer coisa, mas não poderia mentir aqui. Não adiantaria. — De fato, eu realmente adentrei esse local ao lado da Líder dos Rebeldes, mas foi só uma coincidência. Meu objetivo aqui é outro.

— Ah, então você não é uma rebelde? — disse Bart, demonstrando que ele tinha se agarrado ao um certo tipo de esperança. — Me diga o que você veio fazer aqui, que talvez eu ainda consiga te salvar!

— Meus companheiros de time estão aqui para... Resgatar uma amiga. Sabemos que ela está dentro do Castelo, mas não sabemos aonde. Ela estaria em uma Reunião. Mas por coincidência, o horário dessa Reunião foi o mesmo do início do ataque dos rebeldes. Por isso eu não consegui entrar pelos portões da frente.

— Entendo. — o comentarista tinha mudado de expressão mais uma vez. Ele olhou para a mulher do outro lado da sala, analisando bem seu rosto. Mana não tinha hesitado em nenhuma palavra, e Bart tinha acreditado na história dela. Ele parecia mais aliviado agora. — Eu sei que seu objetivo é nobre, mas eu vou pedir formalmente para que fique aqui nessa sala comigo até que os rebeldes sejam eliminados. Se você sair agora, vai ser atacada e vista como uma rebelde. Mas se ficar, eu irei limpar qualquer suspeita que houver contra você. Então por favor, sente-se e aguarde.

— Eu... Não posso fazer isso. — respondeu ela, quase imediatamente. Mana ainda estava confusa com tudo aquilo. Por que diabos ele estava sendo tão acolhedor? Ta bom que ele poderia torcer para ela durante o torneio... Mas ele estava amigável DEMAIS. Mana aprendeu que quando alguém exagera na amizade, é porque ela tem outras intenções. — Eu disse que encontraria meus companheiros aqui, custe o que custar. Então se me der licença...

A assassina deu as costas para o cavalheiro nobre e levou a mão na maçaneta novamente. Aquela conversa tinha sido tão estranha, que ela não sabia o que pensar primeiro. Se existisse algum "detector de anormalidade" instalado no cérebro da garota, ele estaria apitando sem parar.

A maçaneta não cedeu. A porta não abriu. Mana forçou a porta mais uma vez. Trancada. Mas como? Ela tinha acabado de passar por ali! E ninguém passou por ela para trancar! Também era impossível que ela fosse trancada do lado oposto, pois Mana conseguiria ouvir o giro da chave.

PRESSÃO! Mana se virou de novo e encontrou com Bart liberando sua aura. Era ridículo. A aura não estava envolvendo o corpo dele. Estava envolvendo a sala inteira! Do teto até o chão. "Então essa é a sensação de ficar frente a frente com um dos Soldados mais poderosos do mundo?", pensou a assassina.

Ela também havia percebido que a porta atrás de si não estava trancada. Ela estava "bloqueada magicamente". A aura de Bart tinha criado um espaço único, como se fosse um campo de energia não ultrapassável. Se a situação estava estranha antes, imagine agora.

— Desculpe Mana, mas não posso deixar você sair dessa sala. — Bart havia se locomovido bem pouco, saindo da frente da mesa e indo até a lateral da mesma, olhando sempre na direção da assassina. — Você ainda não ouviu tudo o que eu tenho para lhe dizer.

— Dizer? Sua aura não está me demonstrando nenhuma vontade de conversar! — disse Mana, desembainhando sua kodachi. Aquilo sim era "loucura".

— Guarde sua arma. — disse ele, levantando a mão direita. — Não tente me atacar. Não tente fugir. Não tente me contrariar. São três coisas que você está estritamente proibida de agora em diante.

— E quem você acha que é? Meu pai? — Mana não aceitou o pedido do homem para guardar a arma. Muito pelo contrário. Além de se manter em uma posição defensiva, ela começou a liberar sua energia mágica pelo corpo.

— Não. Mas é de meu interesse ser seu esposo.

Mana precisou retirar seus dois últimos pensamentos quando achou que estava em uma situação bizarra. "ISSO sim era loucura!", pensou ela, mais uma vez. Ela olhou fixadamente para o rosto do provável oponente. Ele não estava piscando. Não estava sorrindo. Não estava hesitando. Ele tinha falado a verdade! Não! Mas em que situação ela conseguiu se meter?

O que tinha de errado naquele dia? Primeiro um exército rebelde decide atacar o maior reino do mundo. Daí ela acaba se metendo no meio disso com a simples vontade de resgatar uma ferreira. Depois, correndo para alcançar o panaca de seu parceiro, ela acaba encontrando com Jimmy, que ela achava que estava morto. E então ela descobre que a Líder dos Rebeldes era uma ex vice líder de uma Guilda com renome mundial e que havia sido desfeita a poucos meses atrás, e que esse exército rebelde estava tendo ajuda de dentro do Castelo para poderem avançar.

E pra acabar, depois de ser jogada para uma janela a dez metros de altura do chão, ela acaba dando de cara com um dos soldados mais poderosos do mundo que a pede em casamento? Se existisse alguma "Deusa do Destino", Mana gostaria que ela parasse de jogar dados para definir a vida dela!

A assassina levou a mão esquerda até sua bolsa de agulhas envenenadas e puxou três. Sem perder mais nenhum segundo, ela atirou as três na direção do pescoço do homem nobre. Não importava se você é um soldado com uma força tremenda. Se você leva três agulhas daquela grossura no pescoço, sendo que as agulhas estão ensopadas com veneno mortal, você VAI morrer.

As agulhas viajaram rápido e... Acertaram o teto, exatamente acima de Bart. O teto. Mana viu que elas mudaram de direção um segundo antes de acertar o homem. Mas foi tudo o que ela viu. Bart não tinha se movido um centímetro sequer. As agulhas simplesmente foram para cima, sem mais nem menos. Foi como se o vento tivesse mudado de direção naquele instante.

— É realmente uma pena. — disse Bart, fechando os olhos. — Eu pensei que poderíamos resolver isso pacificamente. Achei que poderíamos entender um ao outro, e termos uma boa conversa. Eu queria saber mais sobre você e fazer você me conhecer de verdade. Mas eu também deveria ter imaginado que você não é uma mulher fácil de se agradar. No fim, eu acho que realmente somos parecidos. Tudo que nos interessa é a força!

— Não, eu não sou como você. Sua força não me interessa. E eu nunca conversaria tranquilamente com alguém que tenta me trancar em uma sala usando energia mágica.

— Ahahahahah! — a risada dele soou como um aviso prévio de uma catástrofe. Mais uma vez, Mana sentiu arrepios pela espinha. — Eu quero ver você dizer o mesmo quando tiver um gostinho do meu poder. Destravar Selo Mundial! — Bart disse isso ao mesmo tempo que fez sua aura crescer mais ainda. Aquilo não era brincadeira. Mana tinha acabado de descobrir porque aquelas pessoas eram consideradas "Lendas". A aura de Bart era tão intensa que todos os móveis da sala estava tremendo como se fossem vítimas de um terremoto. Pela memória da assassina, mesmo o lutador mais poderoso que ela já enfrentou, sequer tinha METADE da força de aura de Bart. E isso era um problema grande o suficiente para Mana começar a sentir um medo verdadeiro. — ASCENSÃO DE NETUNO!

Um círculo mágico se formou embaixo de seu corpo. Provavelmente foi o mais poderoso e intenso círculo de energia mágica que Mana já viu na vida. E as escrituras que haviam ao redor do círculo não faziam o menor sentido. Não porque eram em uma língua diferente, mas sim, porque não pareciam palavras conjuntas para formar alguma frase. Era mais parecido com símbolos. Pinturas estranhas.

Mana resolveu não dar atenção para aquilo. Não era hora de tirar os olhos do inimigo. Sua vida estava em risco. De um jeito que ela nunca ficou antes. Ela estava se sentindo um rato enfrentando um gato.

Piorou quando todo o corpo de Bart começou a reluzir. Quando a assassina percebeu que não era bem o corpo dele que brilhava, já era tudo tarde demais. O que realmente brilhava eram as roupas do soldado. Começou dos pés. A roupa brilhando foi sumindo e dando lugar para... Outra roupa.

Era uma transformação em tempo real. Fez Bart ficar com uma vestimenta totalmente diferente. Aquilo não era bem novidade. Mana sabia que existia muitas magias para invocação de equipamentos. Mas ao mesmo tempo, ela sabia que aquela ali não era nada normal. Principalmente pelo fato de que agora Bart vestia uma roupa banhada em energia mágica.

— Impressionante, não acha?

A pergunta de Bart chegou a cortar o vento. Agora Mana estava encarando uma pessoa totalmente diferente. Sua roupa tinha ficado impressionantemente mais adaptada para um combate. Nas pernas, ele estava vestido com botas de ferro que subiam até os joelhos. Daquela parte até a cintura, havia um calção bem grosso e estufado, na cor azul escuro. Sua camisa tinha ficado imensamente mais simples, dando lugar para uma camisa de botões de manga cumprida na cor branca, com a borda da manga aberta em babados e sem nenhum bolso. Não havia nenhuma armadura protegendo seu corpo. E nem sua cabeça.

Mas agora ele estava segurando uma arma. E ela parecia mais perigosa do que aparentava. Se tratava de um florete com ponta triangular, na cor azul escuro também. Uma arma de esgrima, especializada em perfuração. Mana já tinha presenciado algumas lutas com essa arma, mas nunca tinha enfrentado um oponente direto com ela. Sempre há uma primeira vez para quase tudo, não é?

Mana partiu para cima empunhando sua kodachi. Não importava a arma do oponente se ele será atacado primeiro. Um florete era uma espada leve e seria boa para defesas, mas para isso, Bart precisaria ser ágil o suficiente para ler os movimentos de Mana. Isso não aconteceu.

Não porque ele não viu que Mana pretendia usar uma finta simples para usar um corte horizontal em seu pescoço. E sim, porque ao dar o segundo passo para frente, a assassina tinha sido perfurada três vezes seguidas em lugares diferentes do corpo.

A mulher caiu de joelhos, sem saber o porque estava sentindo tamanha dor em seu corpo. "Por que a espada dele está cheia de sangue?", pensou ela enquanto caia. Mana largou a kodachi e perdeu a consciência por uns três ou quatro segundos por causa do choque. O ataque de Bart tinha sido rápido demais. Ela não viu nenhum deles.

— Como eu disse... É realmente uma pena. — diz Bart, limpando o sangue de sua arma com um lenço vermelho.

As coisas não estavam indo tão bem para o lado de Peeh, mas nada estava perdido. Agora, os barulhos fora do castelo já haviam diminuído consideravelmente, o que era um bom sinal. Ela mesma ainda estava impressionada pelo fato de que não havia quase nenhum soldado no castelo. Claro, quase nenhum se comparado ao número de soldados que ela conseguiu reunir.

Havia muita gente que não deveria estar participando daquilo. Pais de família que trabalhavam em lavouras. Mães que ficavam em casa costurando roupas de cama e panos de louça. Até mesmo adolescentes que ainda iam à uma escolinha quase todos os dias, aprenderem a ler e escrever. Sim, os rebeldes eram formados a maioria por pessoas normais, que não sabiam nem usar sua energia mágica para absolutamente nada. Era triste.

Peeh nunca se conformou e nunca irá. Ela ficou se perguntando o tempo todo se isso era o certo a se fazer. Mas ela não conseguiu dizer "não" àquelas pobres mães que choravam para ver os filhos de volta. Ou para pelo menos saber o que havia acontecido com eles. Era cruel demais para todo mundo.

E Peeh estava no meio de tudo isso. Ela era a Líder. Era a pessoa que carregaria o peso das mortes dos seus soldados. Ela sabia que seria condenada para sempre. Mesmo que não fosse pega e trancafiada em uma cela pelo resto de sua vida, ela nunca se recuperaria do peso em sua própria consciência.

Mas lá estava ela. Correndo em direção ao seu objetivo, como sempre fez. Mesmo quando estava na sua antiga guilda. Era Vice Líder, mas sempre estava na frente do exército. E olha que haviam Comandantes de Pelotão e Generais de Tropas. Não importava. Lá estava Peeh, segurando seu cajado e sendo a primeira a atacar os inimigos. Ela já perdeu a conta de quantas vezes o povo falava para ela ter mais cuidado, que isso poderia lhe matar algum dia.

Ela nunca deu ouvidos para eles. Ela era uma Líder nata. Precisava estar na frente e comandar todos. Pois só assim ela teria certeza que suas ordens iriam trazer seus companheiros são e salvos de volta para o lar. Era uma sensação que ela não conseguia escapar.

Agora ela estava sozinha pelo fato de que Jimmy tinha ficado para trás, atrasando uma tropa dos soldados reais que apareceram pelo norte. Os dois rebeldes não sabiam da onde aquela tropa havia saído, mas eles sabiam que eles precisavam sair do seu caminho.

Antes de poder atacar, Peeh foi segurada pelo braço. Ela se virou para Jimmy que disse pra ela não desperdiçar sua preciosa energia ali, com aqueles soldados. O lutador de Muay Thai disse que ele mesmo cuidaria daquele pessoal sozinho, para o plano não ser atrasado.

Peeh chegou a morder o lábio inferior quando viu que não tinha outra opção a não ser aceitar a proposta do companheiro. Isso era devido ao fato de que eles precisavam fazer tudo o mais rápido possível, pois assim que o ataque começasse, algum informante do Castelo correria até a tropa que saiu em expedição para o sul e traria eles de volta. Se isso acontecesse antes do resgate, tudo estaria perdido.

"Por favor, não vá morrer aqui.", disse Peeh, segurando firme no ombro de Jimmy. O lutador sorriu e disse que não planejava morrer em uma luta fácil daquelas.

Depois de Jimmy avançar com uma voadora contra o soldado mais próximo, matando-o imediatamente, ele começou a abrir caminho dando chutes com impacto no intuito de empurrar os inimigos. O primeiro golpe tinha sido o mesmo que ele tinha usado contra San, e por mais incrível que pareça, San foi o primeiro a defender aquele golpe sem tomar nenhum contra efeito.

Jimmy riu quando sentiu a empolgação de lutar contra o garoto que usava energia vital. Desde quando ele o viu na Arena lutando e derrotando duas oponentes com apenas um golpe... Desde aquele momento que ele conseguiu fazer Mochizuki cair fora do ringue...

O sangue de Jimmy borbulhava de empolgação. Ele não era louco por lutas mortais. Sua arte marcial era realmente feita para matar, mas Jimmy era um esportista. Ele gostava de lutar para testar os seus limites. Uma das coisas que ele nunca fez, foi recusar um pedido de duelo. Esses duelos eram o que fazia ele se sentir vivo. Sentir que todo o treinamento suado dele havia ganhado um sentido maior. Um propósito

Jimmy atacou um dos soldados dando uma cotovelada vindo de cima para baixo, exatamente no meio da cabeça do pobre coitado que estava sem capacete. O lutador não estava poupando esforços. Ele sabia que ali, não poderia ser o "lutador bonzinho" como sempre era. Precisava eliminar os inimigos.

Se esquivou duas vezes da investida de um dos soldados que usava uma lança, e depois se virou e quebrou a lança em dois usando um chute baixo. O próximo movimento dele foi acertar uma combinação de socos no rosto do indivíduo, sem diminuir a força. Em menos de quinze segundos, três soldados já estavam no chão, fora de combate.

Peeh passou pelo meio de toda aquela confusão, e os soldados decidiram se preocupar com o cara que estava matando soldados armados com as mãos nuas. Eles não estavam errados. Suas vidas dependiam deles não perderem a concentração ali. O que era uma vantagem para a Líder dos Rebeldes.

A Líder correu sem ter mais nenhum contra tempo até chegar na suposta entrada para o calabouço. Essa entrada se parecia muito com o grande portão de ferro dos muros que protegiam o castelo, mas em uma escala menor. Era uma entrada feita em "u" reverso, protegido por grades negras de ferro fundido.

Mas aqui veio a primeira estranheza da garota: o portão estava levantado. Ou seja, a entrada estava livre para ela. Como? Quem passaria por aqui e deixaria o portão de uma prisão aberto?

Peeh olhou para todos os lados e concentrou sua percepção extra sensorial. Poderia ser uma armadilha. Mas não havia ninguém ali, e o barulho de espadas e escudos se encontrando estava bem longe. O que poderia ter acontecido?

Era pra haver guardas aqui. A não ser que eles, os soldados reais, acabaram chamando até mesmo os guardas daqui para ajudar na defesa do castelo. Se esse era o motivo, então havia algo dentro das paredes do castelo que PRECISAVA ser protegido. O Rei? Essa era a resposta mais óbvia.

A mulher desconfiada andou até a entrada, tentando se focar no seu objetivo. Depois do portão, tudo o que havia era uma escadaria que levava muito para baixo, mais especificamente falando, para o subterrâneo. Parecia a entrada de uma caverna, e a falta de uma iluminação descente ajudava nessa visão dos fatos.

Peeh tirou uma das tochas que estava na parede rochosa da entrada e começou a descer as escadas em ritmo acelerado, mas totalmente atenta. As escadas não faziam voltas e nem curvas. Era uma descida reta e profunda.

O ar mudou enquanto ela descia, e a temperatura ficou razoavelmente maior. Não havia barulho lá, o que deixava tudo mais assustador. Peeh desceu até finalmente ver uma porta de ferro ao longe, no final da escadaria. Quanto ela já tinha descido? Era muito. Até esse subterrâneo fazia jus ao tamanho exagerado da Capital. "Tudo aqui é grande", pensou ela.

Chegou até a porta e a empurrou. Era pesada, mas foi aberta. Estava destrancada. E o mais estranho ainda? Quando Peeh passou pela porta, ela viu que as chaves estavam na fechadura pelo lado de dentro.

Ela poderia ter ficado mais impressionada com isso se não fosse a visão que ela teve ao ver o que era o calabouço. Era fantástico, na verdade. Talvez "sinistro" seria a palavra mais correta aqui.

Pense em uma área retangular, feita apenas de sacadas. Ou seja, um retângulo sem nada no meio. Com três andares. Peeh estava em cima, na ponta direita em baixo desse retângulo. Agora pense que as laterais desse retângulo eram feitas de celas. Em todos os andares. Imenso. Mal cheiroso. Mal iluminado. Barulhento? Não. Quieto. Uma prisão gigantesca sem nenhum prisioneiro chorando ou fazendo escândalo? Nenhuma prisão no mundo era BOA para isso.

Os únicos barulhos que a garota conseguia ouvir era de goteiras e de ratos à procura de algum biscoito perdido pelo chão. "Isso não é possível!" disse ela em um tom bem baixo. Não havia nenhum guarda ali naquele andar.

Peeh se esgueirou pela parede leste e andou até a primeira cela. Vazia. Estava trancada sim. Mas vazia. Tudo bem. Andou até a próxima, que ficava um metro de distância. Vazia. Trancada. Sem nenhum vestígio de que alguém sequer esteve ali. Foi para a próxima. Vazia. Trancada. Quase limpa. E na próxima. Vazia, destrancada, e para não dizer que estava igual as outras três primeiras, essa estava sem o travesseiro na cama.

Peeh foi até a borda da ala e olhou para os dois andares de baixo. Seus olhos não conseguiam ver o fundo por falta de uma iluminação descente, mas ela sentia alguma coisa vindo de baixo. A situação estava incomum. Ela continuou andando até chegar na ponta de cima da sala retangular. Ela não sabe por quantas celas passou, mas todas estavam vazias. Havia uma escada que levava para o segundo andar ali, e ela a usou.

No segundo andar, as celas pareciam um pouco maiores, sendo obviamente feitas para abrigar mais de um prisioneiro ao mesmo tempo. Dessa vez, Peeh decidiu ir pelo outro lado, pegando o caminho da esquerda. Primeira cela. Vazia. Trancada. Camas desarrumadas. Sem vestígios de que alguém passou por ali nos últimos... Trinta dias? Não, isso só poderia ser algum tipo de brincadeira. Ela acelerou o passo. Cela vazia. Cela vazia. Cela vazia. Cela vazia. Não! Começou a correr. Cela, cela, cela, cela. Todas vazias.

Chegou até a escadaria que levava para o primeiro andar. Aquela sensação estranha continuava lá, e agora estava mais forte. O que era aquilo? Uma aura? Parecia. Era intenso e forte. Como se estivesse querendo expulsar tudo ao seu redor. Não iria expulsar a Líder. Ela já tinha chegado tão longe. Não iria recuar só por sentir uma sensação ruim.

Colocou o pé no primeiro degrau da escadaria. Essa escada era diferente da primeira. Ela não ficava na ponta da ala, e sim no meio. Era mais larga também, e diferente de todo o resto, era bem iluminada à luz de tochas. Desceu rápido sem se preocupar com outros detalhes. "O pessoal pode ter sido locomovido para o primeiro andar.", foi o que ela pensou. Talvez sim... Mas isso não explicaria todo aquele silêncio.

Enfim chegou no primeiro andar. Aqui havia chão de verdade. Não havia mais como descer. Ainda haviam centenas de celas espalhadas pelas laterais, mas no meio haviam mesas compridas e instrumentos de tortura espalhados aleatoriamente. Vários papeis jogados pelo chão. Cadeiras e escrivaninhas viradas de ponta a cabeça. Foi como se tivesse ocorrido uma rebelião em toda prisão. "Mas aí, as celas estariam abertas", foi o que ela pensou.

Peeh andou até o meio daquele lugar gigantesco e sinistro, ainda carregando a mesma tocha que pegou na entrada. Tudo estava vazio. Sem nenhum prisioneiro. Isso não fazia sentido!

Peeh congelou. Alguma coisa estava vindo em sua direção. Ela se virou para os lados e só encontrou escuridão. Passos. Foi o único barulho que ela ouviu daquele lugar abandonado e escurecido. Passos de uma bota de ferro. Firmes. Não era um bom sinal.

A mulher se virou para trás. Encarou a escada que havia descido ainda há pouco. Era de lá! Tinha alguém descendo as escadas! Mas ela não tinha encontrado ninguém esse caminho todo!

— E pensar que haveria alguém aqui mesmo.

A voz da pessoa que apareceu deu calafrios em Peeh. Era uma voz grossa e não soava nada amigável. Qualquer pessoa que aparecesse ali, naquele momento, não estaria com cara de te dar boas vindas. Peeh recuou dois passos para trás, engolindo saliva e deixando um pingo de suor de seu rosto cair no chão de pedra do local.

Ela conseguia ver a pessoa agora, pois haviam duas tochas iluminando o começo dos degraus. Era um homem alto. Um pouco magro, mas claramente forte. Usava uma armadura deveras bonita. Era uma armadura completa de prata, com uma capa vermelha nas costas. Seu capacete era aberto na frente, mostrando o rosto da pessoa. Ele estava com uma expressão séria.

Carregava uma lança pontiaguda nas mãos e pela aura, ele estava louco para usá-la. Um outro detalhe que Peeh percebeu, foi o brasão do Reino de Riven estampado em relevo no lado esquerdo do peitoral da armadura do homem alto. Foi logo depois de olhar para esse brasão que a toda a resolução da cabeça da garota veio à tona:

— General Arian! — disse ela, afastando-se mais um passo.

— É uma honra para mim que a ex Vice Líder da Diamond Wall, detentora do Título Único de "Peste Escarlate", conheça minha pessoa. — Arian fez uma reverencia curta, abaixando a cabeça levemente.

— O que você está fazendo aqui? — perguntou a garota, dando mais uma passo para trás.

— Ora, mas eu poderia lhe perguntar o mesmo. — respondeu Arian, fazendo o contrário de Peeh, dando um passo para frente. — O que uma guerreira sem guilda como você faz nos calabouços do Castelo Real, durante o ataque de um exército rebelde? — Peeh não respondeu nada. Ao invés disso, mudou para uma expressão de vista grossa, sabendo que todo o plano tinha acabado de ir pelos ares. O maior problema foi que Arian percebeu a mudança de ar da Líder. — Claro que isso não é uma mera coincidência. Enquanto eu perseguia uma ratazana, eu acabei dando de cara com uma grande quantidade de rebeldes que estavam adentrando dentro do solo sagrado do Castelo de Nosso Rei. Foi quando eu...

RAIO DE LUZ!

A explicação de Arian foi cortada pela metade. A conclusão foi mais cômica do que sinistra. Peeh sabia que era perca de tempo ficar ouvindo a história do General inimigo. Ela sabia muito bem que Arian estava ali para derrotá-la e levá-la sob custódia para a Corte Real. Ela não era idiota. O que ela fez foi simplesmente encurtar o processo. Uma luta ali era inevitável. E ela estava contra o tempo. Foi só juntar o útil ao agradável.

Quando Arian deu o segundo passo para frente, Peeh usou a energia mágica contida em seu cajado para criar uma magia imediata. Ela apontou a mão esquerda para o oponente e passou a energia do cajado para os cinco dedos de sua mão. Seu próximo passo foi atirar um grosso cubo linear cilíndrico de energia contra o peito do General, que não teve nem tempo para pensar em se defender

A magia atingiu o homem com tudo e o fez voar contra as escadas, caindo nos degraus de costas. Por mais que tenha sido um acerto perfeito, a garota sabia que aquilo não era o suficiente para derrubar o Grande General do Oeste. Principalmente porque Peeh estava bem informada sobre como o exército de Riven era dividido.

Dentro do Exército, os soldados tinham colocado um certo "aspecto" para cada um dos Generais. Raziel era o que tinha o "Aspecto da Habilidade" por causa de suas perícias quase divinas com a espada. Berul, o único General que não estava na Reunião, tinha o "Aspecto da Força", devido ao seu estilo de combate agressivo com um machado enorme e quase tão pesado quanto ele mesmo. Leon era portador do "Aspecto da Adaptabilidade" graças à suas técnicas de copiar magias. E por fim, Arian era conhecido como o General que possuía o "Aspecto da Vitalidade", simplesmente porque sua defesa física e mágica eram ridiculamente altas.

— Vejo que sua mãe não lhe ensinou modos, mocinha. — disse Arian, se levantando lentamente. Ele olhou para a armadura e viu que o local de impacto estava amassado. Ficou impressionado com o fato da magia sem a menor concentração da garota tinha tamanha força. — Magia de luz concentrada. Isso é uma raridade hoje em dia. Dizem que esse é um dos elementos mágicos mais difíceis de serem aperfeiçoados. Onde você aprendeu isso? — mais uma vez, Peeh não estava com vontade de conversar. Dessa vez, ela começou a concentrar energia pelo corpo, demonstrando que não estava para brincadeiras. — Parece que você não vai me dar nenhuma informação por bem. Não importa. Você não vai conseguir escapar desse lugar.

O maior erro de Peeh foi achar que ela já estava em uma boa distância do General. Foi por isso que ela se afastou pouco a pouco dele. Magos sempre faziam isso. Estava no sangue. Eles precisavam de espaço para poderem liberar suas magias mais poderosas e não serem atingidos por elas. Ou pelos ataques dos oponentes também.

Então ela deu mais um passo para trás e se preparou para lançar mais uma magia direta no General. Ela sabia que um duelo contra ele era loucura. Não que ela achava que perderia. Mas ela sabia que seria uma batalha demorada demais e sua vida estaria em risco com cada golpe que ele desse. Então era melhor atacá-lo de longe e tirá-lo do caminho.

Mas antes de poder atirar uma magia nele... Ele já havia desaparecido. Foi num piscar de olhos. Muita concentração e um passo para frente foram suficientes para Peeh não o ver mais.

INVESTIDA RELÂMPAGO!

Essa magia de Arian era provavelmente uma das mais perigosas em toda a lista dos Lanceiros. É necessário resaltar que essa não era uma magia específica DELE, e sim, de sua classe. Mas isso não muda o fato de que a magia se transforma quando usado por outra pessoa.

No mundo da magia, se você pegar duas pessoas e fazê-las usar a mesma magia ao mesmo tempo, as duas magias vão sair diferentes. Mesmo que elas sejam ensinadas pelo mesmo Mestre e mesmo que as duas pessoas tenham o mesmo exato número de dias de treinamento. Existem muitos pontos que fazem uma única magia ser vista de cinco maneiras diferentes. Muitas vezes é por causa do talento da pessoa em questão.

No caso de Arian, era pura "experiência no campo de batalha". Essa técnica faz com que todo o corpo do usuário se torne um raio, atacando o oponente com a ponta da lança numa velocidade extremamente elevada.

Peeh foi atingida no ombro direito e jogada a mais de oito metros de distância para trás, batendo com tudo em uma das mesas de madeira viradas aleatoriamente pelo local. A maga tossiu duas vezes e tentou se levantar imediatamente.

— Impressionante. — começou Arian, girando a lança na mão. — Eu mirei no meio do seu peito, mas você conseguiu ver minha investida de alguma forma e jogou o corpo para o lado no último segundo. Eu já percebi que não posso te subestimar. IMPACTO PERFURANTE!

Dessa vez, foi Arian que não quis perder tempo. Querendo ou não, ele sabia que estava enfrentando um oponente forte. Na história que ele iria contar antes de ser cortado pela maga, o General iria dizer que enquanto perseguia Kuro, ele teve que mudar de direção por causa de uma certa explosão no lado direito do castelo. É claro que ele correu para lá o mais rápido que ele pode, ignorando totalmente a ninja.

Quando ele estava no meio do caminho, Raziel o parou e disse que o Castelo estava sob ataque de um exército rebelde. Era inacreditável, mas Arian não tinha motivos para duvidar de seu camarada.

Mas esse mesmo camarada tinha falado pra ele fazer algo um pouco duvidoso. Raziel pediu para que ele fosse para os fundos do castelo, defender as duas entradas que lá tinham, e que se ele visse alguém entrar no calabouço que não fossem os soldados reais, ele deveria seguir essa pessoa e capturá-la ainda viva, para que eles pudessem interrogá-la.

Quando Arian perguntou o porque disso, o General do Leste só respondeu "Porque eu acredito que o objetivo real desses Rebeldes é libertar os prisioneiros para criar mais caos ainda.". Tinha sido um chute e tanto.

Arian concentrou energia mágica em toda a sua lança e correu na direção da maga que ainda tentava se levantar. Diferente de sua última magia, essa aqui tinha o único propósito de perfurar a carne do oponente, atravessando sua lança com tudo, empalando a pessoa de uma só vez. Era a magia que ele mais usava.

O General usou um ataque vertical de ponta vindo de cima, mas Peeh pegou impulso com a perna e se jogou para o lado, caindo com tudo no chão de pedra, chegando até a se machucar um pouco.

A lança de Arian destruiu a mesa e o chão do local de impacto, provando ser um golpe a ser temido. A maga de luz rolou uma vez pelo chão, se levantou e saiu correndo na direção da escadaria. "Sem chances!", foi o que ela estava pensando. Lutar naquele espaço escuro contra um General do Exército de Riven não estava na agenda dela. Seria arriscado demais. Sem contar que o golpe que ela tinha levado no ombro estava doendo horrores.

Arian se virou para ela com fúria nos olhos. Ninguém dava as costas para ele para fugir do combate. Ninguém! Ele arrancou sua lança do chão e correu na direção da maga. Ele era mais rápido e iria alcançá-la em poucos segundos.

Foi então que ela deu um pulo e virou cento e oitenta graus, encarando ele. Arian freou como um cavalo de corrida e assumiu uma posição defensiva. Foi aí que Peeh gritou consigo mesma "Caiu direitinho!".

BRILHO OFUSCANTE!

Essa magia era um pouco diferente. Ela não era uma magia de causar nenhum dano. Bom... Não diretamente, claro.

Peeh criou uma esfera de energia na mão e a jogou para cima e para frente. Não muito alto e nem muito longe. Mas foi na direção de Arian, o que fez o General lanceiro achar que aquilo iria causar uma explosão de algum gênero. Ele até estava certo, mas a tal explosão não foi como ele imaginou.

A esfera causou uma explosão de luz. Um "flash" de alta potência, que iluminou cada cela e cada canto de toda a prisão. Tudo o que o General conseguia ver agora era o branco total.

Ele estava cego. Levou o braço esquerdo nos olhos que estavam lacrimejando. Ele não via nada e sua audição estava alterada. Onde ela estava? Será que havia corrido? Não iria adiantar tentar correr. Ele a alcançaria mesmo cego.

Então aí ele se lembrou de "ligar" sua aura perceptiva. Sentiu que ela ainda estava no mesmo lugar, a uns três metros de distância dele. Se ele desse uns dois passos para frente, ele a acertaria com sua lança. Mas ela estava lá, concentrando uma densa quantidade de energia mágica. O problema é que Arian tinha percebido esse fato tarde demais.

CANHÃO DE LUZ!

Explicações para essa magia poderiam ser encurtadas se apenas fosse dito que essa magia era um "upgrade" do Raio de Luz dela. Peeh soltou seu cajado no chão e depois levantou as duas mãos para o peito do oponente, mandando toda a energia concentrada para lá.

O que veio depois foi digno de pinturas. Um cone de energia grosso e também cilíndrico, sendo que a ponta fina começava nas mãos da maga e depois iam ficando maiores até acertar o alvo. Foi uma magia estrondosa e poderosa. E certeira.

Como estava cego e por ter sido pego de surpresa, Arian foi atirado muito mais que apenas cinco metros de distância. Ele voou para longe, levando mesas, cadeiras e até uns instrumentos de ferro que tinham pelo caminho. Ele chegou a quicar no chão duas vezes, de tão forte que foi o impacto. Se aquela prisão estava quieta antes, então agora tinha tanto barulho que parecia uma orquestra dentro das celas.

Peeh respirava rapidamente, ofegante. Essa magia era poderosa e consumia uma boa quantidade de energia dela, mas tinha sido por uma boa razão. Ela ainda ficou olhando para Arian. Ele não se mexia.

A maga duvidava que o homem estivesse morto, mas era bem provável que ele estivesse desmaiado depois de levar uma magia dessas na cara."Ele mereceu", foi o que ela queria ter dito naquele momento.

Mas não havia tempo para isso. Não havia ninguém nas celas, então o plano precisaria ser modificado imediatamente. Ela juntou seu cajado do chão e se virou. Ela precisava sair dali e avisar todo mundo. Precisava tirar seu exército dali. Não haviam motivos para continuarem lutando se os prisioneiros, as pessoas que precisavam ser resgatadas, não estivessem ali. Ela se preocuparia com isso depois. Precisava salvar a maior quantidade de pessoas primeiro. Começou a correr.

LANÇA VOADORA!

Correu... Mas não foi muito longe. Assim que começou a correr, ela sentiu sua perna esquerda ser perfurada por algo grosso e afiado. Peeh caiu no chão gritando de dor e se remexendo sem parar. Ainda gritando, ela se virou no chão e levou a mão na perna, retirando seja lá o que estava enterrado ali. Era a lança de Arian.

Peeh se arrastou para frente, com a inútil tentativa de continuar sua fuga. Era impossível. A dor não deixava. Nem para ficar de pé iria dar. Passos. De novo. Passos de uma bota de ferro. Era ele! Ele estava vivo! E acordado!

A maga se virou para a direção dos passos e encontrou o General andando em sua direção, como se fosse a Morte vindo lhe buscar. Ele estava sem o peitoral de sua armadura, mas tirando isso... Ele estava intacto!

— Eu não deveria ter te subestimado mesmo... Mas você não deveria ter achado que me derrotaria só com isso, não é?