Esteja Onde Estiver

Anahi: Capítulo 9


Era uma proposta irresistível; ir ao show do Kalimba... Com ele. Por mais que eu quisesse recusar, não podia, ou talvez, eu não quisesse mesmo recusar. Assenti, e caminhamos até o seu carro. Ao chegar ao hotel, fui para o meu quarto me arrumar, e ele foi para o dele. Arrumei-me o mais rápido que pude, já que ele disse que o show iria começar às 23h. Mas, já passava deste horário quando deixamos o hotel e seguimos para o Auditório da cidade com o seu carro alugado.

"Show's sempre atrasam um pouco, você sabe" - ele disse, ao notar minha expressão ansiosa.

Quando chegamos, o Auditório já estava lotado, mas conseguimos bons lugares na área vip. O show tinha acabado de começar, então não perdemos muita coisa. No momento, a banda cantava a música 'Duele', e como eu amava as músicas do Kalimba, eu comecei a sussurrar a letra timidamente.

"Porque duele, duele tanto amarte así. La ilusión se me escapa. Me deshace despertar e no tenerte aqui. Siento que me mata. Duele tanto amarte así" — ouvi sua voz rouca, sussurrada, próxima ao meu ouvido, e seu hálito quente tocando a pele do meu pescoço entrando em contraste com o ar condicionado do lugar, me causando um arrepio pelo corpo.

Virei o rosto, e o olhei séria; nossos rostos bem pertos, já que ele não se afastou. Deu meu sorriso favorito ao encontrar meu olhar. Permaneci séria, o olhando, então ele voltou sua mirada para o palco, balançando a cabeça para os lados, rindo desconcertado.

Lembro-me que, há muitos anos atrás, eu costumava fazer isto com ele às vezes. Ao contrário de mim, ele é muito tímido. E eu gostava de ver a carinha que ele fazia quando eu o deixava tímido. Eu o olhava, séria, e ainda que ele me perguntasse o que eu queria, ou o que eu estava fazendo, eu permanecia como estava; o olhando intensamente. Então, ele sorria um sorriso lindo, mostrando-se envergonhado, desconcertado com minha mirada.

Quando ele voltou seu olhar ao palco, eu ainda fiquei o olhando por alguns segundos, vendo-o de perfil. A banda começou a cantar outra música, e ele voltou sua mirada para mim, sentindo que eu ainda o mirava. Sorriu, e me puxou para junto de si, me aconchegando entre os seus braços.

"Y es así, yo ya no creo en milagros se tú no estas a mí lado, soy un velero en el mar del pasado. Y sigo así, un soñador sin noches, una alma sin destino que paga por sus errores. Y no puedo dejarte de amar, y no puedo dejar de esperar, y no puedo pederte al final y no te puedo olvidar, no sé vivir si no estás"

Ao ouvir os versos daquela música, eu o apertei forte junto a mim, descansando meu rosto sobre o seu peito. Ele me apertou também, beijando o alto dos meus cabelos. Isto tudo é uma loucura, eu pensei desesperada. Estar ali com ele, nos braços dele, era uma loucura sem tamanho. Tentei me lembrar de que Rodri estava em casa me esperando, que ele era meu marido, mas isto não foi um motivo forte o suficiente para me tirar dali. Lembrar-me de Rodri, só me recordou da decisão que eu havia tomado para quando chegasse em casa. Suspirei ao recordar, e ele acariciou meu braço. Fechei os olhos e sorri. Eu não queria sair dali.

"Se vuelvo a tí seré quien guie tu norte, el farol de tus sentidos, quien te querá para siempre" — ele cantou junto com a banda, sussurrando rouco, balançando meu corpo para os lados, no ritmo da música.

Por Deus! Como eu ia conseguir esquecer ele e viver só para mim? Eu não conseguia me desprender deste amor, e temia nunca conseguir, como se fosse um carma na minha vida, ou um castigo eterno pelo erro que eu cometi anos atrás. Às vezes sentia uma imensa vontade de lhe perguntar se foi tão fácil para ele deixar de me querer, e pedir-lhe que me ensinasse a não lhe querer mais também.

Kalimba começou a cantar outra canção, e enquanto eu a escutava permaneci em seus braços lhe fazendo carinho nas mãos, sentindo-o acariciar o alto dos meus cabelos com os lábios. No refrão, observei os fãs que estavam próximos do palco pular e cantar com muita animação, e por alguns segundos senti vontade de estar lá no meio deles, pulando e cantando também. Mas só por alguns segundos. Quando senti o beijo que ele me deu na bochecha, dei-me conta que eu estava onde eu realmente queria estar. Levantei meu rosto e o mirei, então ele sorriu e começou a cantar o verso da música 'Antes de ti', junto com a banda.

"Desde que tú llegaste, mi corazón sanaste de tanto dolor que habia antes de ti"— sorri, e desta vez, não impedi minha mão de lhe acariciar a barba. Ele abaixou e me deu outro beijo na bochecha.

Voltei minha mirada para a banda, e o show seguiu, com uma nova canção. Agora, eles cantavam a música 'Cada estación', uma das minhas favoritas. Fechei meus olhos, e involuntariamente, comecei a balançar meu corpo para os lados no ritmo da música, e só dei-me conta quando o senti me seguindo, então me lembrei de que eu seguia aconchegada em seus braços. Ele apoiou o queixo em meu ombro, e ficamos assim, bem juntinhos ouvindo a música. Eu não sabia se ele realmente gostava da banda, ou tinha me lavado ao show para me agradar, mas eu sentia que ele estava gostando, assim como eu. E, de alguma forma, isso me fazia sentir-me ainda melhor.

"Te llevaré en cada estacion, cada ves que gire el mundo tu estarás en mi corazón. Te guardaré en cada rincón. Del invierno hasta el otoño en mi voz"

"Se tivesse espaço, nós dançaríamos esta música... assim... bem juntinhos, como estamos agora" - ele sussurrou no meu ouvido.

Levantei meu rosto para olha-lo nos olhos e ver se ele estava falando sério. Mas, apesar do meu sorriso favorito estar ali nos lábios dele sorrindo para mim, eu não vi humor nos seus olhos. Franzi meu cenho, ainda duvidando que ele falara sério. Então, ele roçou seu nariz no meu, e acariciou meu rosto com sua barba em seguida, me causando um grande arrepio, me fazendo fechar os olhos e recordar que o beijo de urso sempre fora o seu preferido.

"Você é louco" - sussurrei incapaz de me afastar.

"Por quê?" - perguntou, sussurrando sua voz próxima à minha boca.

"Eu devo ser mais louca que você" - ouvi sua risada sussurrada, antes de me dá um beijo no canto dos lábios, na trave.

Eu ia me afastar, mas ele não deixou, e eu não sei se era certo eu me sentir menos culpada por isto.

"Christopher, é melh-" - ele me interrompeu.

"Shh...!" - sussurrou próximo aos meus lábios, me olhando nos olhos, sorrindo - "Está começando 'No volverás a mí', e eu adoro esta música" - disse me abraçando pelo pescoço e me dando um beijo na bochecha, antes de olhar para o palco.

"Como vivir así si me mata estar sin ti. Como seguir así sufriendo cada día más. Todos me preguntan y no se que decir, pues no volverás a mí"

Levantei minha mirada, e ele deu o meu sorriso, piscando um olho. Abaixei a cabeça, balançando-a para os lados. Perguntei-me porque eu gostava de me torturar tanto. Talvez eu fosse masoquista, e não tivesse dado conta ainda. Para ele devia ser fácil estar ali comigo. Claro, ele já não me amava. Mas, se ele soubesse o quanto é difícil para mim estar neste conflito entre querer e não poder, talvez ele me ajudasse e não agisse assim. Levantei minha mirada, o olhando outra vez, e dei-me conta, pelo sorriso maroto que ele deu para mim, que não. Ainda assim, ele seguiria me torturando, e desta vez, pelo simples fato de gostar de fazer isto.

"Y cada canción me habla de ti. Me haces tanto ruido y para variar me siento muy mal"— abaixei a mirada e sussurrei o verso da música, junto com a banda - "Me haces tanta falta, todo me recuerda a ti, pero tú ya estas tan lejos..."

"Não estou mais longe" - ele sussurrou, levantando meu queixo - "Agora estou aqui" - disse, acariciando minha bochecha com o dedo polegar.

"Para com isso, Christopher" - disse, tirando a mão dele do meu rosto, parando com aquele tipo de brincadeira.

Voltei a olhar para o show que acontecia lá na frente. Tentei me afastar e me sentar direito no meu lugar, mas ele me impediu outra vez.

"Você não precisa fazer isto" - sussurrou, me apertando para que eu não saísse.

Mas, sentir aquele hálito quente dele tocar meu rosto, só aumentava minha necessidade de me afastar. Eu queria que ele entendesse que, o que para ele são apenas joguinhos, para mim não, e me afeta de um jeito que eu não gostaria; meche bem na ferida. Com uma cotovelada, consegui me esquivar dele e me sentar direito. Cruzei meus braços e olhei para frente, enquanto a banda começava a cantar a música 'Nunca sabrás'.

"Tu no sabrás, que fuiste mi tesoro, y ahora voy caminando sin tu amor. Tu no sabrás, que hoy te extraño tanto, la media luz me recuerda tu mirar, intento olvidarte"

O olhei, e ele passava a mão na nuca, subindo até o alto dos seus cabelos, com uma expressão séria. Quando ele me olhou, eu virei a cara emburrada. Talvez, eu não estivesse com raiva dele, mas sim de mim. Ele sempre foi assim, sempre gostou de conquistar, jogar charme, brincar com a malícia inocente dele. O problema era comigo, eu que não era forte para aguentar esse tipo de brincadeira, quando meu coração doía por não ter o seu amor. É complicado. Suspirei cansada com a minha vida.

"Fallo, quiero no pensarte y solo hay llanto, quiero curarme en tu recuerdo, quiero no sufrir este momento, cuando te amo ya nunca lo sabrás. Tu no sabrás, que para mi eras todo, y siempre estas dentro de mi corazón, intento olvidarte"

"Inferno de música" - resmunguei, irritada com a letra da música.

"Não queria que ficasse chateada comigo" - ele aproximou o rosto de mim, para sussurrar.

"Não estou" - o olhei, e ele levantou uma sobrancelha - "Quero dizer, não é com você, entende?"

"Annie, escuta..." - ele suspirou.

"Não, não diz nada" - o interrompi - "Eu sou assim, você me conhece... Não mudei nisso. Irrito-me e mudo de humor em um estralar de dedos"

"Algo passou" - disse, segurando meu queixo.

"Era mas fácil que te quedaras junto a mi, y ahora solo sé, que intento olvidarte"

"Não" - apertei forte os olhos, ao ouvir aquele verso - "É só que... é este inferno de música" - disse, jogando meus cabelos para trás, irritada.

"Não gosta?"

"Bem, sim... mas, deixa pra lá" - fiz uma careta.

"Quer beber alguma coisa?"

"Vende tequila aqui?" - precisava de algo forte.

"Acho que não" - respondeu, rindo.

"Tcs..." - estralei a língua, voltando a mirada para o show.

Ele se levantou para ir comprar algo. Fiquei lá, ouvindo a música e pensando na noite estranha que eu estava tendo. Eu estava cansada depois de gravar o dia todo, devia ter tomado banho e ido dormir. Além de mais sensato, seria mais seguro para mim. A banda começou a cantar a música 'Olvidame', e eu dei uma risada sem humor. Já chorei tantas vezes ouvindo essa música, enquanto me lembrava dele. Na verdade, tentando entender nossa história. Só percebi que ele voltou, quando senti algo gelado no meu braço. Ele riu do meu susto, e se sentou me entregando a garrafinha de água.

"Água?" - perguntei, sem acreditar.

"Sim... água" - disse, despreocupado, abrindo a dele.

"Você deve está brincando" - ri, sem humor.

"Amanhã trabalhamos bem cedo, Mocinha"

"Corrigindo: eu trabalho. E você?"

"Eu estou dirigindo" - ri, balançando a cabeça para os lados, enquanto me virada para assistir o show.

"Llorar duele mas ya que sé que soy la razon de lo que nos paso. Por no ver que tu eras mas real que un amor y querer que sintieras lo que nunca existio. Tuve un amor imperfecto con sus defectos de amor de verdad. Y yo y mi miedo lo dejamos pasar, ahora que lo entiendo te vas"

"Christopher...?" - o olhei, e ele bebia a água.

"Sim?" - me olhou, fechando sua garrafinha.

"Quando deixou de me amar?" - perguntei séria, me agarrando ao fio de coragem que tive naquele momento, ao ouvir os versos da música. Ele me olhou com as sobrancelhas levantadas, como se não tivesse entendido a pergunta, que para mim era óbvia demais - "Quero dizer, deixou de me amar quando terminou comigo?" - mordi meu lábio inferior.

"Você sabe"

"Eu sei?"

"Não sabe?"

"Não"

"Pensei que soubesse"

Ele voltou a mirada para o palco, e bebeu mais um pouco de água. Eu segui o mirando, esperando que ele respondesse minha pergunta. Quando me lembro de como tudo terminou, sempre me sinto muito mal, porque não foi fácil ir gravar a novela ou fazer um show, e todos os dias durante semanas, receber a frieza dele. Raramente ele me olhou, e quando o fez, era com dois blocos de gelo no lugar dos olhos.

Foi nestes momentos em que me senti suja, com nojo de mim mesma. Mais que qualquer outro momento da minha vida. E ainda que depois de voltarmos a nos falar e tentar uma relação de amizade entre nós dois, às vezes nossos carinhos se excediam e alcançavam o limite da saudade nos remetendo a um passado recente, ainda assim, eu já não tinha certeza se ele ainda sentia amor... Ou era apenas saudade. Nunca pude ler seus olhos, nunca pude tentar entender além de seus gestos e palavras. Talvez, o medo ou o arrependimento tenham cegado meus olhos, e o que via era o homem que eu precisava aproveitar cada oportunidade pequenininha que ele me dava, mesmo sem dar-se conta, de ama-lo mais uma vez. E por isso, a cada vez, eu o amava como se fosse a última.

"El tiempo nos desconocio. Nos apago el corazón ¿Donde escondio todo ese amor? No entiendo..."

A banda começou a cantar a música 'Se te olvido', e já nos primeiros versos, a música o lembrava de o que eu havia lhe perguntado instantes atrás. Ele me olhou, e notei quando sua mandíbula tremeu. Depois passou a mão no queixo, sobre a barba e voltou sua mirada para frente. Então, dei-me conta que ele não responderia minha pergunta. Com um suspiro e um revirar de olhos entediado, eu cruzei meus braços e olhei para a banda cantando no palco.

"Se te olvidó que yo sin ti no puedo respirar. Se te olvidó que el cielo caya caso si no estas. Se te olvidó que siento en mi interior, un eco que no puede hablar. Se te olvidó que si me dejas ya no puedo andar. Se te olvidó que yo sin ti ya no quiero más. Se te olvidó que ahora sin tu amor mi vida se empezó a apagar. Se te olvidó decirme como te puedo olvidar"

"Você tinha razão"

"Em que?" - me virei, para mirá-lo.

"Inferno de música"

"Mas eu falava da outra" - levantei uma sobrancelha.

"E eu falo desta" - me olhou sério, fazendo uma careta.

Mas é claro que esta música também era um inferno para mim. Na verdade, o show todo até agora. Todas as letras das músicas alfinetou nossa história, e consequentemente, as minhas feridas também. Eu já podia me imaginar tento um surto a qualquer momento e começar a gritar e correr, enquanto fugia dali. Mas respirei fundo e permaneci como estava quietinha no meu lugar, assistindo o show e desejando que terminasse de uma vez e eu pudesse chegar logo ao meu quarto.

Nós dois não falamos mais nada. Outra música começou, e eu não a conhecia, então, antes da letra começar eu tive um fio de esperanças que esta, pelo menos esta, não traria na letra versos que falassem sobre Christopher e eu. A música era a 'Tu tienes un lugar', como fiquei sabendo depois. E quando Kalimba começou a cantar, ri sem humor, ao perceber que esta também falava por mim. Que inferno!

"Tu tienes un lugar en mi corazón. Te juro te conviene quedarte amor. Y yo respondo por tenerte. El amor que siento es diferente. Tu tienes un lugar en mi corazón hecho a tu medida, esclusivo de tu amor. Se te marchas, me destrozas. Siempre as dado lus a lo que tocas"

Abaixei minha mirada e cobri os olhos com uma mão, quanto senti que uma fina lágrima iria me trair e cair pela minha face. Mas não deixaria que ele percebesse isso. Senti-me, como se minha resistência estivesse sendo testada esta noite, na verdade, não só esta noite, como os últimos dias. E sentia que estava alcançando meu limite.

Queria não estar ali naquele momento, gostaria de estar em um lugar onde eu pudesse chorar tudo o que eu precisava e me sufocava tanto. Precisava chorar toda aquela dor, todas aquelas lembranças, toda aquela história de amor que não deu certo. As feridas de amor são as que mais doem e só se curam com as lágrimas. Talvez, muitas lágrimas. Ainda que as minhas feridas, eu estive tentando curá-las por mais de cinco anos. Não se curaram, mas estavam bem cuidadas, cicatrizadas, até ele voltar e abri-las, todas outra vez.

Eu precisava chorar, precisava tentar curar minhas feridas. Por que será que é tão difícil deixar de amar? Nosso corpo todo sofre, nosso coração dói, nossa alma chora, enquanto nossos lábios insistem em dizer 'eu te amo'. Será que nosso cérebro não vê o mal que este amor está causando? Será que a parte inteligente do nosso corpo não entende que precisamos eliminar, nos desprender daquilo que nos agride, nos faz mal?

Quando a próxima música começou, eu desisti de esperar e achei melhor sair dali de uma vez. A música era a 'Tocando fondo', a que eu amava, mas temia ouvi-la ali, com ele ao meu lado. Ainda lutei em permanecer ali, nos primeiros versos.

"Pasa la angustia tan cerca de mí cuando de aqui te alejaras. Sé que un sueño sigue por ahi, esperando que intente dormir. Me quedado solo y así no planeava vivir. Me quedado solo y sin ti. Es tan facil volverse loco. Estoy tocando fondo, me niego estar sin tí. Te tengo que recuperar o de una ves dejarte ir. Estoy tocando fondo me duele hablar de tí. No quiero disimular el resto de mi vida"

Mas, ao ouvir o refrão não aguentei mais. Levantei-me decidida a sair dali. Senti sua mão segurar meu pulso e me virei para olha-lo.

"Onde você vai?"

"Embora" - ele me olhou, com uma expressão confusa - "Quero sair daqui"

"Então vamos" - ele se levantou.

"Pode ficar..., eu vou sozinha"

"Não, claro que não" - disse se levantando, como se eu tivesse falado algo errado.

"Eu quero ficar sozinha, Christopher" - disse fraca, o olhando nos olhos.

Ele me olhou sério, mas alguns segundos depois soltou meu pulso. Eu espantei a vontade que me invadia de dar um passo e lhe abraçar, e tentei me convencer que o lugar mais seguro naquele momento era o meu quarto, no hotel.

Virei-me e saí de uma vez dali. Ao sair do auditório, parei na calçada, abracei meu corpo e fiquei olhando para a rua a espera de um taxi. Senti um arrepio pelo corpo, ao dar-me conta que talvez, eu teria que esperar mais do que eu pensava, ou talvez, seria inútil esperar que passasse um taxi ali, porque eu estava em uma cidade do interior, onde quase não se passava carros, quanto mais taxi nas ruas àquela hora da noite, como eu estou acostumada a ver na capital. Mordi o lábio, tentando não entrar em pânico.

"Vamos?!" - senti suas mãos sobre os meus ombros.

"Eu disse qu-" - ele me interrompeu.

"Eu sei" - ele assentiu, parecendo cansado - "Vou te levar ao hotel, para que você fique sozinha como quer, porém, sozinha e segura"

O olhei e tive vontade de chorar. De raiva, tristeza... Do exausta que eu me sentia.

Mas, mais uma vez, tentei me convencer a não fazer isto. Eu só precisava ser forte mais um pouquinho, e eu estaria em meu quarto para chorar tudo o que eu quisesse. Suspirei profundamente, e assenti.

"Obrigada"

Virei-me e comecei a caminhar na direção de onde eu me lembrava de que ele havia estacionado o carro. Ficamos calados nos primeiros minutos, desde que ele deu partida no carro.

"Você sabia que não ia passar nenhum taxi ali, verdade?" - me perguntou, de repente.

"Eu estava pensando sobre isso quando você chegou"

"Desculpe-me pela noite... Se eu soubesse que..., quero dizer, eu só queria que você se distraísse se divertisse"

"Está tudo bem, Christopher. Não é sua culpa. São coisas minhas. Eu também pensei que esta noite seria divertida"

"Não tivemos muita sorte com o repertório..." - o olhei e ele ensaiou um sorriso.

"É... não tivemos" - fiz uma careta, ao me lembrar.

Seguimos o resto do caminho em silêncio. Além de estar cansada depois do dia todo gravando, eu sentia que qualquer coisa que falássemos nos levaria àquela noite, àquele show, às músicas e às letras terríveis que contavam nossa história, de alguma forma. Às vezes nossos temores respondem a motivos que não sabemos explicar. Às vezes se trata de algo que sentimos lá no fundo, algo que sabemos que é verdadeiro, mas que para qualquer outra pessoa iria parecer ridículo.

Eu precisava resolver a minha vida, eu precisava voltar a ser quem eu era a mais de cinco anos atrás. Talvez, assim eu conseguisse seguir minha vida mais facilmente, como eu costumava conseguir. Sairia para me divertir, faria as coisas que eu tanto amava e deixei de fazer, tentaria rever velhos amigos que já não os via há muito tempo, amizades que me fazem falta, como Maite, Dulce, Paulina, Guillermo, e muitos outros.

Mas antes de tudo, eu faria o que devia ter feito há muito tempo; iria me divorciar do Rodri. Não iria continuar com alguém que não amava, e que não me ajudava a ama-lo, que fazia o que fazia comigo como se tivesse direito ao meu perdão todas às vezes. Eu desejava voltar a sorrir como antes, a ser feliz sem pensar no depois, mesmo que por dentro ainda faltasse algo para que eu fosse completamente feliz. Christopher estava de volta, isso era o que realmente importava. E se um dia, perto ou distante, o destino nos unir, será o dia... Será o nosso dia. Porque saberei que tudo valeu a pena para voltar a viver aquele amor, porque saberei que eu, finalmente, serei feliz e que também o farei feliz.

Talvez, eu não devia ter lhe dito que eu era feliz no meu casamento. Ou talvez, eu nunca devesse ter me casado com um homem que eu não amava, apenas para cobrir as feridas de outro amor. Talvez, eu devesse ter seguido minha vida sozinha, curtindo a vida com meus amigos, até chegar alguém que realmente me fizesse esquecer Christopher.

"Vamos?"

Assustei-me e pisquei os olhos, voltando dos meus pensamentos. Olhei para o lado, e ele estava ali estendendo a mão para que eu saísse do carro. Já havíamos chegado ao hotel, e ele já havia desligado o motor e dado a volta para abrir a porta para mim. Suspirei pelo alívio de ver que o percurso não foi tão difícil como imaginei, já que eu o passei todo perdida em meus pensamentos.

Seguimos até meu quarto ainda em silêncio. Ao abrir a porta, eu entrei e me virei para me despedir, mas ele se adiantou.

"Talvez não tenha parecido, mas essa noite foi muito complicada para mim também" - eu assenti, sem saber o que dizer - "Há coisas que não são fáceis ficar lembrando, sabe?!"

"Parece que... Sabe, eu tenho a impressão de que antigamente nós conseguíamos lidar melhor com isso..."

"Parece que sim..." - ele coçou a costeleta com o dedo indicador - "E se tentarmos fazer isso agora?"

"A essa altura?" - ele deu de ombros, e eu sorri.

"Era esse sorriso que eu queria ver"

Ele segurou meu rosto com uma mão, e acariciou minha bochecha com o polegar. Meu sorriso se desfez ao mesmo tempo em que meu coração acelerava.

"Deixou de sorrir só porque eu falei" - disse, dando meu sorriso.

"É que não sei se consigo lidar" - sussurrei.

"Eu também não" - disse sério, me olhando nos olhos.

Por alguns segundos, permanecemos assim, nos mirando sem nos mexer. Até que ele começou a se aproximar, e eu era incapaz de me afastar. Quando comecei a sentir sua respiração, quente, tocar minha pele e se misturar à minha, eu fechei meus olhos, ansiando um beijo seu. Mas, os abri um segundo depois, surpreendida, dando um passo para trás.

"Aí estão"

Ouvi a voz do Rafael soando pelo corredor, e quando Christopher deu um passo para trás, eu dei um para frente, para sair do meu quarto e ver Rafael vindo em nossa direção. Olhei para Christopher, e ele estava com uma expressão fria, como costumava ficar quando Rafael estava presente, uma expressão bem diferente à que ele tinha segundos atrás.

"Procuramos por vocês" - Rafael disse, ao se aproximar - "Eu e mais um grupo de colegas do elenco fizemos uma social lá embaixo para nos despedir, já que muitos vão embora amanhã, e também para comemorar o início das gravações, por ter dado tudo certo"

"Ah..." - tentei sorrir, enquanto as batidas do meu coração se normalizavam - "Não estávamos sabendo"

"Foi de última hora" - assenti, olhando para Christopher, que parecia nem prestar atenção à conversa - "Bem... fica para a próxima..." - ele titubeou, olhando para Christopher - "já é tarde... Boa noite"

"Boa noite" - ri da cara que ele fez, quando apontou Christopher com o queixo, querendo dizer que ele estava bravo ou estranho - "Você não gosta dele, verdade?" - perguntei, quando Rafael já havia ido.

"Não tenho nada contra" - disse, dando de ombros.

"Não é o que parece" - levantei uma sobrancelha, quase sorrindo da cara que ele fazia de indiferença.

"Como ele disse, já é tarde. Boa noite" - se virou, mas eu segurei seu braço.

"Espera!" - ele se virou, e eu o soltei, surpreendida pela minha impulsividade.

"Sim?"

"Não, nada"

"Tem razão..."

"Em quê?"

"Eu ia fazer algo antes de ser interrompido"

Ele me segurou pela nuca com uma mão, e me apertou ao seu corpo pelas costas com a outra, ao mesmo tempo que pressionava seus lábios aos meus. Guiou-me para dentro do quarto, sem se afastar nenhum centímetro de mim, girando meu corpo até me encostar na parede ao lado da porta. Afastou seus lábios dos meus e colou nossas testas, e por longos segundos, permanecemos assim respirando com dificuldade. Nosso peito subia e descia acelerado.

Por várias vezes eu tentei abrir os olhos para olhar nos seus, mas não conseguia. Fiquei ali, respirando com dificuldade, sentindo a respiração quente e acelerada dele tocar meu rosto, enquanto eu agarrava bem forte sua camisa, na altura da cintura.

Lentamente, ele afastou nossas testas, alguns centímetros, descendo seu rosto pelo meu, me arranhando gostosamente com sua barba, até chegar ao meu pescoço, onde acariciou com a barba, o nariz... Os lábios. Era algo que eu não sentia há muito tempo, algo que eu não sentia desde a última vez que estivemos juntos.

Subi uma mão até sua nuca, e acariciei com a ponta das unhas, adentrando um pouquinho dentre seus cachos e voltando outra vez à nuca.

Um tempo depois, ele segurou meu rosto com as duas mãos e me olhou nos olhos dois segundos antes de unir nossos lábios de um jeito urgente, sem demorar a invadir minha boca com sua língua.

Era tão gostoso sentir isso outra vez, sentir o sabor daquele beijo... Era uma sensação tão deliciosa senti-lo morder meus lábios, sugar todo o ar da minha boca e ouvi-lo suspirar entre os beijos. Era tão bom que eu quase tive vontade de gritar. Eu desejava que aquele momento não acabasse que o mundo parasse para nós dois, e eu pudesse desfrutar toda a noite.

Meu coração acelerava tão forte, que eu sentia que ele estava quase saindo pela boca. Mas algo o fez acelerar ainda mais, de um jeito que eu não imaginei que fosse possível. Lembrei-me do que aconteceu na última vez em que estivemos juntos quando descansávamos em sua cama.

Lembrei-me das palavras proferidas por ele, que me feriram tanto, não pelo significado que tinham, mas sim por haver sido ditas por ele. Eu não suportaria passar por um momento como aquele outra vez.

O empurrei assustada, já sentindo meus olhos úmidos.

"Não posso" - disse, respirando com dificuldade - "Não posso" - repeti, para me convencer e me ajudar a ser forte e não voltar para os seus braços.

"Rodrigo?!" - ele mais afirmou que perguntou.

"Não posso suport-" - ele me interrompeu, antes que eu lhe confessasse o motivo que fez eu me afastar dele.

"Eu sinto muito, eu sei que é casada e tá feli-"

"Shhhh" - me aproximei rápido, cobrindo sua boca com minhas duas mãos, o impedindo de dizer aquelas mentiras que eu lhe disse dias atrás.

"Eu fiz tudo errado esta noite, verdade?" - me apoiei em seus ombros, e descansei meu rosto em seu peito. Balancei a cabeça para os lados, lhe respondendo, já sentindo as lágrimas caírem. Eu queria dizer que ele fez tudo certo, porém nas circunstâncias erradas - "Então porque está chorando?" - pegou meu rosto com as duas mãos, me fazendo mirá-lo, enquanto enxugava minhas lágrimas com o polegar.

"É melhor você ir para o seu quarto" - me afastei, indo até a porta. Ele passou a mão pelos cabelos e antes de sair, parou na minha frente.

"Eu sinto muito" - balancei a cabeça para os lados, mordendo minha bochecha para não começar a chorar ali naquele momento.

Ao fechar a porta, cobri a boca com a mão, mas não consegui mais segurar e me entreguei às lágrimas. Quem sentia muito era eu. Eu sentia muito mais que ele.