Capítulo 24 - Sondando a Verdade

No dia seguinte, depois da reunião diária no Royal Garden, Tsukasa e Aruto tinham ficado depois da hora, como já vinha acontecendo há alguns meses. Sem que os outros membros soubessem, os dois vinham apostando em todo o tipo de jogos de tabuleiro, cartas, dados, e tudo o mais em que se fosse possível apostar. E, como acontecia sempre, o mais velho tinha perdido o jogo. Desde que começara essa enxurrada de apostas em jogos de azar que Tsukasa não pedia outra coisa como prêmio além de fazer com que Aruto atendesse seus desejos e caprichos. Ele havia até dado um nome pra isso. Chamava o dia em que realizavam essas apostas de Dia das Tarefas do Valete.

– Eu tenho mesmo que usar isso? - Aruto perguntou pela terceira semana seguida, apontando para o terno preto com gravata-borboleta que Tsukasa tinha obrigado ele a vestir
– Claro que tem! É uma ordem do Rei afinal! - o mais novo respondeu, visivelmente empolgado - Hoje você será o meu mordomo pessoal, Aruto-kun!
– Qual é, eu fui rebaixado de Valete pra mordomo agora? - o violinista resmungou - Fala sério, não é nem necessário que eu use essa roupa ridícula!
– Mas você está me servindo agora, por isso achei que a roupa de mordomo combinaria... ou por acaso você preferia usar uma roupa de maid? - Tsukasa riu, imaginando a cena
– Mas nem morto!!! Você está passando muito tempo com o Daisuke, hein Tsukasa, está ficando que nem ele! Pode tirando essa idéia ridícula da cabeça!! - o maior gritou, corando furiosamente com a idéia
– Hai, hai... tudo bem, não precisa usar roupa de maid - Tsukasa apressou-se a dizer, embora ainda achasse aquela uma idéia muito divertida - Mas... isso aqui você vai ter que usar sim! - ele deu um salto, afim de alcançar a cabeça do maior, e colocou sobre os cabelos dele um arco com duas orelhas falsas de gato
– Mas que droga é essa?! - Aruto indagou, apalpando suas novas orelhas felinas
– Nekomimi! - Tsukasa respondeu sorridente - Ficou muito fofo em você Aruto-kun!
– Você realmente está passando tempo demais com o Daisuke e com as meninas... vai acabar sendo contaminado desse jeito - Aruto resmungou, mas não retirou as orelhas - E? O que quer que eu faça agora?
– Quero que me dê o chocolate! - Tsukasa sentou-se na cadeira mais próxima, balançando os pés no ar, parecendo bastante ansioso, como se tivesse esperado a semana toda por aquilo
– Certo, certo, como quiser, meu Rei... mas eu ainda não sei pra quê isso, você poderia muito bem comer o chocolate sozinho! - o Valete reclamou, mas obedeceu a ordem sem discutir, parecendo já ter se acostumado com aquilo. Ele abriu o pacote de chocolate, separou um quadradinho do resto da barra e o depositou entre os lábios macios do mais novo. Tsukasa abocanhou o chocolate inteiro de uma só vez, quase levando o dedo dele junto - Nee Tsukasa... você enrolou todo mundo ontem, e acabou não respondendo à pergunta da Midori. Me conta, quem é a pessoa que você gosta afinal?

Tsukasa teve um acesso de tosse, se engasgando com o chocolate, incapaz de responder ao que quer que fosse. Seus olhos começaram a lacrimejar, e seu rosto passou de vermelho para roxo, até que Aruto lhe deu um copo de água, que o mais novo engoliu às pressas, finalmente conseguindo fazer o chocolate mal mastigado descer pela garganta. Vários segundos depois, ele respondeu:

– Por que está me perguntando isso agora? Esse é um assunto só meu, não é da sua conta
– Como assim, não é da minha conta?! - Aruto repetiu, ofendido - É da minha conta sim senhor, pode respondendo!!
– Por que? - Tsukasa perguntou, encarando-o nos olhos - Que importância tem pra você de quem eu gosto ou deixo de gostar? Por que esse assunto te interessa tanto?
– N-Não é que me interesse... eu... q-quero dizer... - o maior gaguejou, recuando um passo - É só que... b-bem, você já sabe de quem todos nós gostamos, então não é justo que apenas você mantenha segredo sobre esse assunto!
– Humm... então é só pra fazer fofoca afinal - o menor concluiu - Então quer dizer que é verdade o que a Midori-san e o Daisuke-kun falaram ontem, não é? Se eu sei de quem todos vocês gostam... então significa que você gosta mesmo da Souko-san. Ou será... da Mizue-neesan?
– E-E-Eu não... q-quem foi que disse que eu g-gosto delas?! - Aruto corou, perguntando-se como raios a conversa tinha ido parar nele - Isso não interessa, o que eu perguntei é quem é esse alguém de quem você gosta!!! Vamos, me conte, Tsukasa... eu não vou contar pra ninguém, prometo!!
– Eu é que não vou contar pra ninguém. Nem mesmo pra você, Aruto-kun - o Rei respondeu impassível
– Mas por que não?! Você não confia em mim??
– Claro que confio. Mas não tem importância saber quem é o "alguém" de quem eu gosto, nem faz sentido contar... quando esse alguém já gosta de outra pessoa.

Mesmo dizendo uma coisa triste daquelas, Tsukasa ainda conseguia sorrir docemente para o mais velho, com aquela expressão gentil de sempre, como se aquilo fosse um assunto sem importância. Aruto teve a impressão de que fazer isso o devia estar machucando ainda mais por dentro, e por algum motivo se sentiu culpado também. Talvez por simplesmente não saber o que dizer ao amigo em uma situação daquelas, ele não sabia muito bem. Abriu a boca algumas vezes para tentar falar alguma coisa, para tentar consolá-lo, ou animá-lo talvez, mas nenhum som saía. E, antes que o Valete conseguisse pensar em alguma coisa aceitável para se dizer numa hora como essa, Tsukasa falou:

– Nee, por que você parou de me dar o chocolate? Eu ainda estou com fome! - ele exclamou, como uma criança birrenta, voltando a balançar os pés no ar, como se aquela conversa nunca tivesse acontecido
– Ahn... é claro... o chocolate - Aruto enfim despertou de seus devaneios e, como não tinha conseguido pensar em nada decente para dizer ao amigo, achou melhor pelo menos terminar suas tarefas sem reclamar. Ele tirou outro quadradinho da barra e o colocou na boca do menor - Pronto, pronto, aqui está, não precisa gritar... você parece uma criança mimada assim
– Mas eu sou uma criança! - Tsukasa lembrou o óbvio
– Mas não precisa ser mimado - Aruto rebateu, lhe dando outro chocolate - Vamos, abra a boca, Alteza
– É Majestade - Tsukasa corrigiu
– O que?
– Eu sou o Rei, então você deve dizer "Majestade", que é usado para Reis e Rainhas. "Alteza" é usado para Príncipes e Princesas - o mais novo explicou - Francamente, Aruto-kun, você está no quinto ano e não sabia disso?!
– Eu... hãn... b-bem... ahh, cala a boca e come logo esse chocolate, Majestade!! - ele corou de vergonha e enfiou outro chocolate na boca do menor. Tsukasa apenas sorriu, divertindo-se ao ver a expressão irritada no rosto do mais velho. Realmente, aqueles dias em que fazia Aruto cumprir as Tarefas do Valete eram os mais felizes de sua vida.

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Longe dali, Midori voltava pra casa, sozinha, com exceção de sua Chara, que nem todos podiam ver. Como por exemplo os três garotos grandalhões que se colocaram em seu caminho, cercando a Rainha:

– Ora, ora, ora, vejam só quem está sozinha hoje... a Princesinha do Conselho! - um deles exclamou, arreganhando os dentes amarelos em um feio sorriso
– Passeando sozinha pelo bosque, Princesinha? - o mais alto perguntou
– Mas que a azar o seu, hein.... os "lobos" chegaram - o mais corpulento completou, aproximando-se mais, e fazendo a garota recuar um passo
– O q-que vocês q-querem? - ela indagou, tentando parecer confiante, embora fosse óbvio que estava apavorada. Aqueles eram os mesmos garotos com quem ela e os outros Guardiões já tinham enfrentado problemas várias vezes antes. Os mesmos garotos que intimidavam Tsukasa, Nikaidou, Nodoka, Mashiro, os irmãos Hinamori, ou qualquer outro aluno do terceiro ano pra baixo, que fosse menina, ou que não possuísse força física suficiente pra derrotar três gorilas sozinho. Eram o terror da Academia Seiyo... ou, como Daisuke os chamava, o Trio Baka
– Ah, nós não queremos nada de mais... apenas conversar com você, Princesinha - um deles falou, fingindo-se de inocente, passando a mão gorducha pelos cabelos dela. Midori se encolheu, entre receosa e enojada. Aquele apelido já tinha "pego" na escola toda, Aruto mesmo era um dos que mais a chamavam assim. Era meio irritante quando Aruto à chamava de Princesinha... mas, quando o apelido era proferido pelo Trio Baka, era muito, muito pior. Era completamente repugnante
– Sabe, você deve se lembrar da surra que os seus amiguinhos idiotas nos deram por causa daquela pirralha Nodoka - o mais alto falou - Talvez não lembre, pode não ter sido importante pra você, mas nós lembramos. Não pensou que iríamos apanhar de um bando de pirralhos e que ia ficar por isso mesmo, pensou?
– É claro que não - o mais corpulento disse, antes que a Rainha pudesse responder - Nós só estávamos esperando as coisas esfriarem pra poder dar o troco... e esse dia chegou, Princesinha
– Sabe, de todos aqueles pivetes, você foi a única que não nos bateu... quase dá pena se vingar só de você - o mais feioso disse, fingindo compaixão - Mas fazer o que se você é a mais fraca do grupo, né?
– Midori... vamos fazer o Chara Change e fugir daqui antes que esses caras te machuquem, depressa! - Hime cochichou para a dona, embora não fosse realmente necessário, já que os garotos não podiam vê-la ou ouví-la. Mas aparentemente, Midori também não estava escutando. Estava tão apavorada que não conseguia ouvir uma única palavra do que sua Chara dizia
– Então, minha cara Princesinha... pelo bem dos seus amigos covardes... prepare-se pra apanhar - o mais corpulento cerrou o punho, ao mesmo tempo em que Midori fechou os olhos, mas antes que o garoto a acertasse, uma voz cortou o ar, interrompendo
– Ei! O que estão fazendo com a minha amiga?!
– Yui... chan - Midori sussurrou ao ver a mais velha se aproximar - Fuja... saia daqui, ou eles vão pegar você também!
– Não diga besteiras, Midori-chan! Tá certo que sou boa em fugas, mas até parece que eu iria deixar você aí sozinha com esses caras!
– Há... olha só, o travesti chegou - o mais alto disse em tom debochado
– Tá querendo apanhar também, idiota?? - acrescentou o mais corpulento. Ele segurava um dos braços de Midori, o que tornava impossível para a mais velha simplesmente puxá-la para longe e fugir com ela
– Eu não vou apanhar coisíssima nenhuma. E nem a Midori-chan. Vocês é que vão - a Coringa respondeu, tentando aparentar uma confiança que não sentia
– Até parece! Da última vez vocês eram cinco, por isso tiveram sorte! Mas as coisas são diferentes dessa vez. Vocês são só duas - o mais alto lembrou
– É verdade, somos apenas duas... mas mesmo assim, eu ainda posso derrotar vocês com o meu "golpe secreto". Estão lembrados daquilo, não estão? Ou... eu terei que refrescar sua memória? - a falsa garota indagou, sorrindo maldosamente. Por mais que tentasse parecer confiante, no fundo sabia que eles tinham razão. Ela poderia até derrotar um, talvez, mas eles eram três, e Midori estava tão apavorada que não tinha como lutar. Yui jamais poderia derrotar os três sozinha. A menos que...
– Não pense que vamos cair naquele truque sujo de novo! Vamos arrebentar essa sua carinha de menina antes que você consiga pensar em fazer isso, seu traveco maldito!! - o mais corpulento gritou, embora tivesse recuado um passo
– Droga... eu vou ter que fazer isso - Yui-chan murmurou mais para si mesma do que para eles. Só havia uma saída e, por mais que não gostasse dela, era a única alternativa que lhe restava
– O que foi? No que está pensando? - Junjou indagou ao seu lado
– Só tem... um jeito de salvar a Midori-chan - ela concluiu, preparando-se para o pior - Loli... Chara Change
– Ehh? T-Tem certeza, Yui-chan?? - a Chara indagou, meio hesitante, o que era estranho, visto que ela adorava ativar o Chara Change da dona
– Tenho sim. Pode fazer.

Um laço espalhafatoso surgiu nos cabelos ruivos da Coringa. Sua expressão de preocupação e desagrado mudou rapidamente para um sorriso sugestivo e um olhar meio desfocado. Ela andou com mais confiança do que nunca até onde os garotos estavam, puxou o outro braço de Midori para longe do garoto grandalhão, parou de frente para o rapaz que antes segurava a Rainha e falou:

– Nee... por que você estava segurando essa garota magricela com tanta força? Queria tanto assim ela pra você, é? Por acaso não prefere... uma menina mais bonita e atraente, como a Yui por exemplo?
– O q-que?! - o garoto engasgou-se com as palavras, recuando vários passos, sem acreditar no que ouvia - Mas que merda é essa que você está falando???
– Eu estou falando que a Yui muuuito mais linda e fofa do que a Midori-chan! - a ruiva repetiu, apontando escandalosamente para a Rainha, como que comparando-as, e voltando a falar na terceira pessoa por causa do Chara Change. Midori estava tão atordoada com o Chara Change da falsa menina que nem sequer se ofendeu com o que a amiga disse sobre ela - Olha só pra ela, é tão pequena e magricela.... é só pele e osso, não tem nada de atraente nisso! Já a Yui, é maior, mais velha e mais experiente do que a Midori-chan... com um sabor, assim, de mulher madura, se é que vocês me entendem - ela sorriu ainda mais sugestivamente, dando uma piscadela. O garoto mais alto e o mais corpulento recuaram mais, entre assustados e enojados. O outro garoto corou furiosamente - Então... por que vocês não deixam essa garotinha pra lá e vêm se divertir de verdade com a Yui, hein? - ela atirou seus braços ao redor do pescoço do garoto que tinha corado, que ficou sem reação por um momento, deixando que ela continuasse se aproximando. Até que o mais alto gritou
– Você é louca, é?! Além de ser um traveco maldito com um chute ridiculamente poderoso, ainda por cima é gay?! Sai fora, seu maluco nojento!!!
– Eu é que não vou ficar aqui e deixar esse doente me agarrar, vou sair fora!! - mais corpulento acrescentou, fazendo uma careta.

Os gritos dos dois garotos parecia ter despertado o terceiro para a realidade, e ele rapidamente se desvencilhou dos braços da falsa garota, e fugiu junto com os amigos. Poucos segundos depois, o laçarote nos cabelos de Yui-chan desapareceu e o Chara Change se desfez. Seu sorriso pervertido desapareceu lentamente, sendo substituído por uma expressão de horror quando ela percebeu o que tinha feito. Soltou um grito agudo, caindo de joelhos no chão, as mãos cobrindo o rosto corado.

– Aaahhhhh eu não acredito que fiz isso de novoooo!!!
– Etto... v-você está bem Yui-chan?? - Midori indagou timidamente, ajoelhando-se ao lado da amiga, sem saber o que dizer
– Não, eu não estou bem! Você viu o que eu acabei de fazer, não viu?! Ahh e pensar que, se eles não tivessem fugido, eu poderia... aaaii que horrooor!! - ela balançou-se de um lado para o outro, chocada com suas próprias ações
– D-Desculpe... você precisou fazer isso por minha causa... - a Rainha murmurou sem jeito, sentindo-se culpada
– Ah, não, não se preocupe... eu jamais poderia vencer aqueles caras sozinha numa luta, aquele era o único jeito - ela tirou as mãos do rosto, revelando sua face furiosamente corada - Desculpe pelas coisas ruins que eu disse sobre você, Midori-chan... eu estava no Chara Change, então não leve à sério...
– Ah, não, imagina! Eu também faço muita besteira no Chara Change, não se preocupe - a Rainha apressou-se a dizer - Mas... v-você está mesmo bem?
– Tirando a vontade louca de morrer, estou ótima - ela falou com a voz depressiva. Podia-se ver até uma nuvenzinha negra sobre a falsa garota
– Desculpe... e obrigada por me salvar, Yui-chan
– Ei, você é minha melhor amiga, eu não podia deixar aqueles caras fazerem mal à você - ela virou a cabeça para trás para poder encarar Midori - Além do mais... Fujisaki-kun me mataria se eu deixasse alguma coisa ruim acontecer com você
– O q-que foi que você d-disse??
– Ei, Midori-chan! O que está fazendo aí ajoelhada no chão?? - uma voz gritou, chamando a atenção das duas. Midori corou furiosamente ao ouvir aquela voz, e Yui-chan apenas voltou ao seu estado depressivo. Se era coincidência ou não, ninguém sabia, mas Fujisaki vinha andando ao encontro delas nesse exato momento - Nossa, você está com uma cara horrível, Midori-chan... aconteceu alguma coisa? - ele indagou, abaixando-se, de modo a ficar na mesma altura que ela. Só então percebeu que a Rainha não estava sozinha - Ué? Quem...?
– Eu acho que vou andando agora, Midori-chan... você está em boa companhia agora - Yui forçou um sorriso, e colocou-se de pé. Midori levantou-se também, alguns segundos depois
– Ei... t-tem certeza de que você vai ficar bem? - ela indagou preocupada
– Ah, vou sim, não se preocupe... só preciso passar alguns séculos enterrada em um buraco bem fundo. Até mais - a falsa garota saiu andando, e adentrou o bosque, desaparecendo entre as árvores
– Nee... o que foi que houve com aquela garota?? - Fujisaki indagou curioso
– Ela... fez uma coisa muito, muito vergonhosa... - a Rainha respondeu, meio sombria - Mas ela deve ficar bem, eu acho... Yui-chan é uma garota bem forte no fim das contas
– "Yui-chan"?! - o garoto repetiu incrédulo - N-Não me diga... que aquela garota era o Daisuke?!
– Ahn... b-bem, sim... - Midori confirmou, meio sem saber o que dizer - V-Você sabia sobre ele, senpai??
– Ele tinha me contado sobre isso uma vez... embora não fosse realmente necessário, todo mundo conhece os boatos sobre a "criança travesti do Templo" afinal - o mais velho respondeu - Mas é a primeira que o vejo assim... impressionante, não pensei que fosse verdade, mas ele realmente fica igualzinho à uma garota
– É, ele já enganou muita gente assim - Midori riu sem graça, e recomeçou a andar. Fujisaki deu uma última olhada para as árvores por onde Yui-chan tinha desaparecido antes de acompanhá-la - Fujisaki-senpai, você... n-não se importa com isso? - ela indagou curiosa - Quero dizer... pelo que o Daisuke-kun me contou, todo mundo que descobriu que ele era a Yui-chan até hoje, sempre o rejeitou e o discriminou. O fato de ele ser um travesti... não te incomoda?
– Bem... - o mais velho coçou o rosto sem jeito, pensando no que responder. A verdade é que ele não era uma pessoa que estivesse na posição de julgar o travestivismo alheio, mas não podia contar isso para Midori. Por mais que não gostasse de esconder segredos dela, o receio do que ela faria se descobrisse seu segredo era muito maior - Eu admito que achei estranho no começo, mas... quem sou eu pra julgar os gostos pessoais dos outros? Quero dizer, se ele gosta de... usar vestido... b-bem, isso é um assunto só dele, eu não tenho nada com isso. E ele nunca fez nada que me incomodasse ou me ofendesse para que eu quisesse odiá-lo, então... realmente não faz diferença pra mim
– Eu sabia! Sabia que você entenderia, senpai! - em um ato impulsivo, Midori segurou as duas mãos do garoto entre as suas, com um estranho brilho nos olhos - Os outros membros do Conselho também não se importam com isso, sabe, mas eu sinto como se eles apenas tolerassem isso, só por não terem escolha... mas eu acho tão incrível como ele consegue mudar tanto apenas trocando de roupa! É como se ele e a Yui-chan fossem duas pessoas diferentes!
– Ahn... bem, acho que ele parecia ser outra pessoa mesmo - o sextanista concordou, sem saber o que dizer diante de tanta empolgação da menina - Uma vez ele me contou... que Yui-chan é sua melhor amiga. Bem, eu imaginei que fosse, quero dizer... você não anda com outras meninas além da Mikoto-chan, e ela é meio... b-bem... tem aquele jeito meio, sabe... masculino... por favor não diga pra ela que eu disse isso! Mas, ela não parece ser o tipo de pessoa que seria a melhor amiga de alguém tão... delicada e feminina como você
– Ah, não se preocupe, a Mikoto-chan é bem masculina mesmo, ela mesma sabe dis... - Midori interrompeu-se abrupdamente, percebendo tardiamente o que o garoto tinha falado - Ahn... v-você me acha... d-delicada e feminina, senpai?
– Eu não "acho". Você realmente é delicada! E também... refinada e graciosa... é por isso que todo mundo te chama de "Princesinha", não é?
– S-Sim... é p-por isso s-s-sim... - a Rainha titubeou, corando furiosamente. Ouvir o Trio Baka chamando-a assim tinha deixado Midori enojada, mas vindo do sextanista, soava completamente diferente
– Sabe... quando ouvi que Yui-chan era sua melhor amiga, eu... por algum motivo não gostei disso. Vocês passavam tanto tempo juntos que... não sei, me incomoda às vezes - o garoto confessou em voz baixa, despejando aquelas palavras antes que pudesse se refrear
– Incomoda por que? - ela indagou confusa, e curiosamente feliz com isso - Ela é minha melhor amiga... nós fazemos compras juntas, olhamos as vitrines das lojas, essas coisas. E arrastamos a Mikoto-chan junto sempre que temos chance. Ela é... c-como uma irmã mais velha pra mim
– Uma irmã, é? - ele repetiu, sorrindo de canto. Então ele estava certo afinal, não tinha com o que se preocupar se o relacionamento dos dois era fraternal
– Por favor não conte isso pra ela! - Midori pediu, um tanto embaraçada - Quero dizer, pra ele! Não conte pro Daisuke-kun que... ah, você entendeu!
– Hai, hai... pode deixar, não vou contar nada - o mais velho garantiu - Será o nosso segredinho... "Princesinha" - ele tinha conseguido deixar Midori excepcionalmente corada ao dizer esta última palavra, e sorriu abertamente, satisfeito. Os dois continuaram o caminho de volta pra casa, sem soltar as mãos.

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