Pérola POV

De repente, sua visão direita clareou. Podia mover seu corpo e pensar por si de novo. Pôs a mão sobre seu olho esquerdo, que não conseguia sentir e muito menos ver com ele.

O que tinha acontecido? Onde estava?

Percebeu que havia perguntado em voz alta, e a voz de um garoto respondeu.

— Seja bem vinda de volta.

Ergueu o olhar e notou o garoto segurar seu ombro. Ele estava sorrindo. A alguns metros ao longe, as três Diamantes pareciam se recuperar da mesma coisa por qual tinha passado, e que não tinha certeza do que era. A frente dela, seis distintas gems conversavam.

— Obrigada – murmurou e ele assentiu e a ajudou a se levantar. Então, ele se reuniu com as gems e mais uma garota que não conseguiu reconhecer.

Eles conversavam, sorriam e pareciam ser muito amigos.

Amigos...

Por que sentia que deveria lembrar-se de algo? De alguém?

Procurou em suas memórias, mas tudo parecia confuso demais. Tinha apenas alguns flashbacks do que se parecia ter sido a muito tempo atrás.

Quando percebeu, o garoto conversava com a Diamante Branco. Ela aparentava estar... rosa?

Diamante Rosa. Mais um flashback dominou seus pensamentos. Elas no seu palanque da mesma cor, conversando e rindo como velhas amigas. Elas em um jardim florido e de mármore. Ela indo embora e todo o ambiente estar com rachaduras.

Uma voz reverberou em suas lembranças. Era doce e levemente aguda.

“Promete?”

Ela tentou lembrar-se da dona da voz. Sentia algo diferente ao pensar nela, como se seu coração desaprendesse a bater no mesmo ritmo de sempre.

Quem era ela? Por que não conseguia se lembrar dela?

— Ei, quer ir com a gente? - a voz do garoto a despertou de seus devaneios. Ele sorria. Tinha um sorriso familiar. A garota e as outras gems saíam do ambiente acompanhadas das Diamantes.

— Para onde? - conseguiu perguntar.

— Para casa. Eu te explico tudo no caminho.

Espinela POV

Sentia como se o tempo tivesse congelado. Estava parada já nem sabia a quanto tempo. Na mesma posição em que Rosa a deixou. Com as mãos dadas à frente do corpo, com raízes percorrendo suas botas cor de rosa e tornozelos. O cabelo antes rosa vivo parecia ter perdido a cor, tornando-se um magenta escuro e desprendia-se dos coques em forma coração.

Estava silencioso. O chafariz não funcionava mais e, portanto, o som de água corrente que antes preenchia o espaço havia desaparecido. Tudo que conseguia ouvir era sua própria respiração.

O mármore branco estava sujo e havia mudado para uma cor de terra. As flores haviam murchado, as folhas secado, as constelações do céu mudado.

Pela primeira vez em alguns milhares de anos, ouviu um som na direção de um pilar de mármore. Voltou sua atenção para ele. A antiga forma de transmissão de Rosa com suas irmãs estava funcionando mais uma vez, e de lá, uma voz desconhecida começou a falar.

Eu sei que vocês devem pensar que eu sou a nova Diamante Rosa mas, não precisam me mandar para o trono. Eu já tenho um lugarzinho só meu lá na Terra.”

Espinela piscou. Pôde ver que era um garoto jovem que discursava. O que ele estava falando?

É uma casa na praia onde moro com minhas amigas: Garnet, Ametista e Pérola. Por mais que tenha sido um prazer desfazer o império e salvar tantos planetas, eu estou louco pra ir pra casa e passar um tempinho feliz com os meus amigos.”

Conseguiu ouvir uma voz que devia conhecer ao fundo e a ligação falhar para se desligar assim como fez no começo dela.

Sem que pudesse perceber, estava chorando. Ela correu até o pilar e caiu de joelhos.

Então era isso. Diamante Rosa tinha dito que voltaria para buscá-la, e nunca o fez. Em vez disso, criou uma nova vida lá, literalmente.

Espinela soluçava de tanto chorar. Todos os pensamentos ruins que tinha tido durante todos os anos sozinha, abandonada naquele jardim vieram à tona e tinham se tornado reais: ela não voltaria mais. Nunca mais. Nem ela, nem Pérola, nem ninguém. Ela tinha sido enganada.

Como Rosa pôde fazer uma coisa dessas? Imaginou que, se ela havia feito algo assim, mal podia imaginar o que havia feito com Pérola.

Pérola. Precisa encontrá-la. Por um momento, sentiu raiva de si. Por que havia escutado sua Diamante? Devia ter escutado seu coração, sua gem, desde o começo.

Subitamente, uma raiva e sede por vingança descomunal preencheu sua mente. Secou as lágrimas com as costas das mãos e soltou os cabelos dos coques. Sentia a maquiagem dos olhos escorrer pelas bochechas. Não se importava. Não se importava com nada mais, a não ser, vingar-se.

Sua forma física brilhou e mudou. As ombreiras volumosas se tornaram pontudas, a parte branca onde residia sua gem estava agora preta e com sua gem invertida. As botas antes redondas e que emitiam seu som característica agora não emitiam mais e estavam pontudas como as ombreiras.

Agora incentivada pela vingança, correu para o teletransportador e apareceu nos aposentos de Rosa.

Tudo ali era como imaginava. Pé direito alto, pilares e piso de mármore, um ambiente amplo e vazio, da mesma cor de sua antiga amiga. E de sua antiga eu.

Vasculhou pelos poucos móveis que ali havia. Uma vez, lembrava-se que Rosa havia dito que obtinha uma arma para caso Pérola ou qualquer outra gem questionasse sua autoridade, explicando que um golpe e a gem voltaria a sua função original. Achara besteira e guardara a arma nos fundos de seu quarto.

“Eu não sou má assim.”, conseguiu ouvir a voz dela em seus pensamentos.

Sei. Má. Que reviravolta – murmurou consigo e ouviu um movimento vindo das paredes.

Relembrou de Pérola comentando com ela sobre pequenas gems que viviam escondidos pelo castelo e principalmente, pelo quarto de Rosa. Havia dito que pareciam pequenas rochas que pouco falavam e que precisava conversar com carinho com elas para que sequer dissessem algo que desse para entender.

Bingo. As pequenas gems apareceram por um lapso de segundo na parede, no nível de seu rosto. Desapareceram rapidamente, mas Espinela não era tão boba assim. Não mais.

Apareçam! Eu sou amiga da Diamante Rosa também, sabiam?! - bradou fechando os punhos. Após poucos segundos sem resposta, suspirou e afrouxou as mãos - Olhem, eu só preciso de uma coisa. Vocês poderiam me mostrar onde está? - Ela se esforçou ao máximo para não perguntar grosseiramente ou levantar o tom.

As gems reapareceram no mesmo lugar e pareciam discutir entre si baixinho. Uma corajosa ousou sair dali através de uma pequena plataforma que saiu da parede, curiosa com a gem diferente que estava ali.

— Sabem onde está a foice? - perguntou e as pequenas gems deram um suspiro de surpresa, logo voltando a discutirem entre si. A gem da plataforma voltou sua atenção para a maior e negou com a cabeça.

Espinela suspirou. Ela não estava para conversa. - Ok, então vai ter de ser pelo jeito difícil.

Não foi preciso muito estrago por parte de Espinela para que finalmente conseguisse o que queria. As gems restantes adentraram a parede em redenção e saíram dali segurando um cabo cor de rosa com um botão na ponta.

— É isso? - perguntou com desdém, apenas até apertar o botão e um cabo maior se estender por quase um metro, onde na ponta surgiu a parte curvada da arma como se estivesse eletrizada – Ah, perfeito! - guardou a arma em sua gem e encaminhou-se para o corredor.

Percorreu todo o castelo furtivamente na busca do transporte perfeito para seu plano. Precisava de algo que acabasse com a chance de que qualquer ser pudesse viver naquele tal planeta Terra. Se ela não pôde viver lá, ninguém mais iria.

Estava caminhando por um corredor longo e amplo e decidira procurar pelas portas que ali haviam. Abriu as primeiras portas sem sucesso. Estava a ponto de desistir e procurar em outra parte do palácio quando abriu a próxima porta e se deparou... Com Pérola.

— Espinela? — As memórias a atingiram com tudo. Todas as vezes que brincaram juntas, os momentos em que ela sorria e sentia seu coração errar as batidas.

— Pérola! – A segurou antes que caísse para frente – O que houve?

A mais alta se esforçou para dizer:

— Te pergunto o mesmo — abriu um sorriso suave.

Espinela sentiu o rosto corar.

— O que a Rosa fez com você? — perguntou enquanto a outra reestabelecia a postura.

— Ela... — Pensou em quanto tempo a outra esperou que ela a buscasse – Eu sinto muito. Eu devia ter ficado com você, deveria ter levado você no dia que Rosa foi falar com Branco, provavelmente ela... — Engoliu em seco. Agora entendia o que tinha lhe acontecido naquele dia. Estava perto demais de Rosa e de Branco – Elas não teriam feito o que fizeram – Sentiu os olhos marejarem e as lágrimas caírem.

Espinela segurou as mãos de Pérola — Eu vou à Terra. Vou me vingar de nós duas. Venha comigo.

— O que? Não, você não precisa. Steven é uma boa pessoa, não é como a Rosa era – Apertou as mãos da outra, que a olhou atentamente por alguns instantes antes de recuar.

— Não. Ele é exatamente como a Rosa — murmurou encarando os próprios sapatos – Aquele planeta tirou Rosa de mim, da gente! Se não fosse por aquele desejo dela de ter uma colônia, nada disso teria acontecido, estaríamos bem. Estaríamos juntas – ela ergueu o olhar.

— Espinela, você sabe como ela era. Ela não...

— NÃO! – interrompeu com um grito — Eu não sabia que ela era assim, eu... — Abraçou a si mesma – Eu era ingênua, acreditava que tudo que me falavam era verdade e que era para meu próprio bem...

Permaneceram um tempo em silêncio, apenas conversando com seus próprios pensamentos.

— Desculpe — Pérola suspirou – Lembra quando brincávamos juntas? O dia que você me deu aquela flor? — Ela estendeu a mão na própria gem que brilhou e fez a flor reaparecer — Eu nunca me esqueci de você. Nunca iria. Bom, não se dependesse da minha vontade. Presumo que Branco — Pigarreou – Tenho certeza que Branco não se importava com o que eu achava quando tomou conta da minha consciência.

— Então... Não foi Rosa que fez isso com você? – Não foi preciso apontar para Pérola perceber do que ela falava.

— Bem... Na verdade foi. Mas é o de menos! - Pérola insistiu quando viu o semblante de Espinela se fechar — Eu não me importo com meu olho, e sim com os milhares de anos que tive minha consciência roubada sem que eu pudesse ir até você — Suas bochechas coraram e Espinela franziu o cenho – Quando eu me recuperei, graças ao Steven, eu senti que precisava me lembrar de você, mas eu não conseguia, as memórias iam e vinham... — Seus olhos lacrimejaram mais uma vez — A culpa é minha também.

— Não, não é – rebateu e a outra a olhou nos olhos — Está tudo bem, mas... Eu preciso fazer isso. Preciso ver se a experiência daquele planeta faria valer a pena ela ter me deixado – Seu olhar mudou para um de determinação e vingança – E você não pode me impedir.

Antes que Pérola pudesse dizer qualquer coisa, Espinela lhe deu as costas e correu.