Ta, tudo bem. San não era uma pessoa boa. Deu pra entender, não é? Não só ele é um ladrão e assassino desde pequeno, como mesmo depois de ter virado um adulto, continuou jogando sujo de todas as formas possíveis. Ele era o membro mais complicado do time, e também o mais quieto. Mas também era o mais esperto.

O passado desse garoto é mais escuro do que as noites que não tem estrelas. Ele passou por coisas absurdas, e todas elas, por livre e espontânea vontade. Ao longo dessa história, você vai poder entender um pouco mais sobre como ele pensa e como ele age.

Mas agora, vai entender como ele LUTA.

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Geovanna tinha voltado correndo para a arena. Ela tinha seguido os médicos que levavam Lumi para a Unidade de Tratamento Intensiva, deixando Mochizuki e sua outra colega para trás. Quando a maga de energia chegou, ela quase ficou surda com a gritaria da torcida.

Eles gritavam por Mochizuki. Torciam por ela. Não era nenhum espanto, na verdade. Momo era claramente mais forte do que qualquer outro membro do seu time, e sua luta no dia anterior acabou criando muitos fãs para ela. Derrotar seu primeiro oponente em apenas dois golpes também tinha sido um feito impressionante.

Some isso ao fato de que agora, todos os homens da plateia xingavam San de tudo quanto era jeito, já que ele retirou a mais bela lutadora do Torneio. Para eles, o garoto precisava ter uma morte dolorosa. E eles ainda poderiam ver Lumi! Se Momo ganhasse essa luta e a outra, talvez o time dela ainda teria chances de vitória. E se tratando da xamã, isso era possível.

Com isso em mente, os espectadores triplicaram a torcida. Gritos, bandeiras e cartazes eram levantados, tudo ao mesmo tempo. Geovanna chegou perto da borda do ringue, e olhou na direção do garoto que tinha acordado seu coração. Ele não estava mais com as mãos nos bolsos. Além disso, ele estava em uma típica posição de defesa de alguma arte marcial que ela não fazia ideia qual era.

Mas o mais estranho era a expressão em seu rosto. Ele estava com um olhar fixo. Uma cara de sério. A diferença entre esse San e o cara que foi oponente dela há alguns minutos atrás, era gigantesca.

Ela virou só um pouco o olhar e viu Mochizuki caminhando para o centro do ringue. Ela desabotoou a grande capa branca que sempre carregava, e a jogou para fora do ringue, na direção da sua colega de time. Havia faíscas de energia explodindo ao redor dela. A batalha nem tinha começado, e Mochizuki já estava pronta para dar seu melhor golpe. Essa luta seria mortal. A sua colega não daria chances para San.

Do outro lado do ringue, não havia nenhuma comemoração. Todos os três conseguiram sentir algo estranho assim que a garota pisou no ringue. Ela era rodeada por uma poderosa linha de energia branca, que parecia empurrar qualquer coisa que se aproximasse dela, inclusive o próprio vento. Essa não era a única preocupação deles. Eles conseguiram perceber a mudança de atitude do seu amigo no ringue.

— O ar mudou. — disse Mulkior. — Deu pra sentir a súbita mudança de atitude de San assim que essa garota começou a andar pelo ringue. Mana, você realmente não sabe nada sobre essa guria? San nunca te disse nada mesmo?

— Não, realmente não faço ideia de quem seja e nem o que ele fez pra deixá-la tão irritada. — respondeu a assassina, que não tinha saído na borda do ringue e permanecia de braços cruzados. — San a chamou de "possível melhor xamã do mundo". Isso me dá calafrios, pois agora eu estou conseguindo ver um pouco da aura dela e entendendo o que ele quis dizer com aquilo.

— Sem sombra de dúvidas ela é poderosa. — voltou a dizer Mulkior. Se virando novamente para o ringue. — Nunca vi um xamã lutar. Na verdade, nem sabia que eles eram uma classe de combate.

— Mana, como San está? — pergunta Kula, puxando o braço da assassina. A assassina se virou e se encontrou com o rosto de total preocupação da colega. Esse não era o rosto habitual dela. — Ele usa energia vital para usar as magias, então é como se ele já estivesse danificado, não é?

— Ele... Bem... Eu não sei. É difícil saber disso, já que eu nunca lutei usando essa técnica. Mas o que houve, Kuchi? Você parece até um pouco pálida! Está tudo bem com você?

Com a pergunta direta de Mana, Mumu voltou a se virar de uma vez só. Tudo o que envolvia Kuchiki era de total importância para ele. Ele analisou a garota e viu que Mana tinha razão. A maga de vermelho estava tremendo muito levemente, como se estivesse com frio. Mas seu rosto estava branco e ela olhava fundo nos olhos de Mana. Era a primeira vez que ele a via nesse estado. Ainda com o olhar fixo na amiga, Kula falou:

— Precisamos tirar o San de lá! Ele não pode lutar contra essa garota!

— Mas o quê? Kuchi, está tudo bem com você? Do que você está falando? Você não parece bem! — disse o líder do time, se aproximando.

— Não tem nada de errado comigo! Eu só... — respondeu ela, cruzando os braços na tentativa de parar a tremedeira. Agora parecia mesmo que ela passava muito frio, esfregando um pouco as mãos nos braços. — Eu só estou com medo. Nunca senti uma energia mágica cheia de ira na minha vida! Mana, Mumu... Ela não vai lutar pra ganhar do San. Ela vai tentar matá-lo! E San SABE disso! É por isso que ele deve ter ficado em uma posição defensiva! Mumu! — ela se virou para o mago, e agora era ele que estava sendo encarado pelos olhos profundos de Kuchi. — Você é o Líder do nosso time! Diga que desistimos dessa luta! Nós três iremos dar conta das duas que ainda restam!

Mulkior se viu em um dilema. Nunca tinham pedido algo para ele com tanta seriedade e preocupação assim. Ele não queria dizer "não" para ela. Ele apertou os olhos, para tentar fugir da fraqueza que a maga de fogo lhe causava com aquele olhar profundo. Abriu-os de volta e olhou para Mana, que retribuía o olhar. Quando ela percebeu que ele a encarava, Mana balançou a cabeça negativamente. Ela já sabia o que se passava na cabeça do mago controlador de metais naquela hora. Não que não fosse óbvio, claro.

— Eu não posso, Kuchi. — disse ele, enfim. Sua voz quase falhou. — Eu sei que você tem razão sobre a vontade mortal dessa oponente, mas San não está com cara de quem pretende desistir da luta. É só prestar atenção na aura dele. Eu não posso cancelar essa luta, só ele pode. Desculpe, parceira... Desculpe.

Lutadores apostos! COMECEM!

Mais uma vez, parece que Pablo estava esperando que a conversa entre os colegas de time terminassem para anunciar a partida. O que, na verdade, não era bem isso. Pablo demorava para anunciar algumas lutas porque queria ver a empolgação da plateia antes. Ele conseguia deixar o clima mais pesado quando demorava para anunciar o inicio do combate.

E nesse combate em particular, as coisas tinham começado a ficar tensas quando Momo pisou no ringue. E Bart também estava muito quieto ultimamente. Ele demonstrava uma certa curiosidade nessa primeira luta do dia. Inicialmente, Pablo achou que ele também tinha se perdido nas curvas sensuais de Lumi, mas desistiu dessa ideia quando lembrou que desde o fim do primeiro embate, ele tinha se calado e se fechado. Então o objeto de curiosidade dele era San. O Apresentador estava louco para fazer perguntas, mas ele "sentia" que agora não era a hora certa. As questões poderiam esperar.

San estava do lado de Mochizuki. Ninguém viu quando ele tinha chegado lá. Para Mana e os outros dois de seu time, que conversavam entre si um segundo antes do anuncio de início do combate, era como se San tivesse se teletransportado de um lugar para outro.

E pra falar a verdade, não eram só eles que estavam com essa impressão. Mesmo Geovanna, sua outra colega de time, e os membros dos outros times que estavam assistindo a luta, não viram como ele já estava do lado dela, se virando para acertá-la com um chute na altura da cabeça. Só havia uma pessoa que tinha visto o movimento do garoto, e esse alguém era a própria xamã.

A garota se abaixou, se esquivando do chute horizontal. San continuou seu ataque girando o corpo e tentando acertar a garota com um soco reto, ainda na altura do rosto. Momo deu um salto para trás, se esquivando mais uma vez.

Ela sabia muito bem qual era a habilidade especial de San. Ela sabia que se levasse um golpe direto dele, ela correria sérios riscos de vida. Ter lutado ao lado dele fez ela saber dos estilos de luta desonrosos do assassino, o que agora tinha se tornado uma grande vantagem para ela. Além disso, a garota andou fazendo milhares de pesquisas e treinou seu corpo até o limite para aumentar sua velocidade de reação.

Tudo isso foi só por ter um único objetivo na mente. Tudo isso era pra derrotá-lo. Para matá-lo. Para se vingar e acabar com essa sede de sangue. E hoje era o dia da realização de seus sonhos. Hoje era o dia do fim.

ALMA DO LOBO DO ÁRTICO, INCORPORAR!

Mochizuki Monikawa levantou a mão direita e concentrou energia nela. A menos de um metro acima de sua mão, um tipo de portal dimensional se abriu. Era pequeno e tinha uma cor azul muito escura, quase chegando ao preto. Parecia como olhar para o fundo do mar. Desse portal, uma pequena esfera de luz fosca surgiu, voando até cair bem em cima da mão da xamã.

Momo abaixa a mão e o portal some do mesmo jeito que apareceu. Ainda com aquela esfera em mãos, ela a joga contra o peito, absorvendo toda a energia da esfera de uma só vez. O que aconteceu depois tirou um "wow" de todos os espectadores. Da absorção daquela energia, a própria aura da garota começou a crescer e a tomar forma. E acabou se transformando em um lobo, com caninos perigosos e garras afiadas. Era como se ela estivesse dentro de uma alma de um lobo, o vestindo-o.

O pessoal aplaudia e gritava, mas ninguém tinha entendido nada. Xamãs de Combate eram extremamente raros e não parecia que algum deles já havia passado por aqui. Mana e Mulkior não conseguiam manter a boca fechada depois de verem a quantidade de energia que ela liberava agora que tinha incorporado uma alma.

Kula levou as mãos nos ouvidos, como se estivesse escutando o grito de desespero e de raiva da alma de Momo. Era ensurdecedor. Ela não queria assistir essa luta. Ela pressentia um perigo grande demais indo como uma onda para cima de San. Essa luta tinha que ser parada antes que uma tragédia acontecesse!

Mochizuki olhou para frente e correu na direção de San. Aqui, já dava para ver um diferencial enorme. A velocidade da garota havia sido triplicada. San quase foi acertado pelo primeiro golpe dela por ter sido surpreendido.

Momo o atacou com a mão direita na forma de uma garra, tentando arranhá-lo. San deu um só passo para trás, se esquivando e depois, um passo para frente para acertar a garota com uma joelhada no estômago. Momo pulou para cima, e voltou para baixo com um ataque vertical, como se fosse um lobo pulando para cima de sua presa. San defendeu o golpe com o seu braço esquerdo, e depois tentou acertá-la com um soco do direito. A líder do time Bella's Revenge só precisou jogar a cabeça para o lado para esquivar.

Sua percepção estava muito mais afiada agora. Não importava o quanto San poderia ser um bom lutador de corpo a corpo, ele nunca conseguiria ter a velocidade de reação de um lobo de verdade. "Vamos ver o quanto de 'Lobo' tem nesse seu Título!", pensou ela.

Momo aumentou a velocidade de ataque. Em menos de um segundo, ela aplicou três golpes rápidos, em forma de arranhões. San usou o cotovelo para aparar o primeiro, depois o punho para aparar o segundo, mas o terceiro tinha sido rápido demais até mesmo para ele. O homem levou um arranhão na parte do corpo um pouco mais abaixo do ombro. O sangue pulou para fora do corte, ensopando a vestimenta do garoto com um vermelho vivo.

San não deixou a dor do corte parar seus movimentos, e então tentou acertar uma rasteira circular na oponente. Mochizuki precisou só de um salto baixo para se esquivar. Com San ainda no chão, a xamã invocada acertou um corte em suas costas, mas tinha sido leve. San se levantou dando um impulso com o corpo inteiro contra sua oponente, tentando levá-la ao chão. Mas se provou inútil.

Momo jogou o corpo para o lado, deixando sua investida passar sem ter batido em nada. Mais uma vez, San estava de costas para ela, e essa era a hora que ele iria começar a sentir uma verdadeira dor.

GARRA DE GELO!

A mão direita de Mochizuki brilhou um azul cristalino e suas unhas se encheram de energia mágica. Depois foi só aplicar o golpe. A garota cortou as costas de San de ponta a ponta. Da altura do ombro até embaixo na cintura, rasgando sua roupa de uma vez só.

Não houve sangue. Não porque as garras dela não tinham arranhado a pele do lutador, e sim, porque logo depois do arranhão, onde deveria correr sangue, surgiu uma linha azul que começou a congelar a carne já machucada das costas de San.

O garoto cambaleou, dando três passos bêbados para frente e se virando logo em seguida, para encarar sua oponente. Ele não tinha dado nenhum grito de dor ou demonstrado tal coisa. San tinha entendido o que essa última magia fazia. Depois de cortar a carne, ela usa a energia na ferida e a congela, causando uma dor direta na carne e impedindo que a pessoa cure o ferimento, além de que movimentar o corpo com uma parte congelada não era uma coisa muito legal.

Era uma técnica assustadora. E agora a mente dele estava começando a ficar embaralhada por causa da dor clamando pela atenção do cérebro.

O lutador nem ouvia mais os gritos intensos dos torcedores ou da voz chata de Pablo, que continuava ditando o combate. Ele não tinha tempo para perder com isso. Sua concentração na luta era total. Ele só via e ouvia Momo. Um segundo desperdiçado poderia custar sua vida. Principalmente se ela continuasse usando essa "Alma".

Mochizuki não era a única que tinha a vantagem de saber o estilo de combate de seu oponente. San também sabia como ela lutava, mas chegou a conclusão que ela não era nada comparado ao que era há algum tempo atrás. Quanto tempo faz? Meses? Anos? Quando foi que ele e ela lutaram lado a lado e que acabou acontecendo um certo "mal entendido"? Quando tinha sido isso?

Era impossível fazer matemáticas agora. Mochizuki tinha partido para cima com tudo. Ela sabia que San ainda estava em estado de choque por causa da dor nas costas, e que isso faria ele diminuir sua própria percepção. Chance!

A xamã não teve piedade. Se aproximou e começou a dar uma série de golpes rápidos. Arranhões firmes e precisos. San sabia que sua própria velocidade estava reduzida e as suas pernas não queriam se mexer. Ele teve que pensar em uma outra tática.

Então cruzou os dois braços na frente da cabeça e começou a levar os golpes rápidos de Momo. A cada corte que levava, sangue voava e coloria o chão branco ao redor dos dois combatentes.

Mochizuki queria sorrir, pois tinha o pego de jeito. Ela iria continuar atacando sem parar, não deixando espaço para ele sequer tentar reagir. Ela acertou um, dois, três, quatro e então cinco cortes que pegaram em seus dois braços, espalhadamente. No quinto corte, ela puxou o braço e decidiu imobilizar metade do poder de luta de San. Ela iria congelar seu braço direito. Isso faria com que a luta já chegasse quase a uma conclusão.

GARRA DE GELO!

Momo colocou energia mágica na mão direita e mirou exatamente no meio do braço direito do seu oponente. E então desceu sua garra congelante dando um golpe vertical potente.

Mas não tinha sido efetivo. O golpe dela tinha parado no meio do caminho. San segurou o golpe da garota, agarrando seu braço pelo pulso. Foi a vez de Momo ficar sem reação. A precisão dele tinha sido perfeita.

Ele levantou o rosto e olhou no fundo dos olhos dela, depois usou a força que ainda tinha para apertar o pulso da xamã. A garota se contorceu de dor e tentou se virar para se soltar do aperto. E era bem isso que San queria.

— Você não é a única que tem garras! ESTILO DO TIGRE, GARRA RETALHADORA!

Do mesmo jeito que Mochizuki tinha feito, San estralou os dedos da mão direita e os deixou em uma forma de garra. Suas unhas se encheram de um vermelho forte, igual ao outro golpe que ele tinha usado para destruir aquela bola enorme de energia. Sem soltar o braço da oponente, ele se levantou com um impulso, e acertou um corte vertical vindo de baixo para cima, na frente do corpo da garota.

Dessa vez, ela não tinha conseguido se esquivar, e gritou quando sentiu as garras de energia lhe cortando a pele. Com o golpe, San tinha soltado o braço dela, o que a fez cambalear para trás, com uma das mãos sobre o novo machucado. Antes de cair no chão de costas, Momo lutou por equilíbrio e forçou as pernas para dar um salto para trás, se distanciando um pouco mais do seu atacante.

A garota olhou para sua mão encima do machucado, e viu o sangue pingando no chão. O maldito tinha lhe acertado em cheio. Ela conhecia essa técnica dele. Já o viu imobilizando um inimigo utilizando só esse golpe contra o pescoço da pessoa. Ele concentrava energia vital nas pontas dos dedos e atacava com força em um movimento linear, imitando a patada de um tigre.

Mochizuki sorriu. Era uma técnica poderosa, mas não tinha tido todo aquele efeito nela. Isso só significava que seu treinamento tinha valido a pena. San não iria derrotá-la.

E era mais ou menos isso que ele pensava também. San tinha em mente algo que considerou desde o início do combate: a incorporação de Momo não lhe dava apenas características das almas, como também criava um tipo de tecido mágico que a protegia, diminuindo um pouco qualquer magia que seja atirada contra seu corpo. Era algo preocupante.

Se ele precisasse contar só com sua força física, essa batalha não duraria mais cinco minutos. Ele precisava atingi-la com toda a sua força se quisesse realmente danificá-la, mas dependendo do golpe, isso poderia ser uma morte certa para ela... Ou para ele mesmo.

Ele olhou para os próprios braços, que pingavam sangue e criavam uma pequena poça em seus pés. Ele era bom em não deixar a dor tirar sua concentração, mas também sabia que a cada novo golpe que ele mesmo aplicasse, a dor em seus braços cresceria a um ponto insuportável. Isso sem contar com o fato de que ele mesmo se danifica com suas próprias magias. Suas costas ainda eram um problema também, mas ele ignorava totalmente a dor e o frio que o corte congelado estava lhe provocando.

E ele não tinha tempo para se preocupar com isso. Momo cruzou os braços em frente ao corpo e concentrou energia mágica em volta do mesmo. Era algo grande.

San se preocupou por saber exatamente o que viria. Ele não poderia deixar ela se concentrar mais! Forçou as pernas e começou a correr na direção da garota. Mas já era tarde. Mochizuki já tinha começado a concentrar energia desde que levou o último golpe. San só não percebeu isso porque analisava seu próprio corpo.

INVESTIDA DO ZERO ABSOLUTO!

A xamã começou a exalar um frio ar congelante por todo o corpo, criando uma barreira de vento que fez San parar de correr no mesmo instante. Ele percebeu que ela tinha colocado energia demais nesse golpe. Aquilo estava mais forte do que antes! Mesmo não tendo visto o golpe em si, ele já sabia!

E então veio o golpe. Mochizuki abaixou o corpo, o empinando para frente. Colocou a perna direita para frente e a energizou. Depois, deu o pulo inicial do golpe. Nesse momento, a xamã havia desaparecido aos olhos dos menos treinados. Não, nem isso. Até mesmo muitos lutadores muito bem treinados não tinham conseguido ver o movimento da garota-lobo.

O golpe dela era muito simples, mas mesmo assim, tinha um alto grau de perigo. O usuário energizava todo o corpo e concentrava energia mágica em dois lugares: na perna direita e nos dois braços. Primeiro, ela usa um impulso com a perna direita, correndo na direção do oponente. Quanto mais energia na perna era concentrada, mais rápida ela impulsionava. Depois de correr em linha reta contra o oponente, ela o atingia com a força de uma explosão com os seus dois braços energizados, congelando tudo em volta depois. Uma combinação quase perfeita de força e velocidade.

E San foi atingido. Em cheio, na verdade. Ele colocou os braços para frente na tentativa de segurar o golpe, pois sabia muito bem como ele era. Mas ele não esperava que sua oponente tivesse evoluído tanto essa magia. Ela estava muito mais rápida e o garoto não conseguiu acompanhar a investida.

E depois de levar o golpe em seu peito, San descobriu que "velocidade" não era a única coisa que havia sido aprimorada. A força foi tanta que o garoto voou por quase sete metros sem nem encostar no chão. Enquanto estava no ar, seu corpo começava a congelar, partindo do ponto de impacto que tinha sido no peito. O garoto cabeludo caiu no chão e ainda rolou três vezes, parando de cara no piso e parcialmente congelado.

Foi aí que a tensão do público tinha sido liberada. Geovanna e sua amiga deram um grito de alegria quando viram o golpe certeiro levar o oponente ao chão. A maga de energia só foi se tocar que o tal "oponente" ainda se tratava de San uns cinco segundos depois.

Mas ela estava em um dilema. Tinha que torcer por Momo, por mais que isso doesse em sua alma. Sua amiga vinha em primeiro lugar. Ela só torcia com todas as forças para que San desse um jeito milagroso de sobreviver a essa luta. Não era a intenção da Líder do time que estava em campo.

Mochizuki o olhou no chão, parado e sentiu pela primeira vez um alívio em seu espírito. Era assim que deveria ser. Ele precisava pagar pelo que fez. E isso era só o começo. O desgraçado não iria morrer só com aquilo! Ele precisava se levantar, se achar, e depois apanhar mais ainda!

Mochizuki destruiria o corpo dele parte por parte, até ele não aguentar mais e clamar por perdão. Perdão por ter traído a confiança de seu povo. Por ter manchado a honra que seus pais tinham criado. Ele precisava sofrer e se arrepender do fundo do coração. E depois que ele estivesse de joelhos, pedindo clemência, Momo cortaria a cabeça dele na frente de todos do Coliseu e falaria que era aquilo que acontecia com as pessoas que a traiam.

Ela estava começando a perder totalmente a consciência pela raiva, e não estava percebendo isso.

Mana, Kula e Mulkior estavam totalmente sem palavras. Os três também perderam Mochuzuki de vista por um mísero segundo, e depois viram San voando e caindo no chão, enquanto se transformava em um picolé humano. Agora ele estava caído lá, e não parecia estar acordado.

Kula deu três passos para trás, balançando a cabeça negativamente, não querendo acreditar no que estava vendo. Seu medo não tinha sido em vão. Essa luta se tornaria mortal. Mulkior queria gritar pelo nome do companheiro de time, mas não encontrou motivação o suficiente para tal. Ele olhou para o lado e viu sua parceira com cara de pavor. Olhou para o outro lado e se encontrou com Mana, exibindo o mesmo rosto que ele. Ela também não estava crendo no que via.

A assassina sanguinária nunca tinha visto San ir ao chão desse jeito. Ela já tinha o visto lutar a sério antes, mas sempre derrotava um inimigo sem ficar todo machucado no final. Claro, ela não sabia pelo o que ele tinha passado nesses anos todos que ele havia a deixado para trás, mas com certeza, suas habilidades haviam crescido exponencialmente, já que ele foi ao ponto de ganhar um Título Único.

Mas do que aquilo havia adiantado? Agora ele estava no chão e não se mexia... Não. Espere. Mana forçou a visão e focou no corpo de San. Ela viu sua perna tremer e seu braço se mexer. A parceira do combatente, não conseguindo ditar uma só palavra, bateu levemente no ombro de Mumu, e quando o mago a olhou, ela apontou para San. O mago fez o mesmo que ela e focou sua visão.

E San estava se levantando. O público havia gritado com a súbita dúvida de que a luta teria se encerrado com aquilo. O Telão Informativo chegou a iniciar uma contagem regressiva, demonstrando que talvez o garoto perdesse por ficar inconsciente. Mas agora os espectadores sabiam que poderiam gritar um pouco mais.

Pablo impulsionou os torcedores alucinados dizendo que a luta ainda não estava decidida. Bart continuava quieto. Geovanna e sua amiga haviam parado de comemorar, e por mais que a primeira quisesse voltar a comemorar, ao olhar San se levantando e quebrando o gelo só por se mover, ela decidiu ficar quieta também.

Já Mochizuki... Era a mais calada de todas. Ela não estava acreditando que ele estava se levantando e quebrando o gelo tão... Facilmente! Ele ficou de pé, limpando o ombro. Se virou na direção de sua oponente raivosa e voltou a colocar as mãos nos bolsos. Isso sim tinha sido a gota d'água.

— É Momo... — começou ele. — Você realmente ficou poderosa. Muito mais do que eu imaginava, na verdade. Se antigamente eu achava que você já era a Xamã mais poderosa do mundo, hoje eu posso dizer que eu tenho CERTEZA. Esse seu último golpe foi devastador.

— E você ainda conseguiu se levantar! — gritou Mochizuki. A raiva em sua voz era tão clara, que algumas pessoas no público tiveram um susto. — Esse foi um dos meus melhores golpes, mas se você conseguiu aguentar, então significa que eu tenho que ir com tudo para poder tirar a sua vida!

— Eu sou obrigado a admitir que também vou precisar ir com tudo e mostrar algo que eu não queria. — ele retirou as mãos dos bolsos e fechou ligeiramente os olhos. Estava querendo limpar a mente, mas estava difícil. Ele já quase não sentia o corpo. O frio do congelamento estava afetando ele de todas as maneiras possíveis. — Já vi que usando só os meus métodos padronizados eu não vou conseguir te dar um golpe definitivo, e isso pode acabar me matando. Então está na hora de começar essa luta de verdade.

— Ahhh! Não tente me enganar como fez com minhas amigas! Suas palavras nunca vão me atingir! Eu vou acabar com isso agora!

E então aconteceu. San começou a se concentrar. Sim, exatamente isso. Concentração. Uma coisa notória do estilo de combate de San, era que diferentemente dos outros combatentes que sempre tinham uma aura de energia mágica os cercando, para ele essa aura só aparecia no momento de seus golpes. Era uma aura bem fraca e tinha a cor vermelha, retratando o uso de sangue em suas habilidades.

Mas dessa vez, algo diferente aconteceu. Com a concentração dele, uma aura branca o rodeou. Não era poderosa e não tinha uma grande quantidade. Mas assustou todo o seu time e até sua oponente.

Kula foi a primeira a gritar que aquilo não era energia vital. San estava de fato concentrando energia mágica! Mulkior perguntou para Mana sobre esse fato, e ela mesmo tinha respondido que San nunca usava sua energia mágica em combates! Mesmo quando lutava "a sério", ele usava suas técnicas mortais que lhe drenavam sangue. Mas nunca havia sequer mencionado que tinha alguma magia arcana! Ou seja, aquilo era novidade até mesmo para Mana.

E isso valia para Mochizuki também. Os dois não lutaram juntos por tanto tempo assim, mas tinha sido o suficiente para ver de tudo o que ele era capaz. Mas ele nunca havia concentrado energia mágica!

A xamã tentou não se apavorar. Tinha sido a primeira coisa lógica que ela tinha feito desde que entrou no ringue. Não importava qual era o tipo de magia que aquele maldito poderia usar, era só ela se esquivar e atacar no próximo segundo. Então que venha!

DESLOCAÇÃO DE TEMPO FUTURO!

San fez um movimento horizontal com o braço para frente, e um círculo branco surgiu no chão, o rodeando, com ele no centro. Depois, para fora desse círculo, mas ainda encostado nele, surgiram números. Eles iam de "1" à "12". E dentro do círculo, surgiram duas flechas de tamanhos diferenciados, também brancas. Essas flechas começaram a se mover uniformemente, sendo que a flecha maior era mais rápida do que a menor.

Não tinha sido difícil pra ninguém — nem mesmo para os espectadores que não eram guerreiros — perceber que aquilo se tratava de um relógio de ponteiro. E tudo o que a magia fez foi fazer os ponteiros do relógio rodarem enlouquecidos pelos números, até pararem os dois em cima do "12". Depois, o círculo, os números e os ponteiros desapareceram, deixando somente uma energia branca e estranha ao redor do corpo de San. Mais nada.

Momo ficou esperando e observando. Não era uma magia de ataque? Não, mas algo havia de fato acontecido. Por que ele não estava se mexendo? Ele não ia atirar nada, então por que não estava vindo para cima? A magia falhou?

E então ela o viu fazendo mais uma vez aquilo. Era a coisa que deixava qualquer lutador perder o controle da razão. San tinha colocado as mãos nos bolsos mais uma vez. E dessa vez, Mochizuki perdeu completamente para a fúria. Onde estava aquele papo de lutar a sério? Era só um blefe para ver se ela se amedrontava? Era ridículo!

Momo jogou o corpo para frente e correu. Sua velocidade de movimento era impressionante. Em um segundo, ela já estava no lado de San. O garoto, por sua vez, não tinha se movido. Não virou o corpo e nem a cabeça. A garota não ligou. Mirou um golpe horizontal em seu pescoço. Iria atacar para arrancar a carne. Deu o golpe e então houve um impacto. Mas...

Não havia danos no pescoço de San. Mochizuki arregalou os olhos e olhou para a própria mão. Ela sabia que havia acertado algo! Olhou para frente de novo e viu San sorrindo. Raiva! RAIVA!

Atacou mais três vezes. Foram golpes absurdamente rápidos, mas não foram bem mirados. Mesmo assim, todos os três atingiriam o corpo do garoto. Houve três impactos, e nenhum dano em San. Mochizuki fez a mesma cara de melindrada novamente. San não havia se movido um centímetro sequer e continuava com o sorriso irritante no rosto.

— O que foi Momo? Pensei que ia me atacar para valer.

— AHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!

A Líder do Time das garotas ficou cega por alguns segundos devido a raiva. Sua mente havia sido escurecida e a única coisa que ela enxergava era o miserável de seu oponente. Ela começou a dar inúmeros golpes, sem parar nem para tomar fôlego. Socos retos, socos ondulados, ganchos, arranhões, chutes em baixo e em cima. Todos eles bateram em alguma coisa e San ainda não havia levado nenhum dano.

O público estava mais calado, pois não estavam entendendo nada do que estava ocorrendo ali. Era o mesmo para os dois times na arena. Tudo o que havia entre eles era uma teoria, bolada por suas mentes experientes. E quem começou a dizer isso tinha sido Kula.

— San criou uma barreira?

Mana e Mulkior não responderam porque não sabiam o que estava acontecendo. Essa ideia de Kuchi tinha adicionado uma opção válida em suas mentes, já que era a única explicação plausível. Mas espere...

Se San poderia criar barreiras, então por que não havia criado uma para se defender daquele último golpe? Será que ela não era forte o suficiente para aguentar aquela magia? Mas estava, de fato, aguentando todos aqueles golpes diretos da xamã. Mana foi a única que sabia que havia algo a mais ali. Não se tratava de uma barreira qualquer.

E nisso, Momo continuava atacando sem parar. Não acertava, não acertava, e não acertava. Por mais que agora seus olhos estavam cheios de sangue e seus punhos lotados de uma energia raivosa, nenhum golpe atingiu o seu oponente. Oponente não. Isso era algo bonito demais para se tratar de San. Aquele homem era o seu "inimigo". Era um vilão que precisaria ser derrotado. Era inimigo de toda a vila dela. E se continuasse vivo, seria inimigo de nações inteiras até se tornar um inimigo do mundo inteiro!

Ela não ia deixar isso acontecer. Isso iria se encerrar aqui! Foi tendo esse pensamento em mente que seus golpes começaram a diminuir de velocidade e de força. Mochizuki estava ficando sem fôlego, mas se recusava a parar de atacar para descansar.

Isso deu a oportunidade perfeita para San. Ele esperou os golpes dela enfraquecerem e deixarem ela com uma rápida abertura em sua defesa. Quando isso aconteceu, San agiu.

ESTILO DO DRAGÃO, CHUTE DA ANIQUILAÇÃO!

Por mais que San houvesse gritado o nome de sua técnica, ninguém VIU ele a usando. Tudo o que os espectadores conseguiram ver foi San jogando o corpo para frente e de repente, um enorme barulho de impacto pôde ser ouvido por todo o Coliseu. No segundo seguinte, Momo saiu voando muito alto para cima e para trás, caindo seis ou sete metros de distância de onde estava, voltando ao centro do ringue.

Ela caiu de costas no chão e gritou de dor, levando as duas mãos no estômago. San, com a perna levantada demonstrando que tinha aplicado um chute, volta a ficar ereto novamente. Mas no mesmo segundo que aquela aura branca que corria ao redor de seu corpo sumiu, ele caiu de joelhos, respirando profundamente. Ele estava quase caindo inconsciente, cansado por ter usado energia vital demais nesse último golpe.

Essa era outra desvantagem de usar esse tipo de energia. Se você concentrasse energia mágica em grande quantidade e a soltasse de uma vez só, você só ficaria mentalmente atordoado por poucos segundos. Mas quando você faz o mesmo usando energia vital... Era a mesma coisa que ter sido atropelado por uma carroça a cem quilômetros por hora. O impacto que o corpo sofria era tanto que na maioria das vezes, o usuário acabava entrando em choque e desmaiando. Aconteceu isso infinitas vezes durante o treinamento próprio de San. Foi difícil aperfeiçoar muitas de suas habilidades porque ele vivia desmaiando e só acordando horas depois.

Por sorte, hoje ele já estava bom o suficiente para se manter são. Ou pelo menos metade disso. Com apenas um dos olhos abertos, o garoto começou a olhar e a analisar a situação de sua oponente. Tinha sido um golpe direto, e nem a energia defensiva da incorporação dela tinha a salvado.

Momo tinha parado de tossir e gritar, e agora estava estendida no chão, de costas. Ele percebeu que a alma do lobo que ela tinha incorporado havia sumido também. Será que acabou?

Uma impressionante demonstração de uma Magia de Auto Suporte. — disse Bart em seu microfone, sendo ouvido por todo o Coliseu. — Eu percebi que muitos espectadores não entenderam o que aconteceu no ringue, então deixe-me esclarecer. O combatente San não estava usando nenhum tipo de barreira invisível para parar os ataques da combatente Mochizuki. Ele estava usando seus braços. — Bart conseguiu ouvir o murmúrio da plateia, que parecia estar mais confusa ainda. — O que San usou foi uma magia de suporte de alto grau, que faz o tempo de seu corpo correr em velocidade triplicada. Isso faz a velocidade de seus golpes e de seus movimentos chegar a um ponto onde os mesmos movimentos ficam invisíveis de tão rápidos. O que houve depois também teve haver com essa velocidade. O combatente San aplicou um chute vertical no estômago de sua oponente, a fazendo voar até onde está agora.

Um coro de algo como um "AHHHHHHHHHHHHH ENTENDI!" foi gritado ao mesmo tempo, envolvendo todo o Coliseu em uma descoberta magnífica. Para falar a verdade, nem mesmo os outros membros dos times que ali estavam tinham entendido. Isso só demonstrava a diferença de poder de um membro do Planetarium. E para San, mostrava o quanto eles poderiam ser perigosos.

Mochizuki teve uma visão. Não estava sentindo o gelado do chão em suas costas, ou o quente do sangue que escorria de sua boca. Só estava sentindo uma leve sensação prazerosa. Uma coisa que ela não sentia há muito tempo. Era a sensação da presença de seus pais.

A garota machucada se levantou rápido, percebendo que não tinha mais nenhuma dor. Mas ela não estava mais no ringue do Coliseu. O que havia acontecido? Onde estava a gritaria da plateia? E as suas amigas? Ela se virou para todos os lados, mas só havia escuridão. Onde estava o ringue? E o desgraçado? Onde estava o desgraçado?

Momo percebeu uma fagulha de luz mais ao fundo. Sabendo que não tinha para onde ir, começou a correr na direção daquele pequeno feixe de luz. Enquanto corria, ela parecia se aproximar ainda mais da luz. Ela foi crescendo e crescendo. Até virar uma imagem ao vivo e a cores.

Ela se viu em casa. Na sua casa. Era inconfundível. A lareira acessa queimando as toras de madeira, dando um aroma característico à casa. As janelas se debatendo devido ao vento forte lá fora. O cheiro da sopa que sua mãe fazia e que ela se empanturrava todas as vezes... Ela estava em casa!

E seus pais estavam ali! Sua mãe mexia a sopa em uma grande panela de barro enquanto seu pai estava sentado no sofá da sala, afiando sua lança de caça. Era uma cena muito familiar. Quantas vezes ela já tinha passado por aquilo? Não saberia dizer.

Então as lágrimas vieram. Era sua mãe. Com certeza aquela mulher bonita, vestindo um casaco fino de pele de urso e com expressão serena no rosto lhe mostrava que era a mulher que tinha dado luz a ela. E como se esquecer do olhar sério de seu pai e sua característica toca branca? Impossível! Ela estava em casa! O seu lar doce lar!

Momo deu dois passos e parou. Sua boca abriu para chamar por seus pais, mas nenhuma voz saiu. Mais lágrimas começaram a escorrer de seus olhos quando viu a imagem de sua mãe começando a ficar transparente. Ela estava sumindo. A xamã olhou para o sofá e viu que seu pai já não estava mais visível.

Mochizuki gritou o mais alto que pode. E com o grito, a imagem da pessoa que era sua mãe parou de mexer a sopa, largou a concha e se virou para encará-la. Ela se ajoelhou e abriu os braços, demonstrando que ela estava pronta para receber um abraço de sua querida filha. Mochizuki, chorando e gritando, correu para os braços de sua mãe, mas não encontrou o calor maternal que esperava. Ela olhou para todos os lados, mas não havia mais as imagens de seus pais ou sequer da sua casa. Só a escuridão que parecia a engolir cada vez mais.

Era isso. Essa era a vida dela. Não havia mais nada. Ela só precisava desistir. Ir com os seus pais para o Mundo dos Espíritos. Só lá ela se sentiria feliz. Pra que tantos esforços? Ela só precisava deitar ali e dormir, que logo ela encontraria o carinho de sua mãe e o sorriso de seu pai. Momo se deitou naquela escuridão, colocando os braços entre as pernas, e então fechou os olhos. Ela esperava sonhar com o dia seguinte. E então a escuridão finalmente a engoliu.

San se assustou. Ele viu Mochizuki se mexer no chão e acumular energia mágica. Mas o que realmente tinha lhe assustado foi ver ela levantar da mesma forma de um vampiro se levantando do caixão. O garoto no ringue não era o único melindrado com aquela visão.

Mochizuki estava de pé, com a cabeça pendente, e uma energia forte começou a acumular em seu corpo. San voltou a ficar em sua posição defensiva, e reclamou mentalmente de que deveria ter colocado mais energia no seu último golpe. A xamã levantou os dois braços, mas ainda continuava com a cabeça abaixada. E então a energia dela cresceu. Exageradamente. Muito exageradamente, para ser mais exato.

Mochizuki estava puxando energia mágica de todo o Coliseu para si, absorvendo até mesmo o ar que os rodeava. E então ela levantou a cabeça. San foi o primeiro a ver (e talvez o único) e ficar sem palavras.

Momo estava com os olhos abertos, mas ela não tinha mais o globo ocular. Era como o olhar de um fantasma. Com a cabeça levantada, ela aumentou o acúmulo de energia, deixando todos no Coliseu, sendo lutadores ou não, espantados.

Mana, seu time, Geovanna e sua colega começaram a sentir um leve tremor de terra. Era o efeito daquela concentração absurda? A maga de energia, amiga de Momo por muito tempo, nunca tinha visto ela juntar tanta energia assim.

Kuchiki sentiu um calafrio tão forte, que parecia que alguém tinha lhe dado uma facada em suas costas. Ela caiu de joelhos e começou a tremer espantosamente. Seu parceiro se abaixou e a abraçou, dizendo para ela se acalmar. Kuchi, vista nos braços de seu companheiro, conseguiu realmente se acalmar, mesmo que tenha sido um pouco.

Mana continuava na borda do ringue, olhando cada detalhe da luta. Ela não estava mais apta a falar qualquer palavra. Qualquer letra. Nada. Não tinha o que dizer. Não naquela situação.

ALMA DO LOBO DO ÁRTICO, ALMA DO URSO POLAR, ALMA DO CISNE AZUL, ALMA DA SERPENTE MARINHA, ALMA DA RAPOSA DE GELO, INCORPORAAAAAAAAAAAAAR!

Houve uma clara explosão exatamente no meio do palco. San foi jogado para trás, caindo e rolando pelo chão, quase caindo fora do ringue.Todos os membros dos dois times tiveram que ir para trás e colocar os braços para frente, protegendo os olhos dos fragmentos que voavam aleatoriamente pelo ar.

San tentou se levantar e viu que estava difícil de respirar. A sensação que ele estava tendo naquele momento era única. Ele olhou para frente e viu sua oponente rodeada por cinco energias mágicas diferentes. Elas faiscavam e corriam de um lado para o outro, mas não deixavam o corpo da xamã.

O garoto lutador não acreditava que ela tinha conseguido incorporar cinco espíritos de uma vez só. Até então, ele lembrava que Momo conseguia fazer isso com apenas dois espíritos! Será que ela tinha evoluído tanto assim? Melhor pensando... Era humanamente possível incorporar todos eles de uma única vez? Era energia demais. Quando foi a última vez que ele tinha visto tal acúmulo de energia mágica?

Ele conseguia sentir que a atmosfera ao redor do Coliseu estava sendo alterada pela simples concentração da xamã. Se ela usasse toda essa energia em uma só magia, San sabia que não conseguiria se defender... E nem o público. Com certeza aquilo seria energia o suficiente para passar da barreira protetora dos pilares de contenção. Isso era perigoso demais.

Ele percebeu que Mochizuki não se mexia. Forçou a visão e viu um corte na altura do ombro no braço esquerdo revendo sangue. San não a tinha atingido ali. E não era só no braço. Sua testa e sua perna tinham cortes retos, não profundos, que pingavam sangue.

A xamã energizada deu um passo para frente. E sumiu. San sentiu o ar sendo cortado ao seu lado, se virou e levantou os braços. Sua oponente sinistra estava ali, com o braço direito puxado para trás, pronta para aplicar um golpe.

INVESTIDA DO URSO!

Com a mão aberta parecendo uma garra, a garota aplica um golpe reto que atinge em cheio os dois braços cruzados de San. Ele já esperava esse golpe, então tinha tentado defendê-lo. Bom... Ele conseguiu sim, defender o golpe... Mas não o impacto.

Aliás, nem ele e nem ninguém que assistia a luta esperavam aquilo. San foi arremessado para longe. Foi para fora do ringue, batendo com as costas em um dos pilares de pedra, a uns cinco metros de distância do chão. E sim, San voou mais de dez metros para isso.

O impacto foi tão potente, que o barulho das costas dele batendo no pilar poderia ter sido ouvido até mesmo nas últimas arquibancadas do Coliseu. Depois, sem nenhum ar para respirar, San caiu no chão de terra, batendo com a cara na poeira do terreno largo fora do ringue.

No momento em que encostou no chão, o Telão Informativo ascendeu e marcou um "10" em grande tamanho. Um segundo depois, ele havia caído um número, marcando o "9". Tinha se iniciado a contagem regressiva para alguém que caiu fora do ringue.

San tossiu forte e forçou os braços para se levantar. Ele estava sem ar e a dor nas costas estava insuportável. Não bastava ela ter sido congelada, agora ele bateu com ela nessa porcaria de pilar de pedra. Ele olhou para frente, ainda no chão, e percebeu que estava muito longe do ringue. Ele não precisou olhar para o Telão Informativo para saber que o tempo estava correndo. Seis segundos. Olhou para o ringue e não encontrou Momo. Onde ela estava? Então sua percepção o alertou de um perigo vindo de cima.

QUEDA DESTRUTIVA!

Mochizuki caiu com tudo em cima de San, jogando todo o seu peso em um golpe de esmagamento. San usou energia vital em suas pernas para impulsionar o corpo para frente, assim se esquivando do golpe. Quando a xamã atingiu o chão, outro tremor foi sentido. Dessa vez, por todo o Coliseu.

Momo criou uma mini cratera onde havia caído, demonstrando que se San tivesse permanecido ali, estaria em pedaços nesse exato momento. A garota ficou de pé e começou a flutuar pelo ar. Ela estava voando! Haviam duas asas feitas puramente de energia estrategicamente posicionadas em suas costas.

San, ainda com dificuldades para respirar, viu a sua oponente se virar no ar e o encarar. Ele sabia que ela conseguia voar graças ao Espírito do Cisne, mas também sabia que ela não podia fazer manobras muito abertas e nem atingir uma grande velocidade de voo.

Ele olhou para o Telão. Quatro segundos restantes. O tempo não correria para Momo, já que ela não estava tecnicamente no chão, fora do ringue. San se virou e fez seu corpo o obedecer à força. Começou a correr e pulou para cima do ringue, bem na hora que o contador do Telão marcou "2". E mais uma vez, sua percepção o alertou de uma nova investida de sua oponente.

PRESA VENENOSA DA SERPENTE!

Mochizuki fez uma rasante rápida, com o braço direito estendido para frente e com a mão aberta e reta. Havia uma energia esverdeada correndo pelos seus dedos, mas San não prestou atenção nisso. Ele se jogou para o lado, rolando pelo chão e se esquivando mais uma vez do golpe da xamã.

Momo chega até o centro do ringue e pousa, se virando novamente para seu odiado inimigo. Feito isso, ela dá o maior grito que conseguiria dar, abrindo bem os braços e com a cabeça virada para cima. Era como uma fera enlouquecida.

Geovanna se desesperou com aquela cena. Aquela não era Mochizuki. Ela não poderia incorporar cinco espíritos de uma vez só! A maga lembrava claramente que um dia, a própria xamã tinha lhe dito que o máximo que conseguia era incorporar três de uma única vez, usando toda a sua energia ao mesmo tempo. E ela ainda disse que era algo perigoso de se fazer, pois isso lhe desgastava muito o corpo.

A maga de energia pura olhou de novo para sua amiga e viu que havia muito sangue escorrendo dela. Era esse o perigo! O corpo dela não estava aguentando os cinco espíritos e se a luta continuasse, ela iria se matar!

A garota apaixonada se virou para sua outra companheira de time que continuava ali, e disse que Momo tinha perdido a razão. Mas foi como falar algo para um surdo. A amiga e companheira de time estava com uma cara de desesperada tão absurda, que ela parecia estar olhando para um demônio. Não adiantava nada. Não era culpa dela, na verdade. Geovanna estava na mesma situação, mas não poderia deixar sua amiga morrer por perder o controle.

Só tinha uma pessoa que poderia ajudá-la. Por mais absurdo que fosse, era a única pessoa que iria conseguir salvá-la, mesmo estando em uma situação complicada. Geovanna teve que arriscar, principalmente depois que Momo soltou outro berro, fazendo mais um corte se abrir em seu braço.

A maga tentou não olhar para a amiga no ringue. Começou a correr, deixando sua companheira com a boca aberta ali mesmo. Ela deu a volta pelo ringue, se aproximando do time adversário. Mumu foi o primeiro a vê-la, e estranhou logo de cara. Mas não era com eles que Geovanna queria falar. Ela não estava se aproximando deles. E sim, de San.

— SAN! POR FAVOR! — gritou Geovanna, atrás de San que continuava perto da borda do ringue. Isso fez o garoto virar a cabeça ligeiramente para encarar a pessoa que estava lhe chamando com um tom de desespero. — Por tudo que lhe é mais sagrado! Salve a Momo! Eu imploro! Ela esta fora de controle! Ela não pode segurar essas almas no corpo! Se essa luta continuar, ela vai se matar! Por favor... POR FAVOR! SALVE A MINHA AMIGA!!!

PELOS ESPINHOSOS!

Se virar para Geovanna fez San ficar um mísero segundo sem a concentração no oponente. E mesmo fora de si, Momo conseguiu perceber isso. Talvez não fosse "ela" que estivesse sentindo algo.

A garota se abaixou, concentrando energia em todo o corpo. Depois abriu os braços violentamente, criando uma chuva de espinhos brancos que voaram na direção do garoto de cabelos compridos.

San viu dois problemas aqui. Primeiro, que se ele se esquivasse, os espinhos atingiriam Geovanna e Mana, que estavam uma do lado da outra. E segundo, que ele não tinha tempo o suficiente para preparar qualquer golpe bem pensado. Ele precisou arriscar.

ESTILO DO FALCÃO, DESLOCAMENTO DE AR!

San jogou os dois braços para frente, fez um movimento de que parecia ter agarrado alguma coisa invisível e puxou os braços para perto do peito. Isso fez as correntes de ar se modificarem ao redor de seu corpo, criando um tipo de barreira de vento em sua frente.

Os espinhos de energia voaram até a frente do garoto e depois foram jogados para dos os lados, graças a corrente inversa de ar. San não saiu totalmente ileso. Alguns espinhos, que voavam mais baixos, atingiram suas duas pernas, fazendo-o exibir uma nova expressão de machucado. Com essa conclusão, Momo deu outro berro enlouquecido.

E agora San poderia raciocinar por uns segundos. Suas pernas estavam sangrando, suas costas estavam sangrando, seus braços estavam sangrando. O que mais faltava? Ah claro! Um pedido absurdo da colega de time de sua oponente. "Salve Momo".

Como? Ela estava totalmente fora de si. Isso não era novidade pra ninguém, nem mesmo para os espectadores não combatentes. Ele sabia que incorporar cinco espíritos de uma só vez tinha sido exagero. A vontade dela de matá-lo era tão grande assim? Era isso, Momo? Você estava mostrando que para matá-lo, você estava disposta a jogar sua própria vida fora?

"IDIOTA!", pensou San. Ele odiava esse tipo de comportamento. Por mais que sejamos atingidos pelo sofrimento ou pela dor, "desistir da própria vida" nunca deveria ser uma opção. Isso era só uma fuga das mentes mais fracas. Pessoas que não tem a força de vontade para continuarem em frente. Ele conhecia Mochizuki. Ela NÃO era assim! Ela era esforçada, meiga, preocupada e extremamente caridosa. Foi depois "daquilo" que ela tinha ficado... Bem... Descentralizada.

Mas desde o começo dessa luta, o garoto não pretendia "matá-la". Ele não podia, na verdade. Sabia que era por culpa dele mesmo que Mochizuki tinha mudado tanto. E além disso, ela precisava saber de uma coisa. San tinha que fazê-la ouvir umas palavras e acima de tudo, ele precisava "mostrar" uma coisa que sempre carregou consigo.

O garoto deu um passo para frente. Ele iria aceitar o pedido de Geovanna. E ele sabia que isso era loucura. Já estava arriscado o suficiente ter que enfrentar uma xamã tão poderosa. Agora ele precisaria dar um jeito de salvá-la. Só pra que ela tentasse lhe matar depois. "Ótimo!", pensou ele. Em que situação ele tinha se metido?

Deu outro passo. Momo se alertou e se preparou para correr na direção dele, para continuar o atacando.

APRIMORAMENTO MUSCULAR!

Mais uma vez, San concentrou energia mágica em volta de seu corpo. Mas diferente da última vez, não houve nenhum círculo mágico aparecendo em volta dele. Inclusive, o efeito dessa magia tinha sido muito menos espalhafatosa.

Seu corpo emanou uma aura vermelha escura, fazendo seus músculos enrijecerem. E foi só o que aconteceu. Se na outra magia o pessoal não tinha entendido, imagine nessa?

Mas não era hora de explicar nada para os espectadores. San tinha aumentado sua força utilizando sua magia de suporte. Uma hora ou outra, Bart explicaria isso para todo mundo, já que ele parecia tão bem atento a luta.

San deu outro passo, e foi quando sua oponente fora de si deu um impulso e partiu para cima dele. Ela gritava enquanto corria, demonstrando uma ferocidade fenomenal. A garota deu um salto reto, no intuito de derrubar San. Ela estava com as duas mãos para frente, como se fosse um lobo pulando para cima de sua presa.

San não ia tentar esquivar dessa vez. Afastou as duas pernas e estralou os dedos das mãos. Esperou o momento certo e jogou as mãos para frente, agarrando precisamente os dois pulsos de Momo em pleno ar. Ela, por sua vez, caiu no chão sendo segurada, mas não parecia ter desistido do ataque. Começou a forçar seu avanço, conseguindo empurrar San muito levemente.

O assassino bem treinado sabia que só estava se mantendo ali por causa de sua magia de suporte, pois a força que o Espírito do Urso dava para Momo era fantástica.

Agora eles estavam cara a cara. Mochizuki iria tentar mordê-lo se San afrouxasse o braço só um pouco. Ela estava realmente fora de si. Chegava a babar como um cachorro raivoso. A diferença era que a "baba" da xamã se tratava de um líquido grosso, na cor vermelha, com um cheiro muito característico. Ela abria e fechava a boca muito rapidamente, cuspindo sangue junto com um murmúrio impossível de ser compreendido.

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Estava na hora de acordá-la. E ele tinha a técnica quase perfeita para tal.

ESTILO DO DRAGÃO, TESTA DE FERRO!

San fez seu sangue correr para a cabeça, como se estivesse plantando bananeira com os braços. Concentrou toda a energia vital em sua testa, a deixando com um brilho vermelho e cinza. Todo esse processo foi instantâneo, não deixando nem se passar um segundo sequer.

Depois, San forçou o braço e puxou Momo para si, a fazendo-o avançar desequilibradamente. O garoto atacante levou a cabeça para trás e quando sua oponente já estava mais próxima, ele jogou a própria cabeça para frente novamente, acertando sua testa contra a testa da pobre garota enlouquecida. O impacto foi realmente forte, mas nada comparado ao som oco que reverberou por quase todo o Coliseu.

Mochizuki amoleceu totalmente o corpo com o impacto, ficando momentaneamente desmaiada. Ela iria cair no chão com tudo se San não continuasse a segurando pelos braços. Vendo que a garota estava desacordada, San a deixou de joelhos, ainda segurando seus braços.

Ele também ficou abaixado, mas era porque precisava descansar. Ele já tinha gastado energia vital demais, e não havia sobrado muita coisa em seu corpo para que ele continuasse de pé. Por sua sorte, aquela luta acabaria ali. As almas presas no corpo dela estavam desaparecendo, voltando para o local que os próprios xamãs chamam de "Templo das Almas", um lugar espiritual que o próprio xamã cria para manter seus espíritos em descanso.

Momo estava com os olhos fechados quando foi colocada de joelhos, mas poucos segundos depois ela os abriu lentamente. O que havia acontecido? Ela não estava mais vendo aquele mundo negro de antes. Ela olhava para um chão quadriculado, branco como a neve de sua cidade natal. Ela estava sentindo muita dor no seu corpo. Parecia que ela tinha passado por um escorregador de navalhas.

Cansaço. Sono. Um gosto horrível na boca. Ainda com a cabeça baixa, ela cuspiu no chão. Não havia saliva. Ela começou a raciocinar. E a luta? Ela lembrava estar numa luta. O que havia acontecido? Depois que tudo ficou negro, ela não sabia de mais nada. Só lembrava dos seus pais desaparecendo e então...

Raiva. Ira. Fúria. Era tudo o que ela conseguia pensar naquela hora. Era a primeira vez que isso lhe acontecia. Seus dois braços estavam quentes. Alguém os segurava. Ela percebeu que era a única coisa que não estava dormente. Ela levantou a cabeça com dificuldade. Encarou o rosto que ela mais queria ver destruído. O rosto daquele que lhe tirou tudo.

— Finalmente você acordou. — disse San, assim que viu a expressão assustada de Momo. Ele respirava rapidamente e tentava não se mexer muito.

— SAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAN! — o grito de Mochizuki quase deixou a pessoa em sua frente surda. Ela puxou os braços com toda a força que ainda lhe restava, se soltando finalmente do aperto de San. Ela caiu no chão e ficou encarando o garoto, que permanecia do mesmo jeito. Ela percebeu seu cansaço. E também suas feridas.

— Olha... Momo... Você precisa saber de uma co-

DESTRUIÇÃO ESPIRITUAL!

Esse foi provavelmente a maior quebra de clima inesperada que já houve na história do Coliseu. Foi a primeira vez, em muito tempo, que alguém tinha conseguido calar o publico por infinitos cinco segundos.

Geovanna e o time de Mulkior viram essa cena em câmera lenta. San iria começar a explicar alguma coisa, mas Mochizuki não se interessou. Ela colocou as duas mãos para frente, mirando o seu oponente e concentrou a energia que ainda corria pelo seu corpo. Depois, um tipo de cone cilíndrico feito totalmente de energia mágica saiu das mãos da garota, atingindo o peito de San diretamente.

O golpe atravessou totalmente o garoto, mas ainda sim, o fez voar por muitos metros pelo ringue. Essa foi a parte mais horrível da cena.

Mana viu San voando muito devagar, com o corpo leve, até cair fora do ringue, encostado à borda. Ela não conseguia acreditar no que tinha visto. Ninguém conseguia.

Geovanna estava preste a comemorar quando viu que sua amiga tinha aberto os olhos novamente, e que ela não parecia mais estar sendo controlada pela fúria. Mas ela não comemorou. Ela teve a mesma sensação que Mana.

Kuchiki se levantou em desespero e foi até a borda do ringue, bem na hora que San caiu no chão, sem se mexer. Ela tinha sido a única que gritava o nome do garoto em alto e bom tom.

Na queda, o publico ficou em silêncio total. Era possível apenas ouvir a respiração ofegante da xamã que mantinha os braços levantados para frente, no centro do ringue, e com uma expressão de alguém que viu o fantasma de seu parente já morto há décadas.

Tinha sido um golpe e tanto. Acerto direto em um corpo sem armaduras. Momo sabia que não era possível sobreviver àquele golpe a queima-roupa. Essa sua magia era algo que ela mesma tinha criado, e não necessitava de nenhum Espírito incorporado. Ela usava sua própria energia mágica para dar um ataque direto no corpo do oponente, convertendo sua magia para um ataque espiritual.

Mochizuki tinha usado aquele golpe totalmente por instinto. Ela se assustou com San tão próximo a ela, e além disso, ela ainda parecia confusa sobre o que estava acontecendo. A garota recém acordada se virou para trás e viu que Geovanna estava bem próxima do time de San. O que ela fazia lá?

Olhou para o Telão Informativo, e viu que a luta realmente não tinha acabado ainda. Foi nessa mesma hora que o Telão piscou e mostrou novamente o número "10". A contagem regressiva iria começar.

Kula foi a única pessoa do time de San que ainda se mexia. Mulkior não tinha entendido muito bem o que tinha acontecido, porque ele estava preocupado demais tentando confortar sua companheira. Mana, ao contrário de seu companheiro mago de ferro, tinha visto cada detalhe, e estava paralisada com a conclusão. Ela estava vendo San no chão, totalmente imóvel. E sangrando. Nem viu o Telão marcar "9", ou sequer olhou novamente para o ringue.

Mas Kula não se importava com aquilo. O seu medo tinha se concluído. San não estava se mexendo. Na verdade, ele não parecia nem respirar. Lágrimas surgiram em seus olhos. "Não". Era o que ela gritava dentro de sua cabeça. "Não". Foi o que ela tentou falar, mas não haviam palavras.

Deu passos largos na direção de San. Tropeçou nos próprios pés, fazendo as lágrimas lavarem o chão sujo da arena. Olhou de longe para o corpo do combatente. Ele ainda não se mexia. O Telão contou "8".

Mochizuki se levantou e viu que estava mais machucada do que imaginava. Ela não conseguiu ficar totalmente de pé, e caiu novamente de joelhos. Aquilo era o fim. Todos os seus anos de treinamento tinham valido. Ela não sabia o porque San não tinha a atacado aquela hora. E ela achava que ele estava preste a falar algo, mas quem disse que ela esperaria? Tudo o que ele falava era pura enganação.

Matando ele, Mochizuki não estaria só se vingando como também estaria salvando futuras vidas! Futuras pessoas que seriam enganadas pela falsa confiança que aquele maldito lhe dava. O Telão contou "7".

Kuchiki tinha chegado muito perto do companheiro de equipe, e ele não tinha se mexido nenhuma vez. A maga ainda não conseguia falar nenhuma letra. Ela já estava chorando como uma criança que teve o brinquedo perdido. Ela se ajoelhou na frente dele, e viu o sangue correndo pelo seu corpo, manchando o chão e a borda do ringue.

Kula, sem perceber, estava focando toda sua atenção no corpo morto do garoto. Ela conseguiu bloquear todos os outros sons vindos da plateia ou do Apresentador que tinha voltado a comentar empolgadamente. Ela estava concentrada porque queria ouvir a respiração de San. Não havia. Lágrimas. Telão contou "6".

Mais lágrimas. Por que eles não ouviram? Quantas vezes ela teria que repetir isso para si mesma? O perigo estava estampado na cara da oponente dele desde o momento que ela pisou no ringue! Então por quê? Não podia acabar assim! Não era desse jeito que as coisas tinham que terminar! Ela sabia que existia o risco de vida por participar aqui, mas ela simplesmente não iria aceitar que alguém do seu time morresse daquela maneira.

San precisava ter pelo menos algum pulso. Seu sangue ainda deveria estar correndo! Ela levou a mão bem lentamente até a cabeça do garoto, querendo ter certeza de que não estava errada.

— KUCHI! NÃO TOQUE NELE! — esse era Mumu gritando o mais alto que podia. A maga, com o susto, virou para trás e viu seu parceiro se aproximando com uma expressão séria. — Se você tocar nele, a luta acaba. Está nas regras, lembra?

— MAS! MAS! — era difícil para a garota pensar em algo para falar, pois ela se sentia com uma estranha culpa de não ter conseguido parar aquele combate mortal. Ela sentiu que isso acabaria em um desastre.

— É Kuchi... Não toque... Em mim...

O Telão contou "5" bem nessa hora que a maga controladora de fogo deu um pulo para trás, quase batendo em Mulkior. Era a voz de San. Ela arregalou os olhos como nunca fez na vida, e deixou o seu queixo cair.

San levantou o braço esquerdo e segurou na borda do ringue. Fez força e puxou o corpo para cima, saindo da poeira do chão. Levou a outra mão na borda e finalmente tinha conseguido ficar de pé. Foi nesse momento em que os espectadores voltaram a gritar. Por mais incrível que pareça, ainda restavam pessoas que torciam para o garoto atacante de mulheres.

Todos os membros dos dois times estavam com a mesma expressão, mas a que Momo fazia naquele momento era a mais derradeira. Como ele tinha se livrado dessa? Não, isso era logicamente impossível. A xamã focou a visão no peito dele, bem onde ele tinha levado o último golpe. Sangue e carne queimada. Ele realmente tinha levado o golpe em cheio! Então como?

O Telão marcou "3", e foi quando San pulou para cima do ringue novamente, de uma forma meio que engraçada, pois ele tinha literamente "se jogado" para cima. Agora ele estava caído no chão de pedra do ringue e tentava se levantar. Seus braços estavam pesados. Seu corpo parecia pesar uma tonelada.

Mumu perguntou se ele estava bem. Isso era uma pergunta retórica. Era óbvio que ele não estava bem. A própria respiração dele já demonstrava o seu cansaço. Mas San ainda respondeu o mago. E essa resposta foi o que mais lhe chocou. Era algo absurdo e sem sentido. Kuchiki também achou o mesmo que o parceiro.

— Não, não estou. Mas vou continuar a luta. Não posso deixar com que nenhum de vocês pise nesse ringue hoje.

E então ele ficou de pé, demonstrando uma força de vontade mais que incrível. Kula esticou o braço para tentar agarrá-lo. Mas ele já estava caminhando em direção ao centro do ringue. Ele estava caminhando para a morte.

A maga gritou o nome dele, e foi aí que, mais uma vez, ela viu algo espantoso: San se virou para ela e sorriu. Depois ele voltou a atenção para sua oponente. Kuchiki ia dar outro grito, mas foi impedida por seu parceiro.

— Não adianta, Kuchi. Ele já se decidiu. Desde a primeira luta, ele não estava pensando em ganhar para manter a glória da vitória. Eu acabei de perceber isso. Ele estava lutando com tudo desde o início! Parecia que ele estava caçoando das suas oponentes, mas não era isso! Ele queria ganhar para nos manter fora das lutas de hoje! Ele sabe que estamos machucados e cansados das lutas de ontem, e decidiu dar mais um dia pra gente recuperar nossa energia. Talvez... — ele falou isso olhando para o lado, para encarar Mana que continuava parada no mesmo lugar, olhando fixamente para San. — Talvez ele esteja lutando com o medo de nos ver nesse mesmo perigo que ele esta agora.

— Mas isso é mais um motivo para a gente pará-lo! — disse Kuchi, se virando para Mumu. Ela ainda derramava lágrimas, e nesse dia Mumu descobriu que ver Kuchi chorando era a mesma coisa que levar uma facada no coração. Talvez a dor da facada seria menos dolorida. — San já está no seu limite e por mais que ele tenha conseguido fazer a tal da Momo acordar, ela continua com o anseio de matá-lo!

— Isso é verdade. Mas Kuchi... Eu não consigo ver San perder essa batalha. Olhe para ele. — ele colocou as mãos no ombro da parceira e a virou, fazendo ela encarar o ringue mais uma vez. — Essa vai ser a parte final da luta. Eu sinto isso!

Mochizuki estava concentrando o resto das energias mágicas que ainda tinha. Não era muito. Mas teria que ser o suficiente. Seu inimigo mortal ainda estava respirando e caminhava em sua direção. Aquilo não tinha acabado ainda.

San parou quando percebeu que sua oponente estava pronta para atacar novamente. O garoto estava fazendo cálculos em sua cabeça. "Quanto de energia mágica eu ainda tenho? Pouco.". "Quanto de energia vital eu ainda tenho? Pouco demais.". "Quanto será que minha oponente tem de energia mágica? Pouco também.". Tudo era pouco. Seria todo o restante.

Os dois usariam as últimas forças que tinham para finalizar essa longa luta. Os cálculos de San foram concluídos. Ele já sabia qual seria sua última ação. Ele também já sabia o que Momo faria. Ela atacaria com sua última magia novamente, pois San sabia que ela não teria tempo de incorporar outro Espírito. Isso dava uma vantagem para ele.

Era isso. Agora só faltava ela atacar primeiro. San desviou o olhar por um segundo. Ele encarou Mana, grudada na borda do ringue e com uma cara de que estava vendo um fantasma. Quem poderia culpá-la? O que ele falaria pra ela depois?

Ele só estava vivo por causa de sua magia de suporte, que ainda estava ativa quando recebeu o golpe de Mochizuki no peito. Mas nenhum dos seus três companheiros parecia saber disso. Se ele sobrevivesse a esse último embate, ele teria muito o que contar para eles. E para aquela garota alucinada ali no ringue.

Sua atenção se voltou para ela. Era agora. O momento da verdade. O final.

DESTRUIÇÃO ESPIRITUAL!

Mais uma vez, Momo colocou os dois braços para frente e soltou seu cone de energia mágica concentrada. Dessa vez, a cor da magia parecia estar mais escura, demonstrando que ela estava mais poderosa. San não se espantou. Era exatamente isso que ele esperava.

APRIMORAMENTO MUSCULAR!

O garoto cruzou os braços em "X" na frente do rosto e começou a correr na direção do cone de energia. No caminho, ele concentrou o resto de sua energia mágica e colocou tudo em seus dois braços, os fortalecendo. O plano corria como ele esperava. Mas não como todo o resto do Coliseu imaginava.

O cone de energia bateu com tudo nos braços cruzados de San, mas ao contrário do que todos esperavam, o garoto não saiu voando como da última vez. Ele estava é indo CONTRA a magia.

Mochizuki, irritada, começou a gritar e forçar ainda mais sua energia mágica, mantendo o cone. Ela não iria perder para ele de jeito nenhum. Mas San continuava avançando. Ele não sentia dor? Como ele conseguia andar contra a sua magia? E ele ainda avançava rápido!

A xamã deu passos para trás. Estava sentindo mais medo do que raiva. San se aproximava. Outro passo para trás. Não! Não ia adiantar! Outros dois passos longos para trás.

Momo cancelou a magia. Ela tinha percebido que San estava conseguindo aguentar e que iria ficar cara a cara com ela de novo. Sem o cone, San se viu livre para avançar. Isso, ele não esperava. Mas mesmo assim, o avanço não poderia parar.

A xamã iria atirar de novo. Ela ainda tinha um restinho de energia. Iria pegar ele desprevenido. Seria sua última cartada. Assim que ele se aproximasse para dar um golpe corpo-a-corpo, ela usaria sua magia no peito já ferido dele. E foi exatamente nesse ponto que ela viu que estava na borda do ringue. Não havia mais espaço para correr para trás.

Quando ela tinha chegado ali? Ela tinha recuado tanto assim? Não havia percebido esse detalhe. Tentou ignorar. Ela só precisava atacar San. Só atacá-lo. Só matá-lo. Acabar com tudo isso. Trazer paz para seu povo. Trazer paz para seus pais. Fim. E... Onde estava San?

ESTILO DO TIGRE, INVESTIDA DA FERA!

Não foi por falta de atenção que San desapareceu da frente dela por um instante. Foi devido a essa última magia do garoto. San energizou as pernas para dar um salto frontal em velocidade triplicada. Foi um golpe perfeito, mas acabou sendo uma faca de dois gumes no final.

Como Momo não viu San saltando, ela também não o viu se preparando para acertá-la em um golpe de ombro mirado no peito dela, numa investida violenta. O impacto não foi tão forte quanto os que tiveram nessa luta há alguns minutos mais cedo, mas foi poderoso o suficiente para levar Momo e San voando para fora do ringue.

A garota não sentiu o voo ou a queda no chão. No momento do impacto do golpe de San, ela perdeu a consciência. Quando caiu no chão, ela já estava adormecida e sem condições para continuar o combate. Isso teria dado uma vitória para San... Se ele também não tivesse caído do lado dela, imóvel. Ele estava consciente, mas seu corpo não lhe obedecia.

O Telão Informativo voltou a mostrar o número "10" pela quarta vez. San não conseguia se mexer, não sentia seu corpo ou sequer ouvia qualquer coisa. Antes de dar o último golpe ele precisou fazer uma decisão. Ele só tinha energia vital o suficiente para uma magia. Então ele precisava escolher entre colocar energia nas pernas para fazer um avanço rápido ou usar a energia em alguma de suas técnicas.

Ele sabia que Momo era inteligente e tentaria acertá-lo com outra magia quando ele se aproximasse. Então a escolha mais certa a se fazer era a primeira opção. Mas se ele simplesmente avançasse e a surpreendesse, ele não teria forças para derrubá-la em um golpe sem energia. Então ele precisaria usar as DUAS opções.

Ele não tinha energia vital para isso. Mas fez mesmo assim. Diminuiu o consumo das duas técnicas e usou as duas. Isso fez ele ficar completamente desgastado, fazendo-o ir junto com a xamã para o chão fora do ringue.

Apenas cinco segundos restando. Não que ele estivesse vendo o Telão. Não que ele estivesse vendo qualquer coisa, pra começo de conversa. Mas então ele "percebeu". Alguma coisa... Não, não. ALGUÉM estava se aproximando dele. Estava vindo correndo. Passos silenciosos, leves e rápidos.

San riu. Ele só conhecia uma pessoa com uma técnica dessas. Esse estilo de andar, sem deixar ninguém lhe perceber. "Ela " estava vindo na sua direção. Era a última pessoa que ele esperava, na verdade.

Forças ocultas, vindas do além, fizeram seu corpo se mexer. Ele se levantou muito dificilmente, sentindo uma tensa dor muscular. O último golpe de Momo tinha lhe custado umas duas costelas. San sentiu tontura logo quando finalmente ficou de pé, mas ele não podia demonstrar fraqueza ali. Não na frente "dela".

— E aí... — começou ele, se virando para a pessoa em questão. — Gostou de... Ver a luta? — San nem percebeu um leve filete de sangue escorrendo da sua boca. Mas ele ainda conseguia sorrir, mesmo ali. Quebrado, meio morto, sem sangue, machucado, cortado, destruído. Mas sorrindo.

— Seu... Teimoso!

Mana se virou de costas para San e fungou fortemente. O garoto não falou nada naquele instante. Ficou olhando as costas da parceira, que mantinha as mãos para frente. Mais especificamente, no rosto. Foi só depois que ele olhou para cima, vendo o Telão Informativo mostrar o número "0" e nisso, fazer todo o Coliseu gritar até suas gargantas explodirem.

Fim da luta! Os dois combatentes não conseguiram voltar para o ringue no devido tempo. Essa luta acabou em EMPATE, e os dois serão eliminados da batalha, deixando seus amigos para continuarem as lutas!

Pablo fez um anúncio único. Era o primeiro empate daquele Torneio, e provavelmente foi isso que fez os torcedores não comemorarem tanto quanto estavam acostumados.

Mana e San viram os médicos surgindo ao longe, trazendo duas macas. Eles realmente agiam rápido. A assassina se virou para San, e o viu colocando as mãos nos bolsos e fechando os olhos. A respiração dele estava extremamente fraca, e ele parecia que iria cair de cara no chão a qualquer momento. San era muito bom em esconder sentimentos, mas não dela. Ela sabia que ele estava realmente ferido. Era a primeira vez que ela o via naquele estado.

A companheira de equipe olhou para o lado e para baixo, vendo Mochizuki estirada no chão. Ela estava se mexendo e provavelmente estava preste a acordar. "A xamã mais poderosa do mundo... É, acho que San tem razão.", pensou ela.

Houve um barulho vindo do Telão, o que fez a assassina dar uma olhada nele rapidamente. Agora faltava só mais uma combatente para ser derrotada. O rosto dela aparecia no Telão e o publico já tinha começado a gritar o seu nome. Esse povo não sabia esperar por nada. Mas talvez era isso que fazia esse lugar tão "vivo".

— Desculpa. — disse San, fazendo Mana o encarar de novo. — Eu não consegui chegar até a quarta oponente.

— Você já fez o bastante. Agora é sua vez de descansar. Deixe o resto com a gente.

As macas chegaram bem na hora que Mochizuki abriu os olhos e tentou se levantar. Ela sentiu uma pontada de dor forte no peito, e viu que não conseguia tocar aquela região do corpo. Ela estava sem energia mágica e sua fadiga lhe gritava para que ela simplesmente apagasse a consciência e dormisse de uma vez.

A primeira coisa que ela viu foi o Telão. Ela olhou para a linha que dizia "Terceira Luta - Empate". E então olhou para o lado e viu San e Mana, a encarando. Era o fim. Empate? Como ela poderia aceitar aquilo? Não! Só podia ter uma conclusão naquele combate, e era ver San deixar esse mundo de uma vez por todas.

Ela encarou o garoto profundamente, torcendo para que ela conseguisse concentrar sua energia mágica mais uma vez. Ela não viu os dois médicos chegarem pelo lado dela, com a maca. E nem Geovanna que vinha correndo o mais rápido que conseguia na direção deles.

— Momo, você precisa começar a ouvir mais as outras pessoas. — disse San, colocando a mão dentro do roupão de combate dele. Ele levou a mão até um bolso interno de sua roupa, pegando algo que sempre carregava consigo. — Eu queria te mostrar isso mais cedo, mas você me atacou com uma intenção tão assassina, que me fez querer te derrotar primeiro. Mas enfim...

San retira o que ele havia guardado no bolso. Mana, que estava ao lado dele, foi a primeira a ver o que se tratava.

Era um pergaminho. Um bem típico, longo e enrolado em uma pequena haste de madeira negra, selado com um cordão vermelho. Era o clássico método de guardar documentos em vilas muito antigas ou em Templos mais ritualísticos.

Mana deu de ombros. Não era nada de tão especial assim. Isso foi o que ela pensou ANTES de olhar a expressão de puro desespero que Mochizuki fazia ao olhar para o pergaminho. Desespero? Era isso ou era... Hesitação? Era como mostrar que você tinha a carteira de alguém que acabou de perdê-la. De qualquer forma, era algo estranho de se ver.

O LEGADO DE AINU! — gritou Momo. Ela não tinha toda aquela energia, e depois de ter gritado, tossiu sangue e clamou por ar em seus pulmões.

— Fale mais baixo, Momo. Quer que todos nesse Coliseu saibam sobre o maior segredo da sua família? — disse San, se sentando na maca trazida pelos médicos.

— Espera! Por que diabos você está com isso? Eu achei que...

— E era ISSO que eu ia te dizer. — disse ele, cortando a garota. San fica deitado na maca, percebendo que suas costelas quebradas tinham começado a doer infernalmente. — Está comigo. E se você quer saber mais sobre isso, venha até o quarto da minha equipe hoje a noite, depois de se recuperar.

Mochizuki tentou gritar de novo, mas não conseguiu. Ela estava exausta. E machucada demais. San tinha lhe acertado poucos golpes, mas ela sabia que todos as habilidades dele serviam para matar o oponente rapidamente. Então ela deve ter sido acertada em pontos específicos no corpo, lhe dando um dano maior ainda.

Os médicos ajudaram a pobre garota a se deitar na maca. E então veio a escuridão mais uma vez. Mas foi diferente. A xamã estava tão excitada ao ver o pergaminho que tinha esquecido completamente que estava sem sangue e sem ar. A última coisa que ela viu foi Geovanna chegando até sua maca e gritando por seu nome. Depois, ela se foi. No caso, sua "consciência" se foi. Momo desmaiou de cansado e agora era levada para a enfermaria.

E ali do lado, acontecia algo parecido. Kuchiki chegou chorando desesperadamente até a maca de San que também estava sendo levada à enfermaria. Ela praticamente se jogou na maca, abraçando meio corpo de San. Isso não foi exatamente bonito de se ver, porque San reclamou de dor, fazendo a maga chorona se tocar na hora. Ela pediu desculpas ainda chorando. Não dava pra saber se aquelas lágrimas eram de tristeza ou de alegria.

Mumu chegou um segundo depois disso, fazendo a mundialmente conhecida pose de aceitação, com o dedo polegar levantado. San, ainda sorrindo, diz algo como "Deixo o resto com vocês", e depois some da vista dos três companheiros de equipe.

Foi nesse mesmo instante que os três perceberam que o publico havia diminuído drasticamente a gritaria generalizada. Os três se viraram para olhar para o ringue. Lá estava a última pessoa da equipe adversária. Seu nome estava aparecendo no Telão.

Yary. Vestia uma armadura leve feminina com a cor verde jade e tinha uma espada longa embainhada na cintura. E ela estava com a mão direita levantada e a cabeça abaixada. Era por isso que o publico estava mais quieto. Ela parecia pedir silêncio.

O Apresentador a ajudou fazendo os torcedores mais ávidos a ficarem mais calmos por pelo menos alguns segundos. Quando Yary percebeu que já podia falar, ela finalmente levantou a cabeça e disse com a voz alta:

— Eu desisto dessa luta. É impossível para mim aguentar três lutas contra o restante do time oponente. Não quero arriscar minha vida inutilmente em uma luta sem sentido. Vou pedir desculpas a todos os torcedores que nos apoiaram até agora, e irei pessoalmente me desculpar como o meu time sobre o ocorrido. É só.

E a combatente Yary desiste da última luta! Isso faz com que o Time Immortal Star seja o primeiro time a avançar para as Quartas de Final! Então, senhoras e senhores, FIM DO PRIMEIRO COMBATE DO DIA!!

E então a gritaria volta a trazer a velha vida do Coliseu. Geovanna não conseguia acreditar no que tinha acabado de ouvir. Ela estava vendo Yary caminhar para fora do ringue e vindo até sua direção. Ela se desculpou, abaixando a cabeça para a amiga.

Foi então que a maga controladora de energia percebeu que aquilo era o mais certo a se fazer. Ela tinha visto a força dos outros três membros da equipe de San no dia anterior, e nenhum deles dariam chance para um combate fácil. Ela disse que Yary não precisava se preocupar. No momento que Momo perdeu a luta, mesmo que tenha sido por empate, significava uma derrota para seu time.

A maga se lembrou dos olhos de San antes da luta contra Mochizuki. Aqueles olhos tinham tanta determinação, que ela mesma sabia, do fundo do coração, que ele não iria perder a luta. Claro, ela não poderia torcer por ele naquela hora. "Mas amanhã eu posso!", concluiu Geovanna.

Com a gritaria ainda forte dos espectadores, ela e Yary se retiram da Arena, indo em direção a enfermaria onde as duas outras companheiras estariam em recuperação.

— "Deixo o resto com vocês" uma ova! — disse Mulkior. Ele não parecia irritado, mas queria dar um sermão daqueles em San. — O cara entra no ringue pensando em não fazer a gente lutar muito e acaba quase se sacrificando pra isso! O que ele tem na cabeça?

— Olha Mumu... — começou Mana. — Mesmo conhecendo ele a um tempinho, eu não saberia te responder isso. Eu poderia dizer que ele mudou um pouco, mas... — ela pensou no que diria em seguida e viu que suas memórias estavam começando a ficar embaralhadas. — Mas ao mesmo tempo, não parece ter mudado nada.

Foi daquele jeito que eles terminaram de conversar. O mago não precisava de mais explicações. Para ele, o importante era que eles haviam ganhado a luta e que San estava "vivo".

Para Kula, que se esforçava para parar de chorar, a única coisa que importava era a sobrevivência do garoto. Ela tinha feito uma decisão. Não iria mais fazer lutas difíceis nesse Torneio. Porque foi por ela ter se machucado tanto no primeiro dia, que San teve que passar de seus limites para não forçar a barra dela e de Mana.

Já a assassina pensava um pouco diferente. Ver San tão inspirado para os combates tinha feito seu próprio espírito guerreiro entrar em uma adrenalina intensa. Da próxima vez, ela que iria continuar no ringue, protegendo seus companheiros.

Ela não queria mais ter que passar por aquela sensação de desespero. Ver San no chão parecendo morto fez seu coração parar de bater por pelo menos um segundo. Ela não confiava bem nele, mas isso não significava que ela o odiava ou algo parecido. Ele era teimoso, chato na maioria das vezes, impertinente e sarcástico. E adorava esconder seus verdadeiros sentimentos ou ideias. Era isso que fazia ela ser grossa com ele todas as vezes.

Mas depois de hoje... Ver ele se levantando machucado daquele jeito e voltando para o ringue... Não dava pra acreditar mesmo. Ela imaginou como Momo se sentiu ao ver o garoto mostrar que ainda estava apto a continuar a luta. Aquela força de vontade demonstrada no ringue estava começando a fazer Mana não dar importância a todo o resto das coisas que ela não gostava nele. "Eu não preciso confiar, mas posso pegar mais leve.", pensou ela. Afinal, eles estariam juntos até o final desse Torneio. Pelo menos aqui, ela iria apoiá-lo.

Ela olhou para o lado e viu Kuchi secando as lágrimas. Ela estava com cara de que apoiaria essa decisão de Mana se fosse contado à ela. E Mumu já parecia confiar em San desde quando ele tinha voltado ao ringue àquela hora.

Mana deixou escapar um leve sorriso. O time caminhou pelos corredores do Coliseu até a enfermaria, onde esperariam sentados até que o "Lobo Solitário" saísse de lá.