Fahrenheit e Absinto
Capítulo 34
Valsher caminha para cara, olhando para um dos irmãos que o esperava na porta.
- Solte os híbridos.
- Mas senhor-!
- Mande-os para a cidade, instrua-os a matar todos os mestiços que encontrarem... Mas que sejam discretos.
Os híbridos dos anjos eram invisíveis aos olhos humanos, por se moverem a uma velocidade imperceptível aos olhos humanos, e emitirem uma luz que os olhos humanos não são capazes de captar em juízo perfeito.
Apenas loucos, ou pessoas sob efeito de algum entorpecente conseguem perceber, mas, por sorte, não é creditada muita verdade do que dizem.
Os mais comuns observadores, são chamados esquizofrênicos.
Valsher conseguia ouvir as crianças perdidas passando pelas laterais de sua casa, podia ouvi-los uivando, suas instruções eram as mesmas que as que Valsher passava agora.
- Não falhem... – disse ao irmão, entrando, com um ar contrariado.
Odiava ter de se envolver nas lutas das outras casas.
Mas era preciso.
***
Luka entrava pela porta da casa dos imortais, que olhavam pelas janelas, parecendo ao mesmo tempo, apreensivos e curiosos... Mas já era noite, e eles nada podiam ver além do manto negro da escuridão.
- Cain. – disse, para os senhor daquela casa, que olhava melancolicamente para uma das janelas.
- O momento do julgamento está chegando... Não é? – disse, olhando tristemente para Luka, parado à porta.
Luka se limitou a acenar com a cabeça.
Cain volta os olhos para o teto, respirando de maneira triste e sôfrega.
- Deseja que eu volte em algum outro momento, Cain?
- Não... Eu sabia que o dia do julgamento estava próximo...
Cain deixa a xícara de chá sobre a mesa, olhando para o filho da noite parado à porta.
- Sente-se, filho da noite.
Luka atravessa a sala, sentando-se em frente à Cain.
- Será uma longa noite.
- Apenas façam o que tem que fazer... – ele diz, voltando os olhos para a lareira. – Seus irmãos vão precisar de você nisso, então faça-se rápido aqui... Sei que a captura de Vincent não será nada fácil.
- Eu serei.
***
Alexis escreve em alguns papeis algumas das burocracias que teriam de enfrentar para passar por todas aquelas malditas batalhas.
Ivan bate na porta, empurrando-a um pouco, Alexis acena com uma das mãos para que ele entre, abaixando novamente os olhos aos papeis.
- Alexis, e se Vincent estivesse com Evan para usá-lo como trunfo no caso de nós conseguirmos encontra-lo...?
O irmão quebra a ponta da caneta no papel, espalhando tinta azul pela folha.
- O que você disse? -perguntou, largando o que estava fazendo e olhando para o irmão.
- Achei muito estranho que Evan tenha se recusado a se juntar a nós na caça ao traidor, também achei a caligrafia dele muito estranha na carta que mandou dizendo que não viria se juntar a nós. – respondeu, sentando-se em frente ao irmão. – Então peguei a ultima carta que ele tinha nos mandado desejando boas festas e informando o novo endereço da sua casa.
Ivan estende as duas cartas diante de Alexis, mostrando a assinatura ao fim da carta.
- Evan se escreve com ‘n’, não com ‘m’. E mais, lembra-se que Luka nunca recebeu aquela carta? Pensamos que fosse por que ele morasse próximo a você... Mas e se não for? E se a carta tivesse sido pega e usada para encontra-lo? Você sabe quanto dinheiro existe circulando nas mãos dos imortais... Não seria difícil mandar alguém para levar Evan de lá.
- Mas então por que não sentimos nada? Se ele tivesse sido levado, teríamos percebido alguma coisa.
- Não necessariamente, você sabe que todos os imortais podem influenciar a mente daqueles que olharem demais em seus olhos... Aquela coisa lá com as ligações entre almas e tudo mais.
- Acha que Evan foi colocado sob efeito das ligações dos imortais? – Alexis larga a caneta, jogando o papel manchado no lixo.
- Não apenas Evan, mas também Lokke. – ele complementa. – Eu rodei a cidade, não havia sinal de luta ou de resistência, Lokke é inquieto, até meio hiperativo, ele não se deixaria levar numa coleira assim tão calmamente.
- Se isso for verdade, eles já estão esperando nossa chegada... Ele conhece nossas formas de guerra, nossas mãos estão atadas.
- Talvez não. Há uma maneira.
- O que quer dizer?
- Ele pode ser um traidor, mas não se voltaria contra Cain...
- ...Você não está sugerindo que eu...!
- Claro que não! Se você pedisse alguma coisa assim pra ele, ele mandaria você pastar! Mas... Luka... É diferente.
- Ivan! Mas que droga de sugestão medonha é essa?!
- Aqueles dois são amigos! Luka pode muito bem... Persuadi-lo.
- Eu não vou pedir ao meu irmão que tente seduzir um imortal!
- Você sabe muito bem que para Luka isso não seria tão absurdo.
- De onde você tirou essa ideia ridícula?!
- Tempos de guerra exigem medidas extremas. – ele cruza os braços, dando de ombros. – Se Cain e os irmãos dele nos ajudassem, nos teríamos uma possibilidade de resolver isso.
- O que você faria? Ajudaria a matar seu próprio irmão? – ele diz, cético, e profundamente revoltado.
- Eu prefiro cortar as minhas mãos, claro. Mas eu não tenho Cain e aquele chicote assustador dele para me obrigar. – ele diz, rodando o porta-canetas. – Cain tem muito mais poder sobre eles do que a própria vontade deles. Mas para que Cain nos ajude, ele precisa QUERER nos ajudar...
- Não acredito que está jogando Luka pra isso!
- Você bem sabe que aqueles dois tem uma espécie de passado.
- Ele estava MORRENDO. Tem uma grande diferença.
- Alexis, pare de pensar como um irmão e pense como um líder, o que você quer, que essa tormenta acabe, ou que Luka seja privado dessa situação?
Alexis atira as costa na cadeira, passando as mãos pelo rosto e pelo cabelo.
- Vou pensar...
- Ótimo. Eu e os outros vamos pensar no que fazer quanto a Evan.
- Certo.
***
Absinthe olha a lua, já era noite, mas ela ainda tinha muito o que ler, muito o que testar.
Havia descoberto que seus predecessores, os Eternos, eram grande entendedores dos elementos que os cercavam, e que dentro de cada um deles, existia um cadeado, que trancava sua essência, até que tivessem idade para saber lidar com aquilo.
E era aquilo que ela tinha de encontrar.
Pelos testes que tinha feito, já sabia onde estava...
O que ela queria agora, era a chave.
Já tinha o anel de sua família, havia uma pequena caixa com alguns deles ali... Achava que ali costumava ser a casa de sua família.
E estava perto de encontrar a chave... Muito perto.
Fazia alguns dias que não dormia, mas não importava, queria encontrar a chave primeiro. E depois que aprendesse o que a lidar com o que existia do outro lado daquela porta...
Sairia à caça.
***
Chovia muito naquele momento, Alexis olhava fixamente para a janela... Pensando se devia atirar ou não o irmão aos leões... Na verdade, era apenas um leão, e tinha olhos dourados.
Não sabia o quão longe teria de ir... E isso o perturbava em níveis que poderiam causar-lhe pesadelos terríveis.
- Alexis, voltei. – Luka se atira na poltrona a frente.
Alexis olha para ele, sem dizer nada.
- Acabo de voltar da casa de Cain... Parecia tão triste, pobrezinho. – disse, prendendo o cabelo.
- Luka...
- Hm...? Que cara é essa? Tudo bem...?
- Ele quer te fazer uma pergunta. – Ivan diz, passando pelo corredor com um maço de papeis nas mãos, enquanto descia as escadas.
- Pergunta? Que pergunta? – ele diz, virando para o irmão, com a sobrancelha arqueada.
- Luka... Eu não te pediria uma coisa assim a menos que fosse estritamente necessário...
- Certo... O que é? – Luka inclina a cabeça pro lado.
- Nós precisamos que...
- Nós?
- É, seus irmãos e eu também, ainda que contra a vontade...
- Fale de uma vez Alexis, você não é de hesitar... E está me assustando...
- Ele quer que você convença o imortal a ajudar a gente. – Ivan passa novamente, dessa vez, com algumas pastas nas mãos.
- Convencer? – Luka repete.
- É... Seja persuasivo...
Luka começa a rir, rir o suficiente pra quase tombar a poltrona para trás, Alexis recosta na cadeira, massageando as têmporas.
- Alexis... – ele diz entre risos. – Você está todo dedos por que quer que eu dê em cima do Cain... Pra ele ajudar a gente a bater no Vincent?
- Em resumo, é isso ai.
Ivan agora desce com uma grande caixa, que parecia ter sido tirada de um arquivo.
- Cale-se Ivan!... Deus... Por quê?
Luka volta a rir, apoiando na mesa de Alexis, que não podia estar mais desconfortável com a ideia.
- E você concorda com isso, mano? – ele pergunta, limpando as lágrimas e tomando fôlego.
- É pelo bem da família... Por mais que me embrulhe o estomago pensar nisso.
- Tá, eu dou em cima dele. – ele diz, ainda tentando parar de rir.
- Por favor, não diga isso nesses termos... – ele suspira, revoltado.
- Ah, maninho... Deixa de ser mole, eu já me envolvi com gente muito pior.
- Mas eu não gosto dele... – ele suspira, frustrado.
- Ele também não gosta de você, então tá empatado. – ele diz, apoiando o queixo numa das mãos.
- Não leve isso tão tranquilamente. Me incomoda muito isso... Eu, te jogando no colo dele, assim de graça...
- É pra eu me jogar no colo dele?
- É só uma expressão, Luka! Pelo amor de Deus, fique longe do colo dele!
Alexis sempre se sentiu incomodado com a... Flexibilidade de Luka para escolher parceiros... A ideia de vê-lo morder outro homem sempre foi... Irritantemente desconfortável... Até um pouco perturbadora...
- Own, meu irmãozuxo é ciumento. – Luka ri.
- Não é ciúme, é ASCO!
- Sabe que eu acho o Cain gato, eu chamaria ele pra sair comigo. – ele debocha, deliberadamente dizendo isso somente para irritar o irmão.
- NUNCA MAIS REPITA ISSO!
- Ui, tá bom, tá bom... Não está mais aqui quem falou. – ele ri. – Vou lá cumprir a minha “tarefa homérica para com a casa”.
- Não force demais os meus nervos... – disse, suspirando, irritadiço. – Eles explodem...
- Ah, não se preocupe maninho querido, seus nervos aguentam bastante. – ele diz, soprando um beijinho para o irmão irritado e saindo.
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