Uma moto passava em alta velocidade por uma autoestrada da Flórida, seu condutor parecia estar com muita pressa para chegar ao destino, pois estava quase acima do limite de velocidade. O motorista entrou então em uma estrada vazia, seu desejo real era espairecer sobre os acontecimentos que ainda fervilhavam em sua cabeça e provavelmente o deixarão sem dormir por algum tempo. A velocidade ajudava a relaxar com um pouco de adrenalina, acelerou mais ainda.

O viajante acabou de voltar de uma cidade no interior do Alabama que agora não mais existia, foi consumida pelo fogo como medida para apagar o que ocorrerá mais cedo. Pra todos os efeitos, para a mídia, a destruição foi causada por um foco de incêndio em uma vegetação próxima... Mas a verdade é que tudo foi o desfecho do conflito entre duas famílias de magos que disputavam o território, mais precisamente o “direito” de continuar a escravizar a população local usando sugestões hipnóticas maciças, com o objetivo de extrair carvão das minas locais.

Quando ele chegou ao local era tarde demais, foi capaz de neutralizar a fonte da sugestão, mas o processo estava tão ridiculamente avançado por ter sido praticado anos a fim, que ao ser removido o controle, a população caiu quase que inteiramente morta ou praticamente acéfala. Foram enviados equipes de Magus Killer pela Associação Americana ao local graças a uma “denúncia anônima”, mas só encontraram o trabalho concluído e as duas famílias imobilizadas, só precisaram lidar com as evidencias; O piloto agora entrava numa estrava mais rudimentar que subia um morro.

Seu corpo ainda possuía diversos ferimentos do combate, pois apesar de serem famílias pequenas e com pouco domínio mágico efetivo em combate, foram capazes de covardemente usar a população local como escudo humano, enquanto utilizavam artifícios de fogo e laminares. Na tentativa de não ferir ninguém, foi pagado o preço de se machucar mais do que o necessário, mas tudo em vão no fim; Cada vez que pensava nos rostos vidrados, e posteriormente sem vida, a raiva crescia e com ela seus músculos enrijeciam. Era ruim pois as algumas queimaduras ardiam, mas em especial um desconforto crescente na mão direita.

Finalmente o motociclista chega ao cume de um morro em um mirante um pouco rudimentar, onde pode observar o céu estrelado em busca de um pequeno momento de paz. Ele retira o capacete para poder apreciar mais a vista.

Allan Deborah agora era um homem praticamente feito, com uma estatura mediana e muito mais forte devido ao seu “condicionamento físico” constante. Desde que sua mãe morreu ele passou a ser criado pelo pai e com uma pequena ajuda de seu tio-avô Clauss, mas não se pode dizer que eles passaram maus momentos juntos, muito pelo contrário, o jovem teve o resto da infância e adolescência muito bons ao lado de seu pai. Ele chegou a ir para a Universidade da Flórida para cursar Zoologia, mas trancou há cerca de alguns meses.

Seu pai fez o máximo que pode para cumprir o papel duplo de pai e mãe ao mesmo tempo de Allan, mas nunca mais foi o mesmo homem, também nunca teve interesse em se casar novamente. Eles se mudaram da mansão do lago para um apartamento na cidade, devido as lembranças de Eva que cada cômodo da antiga moradia carregava, seu pai vendeu a propriedade para o governo e posteriormente soube que virou uma área militar. John não admitia, mas de certo modo se culpava por ser impotente em salvar a esposa. Reflexos disso vieram na tentativa dele em impedir que o filho se tornasse um mago, apenas para tentar protegê-lo, mas sofreu oposição do velho padre e do próprio Allan, que desejava conduzir o legado da mãe da melhor forma possível. Após intensas discussões acabou cedendo, mais sob a argumentação do jovem de que o perigo não desapareceria sob o véu da ignorância, de qualquer forma precisaria estar preparado. Neste momento o pai estava no Afeganistão, possivelmente cuidando de assuntos relacionados a retirada de tropas americanas do país.

Agora o rapaz morava sozinho num apartamento em uma cidade do interior da Flórida, ele tentou Jacksonville enquanto esteve na universidade, mas definitivamente não gostava de cidades grandes. O pai insistentemente depositava dinheiro na conta do filho para despesas, mas ele raramente tocava no dinheiro, preferia fazer pequenos trabalhos temporários pela cidade. Mais para que ele tivesse tempo para se dedicar a suas atividades no mundo mágico, sem que houvesse um compromisso fixo no mundo normal.

Essas atividades envolviam investigar possíveis anomalias pelo país e sempre que possível solucioná-las, mas até agora foram poucos êxitos e muitas falhas, pois ele percebeu que muitas tramas eram tão complexas que levariam anos para se quer cogitar enfrentá-las. Mas suas atividades e habilidades chamaram certa atenção, ao ponto dele receber convites para entrar para grupos freelancer, todos recusados veemente. O último fracasso agora estava nítido em sua memória e ainda por cima desenterrou várias outros de sua memória.

Seus cabelos castanho claro estavam um pouco molhados devido ao calor que estava fazendo, mas o que mais incomodava era o aperto no seu peito que não passava. Estava sob a perspectiva de nunca solucionar esses conflitos, mas ao contrário dos convencionais do mundo normal, este ficava a cargo do conhecimento de poucos, mas que podia afetar a todos.

Não poderia sonhar controlar todas essas situações, principalmente porque elas estavam ficando cada vez mais ousadas, mesmo com o desenvolvimento da tecnologia e da comunicação instantânea. As associações tinham problemas cada vez maiores com Apóstolos Mortos e com famílias como a última que enfrentou, que buscavam enriquecer no mundo real usando a magia.

Pode resumir tudo em um só pensamento:

“Até quando?”

A costa de sua mão direita ardeu como se um ferro em brasa estivesse sobre ela. Ele retirou a luva sem dedo para checar o que estava acontecendo e viu um símbolo vermelho estranho similar a uma seta, cujo triângulo era grande e possuía um risco em cada um dos vértices opostos ao da direção principal do vetor. Poderia ser alguma maldição que teriam posto nele e estava se manifestando, mas logo lhe veio a mente o que poderia ser de verdade. O pânico cresceu em seu peito.

— Você não pode ser real... — murmurou em negação.

“Como isso poderia ter acontecido? Essa droga não tinha sido eliminada a pouco tempo pela Associação dos Magos?”, pensou com as mãos atrás da cabeça enquanto andava em círculos pelo nervosismo.

“Mais uma mentira, isso não vai ter fim nunca!” e chutou a grade do mirante para descontar a raiva.

— AÍ! — segurou o pé, a grade era mais dura do que pensava — desse jeito eu vou voltar de UTI pra casa...

Ele sentou em um banco de pedra próximo pra massagear o dedão do pé, precisava se acalmar e pensar no que faria em seguida. Era óbvio que não conseguiram acabar com a Guerra do Santo Graal e que ironicamente ele havia sido escolhido para participar da próxima.

“Tenho duas escolhas: Ou fujo e quem sabe, na melhor das hipóteses, não possam realizar o ritual daquele objeto maldito, ou participo e garanto que isto nunca mais vá acontecer novamente”.

A resposta parecia clara, mas ele precisava aceitar entrar num jogo perigoso e abraçar todas as possíveis consequências que não paravam de ser contabilizadas em sua cabeça, inclusive de causar um desastre da magnitude que acarretou a morte de sua mãe. O próprio também tinha chances gigantescas de morrer, pensava em seu pai perdendo o único filho depois da traumática perda da esposa. Ele não se perdoaria jamais por fazer o pai chorar de novo.

Por outro lado era uma chance única de vingar a morte da mãe e dar um basta em todo este capricho. Não havia mais o que questionar. Ele tocou o pingente de sua mãe que agora se encontrava cheio da água do lago da antiga morada, apesar de não guardar mais nenhum líquido mágico poderoso, continha a lembrança de um local em que ele viveu feliz com a mãe e o pai.

Pegou a moto e se dirigiu até seu apartamento, primeiro precisava descansar antes de procurar a Igreja, o órgão que ele sabia que poderia ajudá-lo por sempre mediar os conflitos. Mas ele só confiava em um padre e era para lá, sua cidade natal, que ele voltaria para se informar. Chegando em casa ele deixa as coisas, apesar de estar com a cabeça cheia, seu corpo pedia para descansar. Porém ele precisava primeiro “avisar suas companheiras” de mais uma viagem, que elas desta vez participariam.

Ele foi até os fundos do jardim do condomínio, oculto do caminho regular dos moradores e funcionários, havia uma pequena colmeia na árvore. Estavam ali seus familiares que ele alojou sob a proteção da vegetação fechada, afinal não havia espaço dentro do apartamento. Era esse um dos motivos dele não gostar da cidade grande, pela dificuldade em manter as abelhas próximas.

— Sentiram saudades? Eu sei que sim, mas precisamos fazer uma viajem — disse se aproximando — nós estamos indo para casa! Estejam prontas que mais tarde antes do sol nascer eu venho pegar vocês — as vezes ele achava que era maluco por conversar com os insetos.

Já haviam passado várias gerações das abelhas, mas ele continuava sem muito controle sobre elas, só conseguia ordenar que elas ficassem quietas ou que se recolhessem em algum recipiente, como também não passassem de determinado espaço para não encontrar pessoas, mas não conseguia que elas atacassem por exemplo ou realizassem determinadas “manobras especiais” (como a Fortaleza da Pupa Real). Era frustrante pois sua mãe parecia transmitir ordens só de imaginar numa noite que as abelhas fizessem algo, como produzir mais mel ou cera por exemplo e no dia seguinte estava tudo conforme ela desejava. Porém houve progressos, como ele poder transitar no meio delas sem levar uma ferroada ou causar alvoroço, assim como ele usufruiu de muitas propriedades especiais dos produtos que só as abelhas de sua família produziam.

Seu pai quis por diversas vezes se livrar delas, foi engraçado quando eles se mudaram pela primeira vez e o garoto instalou as abelhas na varanda de casa. Por muito pouco John não chama os bombeiros, quando o menino firmou um acordo com ele para manter os insetos no jardim da igreja de Clauss.

Ele colocou um dedo dentro do ninho e pegou um pouco de mel, em seguida retirou o tênis e a meia, passando o líquido no dedo inchado. Ele ativou levemente seus circuitos e um pequeno brilho amarelo irradiou pelo dedo, desinchando-o e restaurando o antigo aspecto. Pelo menos uma dor a menos pra lidar.

Igreja de Clauss, uma semana para a Guerra.

As nove em ponto Allan chegou a sua cidade natal, ele nem passou no antigo apartamento para deixar a mochila e se dirigiu direto para a igreja do tio-avô. Chegando ao portal ele notou que não mudou muita coisa, só parecia um pouco mais límpido o aspecto graças a um trabalho de restauração no ano passado, como a cidade não possuía um grande trânsito ou indústrias o efeito persistiu.

O interior por outro lado parecia mais claro que o habitual, assim como estava mais fresco. Fizeram um bom trabalho de climatização com circuladores, porém não conseguiram aparelhos de ar-condicionado. Ao fundo estava o padre ainda vestido de branco por causa da missa das oito, arrumando alguma coisa no altar, ele já usava uma bengala devido à idade que infelizmente avançava, já com alguns sinais de Parkinson que ele controlava com sua “medicina”.

— Não vai deixar isso cair não é? — O velho pulou com o susto e quase deixou a âmbula cair.

— Que susto! — Se virando — Você não tem vergonha de assustar um velho?? E se eu sofro um infarto e caio duro aqui mesmo!?

— Você ainda tem muito gás pra queimar velho Clauss — disse Allan sorrindo, o velho abriu os braços pra receber o jovem que ele não via pelo menos a dois anos, só por telefone.

— Você mudou muito meu filho! Da última vez você não tinha esse visual de motociclista — se referindo a jaqueta preta e as luvas.

— É que eu descobri que gosto de motos, faz mais o meu estilo de velocidade do que um carro — estufando o peito e fazendo uma pose orgulhosa.

— Ótimo, um aventureiro hehe, como vai a universidade? Muitas namoradinhas? — Não podia faltar.

— Não, eu tranquei o curso.

— Mas então o que você anda fazendo da vida?

— Estou só fazendo pequenos trabalhos por aí... — Desviou o olhar e coçou a cabeça.

— Não me diga que anda se metendo de novo onde não é chamado? — Desde os dezoito o jovem costumava fazer suas pequenas viagens, mas eram poucas em relação a agora e eram confessadas apenas ao velho Clauss — Eu já disse que isso é perigoso Allan, quando o seu pai souber ele vai ficar uma fera!

— Ele não vai saber porque você não vai contar, afinal foi segredo de confissão e você não pode quebrar seus votos de qualquer forma. Em todo caso não foi isso que me trouxe aqui.

O velho parecia um pouco estarrecido — pois então diga, você me deixou preocupado quando me ligou tão tarde, achei que alguma coisa grave tinha acontecido.

— E aconteceu — Allan retirou a luva direita e mostrou a marca para o padre.

— Mas o que é... — depois de alguns segundos ele reconheceu e seu rosto transpareceu o espanto — não pode ser! Fontes seguras me garantiram que a disputa pelo Santo Graal terminou em Fuyuki pelas mãos de agentes da Torre do Relógio!

— Pois é, pelo visto isso não é verdade, vim aqui porque você é o único membro da Igreja em quem confio pra pedir informações deste tipo.

— Eu não sei como te ajudar, não sei nada a este respeito, vou precisar me comunicar com meus superiores pra te dar uma posição sobre isso, espere um pouco aqui que eu já volto — se dirigindo até os fundos, provavelmente usaria algum equipamento mágico para se comunicar com a Igreja.

— Ei, tio! — Recordou-se que as abelhas deviam estar desconfortáveis no aperto da bolsa — Posso colocar minhas “amiguinhas” no lugar de sempre?

— Não acredito que as trouxe para cá! — Parando na porta e colocando as mãos na cintura.

— Fazer o quê? Não posso abandoná-las, elas são da família — o velho ergueu as mãos pro céu com este trocadilho infame e continuou seu caminho.

Allan após acomodar os insetos na mesma velha árvore, que continha uma grande fenda onde estavam outrora instalados. Ele voltou a igreja e sentou no banco, aguardando o velho senhor voltar, ele estava de certo modo ansioso, não tinha nem ideia de como providenciaria um catalisador decente para um servo. Era do seu conhecimento muito sobre a Guerra pelo Cálice, grande parte graças a sua mãe que fez uma investigação minuciosa sobre o “evento” e suas razões, era um ritual simples, mas que conduzia a algo complexo e muito perigoso: um milagre. Mas assim como sua mãe ele tinha a opinião de que era tudo falso, o único legado deixado até agora foi apenas a destruição, possivelmente causado por quem o buscava. Quando ele menos espera o padre retorna o retirando de seus pensamentos.

— Receio que não tenho boas notícias — disse o velho.

— E o que seria?

— Eles não quiseram me informar qual o local.

— Mas não é o mesmo de sempre, Fuyuki?

— Não, realmente era verdade que as Guerras de Fuyuki acabaram, mas conseguiram construir outro Cálice.

— Como assim?? Agora qualquer um que resolver vai fazer uma Guerra? — Disse elevando a voz.

— Não, pelo visto há apenas um igual a anterior — o padre fez um sinal para ele não se exaltar, afinal eles estavam em um lugar sagrado.

— Tá e como eles pretendem que eu participe? Escolhendo um ponto aleatório no mapa-múndi e torça pra que seja o certo? — Ironizou.

— Não é isso, eles não quiseram revelar por instrumento o local onde seria o por medida de segurança, mas destacaram um agente capacitado, que estava coincidentemente vindo para cá, para te orientar corretamente. Ele chegará aqui dentro de quatro horas.

Allan bufou, não esperava tratar com estranhos um assunto tão delicado, mas resolveu aceitar.

Clauss continuou — Porque não vai pra casa e descansa um pouco? Você parece estar muito cansado — e estava mesmo com algumas olheiras.

— Já que não tem outra saída, vou pra casa aguardar este “agente” — gesticulou com os dedos e deu um até logo para o velho, se dirigindo para casa com a moto.

Ao abrir a velha casa era como se ele voltasse um pouco no tempo, estava impecavelmente arrumada e limpa, provavelmente alguém devia vir limpar frequentemente enquanto John estivesse fora, mas os toques eram claramente obra do pai que gostava de tudo muito bem organizado, fruto de sua disciplina militar como ele dizia, seu filho sempre disse ser TOC. Desde os livros organizados em ondem de séries e cronologicamente, ou simplesmente alfabética para os soltos.

Olhando pela janela do seu quarto, Allan se lembrava de quantas vezes a pulou quando estava de castigo, auxiliado pelo encantamento das Falsas Asas que sua mãe lhe ensinou muito bem, para vencer a barreira do quinto andar que era considerado alto pros padrões da cidade. Tudo pra ir brincar na praça ou ir se encontrar com a Olivia, que ele teve um pequeno romance juvenil. Seu pai cogitou até instalar grades com medo do filho se expor de alguma forma, mas a maturidade veio primeiro antes de chegar a esse ponto.

O cansaço se abateu sobre seus ombros, afinal ele não dormiu nada na noite anterior com a ansiedade. Duas viagens seguidas era demais até pra ele que era acostumado a vida na estrada, então após comer um prato que ele trouxe de uma padaria local, ele tirou a roupa ficando só de cueca e se jogou na cama, caindo em sono profundo.

Quatro horas e meia mais tarde

Um barulho de alguém insistentemente tocando a campainha foi ouvido, Allan virou para o lado.

“Não tem ninguém em casa”, mas seus olhos abriram um pouco focalizaram o relógio marcando 14:30 e ele levantou em um salto.

— Merda, atrasei! — Vestindo a roupa e o tênis.

Precisava dispensar a visita o mais rápido possível e torcer pro enviado estar atrasado também, ele pegou o celular e tinha várias ligações perdidas do tio-avô, aumentando o desespero. Quando ele abriu a porta deu de cara com uma moça morena muito bonita de olhos verdes.

— O-Olivia? O que faz aqui?? — Perguntou pasmo.

— Celular agora é enfeite rapaz? Onde está sua responsabilidade? — Ouviu-se uma voz irritada atrás da moça, era do velho padre.

— Desculpa tio, é que eu acabei dormindo mais do que devia, onde está o enviado?

— Foi embora, cansou de esperar — respondeu Clauss bravo — e agora o que você vai fazer?

— Ir atrás dele é claro! Pra onde ele foi? — Pegando as chaves e o capacete.

— Pra estrada principal em direção a interestadual.

— Então eu vou indo, foi mal Olivia, vamos ter que conversar outra hora — abrindo a porta.

Ouviu então a risada da garota, logo em seguida do velho, os dois estavam quase se acabando e então ele se deteve.

— O que é tão engraçado? — Agora quem estava irritado era ele por rirem de sua desgraça.

— Allan, eu sou “o enviado” da Igreja, estou aqui para te orientar sobre a Nova Guerra do Santo Graal.

O rapaz olhou espantado para a moça e fechou a porta e deixando o capacete no lugar.

— Como assim você é o enviado? Olha se isso for alguma brincadeira, saiba que está me fazendo perder um tempo precioso.

— Não, não estou, agora se acalma que eu vou pegar um copo de água na cozinha. Quer também vovô? — Se virou para o padre, que negou, ela então se dirigiu até a cozinha.

Não podia acreditar no que acabara de ouvir: Olivia entrou para a Igreja e ela que iria orientá-lo? Ambos se sentaram no sofá antes que ela voltasse e Allan começou a bombardear o tio.

— Que história é essa da Olivia ter entrado pra Igreja?

— Bem, quando ela tinha dezesseis anos resolveu largar a vida mundana e entrar para um convento, logo depois reconheceram suas habilidades mágicas e ela foi designada para outro setor que eu desconheço, pois não quis me falar qual era.

— E também não vou dizer — a garota adentrou a sala — afinal eu vim aqui falar de você e não de mim.

— Mas eu tenho direito de saber afinal... Considero você uma amiga e me preocupo!

— Agradesço sua preocupação, mas dispenso. Façamos o seguinte então: Eu não perguntarei sobre você ter largado a faculdade e suas “aventuras” bancando o herói por aí, em troca você não vai questionar minhas vocações religiosas, fechado? — disse sorrindo para o jovem.

Allan olhou com ódio para o tio que desviou o olhar fingindo interesse numa foto na mesinha de cabeceira, “Votos sagrados, hã?”. Acabou por balançar a cabeça concordando.

— Bom, vamos ao que interessa, o tempo é curto, quanto você sabe? — Disse a moça.

Olivia explicou cada detalhe importante, como por exemplo, onde seria a nova localização da guerra, quais as famílias envolvidas e demais conjunturas. Inclusive sobre o prazo ridículo de seis dias para estar dentro dos limites da cidade.

— Como assim?? Só esse tempo pra me preparar?

— Sinto muito, mas ao que parece você foi o último a receber os Selo.

— Ótimo! E como eu vou arrumar um catalisador em tão pouco tempo?

— Você vai ter que dar um jeito, só adianto que os outros competidores já devem estar esgotando as vagas de servos — fez uma pausa e cerrou os olhos — Entretanto Allan, por que quer tanto tomar parte disso? Por que você não espera o prazo terminar e deixar que os Selo passem para outro pretendente? Sempre achei que odiasse a Guerra pelo Cálice.

— Porque eu não posso me omitir Olivia, isso pode acabar em mãos erradas — respondeu com firmeza o rapaz.

— Você sabe que isso não vai trazer sua mãe de volta, ou será que é isso que pretende? — Mirando-o com preocupação, seguida do tio que ouvia tudo em silêncio.

— Não sou iludido Olivia, sei mais do que ninguém que essa coisa não traz milagre algum, só destruição... Mas é a chance de fazer isso parar de uma vez por todas — disse se erguendo e se dirigindo até a porta.

— Onde vai? — Perguntou a moça.

— Atrás de um catalisador, nem que seja roubando um museu ou coleção particular qualquer.

— Receio que possa ajudar — disse o velho padre se erguendo com dificuldade, apalpando o bolso — a Olivia deve ser neutra, mas isso não se aplica a mim, um velho padre de uma esquecida Igreja do interior.

Clauss entregou um bilhete para Allan, que continha um nome, um endereço e uma frase em italiano.

— Liguei antes de vir para cá para um “amigo” dos tempos perdidos — referia-se ao período antes de ter filhos e logo depois entrar para a igreja — ele concordou em te esperar daqui dois dias para negociar uma relíquia. Mas te adianto que não vai ser nada barato com toda certeza.

— Obrigado tio, você sempre me apoiando! — Abraçando o velho — pode deixar que do dinheiro eu cuido.

— Você deve dizer a frase do bilhete, é a senha — disse o velho para ele.

Mais uma vez o jovem reuniu suas coisas.

— Tenho uma pergunta pra cada um dos dois, primeiro pra você tio: Cuida das abelhas enquanto eu não volto?

— Sim, afinal elas são da família, não? — Respondeu com ironia.

— Segundo, Olivia, responda com sinceridade... Você é a juíza desta guerra? — Ela o fitou por alguns instantes.

— Não Allan, eu não sou — respondeu a moça.

Allan saiu junto com os dois da casa, Olivia iria embora no mesmo dia pois tinha outros afazeres, disse que o objetivo original era rever o avô quando entraram em contato com ela. A jovem fitou o rapaz subindo na garupa da moto para a cidade vizinha, onde havia um aeroporto, seria mais uma longa viagem do rapaz até seu futuro fornecedor.

“Pobre Allan, eu não queria que você estivesse envolvido nisso, mas eu vou te proteger!”

Storrs, Condado de Tolland em Connecticcut, 4 dias e 11h para o prazo final

Allan chegou até o endereço que Clauss forneceu, era muito próximo da Universidade de Connecticcut. Era uma pequena casa de madeira perto do vilarejo, quando tocou a campainha foi atendido por um senhor de idade, possivelmente era da velha guarda perdida dos amigos do tio-avô. O homem abriu a porta vagarosamente, como se estivesse desconfiado e só o deixou entrar após ele dizer “Ragazza Ladra”, que era a frase do bilhete. Olhou mais um pouco pra fora quando o rapaz entrou e fechou a porta, em seguida fez uma rápida revista nele, a procura de algo escondido.

— Algum problema? — Perguntou o rapaz ao senhor.

— Estou só checando se não há nada de errado, sabe... Desviar itens do departamento de arqueologia não é nada fácil ou seguro — respondeu o senhor, indo até um armário no final da sala.

Ele moveu o fundo que era falso e retirou três embrulhos.

— Pois bem, vamos aos negócios — disse o homem abrindo os pacotes.

— O que você tem pra mim?

— Antes, eu só aceito dinheiro ou depósito na minha conta.

— Vou pagar por depósito, mas quero ver o que você tem pra me oferecer primeiro.

O homem desembrulhou cada um dos três pacotes. O primeiro era uma rédea, o segundo um chumaço de lã dourada e o terceiro era um pedaço de coral.

— O primeiro é a provável rédea dos cavalos de Hipólito, quando ele morreu no acidente com sua biga. A segunda é a suposta lã do Velocino de Ouro, ligada ao mito de Jasão. O terceiro é coral do mar mediterrâneo, precisamente da cidade de Tel Aviv — o homem cruzou os braços — então qual será?

O jovem pegou dois frasco do bolso, misturou e dosou algumas gotas em cada peça, que ficaram rosas e depois retornou a cor normal. Era um pequeno teste alquímico pra determinar a idade de um objeto, muito similar ao do carbono 14, mas relativamente grosseiro na precisão da escala. Dependendo da cor que adquirisse o objeto teria uma determinada faixa de idade. Rosa e similares era a cor ideal para determinar que o objeto datava de, pelo menos, antes de 500 A.C.

— O que está fazendo?? Vai estragar as peças assim! — Disse o homem fazendo menção de recolher os artefatos.

— Relaxa, estou apenas determinando a veracidade das suas mercadorias e de fato... Parecem autênticas — se pôs então a refletir.

“Decisão difícil, não posso levar todas para decidir mais tarde por causa do preço... Sem dúvida Jasão e Hipólito dariam ótimos Riders. Esse coral talvez ligue a Perseu ou Andrômeda, mas é uma relíquia muito vaga”, Allan passou a mão em cada objeto, tentando se decidir.

“Vou pela suposta personalidade” e pegou as rédeas de Hipólito.

O rapaz ligou para o banco e ordenou a transferência da quantia absurda informada pelo contrabandista para uma conta na Suíça, que foi confirmada pelo beneficiado depois com seu próprio gerente. Satisfeito, o homem fechou o negócio.

Saindo do local o rapaz recebe uma ligação, o visor do celular informava que era Clauss.

— Alô?

“Allan? Aqui é o Clauss”, é as vezes ele esquecia que celular já informava quem era, “Liguei só pra você não se esquecer de pegar suas coisas aqui antes de partir pra Nuevos Santos, já chamou seu ‘ajudante’?”

— Não, esperava fazer isso com o senhor, aqui não tenho o local ideal — era muita gente para todo lado e ele tinha prazos curtos pelas passagens de avião marcadas — estou de volta amanhã de noite aí, eu preciso mesmo bus... — mas foi interrompido.

“Preciso ir! Então nós nos falamos mais tarde, tchau” e desligou.

Ele ficou preocupado, o avô parecia um pouco tenso, talvez tivesse acontecido alguma coisa, precisava voltar com urgência. Saiu pois seu voo sairia em pouco mais de duas hora e ele ainda precisava chegar ao aeroporto.

Igreja do Padre Clauss, 3 dias e 3 horas para o prazo final

A Igreja estava fechada e a área deserta, ao questionar uma mulher próxima ao local, foi informado que a Igreja não abriu desde ontem pois o padre estava indisposto e precisava descansar. Realmente devia ser algo grave, pois nunca ouviu falar em um único dia que o padre Clauss tenha fechado a igreja, só quando viajava.

“Preciso urgentemente me preparar pro ritual, mas ele deve estar doente, vou preparar um círculo depois de ver o que ele tem”

O rapaz abriu a grande porta de madeira e estava tudo escuro no interior, deu alguns passos dentro do recinto e as luzes se acenderam. Haviam três figuras na igreja perto do altar, terrificado o jovem viu que uma era o padre amordaçado, sendo segurado por um homem com um braço e com a outro apontava uma arma para sua cabeça. A terceira era um homem com aparência árabe e apontava uma arma em sua direção.

— Allan Deborah eu presumo? — Disse o homem.

O rapaz fez um movimento em direção aos três mas o homem com o refém pressionou mais a arma contra a cabeça do padre — Quem são vocês e o que querem comigo?

— Não interessa quem somos, viemos pegar os seus Selos de Comando, nos entregue e não faremos nenhum mal ao velho.

— Certo, mas não machuquem o meu tio — disse erguendo as mãos e se aproximando, precisava de um plano urgente.

— Pare! Primeiro Kozak vai revistá-lo pra ver se você não tem nada escondido — um terceiro homem saiu da porta da sacristia e o revistou, encontrando as rédeas num bolso interno da jaqueta e entregando pro “Árabe” — ótimo, agora pode vir, prometo que não vai doer nadinha, ou talvez você só precise perder uma mão — riu o bandido.

Ele se aproximou devagar, “Talvez eu possa derrubar ele com o Drone, mas preciso ser rápido para o outro não atirar, com ajuda seria mais fácil”.

— Devo avisá-lo que essas balas são “incendiárias”, qualquer gracinha e você vai queimar junto do seu velho. Anda logo que eu não tenho a noite inteira — ameaçou, mas o jovem parou no lugar que estava, o homem que segurava seu tio-avô então lhe golpeou na cabeça com uma coronhada e ele desmaiou.

— NÃO, SEUS DESGRAÇADOS!! — Allan gritou ao ver o sangue brotar na cabeça de Clauss.

— NÓS NÃO ESTAMOS BRINCANDO MOLEQUE, ENTREGUE OS SELOS! — vociferou o "Árabe".

“Preciso de ajuda”, pensou.

Ouviu-se então um som agudo que logo aumentou de intensidade, como se fosse um zumbido do lado de fora da janela esquerda da igreja. Allan que estava a cinco passos do homem apurou a audição “Será que?... VENHAM, ACABEM COM ELES”, pensou com todas as forças. Então logo dezenas e dezenas de abelhas entraram rapidamente pelas janelas, atacando ferozmente os três homens que foram pegos desprevenidos, o homem que segurava seu avô como refém o soltou para tentar afastar o enxame. Eles gritavam com a dor das picadas, mas o interessante é que as abelhas de Eva não perdiam o ferrão igual as vespas ao picar um humano.

O “Árabe” acabou atirando as rédeas um pouco longe enquanto tentava afastar as abelhas e começou a atirar para todos os lados, as balas realmente eram incendiárias e por onde atingiam causavam uma pequena explosão e um foco de incêndio. O rapaz se jogou atrás dos bancos pra se proteger e observava pelas frestas, esperando a oportunidade de recobrar o catalisador. Nesses disparos ele acertou seu comparsa que caiu um pouco longe do tio, mas as chamas brotaram e cresciam rápido. Por fim para a desgraça de Allan, um dos disparos acertou o chão onde estava o catalisador, que começou a pegar fogo antes que Allan pudesse fazer alguma coisa. Tudo dentro da Igreja estava virando um inferno literalmente em questão de poucos segundos, não havia muito tempo para lamentar.

Falsas Asas: Salto”, “Drone: Falsos Ferrões do Rei!”. Este último encantamento era uma conjuração usando os circuitos circulares dos braços, em que ele projetava uma estrutura feita puramente de seu prana que recobria a parte de cima do antebraço, criando uma espécie de estaca ou ferrão energético de cor amarela, que ele usava para lutar como uma estaca.

Exitou durante alguns segundos para se convencer do que ia fazer, mas os dois não permitiriam que ele retirasse o tio em segurança e provavelmente estavam condenados depois de tantas picadas. Com isto ele investiu sobre o Árabe e o homem, perfurando-os com os ferrões. Ele pegou Clauss do chão no colo e saiu correndo para a saída dos fundos que ainda não tinha começado a queimar. As abelhas também se retiraram com o começo da fumaça.

O velho padre tinha um corte um pouco acima do supercílio e um galo crescia, ele respirava e tinha pulso, mas permanecia desacordado. O rapaz decidiu levar o senhor para curar as feridas com o mel das abelhas no jardim lateral antes de ir para o hospital. Chegando lá ele encontrou quase em frente ao ninho, que ficava num local aberto, um círculo mediano no chão, era feito com pequenas folhas e própolis, preenchido com pequenos hexágonos distribuídos simetricamente por dentro.

“Foram vocês que fizeram isso?”, pensou nas abelhas que ainda não tinham retornado para a colmeia, “Mas desde quando vocês atendem a minha vontade?”, porém lembrou que o catalisador estava perdido, sua chance de entrar na Guerra se fora e ele não tinha nem ideia de como arrumar outro catalisador, só seu tio sabia encontrar o contrabandista.

— É uma pena amiguinhas, agradeço o empenho, mas não vai haver mais ritual de evocação esta noite... — Disse tristemente, mas quando começou a se mover de novo ouviu o estalo da vegetação atrás dele e sentiu uma picada na perna, imediatamente largou o padre no chão.

“Drone: Pupa!”, era a versão em que ele expandia as projeções no antebraço para formar um escudo de mão, mas no caso esta era uma versão maior da barreira, criando uma esfera grande o suficiente para cobrir ele e o tio.

A proteção foi ativada em tempo, pois logo dois homens começaram a disparar contra ele usando armamento pesado. As balas ricocheteavam, mas apesar de não serem incendiárias como as do “Árabe”, eram de grosso calibre. Ele olhou para a perna e era um dardo tranquilizante, que ele arrancou rapidamente com o braço livre, mas ele já começava a sentir os efeitos e ajoelhou.

— Vamos garoto entregue os selos! — disse um dos homens não cessando os disparos.

— NÃO, JAMAIS!! — respondeu.

— Não importa, logo o sonífero vai fazer efeito e nós vamos retirá-los de você de qualquer modo — disse o outro.

Cada vez mais tonto, logo seus circuitos começaram a dar sinais de falha, provavelmente era uma droga especial para evitar que o mago pudesse se dissipar. Mas ele não iria se entregar facilmente.

“Mãe, eu prometi diante do seu túmulo carregar o seu legado da melhor forma possível...”, tocando o pingente com a mão livre.

—... Eu prometo vencer custe o que custar, não importa quais batalhas forem! — Concentrou o prana no braço livre — Drone: Dispa... — Mas algo o interrompeu.

Um brilho amarelo iluminou atrás de Allan, sua visão começava a ficar meio turva, mas ele virou a cabeça para trás para ver o que estava acontecendo. O círculo improvisado pelas abelhas estava iluminado, de alguma forma o ritual de evocação começou! O brilho cresceu até o ponto de uma luz cegante e o jovem foi obrigado a voltar pra posição em que olhava para os dois, que cobriram os olhos também.

Quando os dois homens se viraram pra atirar no possível servo, dois disparos brancos os fizeram parar. Mas no lugar de feri-los, ambos estavam imóveis, como se estivessem aparentemente congelados. Allan se virou para trás para ver o seu grande salvador, apesar de já estar no ponto de desmaiar.

Viu uma figura trajando uma espécie de macacão cinza com detalhes laranja, usava também uma tipo de capacete com as mesmas cores e um visor negro que impedia a visão de seu rosto. Empunhava uma estranha pistola.

— Quem é você? — Perguntou Allan.

— Sou o servo da classe Rider, você é meu...

Mas não pode completar, Allan desmaiara.