9 anos se passaram

O professor entregava as provas e Sanji sentiu sua língua embolar ao deparar-se com sua nota. Sua boca abria e fechava, uma balbuciação que tentava dizer alguma coisa, que tentava exprimir o seu desespero e só conseguia pensar em amassar aquela folha de papel numa bolinha o mais rápido possível. Mas seu amigo Luffy, que sentava-se na carteira atrás da sua, viu sua nota rubricada em vermelho antes que pudesse pôr em prática o que pensou.

— 7?

Sanji virou-se numa velocidade absurda e colocou o dedo indicador junto aos lábios que se comprimiram em um "xiiii". — Não conte ao marimo!

— Ham? Por quê?

— Aquele imbecil fechou esse teste, enquanto eu tirei 7!

Luffy piscou os olhos, coçou a cabeça por baixo do chapéu de palha que usava. — O que tem 7? É uma nota boa, não?

— Pra você sim!

Nesses momentos que não se sentia bem, Sanji costumava ser mais ignorante que o normal, mas Luffy não se importou — diferente de Zoro, que sempre retrucava e virava uma guerra de egos —, ele conhecia seu amigo e era normal que soasse como um cuzão de vez em quando. Luffy apenas jogou o corpo pra trás, recostando-se no encosto da cadeira até o professor chegar perto e lhe entregar a prova. — Ora, eu também tirei 7.

Sanji revirou os olhos, havia tirado a mesma nota que a do asno da sala de aula. Escondeu o rosto na carteira com os braços ao redor e amaldiçoou a sorte de Zoro. Se a prova não fosse toda objetiva, tinha certeza de que ele tiraria um zero. Mas isso era pensamento de perdedor querendo se acomodar com coisas muito simples, como uma disputa besta com o melhor amigo. Sanji devia pensar maior, pensar que suas notas estavam caindo e que provavelmente não conseguiria ingressar uma universidade no ano que vem.

Seu sonho de ser um chef de um restaurante famoso ia por água abaixo.

— Então, você tirou 7? — Zoro ficou sabendo com Luffy na hora do intervalo, porque Zoro fazia parte de outra turma.

Os dois desciam a ladeira em frente a escola com os demais alunos, naquele momento o céu estava alaranjado por conta do sol se pondo.

Sanji se esforçou para não pular em cima de Zoro com um sorriso presunçoso. — Olha aqui, você só conseguiu tirar 10 porque foi tudo de marcar X e não sei como não consegue vencer na loteria.

— Não tenho sorte com dinheiro.

— Já percebi, não consegui pagar toda a dívida com a Nami-san.

Zoro parou os passos, pasmo. E Por falar demais, Sanji parou também. — Você pagou minha dívida com aquela bruxa?

Sanji soltou um suspiro. — Eu só paguei uma parte...

— Por que fez isso? — Zoro estava irado.

— Marimo, eu só quis ajudar, tá legal? Afinal, somos amigos, né? — Sanji tentava mirar em seus olhos castanhos, mas Zoro os desviava porque se sentia desnorteado. Tanto faz, resolveu andar mais rápido e deixar o sobrancelhas pra trás. — Marimo! Me espera! — Parou Zoro pegando em seu braço.

— Não se mete onde não deve! — Esbravejou muito irritado, às vezes odiava aquele altruísmo exagerado do amigo. — Você não deve nada a mim! Para com essas coisas!!

Sanji piscou os olhos muito perplexo, depois afrouxou a mão no braço de Zoro. — O que você está querendo dizer?

— Isso mesmo que está pensando!

Zoro voltou a caminhar em direção a sua casa e Sanji, sem nada melhor para fazer, resolveu o acompanhar. No entanto, na mente de Sanji residia a dúvida se o marimo sabia o que tanto pensou durante aqueles 9 anos de amizade: que Zoro abriu mão de sua vida para protegê-lo e que por conta disso achava que estava em dívida com o marimo.

Quando chegaram no final da ladeira, Zoro encontrou um espírito maligno olhando Sanji. Ele estava alguns metros de distância, aguardando o momento ideal para atacar. Parecia exatamente como uma nuvem negra, mas o único olho que tinha era enorme e por isso bem visível. Zoro se perguntou onde haveria a boca, caso ele quisesse devorar seu amigo.

Sanji parou os passos para mexer na mochila, mas ficou confuso com a aproximação repentina de Zoro.

Ele tocou o seu braço. — Vamos, sobrancelhas.

Seu semblante ficou mais sério que o normal e uma aura intimidadora passou a exalar de Zoro. Sanji entendeu o que ele estava querendo dizer, havia um espírito por perto e largou a mochila para que pudessem se apressar.

Chegaram na casa de Zoro, uma casa tradicional japonesa, tendo um jardim arborizado com árvores e flores, um lago de carpas com uma ponte de madeira sobre ele, um dojô compartilhava o mesmo terreno; o pai de Zoro, além de sacerdote, era professor de kendô e seu filho era o seu melhor aluno.

Eles comeram algo e foram até o quarto em que dormiam juntos. Por conta dos espíritos ruins, Sanji e Zeff precisaram se mudar para lá, sendo que Sanji ainda precisou ficar no mesmo quarto de Zoro, porque muitos espíritos se aproveitavam de seu sono e o atacavam.

— Marimo... você não tem curiosidade de saber como seria sua vida se eu nunca tivesse te conhecido? — Sanji estava sentado no tatame, próximo a janela, observando os pássaros voltando para os seus ninhos por se aproximar da noite. Na sua cabeça vinha o flashback da discussão na ladeira.

Zoro estava deitado na sua cama e revirou os olhos ao ouvir isso. — Minha vida seria a mesma, eu estaria morando com o meu pai e meu futuro seria o mesmo, eu me responsabilizaria com o templo e o dojô.

— Não tem vontade de viajar?

— Por que tá me perguntando essas coisas?

Sanji não respondeu, mas continuou a pensar que não viviam da maneira certa. Era desagradável pensar que só poderia realizar seu sonho se tivesse o marimo ao lado sem nem ao menos saber o que Zoro queria realmente fazer.

Zoro soltou um suspiro ao notar o seu cenho preocupado e se levantou da cama, indo em direção a sua parte do armário. Ficou um tempo lá procurando algo, despertando a atenção de Sanji.

— Olha isso. — Aproximou-se de Sanji, sentando no tatame com um colar em mãos.

— Um rosário?

— Sim, eu percebi que você tem grandes planos pra sua vida, como ter uma família e um restaurante na França. — Sanji abriu os olhos, assustado. Ele evitava falar do assunto com o marimo e imaginou que Luffy devia ter contado algo. — Cada esfera tem minha aura, faço mantras e orações em cada uma.

— Marimo, você está querendo me diz...

— Sim, se você carregar isso consigo, você não vai mais precisar de mim. — Zoro pegou uma mão de Sanji e a fechou com o rosário na palma. — Eu ia te dar no seu aniversário, mas você tem se deprimido muito e agora você não precisa mais pensar que está em dívida comigo.

Sanji fungou o nariz, estava chorando com o quão gentil Zoro era. — Na verdade... eu imaginava uma família com você...

— O quê?

— Bem... Zoro... o que sente por mim?

Zoro se enrubesceu, Sanji estava mesmo falando sobre aquilo que martelava na sua cabeça e sobretudo no seu coração. — Co-como assim?

— Eu percebi que não é normal dois garotos se tocarem tanto quanto nós dois... — Sanji mexia no seu cabelo, um sinal que Zoro sabia que significava desconforto. — Eu acho que é por isso que nos colocaram em turmas diferentes, não tem?

— Que? Não estou entendendo nada do que está dizendo.

— Eu quero dizer... que você faz parte dos meus sonhos... — Murmurou.

— Oi?!

— Você faz parte dos meus sonhos, porra!!

— Ham? Você não quer me ver longe de ti?

— Eu pensei mesmo que estava em dívida com você, porque você não se envolvia com ninguém por minha causa... você teve que abrir mão de muita coisa e nem pôde contestar...

— Bem, isso é verdade. — Disse Zoro, fazendo Sanji se espantar por ouvir de sua boca que estragara mesmo sua vida, mas completou: — Só que eu não me envolvia com ninguém, porque queria me envolver com você.

— Q-queria? — Sanji não parava de gaguejar ainda que quisesse fazer uma piada. — N-ão quer ma-mais?

Zoro riu com o seu jeito acanhado, tentando ser atrevido, e pensou que tinha mesmo muita sorte. — Quero sim.

Respondeu, encurtando a distância entre eles até tomar os lábios róseos de Sanji. O beijo casto conseguiu ficar libidinoso, mesmo nenhum dos dois terem beijado alguém antes, mas seguiam a excitação e seus corpos colidiram. O rosário se encontrava na mão de Sanji e ele seria ainda útil, porque ficaria com ele quando Zoro tivesse que se afastar um pouco.

Mas não pra sempre.