Eu odeio surpresas!

Capítulo Único-Vinte e um de Setembro.


"Wonderwall! Wonderwall! Wonderwall!"

Acordo ouvindo o mix que fiz para ser toque do meu celular, algo como minha voz repetindo "wonderwall" e a voz de John (Deus) Lennon cantando qualquer coisa agradável. Suspiro.

O visor do meu celular marca seis e meia da manhã, imagino quem seja:

-O que você quer? - Pergunto desanimado.

-Bom dia!-Ouço a voz do meu irmão mais velho, Paul.

-Qual seu problema?

- Nossa... Hoje é seu aniversário, irmão!

-Seis e meia da manhã, me chamando de irmão... De quanto você precisa?

- Só quero te desejar um feliz aniversário, Liam.

-Você tem que me lembrar todo santo ano? -Indago revirando os olhos.

-Achei que hoje você ia ser menos... Assim. -Ouço um suspiro.

-Por que você não faz isso com o Noel?

-Isso o quê?

- Ligar seis da manhã todo aniversário dele. –Bufo de raiva.

-Não tem nada a ver com o Noel, Liam. Hoje é seu aniversário e eu queria te dar parabéns, posso?

- Você só faz isso para me irritar, seu idiota! -E desliguei.

Todo ano é assim, ele me liga de madrugada e faz esse "jogo". Todo vinte e um de setembro... Suspiro novamente.

Após mais uns vinte minutos me remexendo na cama, me conformo que perdi e o sono e me levanto. Geralmente eu encheria uma bela tigela de cereais, comeria uma fatia de pão e uma xícara de café, mas hoje, eu decidi tomar aquele “breakfast” gordurento (e ruim quando se quer manter meu porte físico). Dois ovos fritos, uma salsicha, um pedaço de bacon, uma porção pequena de feijão cozido e metade de um pão frito. Talvez você se assuste com esse desjejum, todavia ele é ótimo, depois eu queimo tudo na caminhada. Após comer tomei um belo banho e vesti qualquer coisa que me fizesse parecer em luto (o que significa: qualquer coisa do meu armário) e ainda entojado por serem apenas oito da manhã, peguei meu violão e comecei a compor.

O nome da minha melodia atual (que está sendo feita) é: “Queridas Estrelas”, eu já estreie uma versão mal feita dela há alguns meses em um pub, mas não gostei do resultado. Ficaram achando que fazia referência ao último álbum do Noel (como se eu vivesse em função dele), então resolvi muda-la um pouco, tipo quase tudo. Okay, eu admito que graças a esse infeliz incidente, eu abandonei aquela melodia e comecei a compor outra, não faz mal, em alguns anos eu volto com ela.

A minha voz, como sempre, saiu a mais bela de todas e aquelas palavras (“The stars, I want the stars”), seguidas de um ritmo “meloso” me fizeram pensar se valia a pena lançar isso. Decerto que não. Arremessei a droga do instrumento contra a cama, raivoso. Não vou negar que o Noel é um baita de um imbecil, mas pelo menos ele sabe fazer isso, sabe compor. A única coisa que ele faz bem, e infelizmente, melhor que eu. Não que minhas músicas sejam ruins... Blah, você entendeu.

Fiquei quase até a uma da tarde olhando pro nada ou vendo televisão, foi quando resolvi ir almoçar em algum pub. Aliás, não um pub qualquer, o “Fresh Food”, uma perfeita mistura de restaurante com bar, mas que mantém o estilo medieval com pouca iluminação, por isso, eu acho que ainda é um pub. Fica ao lado da minha casa e faz jus ao seu nome, que significa “comidas frescas”. E o bom de comer sempre em um só lugar é não ter que ficar rodeado de pessoinhas chatas e distribuir tanto autógrafos que com o papel daria para refazer a floresta amazônica três vezes, na hora do almoço. As pessoas já “me conhecem”, estão acostumadas a me ver, então, sou tão comum quanto aquele rosa verde que surge toda primavera no quintal do vizinho.

Adentro o estabelecimento, bebo um gole d’água (o Sol está escaldante) e peço por uma cerveja e um sanduíche. Claro que eu deveria estar almoçando, contudo... Depois do meu desjejum, não vai faltar nutriente.

Uma menina loira e com um vestido cor de rosa se aproxima de mim, eu a fito. Aparenta ter sete ou oito anos e carrega com dificuldade um violãozinho meio arrebentado, suas sapatilhas parecem estar a ponto de estourar e usa uns óculos pretos sem a lente.

-Que foi? –Pergunto insensível.

-Assina meu violão? –Ela indaga tímida.

Eu reviro os olhos e pego o objeto e antes de pedir uma caneta ela me oferece. Assino “LiamGallagher”, tudo junto e de forma que borro o início do “G”. Ela abre um sorriso enorme e questiona:

-Hoje não é seu aniversário, seu Liam?

A cerveja chega junto com o sanduíche e a menina fica olhando atentamente para a comida. Em um ato repentino eu recolho o alimento e dou para a mesma, que por alguns segundos parece não acreditar.

-Obrigada! –Seu sorriso é ainda maior.

Faço um cafuné sútil em seus cabelos dourado, quando um homem andrajoso se aproxima e com brutalidade puxa a menina:

-Quantas vezes já não disse para você não perturbar os outros com sua música? –O homem grita.

-Ela não está perturbando ninguém. –Respondo instintivamente, mas sou ignorado.

Depois que vejo os dois se retirando do pub, me viro para o copo de cerveja e reflito brevemente sobre aquela garotinha, em seguida despejo o líquido amarelado na garganta e bebo de um gole. Passa-se um tempo e consumo umas três sou quatro doses alcoólicas, até que começo a enxergar tudo levemente esbugalhado: melhor parar.

Levanto com uma tontura de nível baixo e me retiro, ainda não estou bêbado, mas estou quase. Passo por uma lojinha de perfumes e resolvo entrar. Não sei se as pessoas estão muito distraídas para me perceberem ou se simplesmente não se importam com um astro do rock andando por ai, sozinho.

Compro um perfume “Smell” (Cheiro), meu favorito. Sim, eu sou uma pessoa vaidosa. E sou lindo também.

Tomo um sorvete e olho no meu celular que marca quatro e meia da tarde, antes de voltar para casa eu preciso fazer mais alguma coisa. Penso em ir visitar o Gene ou o Lennon (não o “Deus”, pois este... Meio que sou eu... Lennon, o meu filho chamado Lennon), quem sabe o Paul? Mas não, eles iam querer me fazer uma surpresinha. Eu odeio aniversários; lembro que não tenho família. Quer dizer, ter eu tenho, mas eles são chatos. Paul é aquele irmão mais velho-do contra, meus filhos são crianças ainda, nunca terão idade suficiente para me entreter - filmes que eles assistem são chatos, suas conversas são inocentes e seus gostos são totalmente diferentes, só puxaram a arte musical (ou melhor, gosto musical, porque nem para tocar eles servem, embora eu os ame) – sou solteiro e não tenho outro irmão (não, o Noel não conta).

Conformo-me em voltar para casa, já pensando em compor uma música que vai falar sobre um cara que está preso no tempo; ótima ideia. Chego por volta das cinco e entro, está tudo naturalmente escuro e o silêncio é naturalmente perturbador. Eu acendo a luz da cozinha, deixou a sacolinha em cima da mesa e ouço um ruído estranho, como alguém se movendo, ignoro. Fecho a porta e tiro a camiseta, pois está um calor dos infernos, e como sou muito inteligente saí todo vestido de preto...

Cheiro meu “sovaco” (axila para os mais sutis) e torço o nariz involuntariamente. Se soubesse que voltaria do passeio assim teria passado desodorante.

Pego uma toalha e acendo a luz do banheiro, abro a torneira para ir enchendo a banheira, e enquanto cantarolo “Rock ‘N’ Roll Star” (com um ritmo perfeito, como sempre), me dirijo até o quarto. A porta está estranhamente trancada, não lembro a última vez que tranquei o meu quarto. Pego uma chave e, acho que ouvi umas risadas, mas ignoro novamente, concentrado na lembrança de um show que fiz na argentina e que cantei essa música.

Abro a porta com brutalidade (talvez porque quando o faço, estou na parte da música que mais me anima) e jogo a chave no chão me excitando um pouco e dando um “berrinho” (não de a voz ter saído fina, e sim, de ter sido um grito nem tão alto), depois caio na risada comigo mesmo e ainda no escuro vou até o guarda roupa, estranhamento não o encontro e quase bato a cabeça na parede, suspiro e acendo a maldita luz. Fico horrorizado com o que vejo.

-Surpresa! –Várias vozes em coro.

Minha boca fica entreaberta e minha expressão é de puro horror. Olho lentamente para cada rosto: Paul, Gem (ex-colega de banda), Andy (da Oasis), Arthur (Da Oasis também), Nicole (ex-mulher), Gene, Lennon, Molly (filha), Patsy (ex-mulher), Johnny Depp (poucos sabem que somos “colegas”), Amber (mulher de Johnny), Lily e John (filhos dele) Donovan (sobrinho), Sarah (cunhada), Sony e Anais (sobrinhos)... Por fim, o idiota do Noel.

-O quê vocês pensam que estão fazendo? –Indago com a voz seca- E cadê a droga do meu armário?

-Hoje é seu aniversário Liam! –Responde Nicole, que eu confesso, ainda mexe um pouquinho (só um pouquinho) comigo.

Quer dizer, eu não vou negar que a trai (e sei que estar bêbado não é um motivo para ser perdoado), mas ainda não me recuperei totalmente, lembrar-me dela ainda me “balança”.

-Não diga. –Reviro os olhos.

-A gente veio comemorar. –Sorri Paul.

-Comemorar o quê? –Bufo de raiva- Que eu estou um ano mais próximo da morte? –Riu alto e ironicamente- “Eba, daqui a pouco não vamos mais ter que aturar o Liam”.

-Mas pai – Corta Gene-, temos que comemorar que você viveu até aqui, é uma coisa boa! Há alguns anos atrás você estava nascendo, é um bom motivo.

Eu paro de falar por uns segundos, a inocência de Gene é algo incrível, especialmente para alguém com quatorze, acho que na época dele eu já fumava maconha. Enfim, suspiro e começo de novo:

-Gene, Molly, Lennon, você são meus filhos; Noel, Andy, Arthur, Gem, você trabalharam anos comigo; Patsy e Nicole, você foram casadas comigo; Paul você é meu irmão! –Digo indignado- E John?! –Uso o verdadeiro nome de Depp- Ainda não acredito que até você. Porque nada disso impediu vocês de vierem até aqui, e se me conhecessem só um pouco, saberiam que eu não suporto, eu simplesmente odeio surpresas!

Eles começaram a se entreolhar, mas eu não parei por ai:

-E cadê a droga do meu violão?! –Isso foi um grito, pois a minha cama estava vazia.

-Está no andar de cima, –Avisou Molly- junto do seu armário.

-Olhem só como eu estou! –Gritei em seguida, mas dessa vez a bronca era para mim mesmo- Estou descabelado, cansado, estressado, fedendo, e fedendo muito, suado, sem camisa, indo tomar banho e surge esse troço –Apontei para eles- daqui a pouco eu enfarto.

-William, –Nicole me chamou pelo nome inteiro- vai tomar banho, relaxa e depois nós todos conversamos, okay? Você vai ver como pode vir a ser legal.

Suspirei e assenti irritado, como não ceder a um pedido da doce Nicole? Porém antes de sair, eu fito Patsy mortalmente:

-E eu ainda não acredito que você teve a coragem de vir até aqui depois de tudo que você fez, imbecil.

-Achei que já tivesse esquecido... –Ela sussurra, todavia eu ouço.

-Esquecido? –Volto-me para ela- Você é uma pessoa que eu quero encontrar no inferno! –Destaco a palavra “Inferno”, depois me retiro batendo a porta.

Pego minhas roupas no andar de cima e já com a toalha na porta do banheiro, entro despido na banheira. Depois de uma arfada eu me acalmo, não posso lhes dar o prazer de morrer hoje, vão ter que me aturar por pelo menos mais quinze ou vinte anos. Ou melhor, trinta.

Y-Y-Y

Dentro do quarto de Liam tudo fica tenso, após aquele sermão eles se olham.

-Eu disse que ele não ia gostar. –lembra Nicole para Paul, o organizador da surpresa.

-Mas não disse que ele ia detestar! –Retruca o mesmo.

-E agora pai? –Pergunta Sonny, tenso, e mostra a caixinha verde embrulhada em papel presente para seu pai, Noel- O que eu faço com isso?