I Will Possess Your Heart

Capítulo VIII - And down we go.


Os quatro amigos saíram do hotel a procura de uma lanchonete. Gerard estava no banco de trás do carro, ao lado de Ray, enquanto Quinn dirigia e Bert tratava de avisar qualquer buraco ou movimento na pista, como uma garotinha desesperada. Ray estava agindo como se nada tivesse acontecido, vez ou outra até brincava com Bert. Tal atitude deixava Gerard ainda mais assustado, que ficou encolhido em seu canto, sem conseguir sequer olhar para Ray.

Finalmente acharam uma lanchonete na esquina de uma rua sem qualquer sinal de vida. Os quatro entraram e se sentaram numa mesinha no fundo do estabelecimento. Uma garçonete gordinha andou até eles com cara de poucos amigos.

A mulher segurava um pano sujo em uma das suas mãozinhas rosadas e um cardápio na outra. “Aqui está o cardápio, qualquer coisa é só gritar.” Entregou-o para Quinn. Quando ia se retirar, olhou para cada um deles, e soltou um gritinho gutural. “Ora, ora, ora! Olha só quem voltou para nos visitar!” Gerard olhou para Quinn e Bert, que também estavam confusos, e fitaram Ray, que estava vermelho. “Joseph, vem cá! Vem ver quem finalmente voltou para casa!”

Um senhor corcunda saiu de trás do balcão e se arrastou até a mesa, ao fitar Ray, abriu um sorriso, mostrando suas enormes gengivas arroxeadas. “Olha se não é o pequeno Raymond!” Os três amigos olharam para Ray, que rolou os olhos e ficou em pé, forçando um sorriso. “Vem cá dar um abraço, vem.” Ray o abraçou desajeitado, sem dizer nada, enquanto a mulher ficava na ponta dos pés tentando dar um abraço triplo.

“O que você está fazendo por aqui, Raymond?” A mulher puxou um banquinho e se apertou entre os amigos, o senhor voltou para o balcão, dizendo que iria buscar um café para eles.

“Eu estou... procurando uma pessoa. Um amigo nosso.” Ray falava entre dentes, enquanto movimentava sua enorme cabeleira. “Na verdade, nós estamos atrasados. Só viemos comer algo rapidinho.” Ray olhou para Quinn, pedindo para que ele confirmasse. Quinn não disse nada.

“Olha lá, hein? Você não está aprontando mais uma?” Ray tossiu e olhou desesperado para a mulher, que entendeu que deveria mudar de assunto. “Mas então, quem são essas gracinhas?”

“São meus... amigos.” A mulher gorducha passou as mãozinhas oleosas pelo cabelo de Quinn numa forma desajeitada de tentar arrumá-lo, Quinn se esforçou para não fazer uma careta, enquanto Bert fuzilava a mulher com seus olhos azuis. “Margareth, você poderia nos trazer um café da manhã bem caprichado?” Ray atropelava as palavras, tentando afastar a mulher dos amigos. “Aliás, eu vou com você até o balcão, aí nós podemos colocar o assunto em dia, hm?” Ray se levantou rapidamente e puxou a mulher pelas mãos, arrastando-a até o outro lado do local.

“Mas que merda foi essa?” Bert perguntou para Gerard, que ainda estava parado, de boca aberta. “Eu sabia que o Ray já teve uma fase hippie, mas não sabia que ele realmente conhecia todo mundo. E que mulherzinha oferecida, o que ela tinha que ficar arrumando seu cabelo?” Bert deslizou os dedos pelos cabelos finos de Quinn, bagunçando-os novamente. Quinn ia responder, mas seu celular começou a tocar, ele pediu licença e saiu da lanchonete, com os olhos de Bert o escoltando até a porta.

“Ô Bert!” Gerard puxou a cadeira para perto de seu amigo, enquanto olhava por cima do ombro para se certificar de que Ray estava longe o suficiente. “Você sabe onde o Ray foi essa madrugada?”

“Cara, não sei. Deve ter saído pra falar com algum amigo que mora por aqui, ele conhece todo mundo. Só sei que ele voltou com um saco de lixo no carro, algumas marmitas usadas, garrafas de água vazias, essas coisas. Deve estar alimentando algum amigo mendigo por aí.” Bert falou despreocupado. “Mas e o seu pulso? Parou de sangrar?”

“Parou, mas ainda arde. Eu pensei em conversar sobre isso com o Ray, mas ele anda tão estranho ultimamente. Acho melhor deixar pra lá.”

Quinn passou pela porta novamente e caminhou em passos largos em direção aos amigos, Ray levantou-se do banquinho e seguiu o loiro.

Quinn se sentou na cadeira, enquanto puxava a outra para Ray. “Os pais do Frank me ligaram e disseram que os policiais desistiram da busca.” Tirou um pequeno notebook da mochila e o abriu. “Daqui três dias eles farão um velório para ele.” Quinn tossiu ao terminar a última frase, Bert notou que as mãos do loiro tremiam, e tratou de segurá-las com as suas. “Nós temos que voltar.”

“O quê? Voltar? Você tá louco? Nós não vamos voltar agora.” Ray gritou ao lado de Quinn, jogando suas mãos para o alto. “Gerard, não vai dizer nada?”

Gerard juntou as sobrancelhas em confusão. “Eu? Quem decide é o Quinn, o amigo é dele.”

Ray tocou nos ombros de Gerard, que sentiu um choque passar por todo seu corpo. “Por favor, me diz. O que você acha?” Bert olhou para Quinn, que olhou para Ray, confuso.

“Você endoidou, Ray?” Gerard se afastou e colou sua cadeira ao lado de Bert. “Eu nem conhecia o Quinn, nem o tal do Frank, você acha que agora eu tenho que decidir tudo?”

“Nós não podemos voltar agora. O Frank não tinha aquela bandinha de garagem? Ele deve conhecer alguém por aqui, quem sabe ele não veio pra cá e aconteceu alguma coisa?” Quinn olhou desconfiado para Ray, que se calou imediatamente.

“Eu... Eu não sei. Eu já volto, preciso esfriar a cabeça.” Quinn se levantou e olhou para Bert, que entendeu que também deveria ir.

“Gerard, você não pode deixar isso acontecer. Nós não podemos ir embora.” Ray sussurrou para Gerard.

“Ray, sinceramente... Eu nunca vi esse tal de Frank, por que você tá insistindo tanto na minha participação nisso?”

“Você sabe, Gerard. Eu sinto algo em você. Acho que você realmente pode nos ajudar. E se eu te mostrar algumas fotos do Frank? Talvez você se lembre dele.” Gerard deu de ombros. “Aqui.” Ray pegou o notebook de Quinn e abriu uma pasta com dezenas de fotos de Frank e Quinn juntos. “Olha bem, talvez você o conheça.”

Gerard trouxe o notebook para si e abriu a primeira foto. Um garoto baixinho de costas, com Quinn pendurado em seu ombro. Gerard sentiu um vento frio em sua nuca, seguido por uma pontada em sua têmpora. Passou para a segunda foto. Quinn e Frank sorrindo. “Mas que...” Ray olhou ansioso para Gerard. “Esses olhos...” Ray passou para a terceira foto, apressado. Era apenas Frank, olhando diretamente para a câmera. “Ray! É ele!” As mãos de Gerard tremiam. “É ele! É ELE!” Ray abriu um enorme sorriso, vitorioso.

“Caralho. Eu sabia, eu sabia.”

Gerard não entendia o que Ray estava dizendo, não entendia o que estava sentindo, não entendia o que estava vendo. Frank. Frank era o dono dos olhos castanhos que invadia seus sonhos. Frank era dono do pequeno corpo que ele tanto almejava. Frank era o corpinho que na noite anterior estava queimado no chão do quarto do hotel.

“Meu Deus. ELE TÁ VIVO, RAY.” Gerard se levantou da cadeira e pegou o notebook. “Chama o Quinn, chama o Bert. Rápido.” Ray abriu um sorriso enorme, quase maníaco, e saiu correndo até o banheiro. Os três vieram apressados, Gerard agarrou Bert pelos ombros. “Bert! Meu Deus, Bert. É ele. O Frank. Vamos!”

Os quatro foram apressados para o carro. Quinn não entendia nada, mas obedeceu Gerard. Bert tentava ligar os pontos, e entrou no carro boquiaberto. Ray não conseguia conter sua animação, mas parou no meio do caminho e voltou apressado para a lanchonete, dizendo que iria se despedir dos amigos.

“Pra onde nós vamos agora, Gerard?” Bert perguntou.

“Eu não sei. Ai, meu Deus. Eu não sei. O que tá acontecendo comigo? Que porra é essa? Eu não consigo... eu não sei no que pensar.” Gerard estava branco, gelado. Seu corpo não o obedecia mais, suas mãos tremiam sem parar, seus olhos giravam. Bert olhou para o amigo, preocupado, e soltou um grito.

“Quinn! Não liga o carro ainda. Cacete!” Um filete de sangue escorria pelo nariz de Gerard. “O que nós vamos fazer agora?” Bert ficou de joelhos no banco da frente, tentando segurar Gerard. “Ele tá gelado. Caralho.” Bert segurou Gerard pelos ombros. O corpo de Gerard endureceu, e seus olhos se fecharam.

“PUTA QUE PARIU. Ele morreu?” Quinn se encolheu no banco da frente, tentando não olhar para trás.

Gerard abriu os olhos novamente, esfregando-os com a palma da mão. “Hmm?” Olhou para Bert, e depois para Quinn. “Quinn?” Quinn estava estático, não conseguiu responder. “Quinn...” Gerard passou as mãos branquelas pelos seus pulsos machucados, soltou um grito fino. “Quinn, vem me buscar.”

Bert olhou para Quinn, confuso. “O quê?”

Os olhos de Gerard se encheram de lágrimas. “Quinn...” Gerard se jogou rapidamente para frente e agarrou o loiro pelos ombros, ignorando a dor que sentia em seus pulsos. “Me ajuda, Quinn. Me ajuda. Eu tô tão perto, eu não sei onde... por favor.”

“Peraí...” Quinn arregalou os olhos e também se colocou de joelhos sobre o banco. “F... Frank?”

Ray entrou no carro e Gerard o fitou. “Não... Não!” Os olhos de Gerard giraram, seu corpo se contorcia. Ray o segurou pelos ombros, enquanto Bert gritava por socorro e Quinn se encolhia ainda mais. Gerard parou aos poucos e desmaiou sobre os braços de Ray.