Você nunca sabe o que te espera.

Point of view: Carlton

Estados Unidos, 3 de julho de 2016.

Por tanto tempo esperei e torci para conseguir recuperar a memória. Lembrar meu nome e quem eu era. E finalmente consegui! Cada dia fui lembrando de algo até conseguir lembrar de tudo sobre a minha antiga vida, ou pelo menos quase tudo, ainda não sei ao certo o quanto eu consegui lembrar. Agora que sei quem sou, resolvi voltar para Seattle e retomar minha vida. Após agradecer Mary Lucy por ter me acolhido durante todo esse tempo, me despedi dela e entrei no barco onde John já me esperava.

Durante toda a viagem de volta para Seattle, só fiquei pensando em como seria reencontrar meus filhos e minha esposa depois de tanto tempo. Reencontrar meus pais, meus amigos, e até meu irmão. Como será que eles estão? Será que sentiram minha falta? E meus filhos? Como devem estar crescidos! Era só o que passava pela minha cabeça.

Depois de algumas intermináveis horas, chegamos em Seattle. Ainda era de dia, final da tarde. Fiquei alguns bons minutos me despedindo de John e o agradecendo por tudo o que fez por mim. Por fim, nos abraçamos, demos Adeus um para o outro e segui até a praia.

Não demorou para que eu reconhecesse aquela casa, a minha casa, quer dizer, a casa em que eu morava. Estava intacta, igualzinha há um ano atrás. Nada foi mudado. Me aproximei meio receoso, não sabia como iriam reagir ao me verem. Será que Grace continuou me procurando? Será que sentiu minha falta? Porque mesmo tendo passado a maior parte desse tempo sem memória, eu senti a falta dela. O meu maior desejo era vê-los novamente.

Respirei fundo tomando coragem e bati na porta, torcendo para que Grace continuasse morando lá. Ao ver a porta se abrir, estranhei por ver o homem que atendeu,. A criança no colo dele parecia ter a idade do Noah hoje, e possuía os mesmos cabelos castanho claro e olhos verdes. Mas será que seria mesmo o meu filho? Pensei. Fazia um ano que não o via e ele ainda era muito pequeno quando desapareci, ficava difícil de reconhecê-lo, sem ao menos saber se a minha família realmente continuava morando ali.

—Pois não? - Ele perguntou.

—Eu sou Carlton Johnson, eu... moro aqui. Quer dizer, morava... - Falava meio confuso e percebi o movimento de sua garganta e a cara de espanto assim que ouviu meu nome.

Aquela criança... eu tinha quase a certeza de que era o meu filho, alguma coisa me dizia isso! Por mais que eu tivesse notado a reação do homem, não conseguia tirar os olhos do menino, tentando achar mais semelhanças com o bebê que eu havia deixado há um ano. Precisava descobrir se era mesmo ele..

—Desculpa... Quem é você? - Perguntei intrigado levantando meu olhar para ele e o vi colocar o menino no chão.

—Ei Noah. O que acha de ir ajudar sua irmã com a pipoca? - Ouvi ele falar.

Então eu não estava enganado! Aquele era mesmo o meu filho! Isso quer dizer que Grace e Rose continuavam morando naquela casa. Mas como meu garotão havia crescido! Ele estava lindo! Não conseguia parar de olhar ele e admirá-lo. Talvez o homem já tivesse percebido isso.

—Ok, papai! - Respondeu.

Eu não tinha noção de tempo até ouvir meu filho chamando aquele homem de pai. Foi aí que percebi quanto tempo fiquei longe. Pior que eu não poderia culpá-lo por ter me esquecido, ele era ainda muito pequeno quando eu sumi. Para todos eu estava morto, pelo menos é o que devem ter achado.

Vi meu filho correr para dentro da casa e em seguida o homem sair fechando a porta.

—Você estava morto. - Ele me olhava, com uma certa desconfiança. Eu suspirei.

—Eu sei... Mas não estou... - Meu tom de voz era baixo.

Como ele sabia quem eu era? Eu nem o conhecia. Como ele podia me conhecer? Pensei.

—Você foi levado pelo mar... Eu resgatei a Rose naquele dia. Ela te viu afundar... Você ficou longe por UM ANO. - Ele parecia ainda não acreditar no que via, mas ao mesmo tempo sua voz possuía um leve tom de repreensão.

—Sim, eu sei. Eu sei que todos achavam que eu estava morto. E era para eu estar. Mas por incrível que pareça, eu sobrevivi. E não pude voltar antes, por mais que eu quisesse ter voltado.- Me justifiquei e eu nem sabia o porquê. Não fazia o menor sentindo eu estar dando explicações para ele. Afinal, onde estava a Grace? Por que não foi ela quem abriu a porta? Me perguntei.

—Onde a Grace está? - Dessa vez resolvi perguntar.

Não queria ser grosseiro, mas também não iria ficar dando explicações para ele. Só queria ver minha esposa e contar á ela que eu não morri.

—Está trabalhando. Ela chega as 23:00. - Ele me encarava.

É claro, o hospital!! Eu havia me esquecido. Será que deveria ir até lá? Não, é melhor não. Raciocinei por um momento.

—Mas espera... Você ainda não disse quem é você e o que faz aqui. Na minha casa e com meus filhos. - Quis saber.

—Sou o namorado da Grace... - Sua expressão era séria e eu engoli em seco ao ouví-lo.

—Namorado? Então quer dizer que ela... - Soltei um suspiro triste e inconformado.

Acho que eu já imaginava que isso pudesse acontecer, só não esperava. A Grace já está em outra. Isso quer dizer que ela me esqueceu? Eu sei que ela precisava seguir em frente, mas não pensava que seria tão rápido. Ou será que não foi?

[Deem play na música]

—Eu sinto muito cara... mas sim, ela seguiu em frente e posso te dizer que está feliz. Todos estamos felizes.- Finalizou a constatação com um leve sorriso no rosto. Eu não sabia se aquele sorriso era pra tirar uma comigo, ou se ele havia sido sincero ao dizer aquilo. Mas de alguma forma aquilo havia acabado comigo, pelo menos naquele momento, eu havia sentido como se meu coração tivesse sido arrancado de mim. Era a notícia de que a minha família não sentia mais minha falta, que eles já haviam me esquecido e que a minha volta já não faria mais a menor diferença.

Me sentei no balanço que havia na varanda - que para minha surpresa, permanecia do mesmo jeito - sem saber o que fazer. Eles estão seguindo sem mim. Me senti decepcionado comigo mesmo por não ter voltado antes. Eu fiquei contente que Grace e as crianças estejam felizes, mas doeu saber que eu não fazia mais parte dessa felicidade. Voltei depois de tanto tempo pensando que reencontraria minha família e que tudo voltaria a ser exatamente como era há 1 ano. Que eu voltaria a ser pai, marido, médico, e teria eles ao meu lado. O que me levou a pensar isso? É claro que não estaria tudo igual. É claro que as coisas não voltariam a ser como eram.

—Se eu não tivesse entrado no mar naquele dia...

Murmurei me culpando por ter abusado tanto naquele dia, mas nem notei que ele já havia entrado em casa.

Permaneci por mais um tempo ali fora desconsolado, sem saber o que fazer. Até que me levantei e resolvi ir até a casa de meus pais, se é que eles ainda moravam no mesmo lugar. Precisava contar pra eles que eu estava vivo.

Peguei um táxi e fui guiando o motorista até onde me lembrava que era a casa deles. Ao chegar, paguei o motorista com um dinheiro que John havia me dado e desci do táxi. Fui até a porta da casa e toquei a campainha. Não demorou nem dois minutos para que eu visse a porta se abrindo. Foi meu pai quem abriu.

—Carlton?? - Vi seus olhos se arregalarem. -Você tinha... - Ele parou antes de completar a frase, talvez tentando raciocinar.

Não disse nada, apenas esperando pelo o que ele iria dizer.

—É você mesmo, meu filho?

Assenti com a cabeça.

—Oh meu Deus, garoto! - Sorri quando me abraçou e rapidamente retribui o abraço apertado.

—Tereza, amor, corre aqui!! - Chamou-a, eufórico, me soltando do abraço.

—Que foi, amor? Pra que esse escândalo to... Ca...Carlton? - Gaguejou ao me ver na porta. -Você está vivo, filho! Ah meu Deus, você está vivo!! - Seu sorriso foi de orelha á orelha e rapidamente me abraçou.

—Estou! - Sorri também e retribui o abraço.

—Como eu senti sua falta, filho! - Minha mãe disse me apertando mais no abraço, senti ela quase me esmagar com aquele aperto e depois me soltar..

—Eu também senti a de vocês! - Sorri.

—Vamos entrar! Seu irmão está lá dentro. - Ela disse enxugando os olhos que estavam cheios de lágrimas. -E eu quero saber tudo o que aconteceu! - Entramos e ela fechou a porta.

Eles chamaram meu irmão e a reação dele não foi diferente ao me ver vivo. Meus pais me disseram o quanto ele também sentiu minha falta e matamos a saudade um do outro. Meus pais e ele me encheram de perguntas e eu contei tudo sobre o acidente e como sobrevivi todo esse tempo. Também contei sobre a Grace e eles disseram que já sabiam e lamentaram eu ter descoberto tudo assim. Eu estava sem onde ficar, pois a casa em que eu morava com a Grace, já estava ocupada. Então perguntei para meus pais se eu poderia ficar morando com eles. Meus pais, é claro, concordaram e disseram que a porta da casa deles sempre estaria aberta para mim e que eu poderia ficar lá o tempo que quisesse.

NO DIA SEGUINTE...

Acordei e fui fazer minha rotina matinal. Enquanto o fazia, fiquei pensativo sobre ontem. Me arrumei, tomei café da manhã junto da minha família, e depois de falar com eles, fui até o hospital. Parei na entrada olhando o mesmo e lembrando de tudo o que vivi ali. Eu queria falar com a Grace e rever todo mundo, mas fiquei sem coragem de entrar, então fui embora, sem falar com ninguém. Fiquei um tempo andando pela cidade e pensando, passado-se algumas horas, voltei para a casa dos meus pais.