Franklin, 24.11.2003 7hrs30min

Daquele dia em diante eu e minha mãe tínhamos virado cumplices de travessuras e confissões, e isso era bom. Mas dentre coisas boas aconteciam coisas ruins também, algumas pessoas do bairro começaram a discriminar minha mãe por ela ser uma mulher separada, isso era doloroso por que às vezes ela mal podia entrar em um mercado que os cochichos começavam. Meu pai já tinha entrado com o processo de separação e a visita do advogado fez minha mãe ficar pior. Dave estava cada vez pior e agora ele quase ficava acampado na porta da minha casa me vigiando.

Acordei cedo e fui pra escola naquele dia decidida a falar com ele pra parar com aquilo, pois estava me assustando. Assim que entrei na escola ele pegou meu braço e puxou com força pra um canto do colégio.

- AI DAVE VOCÊ ESTA ME MACHUCANDO! – eu gritei quando ele me soltou ele me olhava um pouco furioso

- PORQUE VOCÊ SAIU ONTEM COM A SUA MÃE E NÃO ME FALOU? ONDE VOCES FORAM? FORAM FAZER O QUE? PORQUE VOCÊ NÃO ME CHAMOU PRA IR COM VOCÊ? NÃO QUER MAIS ANDAR COMIGO? ACHOU OUTRO AMIGO É?

- DAVE! EU SAI COM A MINHA MÃE! EU SÓ FUI AO SHOPPING! DÁ PRA PARAR COM ISSO VOCÊ TA ME ASSUSTANDO! – eu disse me afastando dele – E DESDE QUANDO EU TENHO QUE DAR SATISFAÇÃO PRA VOCÊ DO QUE EU VOU OU NÃO FAZER? – ele pegou meu braço de novo e me empurrou na parede, me fazendo bater a cabeça na parede – AI MINHA CABEÇA! – ele se aproximou e segurou o meu queixo a centímetros do rosto dele

- Desculpe-me... Se às vezes eu sou grosso de mais, mas é por que eu só quero te defender... Só quero o seu bem... Minha Hayley... Eu só quero te defender... Cuidar de você... Você é minha... Só minha... E de mais ninguém entende...? Só minha... – ele repetia isso varias vezes, parecia um louco sei lá - Mas eu juro que não quero te machucar, por isso eu sou assim com você...

- Dave, eu não sou sua... Eu sou sua amiga, mas esse seu jeito me assusta... E como eu disse, eu não sou sua! Você pode me soltar agora? – eu disse tentando soltar meu rosto do dele, ele deu uma risada irônica.

- NÃO! EU NÃO VOU TE SOLTAR... VOCÊ É MINHA E PRONTO! QUANDO VOCÊ VAI ENTENDER ISSO HEIN? VOCÊ É MINHA SIM HAYLEY E SÓ MINHA, DE NINGUÉM MAIS! EU QUERO VOCÊ PRA MIM E VOU TER VOCÊ PRA MIM... VOCÊ É SÓ MINHA E PRONTO! NADA NEM NINGUÉM VÃO MUDAR ISSO... NEM MESMO VOCÊ OK? VOCÊ SÓ PODE SER MINHA... DE MAIS NINGUÉM... VOCÊ ME ENTENDEU? HEIN HAYLEYE? VOCÊ ME ENTENDEU? V-O-C-Ê –É- S-Ó- M-I-N-H-A- E- D-E- M-A-I-S- N-I-N-G-U-É-M! NINGUÉM VAI TOMAR VOCÊ DE MIM...

- ME SOLTA DAVE! VOCÊ TA ME DEIXANDO COM MEDO! EU NÃO TENHO NADA COM VOCÊ... E NÃO QUERO TER... QUAL É O SEU PROBLEMA, EU NÃO QUERO VOCÊ, EU NÃO QUERO SER NADA SUA E EU- NÃO- SOU- SUA! – eu puxei o meu braço com força – VOCÊ ESTÁ ME MACHUCANDO!

- VOCÊ É MINHA! EU JÁ DISSE... E NADA VAI MUDAR ISSO - ele agora segurava os meus dois braços com força, era impossível eu me soltar sozinha, ele estava com raiva e dava medo dele fazer algo comigo, ele me empurrou na parede de novo só que ele não me soltou e se prensou contra mim, me apertando na parede.

- Dave, o que você vai fazer?- eu disse tentando me soltar

- EU QUERO BEIJAR VOCÊ... EU QUERO VOCÊ HAYLEY... – levei o maior susto quando ouvi aquilo, não conseguia acreditar que aquilo era o Dave que pronunciava, era inacreditável, eu não esperava aquilo não podia ser ele.

- Mas eu não quero... Você não vai me obrigar não é Dave? Eu não quero nada com você...

- MAS EU QUERO HAYLEY... PENSA SE NÃO SOU EU QUEM MAIS VAI FICAR COM VOCÊ, EU NÃO QUERO TE MAGOAR MAIS EU SEI QUE SOU A MELHOR PESSOA PRA VOCÊ... EU SOU A UNICA PESSOA QUE TE CONHECE... –ele passava a mão no meu rosto e foi indo até o meu ombro

- Dave por favor... Não me obriga... Eu não quero... Eu não te quero... Você é como um amigo pra mim... Um irmão... Você não pode me obrigar...

- EU NÃO QUERO SER SÓ SEU IRMÃO!EU NÃO QUERO SER SÓ SEU AMIGO! VOCÊ NÃO ENTENDE? PRA MIM SÓ IRMÃO NÃO DA MAIS, MUITO MENOS SEU AMIGO, ENTENDA ISSO DE UMA VEZ POR TODAS HAYLEY... VOLTAR A SER SÓ SEU IRMÃO, NÃO DA MAIS OK? SE FOR PRA SER ASSIM, EU NÃO QUERO MAIS!

- Mas é assim que eu te vejo Dave... Desculpa, mas eu não cultivo os mesmos sentimentos que você... Eu não te vejo como namorado... Pra falar a verdade eu nem sei como é isso! E agora... Depois disso tudo que aconteceu com os meus pais eu nem sei se quero sentir algo assim... Desculpa se isso te Machuca... Não é e nunca foi a minha intenção te machucar, mas é assim que eu me sinto...

- CALA A BOCA HAYLEY! EU NÃO QUERO OUVIR ISSO... – ele usou toda a sua força pra me jogar no chão depois ele tampou o ouvido – EU NÃO QUERO OUVIR NADA... ISSO É MENTIRA! VOCÊ ME AMA TAMBEM... CALA BOCA HAYLEY, EU NÃO QUERO OUVIR MAIS NADA... PARA, PARA, PARA, PARA... – eu tinha começado a chorar

- Ai Dave... Você está me machucando assim...

- CALA A BOCA HAYLEY! EU JÁ MANDEI! – eu me encolhi no canto da parede assustada, pedindo pra que alguém aparecesse ali pra me ajudar. Ele chegou perto de mim de novo e puxou o meu braço com força me levantando – EU SÓ VOU TE AVISAR UMA COISA, SE VOCÊ NÃO FICAR COMIGO, TUDO BEM, EU VOU TENTAR ENTENDER, MAIS QUE VOCÊ FIQUE AVISADA QUE TAMBEM VOCÊ NÃO VAI FICAR COM MAIS NINGUÉM, PORQUE EU NÃO VOU DEIXA... ENTENDEU BEM HAYLEY? MAIS NINGUÉM... – eu me afastei dele indo em direção á porta

- Eu espero que você fique bem Dave... – ele virou o rosto e não me respondeu, eu só abaixei a cabeça e saí de lá correndo, na verdade eu não sabia pra onde ia, eu só queria ir pra bem longe dali. Acabei trombando em um professor que viu que eu chorava e me levou direto pra secretaria, lá eu liguei pra minha mãe e ela foi me buscar. Eu corri até a minha mãe quando ela chegou e ela me abraçou.

- O que aconteceu meu anjo? – ela passava a mão no meu cabelo – Calma... Calma... A mamãe já está aqui... Shiii... Calma... A Mamãe precisar saber o que aconteceu com o bebê dela... Calminha... Calminha...

- O... O... O Dave... Eu tô com medo dele mãe... Ele não ta bem... Ele queria ficar comigo á força hoje... Eu não quero mais ver ele... Eu não quero estudar aqui mais... Me leva pra outra escola mãe... Por favor...

- Meu anjo... Calma... Eu vou levar você pra casa agora, lá você vai se acalmar, nós vamos conversar direito e vemos o que vamos fazer ok? Mas você tem que se acalmar e me contar tudo direitinho... Pra gente ver o que faz ta bom? Confia na mamãe está bem bebê? – ela me abraçou de novo, eu acenei que sim e peguei minha bolsa. O diretor garantiu para a minha mãe que conversaria com o Dave para saber o que tinha acontecido e tomaria as medidas cabíveis ao caso, segundo o diretor minha mãe não precisava me tirar da escola, apenas me mudar de turno. Mas eu queria sair daquele lugar a todo custo, eu estava com medo de que ele me seguisse ou me esperasse sair da escola. Quando chegamos em casa eu contei tudo o que tinha acontecido pra ela e ela também achou melhor me mudar de escola, depois de 4 dias foi a primeira vez que minha mãe ligou para o meu pai, para lhe explicar o ocorrido. Ficou decidido que eu iria passar o dia seguinte na casa do meu pai enquanto minha mãe ia atrás de uma nova escola pra mim, e comunicava o caso á mãe do Dave e registrar um boletim de ocorrência na policia. Eu achava aquilo desnecessário, mas minha mãe insistia em dizer que eu tinha sido quase violentada e que era melhor comunicar isso ás autoridades antes que voltasse á se repetir.

Franklin, 25.11.2003 20hrs30min

No dia seguinte, minha mãe me acordou cedo, era por volta de 8 da manhã quando meu pai tocou a campainha, eu imaginava o quanto aquilo estava sendo difícil para os dois, meu pai, ver a casa que ele tinha escolhido com tanto carinho pra nossa família agora ser apenas uma casa qualquer e minha mãe ver o cara que ela amou a vida toda ir lá apenas pra buscar a filha. Eu não queria ir, não queria conhecer a tal mulher que tinha destruído a minha família, não queria conhecer a minha “irmã”, mas decidi ir para não contrariar minha mãe.

- Bom dia filha! – meu pai dava um sorriso bem largo, depois ele abriu os braços pra me dar um abraço, eu corri ele até ele e dei um abraço bem forte nele, ele ficou um tempo mexendo no meu cabelo depois se afastou – Então, vamos?

- Vamos... – disso num tom um pouco desanimado. Eu dei um sorriso torto e corri pra dar um abraço na minha mãe e saí com ele, eu estive pensando e imaginando como seria aquele dia, se eu conversaria com meu pai, se seria uma viajem silenciosa, se minha “irmã” seria uma pirralha. E no caminho meu pai tentou conversar comigo, me animar pra conhecer minha mais nova segunda família.

- Então, como você ta? Ta curiosa pra conhecer as meninas lá? Eu sei que é muita coisa nova pra você, mas eu espero que você pelo menos tente conversar com elas... Você vai ver que elas não são más...

- Uhnn... Eu só quero saber que horas eu volto pra casa... – eu disse olhando pra frente – Eu não gosto de ir a lugares que eu não conheço...

- Tudo bem... –ele respirou fundo – eu não vou te prender lá, é só o tempo de a sua mãe ir resolver as coisas ta bom? Eu não quero você lá assim, sem vontade... – Eu respirei fundo e me virei pra ele

- Desculpa pai... Eu não queria ter falado isso com o senhor... É que... Eu ainda não me acostumei com o fato de “outra família”... E eu não quero outra família... Eu sei que o senhor ta fazendo o maior esforço pra que eu goste da... Sua... Nova esposa... - eu disse com cara de nojo – mas eu não consigo gostar de alguém que destruiu a minha família!

- Eu te entendo minha querida... Eu sei o quanto isso é difícil pra você, você ainda está sendo uma garota muito forte indo lá hoje que ta tudo tão novo ainda... Não sei se vale muita coisa mais pode ter certeza que o papai aqui ta muito orgulhoso de você ta? – eu dei um sorriso torto

- Como a meni... Quer dizer... A minha irmã chama? – eu disse tentando parecer entusiasmada- quero saber qual é nome dela pra não ficar boiando lá...

- Uhnn ela se chama Erica... E é bem parecida com você... Eu digo no sentido de ser parecida no modo de pensar e de agir... É bem parecida com você... – ele respirou fundo sabendo que aquilo não tinha me animado, acho que a vontade dele era de sumir dali com aquela situação desagradável.

- Pai... Não precisa preocupar... Eu não vou dar uma crise existencial de ciúmes lá... Eu só vou... Conversar com a minha irmã... E só com ela também... Eu não tô pronta pra ter uma relação sadia com a moça com quem o senhor esta vivendo... Ok? – eu pus a mão no ombro dele

- Tudo bem meu anjo... Pra ser o começo ta ótimo ta? O papai fica muito feliz vendo você se esforçar... Você pode não acreditar e achar que estou mentindo, mas o papai te ama muito, você vai ser sempre a minha menina... Minha princesinha!

- Pai... Todo mundo sabe que a sua princesinha agora é essa pirra... A Erica... – eu disse fechando os olhos pra me corrigir – e eu não ligo pra isso... Agora é a vez dela... Eu já fui mimada e bajulada o bastante...

- Você sabe que não é assim, você sabe que isso não é verdade... Você querendo ou não, gostando ou não gostando, achando ou não achando você SEMPRE, independente de tudo que acontecer você SEMPRE será a minha princesinha e pronto!

- Mas quem precisa disso agora não sou eu... Eu sei que ela é a nova queridinha... Eu não ligo não me importo... Eu só... Preciso me acostumar com fato de ter que dividir meu pai com outras duas mulheres que eu não conheço e não me sinto feliz ou entusiasmada em conhecer... Mas isso eu me acostumo fácil... Eu só peço que o senhor me peça ou exija que eu seja adorável com a sua nova mulher...

- Eu não tô exigindo nem ao menos te pedindo, como eu disse, eu acho tudo ainda muito fresco pra você, mas eu espero que isso UM DIA possa ser “normal” pra você, ou que ao menos você me perdoe pra sairmos desse clima tenso que você sabe que não combina com nós dois...

- Eu não tenho que perdoar nada pai... – eu disse dando um sorriso pra ele – vai ser um dia normal... Um dia com o meu pai...

- Tudo bem... Um dia normal... Um dia normal de pai e filha não é meu anjo? – ele me olho dando um sorriso tentando me animar, eu acenei que sim e voltei a olhar pra frente, o resto do caminho foi em silencio.

Quando chegamos a tal casa uma menina saiu correndo porta a fora e sem quase não esperar meu pai sair do carro já pulou no colo dele.

- Papai! Por que você demorou? – ver aquela menina me fez lembrar de quando eu tinha aquela idade, eu fazia a mesma coisa quando meu pai saia para trabalhar, eu ficava ansiosa pra quando ele chegasse, pra que eu pudesse me aninhar no colo dele. Pouco depois, uma moça de cabelos pretos apareceu na porta e se assustou quando me viu.

- Ah Hey... Você deve ser a Hayley né? – a menina tomou a iniciativa e veio-me cumprimentar, ela foi até mim e esticou o braço – Prazer Hayley, eu me chamo Erica...

- Ah... Oi Erica... – eu disse esticando o braço, ela era muito inteligente pra ter seis ou sete anos, eu olhei pra moça parada na porta e respirei fundo – pai, onde eu posso por essa mochila?

- Se você não se importar, a Erica pode te mostrar onde é o quarto dela aí você pode guardar lá... Mas, se você não quiser pode guardar lá no meu quarto... – ele passou o braço no meu ombro e foi me puxando pra dentro da casa, era bonita como a minha e a da minha mãe, bem aconchegante.

- Uhnn então ta... Você me mostra onde é Erica? – Eu disse tirando a mochila das costas e o tirando o sapato na sala mesmo.

- Mostro sim Hayley, claro... Vem - ela saiu me puxando toda animada me mostrando todos os cômodos da casa até chegar ao quarto dela, que por incrível que pareça se parecia com o meu.

- Uhnn... Onde eu posso por? – Eu disse olhando todo o quarto. Tive a sensação de que havia outra Hayley ali, uma Hayley de seis anos.

- Pode por na cama... Uhnn você é bem educada... Mesmo não gostando de mim você conversa comigo... Sei lá acho que gostei de você...

- Quem disse que... Eu não gosto de você?- eu disse jogando a bolsa em cima da cama

- Eu sei Hayley, não se faça de boba, toda garota no seu lugar não ia gostar de mim mesmo... Minha mãe “destruiu a sua família”... – Eu respirei fundo e me sentei na cama dela

- Uhnn... Erica senta aqui... – Eu disse apontando para a cama ao meu lado

- Uhnn?! –ela me olhou sem entender, mas se sentou do mesmo jeito – O que?

- Eh... Eu posso te dizer uma coisa? É... Eu tive ódio, raiva, nojo quando eu descobri que eu tina uma irmã... Mas não é e nunca foi de você... Por que se alguém aqui tinha alguma culpa esse alguém não era você... Eu tinha raiva por que, eu sempre quis ter uma irmã ou irmão, só que sendo do meu pai de da minha mãe... Eu não esperava esse choque... A imagem que eu tinha da minha família era que ela era perfeita, mesmo com a discursões e brigas dos meus pais aquilo ali pra mim era indestrutível, ai de repente, eu vejo tudo desmanchando... Eu tive raiva, no primeiro momento, e pra falar a verdade eu até tinha um pouquinho ate chegar aqui... - eu disse rindo – mas ai, eu vi o quantos nós duas... Somos parecidas... E sei lá... Parece que a raiva passou... Não que eu seja uma louca e não tenha raiva de tudo que aconteceu com meus pais... Como eu disse ao meu pai, eu não tô preparada pra ter uma relação saudável com a sua mãe... Mas com você... Eu gostei de você- ela deu um sorriso torto

- Você é uma pessoa legal, meu... O papai não economiza elogios quando vai falar de você... E ele ta certo... Desculpa por ter “tirado” o seu pai de você, eu sei o quanto é ruim viver sem um... Mas como você disse, eu não tenho culpa, eu não pedi isso pra minha vida...

- Obrigada, mas você não tem que me pedir desculpas! E... Eu já vivi 14 anos com meu pai... É hora de você ter a sua vez... Eu ainda tenho a minha mãe que, por mais desmiolada que seja ela cuida muito bem de mim... E eu cuido dela... É uma troca legal... – eu disse rindo pro nada

- Sua mãe deve ser uma pessoa legal... O papai já falou um pouco dela pra mim... Mas tipo, falou muito pouco... Ela é bem doidinha né? –ela falou rindo olhando pro nada como se lembrasse de alguma coisa.

- É... Ela é sim... Ela ta um pouco abatida agora, mas se você a conhecesse quando ela estava normal... Ela é o tipo de pessoa que vive sem pensar no amanhã, ama sem pensar se vai se machucar e que não tem um pingo de juízo... Quando a gente morava em Meridian meu pai vivia pedindo pra ela por um pouco de juízo na cabeça, mas acabava depois fazendo a mesma coisa que ela...

- Uhnn... Ele me falou que ela é totalmente sem juízo e que não é nem um pouco responsável... Mas que apesar de tudo é um pessoa maravilhosa... Ele fica com um enorme sorriso no rosto quando fala dela... Acho que ele nunca vai esquecer a sua mãe...

- Uhnn... Um dia quem sabe...? Agora é muito cedo pra dizer se isso vai passar ou não... Só tem quatro dias que meus pais se separaram! – Eu disse tentando dar um sorriso que não deu muito certo.

- Ah... Eh... Desculpa... Eu não queria ter tocado no assunto... Não foi a minha intenção... Desculpe-me... Foi sem querer...

- Não... Tudo bem... Não tem problema não... – Eu disse dando um sorriso amarelo ela riu e chegou perto de mim

- Você é assim sempre? – ela me olhou rindo e mexendo no meu cabelo

- Assim como? – eu disse sem entender

- Sei lá... Tenta agradar todo mundo... É educada com todos... Você é muito gentil...

- Eu não sei... Eu faço sem perceber... E eu não estou falando isso pra tentar agradar você... Eu estou falando a verdade...

- Obrigada... É bom ouvir isso de você... Acho que você não guarda magoas... – ela riu e esticou o braço até mim – Acho que podemos ser grandes amigas... O que você acha? Não que tenha que ser agora e nem que eu esteja te obrigando, mas... Acho que nos damos bem... –eu ri e estiquei o braço pra ela

- É uma boa proposta... Eu vou adorar ser sua amiga... Você tem razão, a gente se dá bem...

- É isso aí... –ela riu e me deu um abraço bem forte, eu me assustei um pouco, não esperava aquilo, mas acabei retribuindo o abraço.

- Uhnn... Agora eu vou descer porque o papai já deve estar pensando que eu te amarrei aqui e estou te torturando - ela soltou uma gargalhada

- Vamos, mas ele sabe que você não faria isso... Mas enfim, vamos lá... A gente aproveita e faze um lanche... Eu tô com fome e você certamente deve ta também, vamos lá... -ela riu, esticou o braço e saiu me puxando junto com ela.

Pensando por um lado Erica era o tipo de irmã que eu sempre quis ter, me entendia perfeitamente e tinha apenas seis ou sete anos! Passar à tarde na companhia dela foi à coisa mais legal que eu tinha feito em toda vida e eu nunca tinha me divertido tanto brincando de boneca. Acho que meu pai ate achou estranho o fato de eu ter ficado a maior parte do dia junto com a minha meia irmã. Por varias vezes a mãe dele foi ate o quarto e ficou olhando o que nós estávamos fazendo. Os meios irmãos dela chegaram da escola no final da tarde, mas eu não tive muito contato com eles. Parece que seus pais também eram divorciados desde antes que Erica nascesse.

Era umas 19h30min quando o meu... Melhor, o nosso pai bateu na porta do quarto da Erica.

- Filha, eh... Sua mãe ligou... Disse que já chegou em casa.. Você já quer ir pra casa?

- Uhnn... Acho que sim... – eu disse me levantando – Eh... Foi ótimo passar o dia aqui com você Erica... Eu prometo que eu volto... – Eu disse rindo e pegando a minha bolsa e jogando ela nas costas

- Ah... Volta sim... Sei lá, vem um dia pra dormir aqui... Ia ser maravilhoso uma “noite do pijama” com você... –ela me olhou dando um sorriso torto, certamente ela não queria que eu fosse embora, depois eu fui até ela e dei um abraço nela.

- Ok... E você vai lá em casa também... Eu tenho certeza que você vai adorar conhecer a minha mãe... – Eu disse rindo enquanto eu abraçava ela, meu pai me olhou assustado, provavelmente com a minha atitude de chamar ela pra ir na minha casa, na casa da minha mãe.

Eu me despedi timidamente da mãe de Erica e sai com meu pai em direção ao carro. Quando entrei no carro acenei mais uma vez para Erica que estava parada na porta da casa. Meu pai arrancou o carro e então eu não á vi mais. Meu pai me olhava com um ar de curiosidade.

- O que foi pai?

- Sério que vocês duas, você e a Erica, deram certo assim, aponto de uma convidar a outra pra ir dormir na casa da outra...? Você gostou dela? Por que é visível que ela te adorou... –ele voltou a olhar pra frete rindo

- Ela é a irmã que eu sempre quis ter e você e a mamãe não me deram... – eu soltei de uma vez - E ela é adorável, e muito inteligente pra uma menina de sete anos! E ela se parece comigo... Não tinha como não gostar dela... Finalmente eu tenho uma irmã que eu pedi!

- É bom saber disso, fico um pouquinho mais aliviado... Mas você... Vai... Falar isso... Com a Cristie? –ele tinha certo tom de preocupação, ele conhecia melhor que ninguém o nível de ciúme da minha mãe.

- Vou... Ela vai sentir um pouco de ciúmes, mas vai entender depois... Eu conheço a minha mãe... Ela vai ter uma crise no inicio, mas depois ela relaxa...

- Eu não quero que vocês duas briguem... Você conhece a sua mãe e sabe o que ela vai aprontar se souber disso... E você quer saber a verdade que? Eu nem acho uma boa ideia a Erica e lá na sua casa...

- Por quê? Minha mãe é ciumenta, mas sabe se comportar quando eu peço... E eu aposto que ela vai adorar conhecer a Erica... Se vamos ter que conviver assim, então é melhor que seja da melhor forma possível! E... Pai...

- Oi meu anjo... –ele abaixou a cabeça um pouco e respirou fundo - Me desculpe... Eu não quis falar por mau... Eu não queria ofender a Cristie... – Eu respirei fundo

- Ok... Tudo bem pai... Eu não vou falar com a mamãe... Não por agora... Mas impedir da Erica ir lá em casa...! Vai me distanciar mais ainda da minha irmã... Por que a mãe dela não gostou de mim!

- Uhnn? Quem te falou isso? Ela te falou ou te fez alguma coisa? Se fez pode me contar ta bom? –ele me olhou um pouco assustado

- Não... Ela não fez nada não... Ela só... Ficou me vigiando... Toda hora ia ver o que eu estava fazendo... Como se eu fosse fazer algo com a Erica á qualquer momento

- Não se preocupe... Ela é assim... É o jeito dela, ela parece que morde, mas é legal, ela só ta... Com medo... Mas aos poucos ela vai se acostumando com você também...

- Medo? Medo de quê? Até parece que eu sou alguma estranha maluca assassina!

- Não é isso filha... Ela tem medo é que quando você sair daquela casa eu venha embora com você... Que eu volte a “abandonar” ela e não volte ver ela nunca mais e esqueça ela e a Erica... Esse é o medo dela... Ela sabe que você não é capaz de fazer nenhum mal...

- Todo mundo sabe que você e a mamãe não têm volta... Ate papel de separação o senhor já arrumou! Quem devia ter medo era a mamãe... Não a sua nova esposa... – Eu disse olhando pra frente, sentindo a raiva tomar conta das minhas palavras – medo que mais alguém abandonasse ela... Medo que eu saía por aquela porta e não volte mais, do mesmo jeito que o senhor fez... –ele não falou nada, só respirou fundo aceitando a culpa, vi que aquilo tinha machucado ele muito, as palavras saíram da minha boca e cortaram o coração dele sem nem um pouco de dó ou ao menos receio do que eu poderia escutar, mas ele preferiu o silencio e como eu já disse uma vez, meu pai era correto de mais pra ao menos retrucar aquilo que eu tinha falado. – você e a mamãe não têm volta mesmo não é? O amor de vocês acabou? Você pediu a separação por que você não quer nem tentar voltar com a mamãe não é? – eu perguntei ainda sem olhar pra ele, eu estava sentindo aquele desespero voltar, ele respirou fundo umas três vezes antes de responder.

- Não... Não temos... Mas não porque eu quero ou não... E sim pela sua mãe... E que se voltasse agora não seria mais a mesma coisa... Haveria desconfiança em todo momento de ambas as partes... E por mais que a gente queira uma relação assim não dá... As brigas vão ser mais que frequentes... Você sabe como já era um inferno não é?

- Você vai se... Casar com a mãe de Erica? – Eu disse em voz baixa olhando pra janela – Você não ama a mamãe mais...

- Eu não disse que não amo a sua mãe mais... Eu vou me casar com a mãe da Erica porque acho certo e não posso ficar na casa dela assim, sem ter nenhuma responsabilidade, praticamente de favor lá... Você me conhece e sabe que eu não aceitaria isso nunca... – eu respirei fundo e não respondi, havíamos chegado à minha casa e quando minha mãe viu o carro ela saiu correndo pra me abraçar, ela quase não olhava para o meu pai.

- Oi meu anjo... Que saudade que a mamãe estava de você... Então, vamos entrar pra casa? Aqui fora ta frio... E adivinha, a mamãe acabou de fazer aquele chocolate quente que eu sei que você adora – ela falou rindo mexendo no meu cabelo.

- Vamos sim mãe... Uhnn... Tchau pai... – eu disse rindo pra ele

- Tchau meu anjo... Mas eu quero o meu abraço e meu beijinho de boa noite do meu anjinho... –ele falou rindo esticando os braços, eu corri ate ele e dei um abraço apertado e um beijo na bochecha dele - boa noite meu anjinho... Durma bem ta? – ele riu mexendo no meu cabelo - como você já sabe, qualquer coisa me liga ta?

- Uhunn... – Ele deu um beijo na minha cabeça e me soltou

- Boa Noite Cristi... – ele disse esticando a mão pra minha mãe

- Boa noite Joey... –minha mãe resmungou sem nem olhar pra ele - Então filhinha vamos entrar? Ta fazendo frio aqui fora... E o chocolate vai esfriar lá dentro... –ela disse me puxando

- Eh... Vamos... – eu acenei uma ultima vez para o meu pai e entrei em casa com ela – Mãe... Por que você não pegou na mão do papai? Ele ficou com a mão estendida! – eu disse jogando a bolsa no sofá

- Eu nem vi... Ele ficou? –ela gritou indo pra cozinha - Mas já fui educada o bastante dando um “boa noite” pra ele...

- Mas custava ser gentil e dar a mão? Poxa, vocês vão conviver assim agora!... Pelo menos que não haja rancor! – ela me olhou assustada e se afastou um pouco.

- Hey filha... O que aconteceu hein? Eu não cometi nenhum crime não... Só não vi o seu pai com a mão esticada... Até onde eu sei isso não é pecado nenhum, eu não vou ser descomungada nem vou ser apedrejada por causa disso... Eu acho né?

- A senhora sabe que eu não estou falando isso! Eu estou falando que a senhora tem que parar de ignorar o papai... Ele vai vir me buscar sempre, ele vai te cumprimentar sempre e a senhora vai ignorar sempre?

- Mas eu o cumprimentei... E você viu tô mentindo? Ele falou “boa noite” e eu retribuir... Vai me dizer agora que eu deveria ter feito mais...

- Ta bom mãe... Você fez tudo certinho... Não vamos discutir mais isso ok?

- Tudo bem... Na verdade eu não quero discutir nada com você meu anjo... Enfim, como foi seu dia lá na casa do seu pai? Como é lá? Como são as duas lá?

- A Erica é um amor de menina, eu adorei passar o dia com ela e convidei ela pra vir aqui qualquer dia desses... E a mãe dela... Ela não foi com a minha cara... E nem eu com a dela. Acredita que ela ficou me vigiando o tempo todo? Como se eu fosse fazer algo com a Erica a qualquer momento!

- Uhnn... Esse é o tipo de mulher que seu querido pai decidiu ir morar junto... Uhnn... Então você gostou da garotinha... Pra mim ela deve ser que nem a mãe... A final, “filha de peixe, peixinho é...” se não é igual à mãe é igual ao pai... – ela falou no maior tom de desdenho, ou nojo sei lá.

- Não mãe... A Erica se parece comigo... Ela se sente culpada pelo o que aconteceu com a nossa família... Mesmo sabendo que não é... Ela não pediu pra nascer, pra ser filha de dois irresponsáveis... Ela é um amor de pessoa... E ela vai vir aqui qualquer dia desses...

- Uhnn... Como quiser... – ela respirou fundo pra não tentar me fazer mudar de ideia, ela não tinha gostado da ideia, mas nem procurou discutir.

- Você pode pelo menos tentar ser gentil com ela? Por mim? – Eu disse olhando suplicante pra ela

- Eu vou filha, vou ser a pessoa mais educada que essa garotinha já conheceu... – ela disse em um tom de ironia e um pouco de sangue frio

- Eu sei que não vai... Tudo bem mãe, ela vai vir aqui, mas a senhora nem vai ver ela ta? Pode deixar que eu cuido dela...

- Ta bom, mas eu não disse que não quero ver ela... Eu não sou grossa a esse ponto... Mas quando ela vai vim?

- Não sei... Eu tenho que pedir o papai pra trazer ela... E eu não tô falando que a senhora é grossa, só tô falando que se é pra ser irônica é melhor evitar...

- Olha, eu vou ser natural com ela, não vou tratar ela nem melhor nem pior que ninguém... Você me conhece e sabe que eu sou assim... – ela disse se esticando no sofá

- OK... Mas eu vou evitar de todo jeito... O papai falou muito bem da senhora pra ela... Eu não quero que ela saia daqui achando que o papai é um mentiroso doido...

- Se... Seu pai falou de mim pra ela? – ela se sentou na hora, na verdade ela quase caiu do sofá de susto, ela também não escondia a sua felicidade por saber disso, era a gloria pra ela.

- Sim, e muito bem por sinal, por que ela elogiou muito a senhora... Ainda disse que sempre que o papai vai falar da senhora pra ela, ele fala com um sorriso nos lábios... Ela disse que a senhora deve ser uma pessoa legal...

- Uhnn... Sério...? – ela me olhou com um olhar meio desconfiado, ou ela realmente desconfiava ou não queria acreditar no que eu tinha acabado de falar – Sei não... Pode ser coisa dessa menina, ou coisa sua mesmo...

- É sério mãe... Se não fosse verdade eu não falaria com a senhora... Agora se a senhora não quer acreditar, eu não posso fazer nada... Pode ter certeza, eu também fiquei surpresa quando ela falou...

- Mas por qual motivo que ele faria isso? Não tem motivos... – ela pensava alto, acho que sem ver ela ria.

- Por que ele ainda gosta da senhora...

- Não filha! Isso não é verdade... Seu pai e eu não temos mais essa possibilidade – ela riu sem graça, realmente ela não queria acreditar naquela possibilidade.

- Por que não tem essa possibilidade? A senhora sabe que o papai foi embora por que ele sabia que a senhora não ia perdoar ele nunca... Não porque ele não amava a senhora!

- Mas se ele me amasse como ele dizia, ele não tinha feito aquilo, nunca! Aí ele me vem com aquela desculpinha barata de que ele “fraquejou” a me poupe né... Por favor...

- O papai errou, mas errar... Todos nós erramos... Não foi por causa disso que ele deixou de te amar... E tem mais, ele disse que não tem volta por causa da senhora... Por que a desconfiança iriam viver sobre vocês dois e isso aqui ia virar um inferno... Eu vi nos olhos do papai mãe... Ele ainda ama a senhora...

- CHEGA HAYLEY! Eu não quero ouvir mais nada! CHEGA! Isso já deu por hoje! –ela levantou furiosa – eu não quero saber disso mais! Ok?

- Ta bom mãe... Eu não vou falar mais nada não... – Eu me levantei e fui com ela pra cozinha pra tomar o tal chocolate quente

- Ok... Deixa que eu busque o chocolate... Melhor, enquanto eu o esquento mais um pouco você toma um banho... Pode ser?

- Pode mãe... – Eu peguei a mochila em cima da cama e subi pro meu quarto, depois que procurei meu moletom eu corri pra debaixo do chuveiro.

Aquela não foi das melhores noites, mas foi legal... Minha mãe não ficou com o mal- humor que ela estava antes e até chegou a perguntar mais sobre a Erica. Parecia que ela estava começando a se interessar pela vida da minha meia irmã, e isso era muito bom.

Naquele dia nós ficamos na sala conversando ate tarde, e quando já não aguentava mais acabei dormindo no sofá mesmo. Quando acordei vi que não estava sozinha, minha mãe tinha acabado dormindo lá também, corri no meu quarto e busquei dois travesseiros e duas cobertas, ajeitei a minha mãe e depois me ajeitei no outro sofá e acabei dormindo de novo.