Esteja Onde Estiver

Anahi: Capítulo 10


No dia seguinte, acordei exausta pela noite mal dormida. Passei muito tempo chorando e recordando o beijo. Quando desci para tomar café, não o encontrei como nos outros dias. Só estava Pedro. Servi-me de uma xícara de café e me sentei a sua frente.

"E Christopher?" - perguntei, após cumprimentá-lo.

"Foi embora"

"Como embora? Para o set de filmagem?" - perguntei, mesmo sabendo que não.

"Não... Para o DF"

"Mas... mas por quê?" - perguntei, sentindo um nó na garganta.

"Ora, Annie... O autor só escreve a estória, o produtor dá vida" - ele disse, sorrindo - "Christopher não precisava estar aqui, vir foi uma opção dele"

"É... eu sei" - fiz uma careta.

"Agora que seu motorista pediu as contas, eu te levo para o set, sim?" - eu assenti. Pelo menos com Pedro teria mais assuntos durante o percurso.

Quando cheguei, fiquei passando o texto enquanto não tinha cenas para gravar. Mas, por mais que eu tentasse, não conseguia me concentrar. Não queria que ele fosse embora, e não sabia se ele foi embora chateado comigo. Outra vez não... Não queria que as coisas terminassem assim, justo quando nós dois estávamos começando a nos entender.

Eu estava distraída e não percebi quando Rafael se aproximou e se sentou ao meu lado, por isso, não tenho noção de quanto tempo ele ficou ali antes de começar a falar e me despertar dos meus pensamentos.

"Está mal, verdade?" - olhei para o lado, me deparando com ele e sorri.

"Não... estou bem, por quê?"

"Não é o que está parecendo, sabe?!

"Só estou um pouco cansada... Só isso"

"Mm... pensei que tinha algo a ver com a partida do Christopher..." - o olhei num reflexo, surpreendida.

"Não... claro que não..." - titubeei - "Por que teria?"

"Bem, eu estava tomando café na mesa atrás de você"

"Não o vi... Perdão"

"Tudo bem" - ele sorriu - "O fato é que alguns minutos antes de você chegar, Christopher estava lá com Pedro. E não pude deixar de ouvir a conversa. No fim, entendi que no passado vocês foram namorados ou algo assim... Estou errado?"

"Nã-ão... está certo... Faz muitos anos... Mas, o que você ouviu?"

"Eu acho que de tudo que ouvi, o que você gostaria de saber é que ele justificou a partida dele dizendo que foi um erro ter voltado, pois ele já havia perdido há muito tempo. Talvez isso faça algum sentido para você, não sei..."

"Ele disse isso?" - ele assentiu sorrindo e me puxou para um abraço, me dando um beijo no alto dos cabelos.

"Você merece ser feliz, sabe?! Pelo pouquinho que te conheço, às vezes penso que você não se dá conta disso" - me afastei e o olhei, e ele piscou me fazendo sorrir - "Sabe a parte boa? Que amanhã estamos voltando para o DF" - fiz uma careta de dúvida, e ele riu antes de explicar - "Eu vou matar a saudade da minha família, e acredito que você também já saiba o que fazer..."

"O que eu sei é que já está na nossa hora de ir gravar" - me levantei e o puxei pelo braço - "Vamos, levante" - ele se levantou e cutucou minha cintura, me causando cócegas.

Naquela noite, depois de gravar o dia todo, fiquei deitada e pensando no que Rafael me falou, e me recordando do beijo. Então, me dei conta que se ele me beijou, foi porque sente algo por mim, e não podia ser apenas desejo, porque se eu não estiver confundindo as coisas, ele disse que voltou por mim.

Por Deus! Eu não podia deixá-lo seguir acreditando que eu estava feliz no meu casamento. A partir daquele momento, eu começava a contar os minutos para chegar o dia seguinte e eu ir para casa pedir o divórcio ao Rodrigo e depois ir atrás do Christopher.

Minha vontade era pegar o celular e ligar para ele naquele momento, lhe chamar de tonto por ter acreditado na minha falsa felicidade e dizer que me esperasse, pois no dia seguinte, iríamos terminar aquele beijo da noite anterior. Mas precisei me controlar, porque essas coisas teriam que ser resolvidas pessoalmente. Meu peito quase explodia de tanta alegria e ansiedade, não podia acreditar que em breve eu o teria de volta.

Cheguei em casa no meio da tarde, e após tomar um banho, Conchita me encheu de perguntas sobre a viagem. Queria saber como foi tudo. Entreguei-lhe a lembrancinha que havia lhe comprado lá e ela adorou. E no decorrer da tarde, enquanto ela desfazia minha mala e arrumava minhas coisas, nós conversamos. E isso me ajudou a esquecer da vontade desenfreada que eu sentia de ir ao apartamento do Christopher.

Rodrigo chegou ao início da noite, eu o esperei tomar banho antes de conversarmos. Quando ele desceu, estava todo sorridente, dizendo que sentiu minha falta e pediu para Conchita servir o jantar. Mordi meus lábios para não falar que eu queria resolver minha vida logo, e achei que desta vez seria melhor jantar primeiro, afinal, aquela ansiedade toda estava me deixando faminta.

Durante o jantar, ele me perguntou como foi a viagem e eu lhe respondia cada pergunta o mais natural possível, sempre relacionado ao meu trabalho. Quando terminamos, eu lhe disse que precisávamos conversar e fomos para a sala. De todas as formas que imaginei como começaria esta conversa, não usei nenhuma.

"Rodrigo, eu não vou ficar enrolando para falar o que quero. Acho melhor ser direta..."

"Então seja" - me encarou, sério, sentado na mesa de centro de frente para mim.

Eu me levantei para estar o menos próxima possível dele quando eu dissesse, e parei atrás dele, do outro lado da mesinha.

"Eu quero me separar"

"O que disse?" - se levantando, ficando de frente para mim.

"Vai ser melhor para nós dois"

"O que aconteceu durante esta viagem para você chegar me pedindo o divórcio?"

"Aí está! Não aconteceu nada, e me dei conta, não só nesta viagem, mas há algum tempo, que não estamos casados, estamos acomodados. Não somos felizes..."

"Fale por você"

"Sim..., então eu não sou feliz, há muito tempo"

"Fala logo, Anahí... Que quer se separar porque aquele cara voltou e vocês estiveram toda esta maldita viagem juntos, rindo nas minhas costas"

"Você sabe, Rodrigo, sabe muito bem que tentei fazer este casamento dar certo. Eu abri mão das coisas que eu amava, eu mudei por sua causa. E você merece? Não, Rodrigo! Não merece, e você sabe por que e do que estou falando. A paciência se esgota quando rompe a realidade e mata os sonhos"

"Eu não vou te dar o divórcio, fique sabendo desde já e vá se acostumando. Não pense que vou te deixar livre para ficar com aquele idiota"

"Eu também não vou discutir isto com você. Isto você resolva com meu advogado" - saí, deixando-o falar sozinho, enquanto seguia falando que não me daria o divórcio.

Enquanto subia para o meu quarto, pensei e achei melhor sair um pouco e esfriar a cabeça, antes de ir atrás do Christopher. Então resolvi ir à casa da Clau, e assim já lhe contava a novidade. Arrumei-me, peguei minha bolsa e desci.

"Aonde vai? Já vai atrás dele?" - perguntou, quando me viu arrumada para sair. O olhei e ele já estava com um copo pela metade de alguma bebida na mão.

"Não, Rodrigo... Não vou atrás de ninguém... Só vou sair um pouco para esfriar a cabeça"

Durante o percurso até a casa da Clau, fui pensando em como organizaria minha vida a partir dali. Se tudo desse certo aquela noite - e eu não parava de desejar que sim - eu iria depois para a casa da minha mãe, mas beeem depois, bem mais tarde, depois que eu o curtisse muito. Na manhã seguinte lhe daria a notícia e pediria para ficar morando com ela, até achar um apartamento para mim (mesmo sabendo que nem preciso pedir, afinal, meu antigo quarto continua lá e não mudou nada), depois aproveitaria que Rodrigo estava trabalhando, para ir à minha - ainda - casa e recolher alguns pertences, e se der, recolher quase tudo de uma vez.

Uma coisa que eu não fazia nenhuma questão mesmo era ficar com a casa. Passei anos horríveis ali, e apesar dos bons momentos que também passei não me fazem esquecer os ruins. Aproveitaria também para conversar com Conchita, afinal, se eu vou, ela vai também, a menos que ela queira ficar. Mas isso eu tenho a absoluta certeza que não.

Bem, depois de entrar em contato com o amigo da minha mãe que é um advogado reconhecido pela sua competência nestes casos, eu teria que ir trabalhar e ver meu amor, e à noite vê-lo mais um pouquinho, e mais um pouquinho...

Eu não podia acreditar! Só de pensar, eu já me pegava rindo igual uma boba!

Quando contei à Clau que eu ia me separar de Rodrigo, eu não imaginei que ela fosse ter a reação que teve. Eu já esperava certa comemoração da parte dela, mas não tanta animação ao receber a noticia. A cada dia eu me dou mais conta do quanto ela fica mais louca com o passar do tempo.

"Isto é motivo para soltar fogos, ligar o som no volume máximo e sair gritando pela rua"

"Cale a boca" - mandei, rindo.

"Annie, hoje aconteceu um milagre! É motivo para comemorar"

"Vai continuar com suas gracinhas, ou vai ouvir meus motivos?"

"Mas nem precisa! Basta o Rodrigo existir para eu entender que qualquer mulher pediria a separação" - revirei os olhos, balançando a cabeça para os lados, rindo - "Mas conte o motivo desse sorriso todo que de tão grande já está fazendo eu sentir minha casa pequena. Eu sei que se livrar do idiota do Rodrigo é motivo de alegria, mas te conheço muito bem para saber que tem algo mais por trás desse sorriso"

"Eu já te falei que orégano é para colocar na comida, e não para cheirar ou fazer batida com cachaça"

"Há há. Ande, conte logo"

Contei-lhe tudo que aconteceu durante a viagem, incluindo o beijo e o que passou depois.

"Eu não acredito que você o afastou!" - ela disse, chocada - "Annie, você tinha o cara que ama ali te beijando e interrompeu o momento e o mandou ir embora? Você chorou e lamentou todos estes anos para que isto acontecesse, e quando acontece você não aproveita?!"

"Eu tive medo, caray"

"Medo?" - ela riu, sem humor - "Você está mais mudada do que imaginei, viu?!"

"É medo, sim, Clau. Tenta entender... Se lembra de o que aconteceu na última vez que estivemos juntos? Ele me chamou de tanta coisa, me machucou de um jeito que dói até hoje. Não ia suportar se aquela cena se repetisse"

"Ai, Annie..." - ela balançou a cabeça para os lados - "Mas se ele te beijou, é porque te queria..."

E então, lhe contei o que aconteceu no dia seguinte. Disse-lhe que ele foi embora sem se despedir, e mais tarde fiquei sabendo por que.

"Está vendo só?! Ele voltou por você, e se você não tivesse mentido que estava feliz, talvez, vocês já estivessem juntos"

"É, eu sei... E é por isso que voltei de viagem disposta a duas coisas"

"Quais?"

"Me separar..."

"Isto você já deu o primeiro passo, qual a próxima etapa?"

"Ir atrás dele e desfazer todos os mal-entendidos"

"Isto aí" - ela bateu palminhas, como uma criança de três anos.

"Espere aí... Até dias atrás você não o suportava... Por que está comemorando agora?" - perguntei, rindo.

"Porque, enquanto ele for o causador desse sorriso e me devolver a Annie de antes, eu vou gostar dele" - disse, e se aproximou me abraçando.

A abracei bem forte, agradecendo por todo o apoio sempre. De todos os meus amigos, a Clau foi um dos poucos que restou, e em todos estes anos, saber que ela estava ali, foi fundamental pra mim.

Quando lhe contei tudo o que planejei enquanto dirigia até sua casa, ela vibrou comigo e disse que ia torcer para que desse tudo certo. E isso era uma coisa que eu não parava de desejar também. Antes de ir embora, precisei prometer que ligaria no dia seguinte, lhe contando tudo.

Fui para casa pensando em que roupa vestir. Queria estar perfeita para aquela noite. Mas, por mais que eu pensasse, não conseguia me decidir em qual ficaria melhor para a ocasião. Resolvi, então, que chegaria em casa, tomaria banho, e depois experimentaria as roupas que me deixaram em dúvida. Conferi as horas, e me dei conta que não poderia demorar muito para me arrumar, ainda que eu achasse que fosse necessário, mas já não era tão cedo.

Após tomar banho, achei melhor preparar a bolsa com algumas coisas que levaria para a casa da minha mãe. Vesti um roupão e fui para o closet. Antes de começar a pegar as roupas, peguei a caixa preta primeiro. Ela iria comigo.

"Aonde vai com esta bolsa?" - ouvi a voz falhada de Rodrigo soar do quarto. Saí do closet com algumas peças de roupa que usaria no dia seguinte na mão.

"Oras, quando um casal de separa, alguém sai de casa"

"Eu já disse que não te darei o divórcio" - disse, colocando um copo quase vazio em cima da cômoda, o que me fez pensar que ele esteve bebendo desde que eu fui à casa da Clau.

"E eu já disse que não vou discutir isto. Estou indo para a casa da minha mãe"

Terminei de arrumar a bolsa, aos olhos de Rodrigo, que me observava em silêncio. Ao fecha-la, deixei-a em cima de uma poltrona do canto do quarto e com o peito cheio de ansiedade, comecei a caminhar para o closet, pois naquele momento eu começaria a me arrumar para a minha grande noite. Mas, algo me fez parar antes de chegar à porta. Os braços de Rodrigo envolveram minha cintura, e seu queixo descansou em meu ombro. Senti um forte cheiro de bebida, quando sua respiração tocou a pele do meu pescoço. Meu coração disparou, enquanto eu tentava me livrar dele.

Ele me segurou pelos braços, apertando-os fortemente, me fazendo gemer pela dor. Virou-me de frente para ele, e me puxou para um beijo forçado, pressionando nossos lábios, segurando minha cabeça pelos cabelos acima da nuca. Eu sentia fortes puxadas nos meus cabelos a cada tentativa que eu fazia para me afastar. E eu senti medo, porque ele estava bêbado, e eu já não sabia do que ele era capaz.

Quando afastou nossos lábios, depois de inúmeras tentativas de invadir minha boca com sua língua, ele me arrastou pelo braço até a cama, onde me jogou com brutalidade. Com a queda, meu roupão subiu um pouco, deixando minhas pernas a mostra. Eu tratei logo de ajeitar, ignorando as mexas de cabelo que caiam sobre meu rosto.

"Não adianta..." - ele disse se ajoelhando na cama e caminhando até mim - "Você não vai precisar dele" - se sentou sobre minhas pernas, me prendendo sobre a colchão com suas pernas - "Vou te mostrar que você não pode viver sem mim, vou te lembrar o que você gostava tanto quando namorávamos"

"Eu já falei que você não iria me machucar mais. SAI DE CIMA DE MIM!" - gritei, o empurrando. Ele quase tombou para o lado, mas se equilibrou a tempo de me prender novamente com suas pernas.

"Escuta aqui, Annie" - ele apertou, agressivamente, minhas bochechas, me obrigando a olhá-lo - "É melhor você colaborar..., e no fim, você verá o quanto foi prazeroso. E vai esquecer esta estupidez de separação"

"NUNCA! E você não vai me obrigar mais"

"Vou te mostrar que sim"

Ele desatou o laço do roupão. Eu tentei impedir que ele tirasse, mas ele me impediu, esticando meus braços, apertando-os sobre o colchão. Ele abriu o roupão com rapidez e gana, se deliciando com minha nudez. Não resisti olhar para o seu rosto e observar seu olhar sobre mim, e me entreguei às lágrimas. A partir daquele momento, eu fechei os olhos e desejei que tudo aquilo terminasse de uma vez. Minha alma já estava ferida demais, àquela altura já derramava lágrimas de sangue, e eu sabia que seria inútil lutar contra um homem bêbado e tomado pela raiva.

Por isso, enquanto chorava, tentei ignorar as fortes pressões e mordidas que ele dava nos meus seios, apenas mordia os lábios obrigando-me a calar a minha dor. Ignorei também, os apertos tão agressivos que ele deu nos meus braços para impedir que eu escapasse. E apertei forte meus olhos, me obrigando a ignorar que ele apenas afastou minha calcinha, na pressa que tinha de me ter.

Eu fiquei por alguns minutos deitada imóvel na cama, tentando conciliar pesadelo e realidade. Depois, quando já não suportava mais, soltei todas as lágrimas que segurei momentos atrás. Puxei o lençol me cobrindo até o pescoço e me encolhi na cama, aliviada por Rodrigo ter saído. Ele me deixou jogada na cama, se levantou e saiu, e pelo barulho que ouvi vindo lá de baixo, ele saiu batendo porta.

"Niña" - ouvi a voz de Conchita minutos depois, mas não consegui me virar para olhá-la - "Oh, niña!" - se aproximou rápido, se sentando ao meu lado - "O que aconteceu?" - eu não conseguia dizer, só chorar - "Shh... Estou aqui... Shh" - me abraçou por trás, balançando meu corpo para os lados - "Vai ficar tudo bem, sim?!" - me deu um beijo no alto dos cabelos - "Ele saiu... Pode ficar mais tranquila... Eu estava na cozinha preparando um chá quando ouvi o barulho da porta batendo. Olhei pela janela, e era o Sr. Rodrigo saindo apressado e furioso. O que ele te fez, minha menina? Dá para ouvir seu choro lá da escada..."

Quando eu já estava mais calma, e já conseguia falar, consegui contar para Conchita o que aconteceu. Ela ficou espantada e me aconselhou a denunciá-lo, então eu disse que iria me separar. Desconfiada, ela me perguntou se isto aconteceu todas às vezes em que eu fui dormir no quarto de visitas, e eu lhe confessei a verdade. Mas que nenhuma das outras vezes foi tão violenta como desta vez. Ela me ajudou a me levantar, arrumou meu roupão no lugar e refez o laço. Depois me guiou até o banheiro.

"Vai, menina... Toma um banho quentinho, enquanto eu separo uma roupa confortável para você"

"Conchis..." - sussurrei, de frente para o espelho - "Eu vou sair"

"Aonde vai a essa hora?"

"Embora, Conchis, embora... Preciso sair logo daqui" - ela abaixou a cabeça e assentiu.

"Será melhor.,. Vá para a casa da sua mãe" - eu assenti - "Vou pegar sua roupa" - disse, saindo do banheiro.

De frente para o espelho, desatei o laço do roupão, e ao afastar e deixar que ele escorregasse pelo meu corpo, olhei meu reflexo no espelho e com a mão sobre os lábios, voltei a chorar. Mais do que todas as outras vezes, meu corpo estava marcado pela violência do Rodrigo; mordidas, apertões por todo o corpo. Passei meus dedos levemente sobre algumas, e senti a dor tanto física quanto a dor que sentia minha alma. Não podia acreditar que eu realmente estava vivendo aquela noite, quando eu esperava por uma tão diferente, tão linda.

Liguei a ducha e voltei para frente do espelho, me via e não me reconhecia. E não tanto pelas marcas, mas pela ausência daquela luz, daquele sorriso que eu tinha antes de chegar em casa. Fechei meus olhos e tentei não chorar mais, tentei apagar aquelas imagens, mas não conseguia, doía demais.

"Oh, niña..." - Conchita se aproximou, me abraçando - "O que aquele homem te fez!? Como pôde fazer mal à você?"

"Por que, Nana?" - perguntei, chorando - "Por que comigo? Por que hoje?"

"Tudo vai ficar bem... Shh... Agora isso acabou, não vai voltar a passar"

"Hoje, Nana..." - solucei - "Hoje que eu ia falar com o Christopher... Dizer que o amo, dizer tu-tudo"

"Oh, Virgenzinha, tenha piedade da minha menina... Tenha piedade" - disse, acariciando minhas costas - "Vamos, menina... Entre... Depois de tomar banho se sentirá um pouquinho melhor" - me guiou até o box - "Vou preparar um chazinho para você tomar antes de ir... Já volto, sim?!"

Entrei no box e deixei a ducha molhar meu rosto e cabelos para me ajudar a esquecer, e fazer toda aquela dor ir embora pelo ralo junto com a água. Mas não adiantou, por mais que eu desejasse, a água ia, mas a dor permanecia ali. Peguei a esponja e esfreguei forte todo o meu corpo na esperança e desejo de me livrar de momentos atrás, quando Rodrigo tocou meu corpo.

Quanto mais eu me lembrava daqueles momentos, mais eu sentia náuseas e raiva, me levando a intensificar a pressão da esponja sobre a minha pele. E eu não me importava da dor que sentia quando pressionava alguma mancha causada pelos apertões dele, eu só queria me livrar daquela sensação de ainda ter algum vestígio dele em mim.

Quando já me sentia esgotada pelo esforço, abandonei minhas mãos ao lado do corpo, e respirei com dificuldade, em busca de ar. Encostei-me ao azulejo, e me deixei escorregar até o chão e chorei... Pus para fora toda a dor, magoa e raiva que eu sentia, através das lágrimas.

Não sei por quanto tempo fiquei ali debaixo d'água agachada, mas só me dei conta quando Conchita voltou e me encontrou ali no chão chorando. Abriu o vidro do box e me ajudou a levantar. Não consegui afastar a dor dos meus pensamentos e observar o que ela fazia, mas era algo como lavar meus cabelos enquanto cantarolava uma melodia serena que foi me acalmando aos poucos até meu choro ser reduzido a soluços com largos intervalos de tempo.

Ao me enxugar, me olhei novamente no espelho, e me dei conta que não foi pesadelo, foi real, e as manchas estariam ali por alguns dias me lembrando disto. Dei-me conta também, que por um descuido estúpido, eu havia me esquecido de tirar a aliança antes de viajar, quando eu já estava decidida a me separar. E depois do que aconteceu esta noite, vê-la ali no meu dedo, me dava mais raiva e me causava mais dor.

A tirei do meu dedo no mesmo instante e deixei ali mesmo sobre a bancada da pia. Conchita me observou em silêncio, e após me ver abandonar a aliança ali, me pegou pelo braço me guiando para o quarto, talvez, por querer me ajudar a livrar-me de uma vez daquilo.

"Desce com as minhas coisas enquanto eu me visto?" - pedi num sussurro. Ela assentiu, sorrindo fraco.

Ainda enrolada na toalha, peguei meu celular na bolsa e me agachei ao lado da cama. Mergulhei meu rosto sobre os joelhos e voltei a chorar. Eu precisava ligar para minha mãe e avisá-la que estava indo para lá, ou talvez ligasse para a Clau pedindo abrigo aquela noite para assim tê-la ao meu lado para conversar e ser consolada. Eu precisava das duas comigo aquela noite, eu precisava do abraço das duas para me passar a segurança que estava tão ausente em mim.

Mas ao desbloquear meu celular, admiti que só havia uma pessoa que eu precisava mais do que nunca comigo naquele momento. Após marcar o número, abracei minhas pernas e fiquei esperando que me atendesse. Chamava muito, e tive medo que não me atendesse por causa do horário. Já sentia um nó se formando na minha garganta.

"Alô" - ouvi sua voz rouca - "Alô?" — eu queria falar, queria responder, mas não conseguia. Se eu tentasse, ia voltar a chorar, e tentar me livrar daquele nó - "Anahí, é você?" — eu queria tanto falar, que meu coração se apertou, me causando dor - "Anahí?"

"Christopher" - sussurrei, com a voz falha.

"Anahí, o que você tem?" — ouvi sua voz preocupada. Coloquei a mão sobre a boca, me impedindo de chorar, e apertei os olhos liberando grossas lágrimas - "Annie? Está aí?"— perguntou, quando segui sem responder.

"Posso..." - tentei falar - "Posso..."

"Está chorando? O que você tem?" — apertei forte, novamente, meus olhos, e mordi meu lábio inferior buscando forças - "Annie, me responda, o que você tem?"

"Onde está?" - consegui perguntar, num sussurro.

"Em casa"

"Posso... posso ir aí?"

"Claro que pode! Quer que eu te busque?"

"Não"

"Anahí..."

"Não..." - o ouvi respirar fundo - "Estou indo"

Quando desci, Conchita estava próxima à porta da sala com uma xícara na mão. Ao lado dela, no chão, estava minha bolsa com minhas roupas e a caixa preta.

"Toma, beba este chazinho" - disse me entregando a xícara.

"Não quero, Conchis... Quero sair logo daqui"

"Por favor, menina... Só um pouquinho para se acalmar" - a olhei e me dei conta que se eu saísse sem tomar um pouquinho que fosse do chá, não a deixaria em casa tranquila. Peguei a xícara da sua mão e tomei um pouquinho, e sentir aquele líquido morninho descendo pela minha garganta, me deu uma sensação melhor no corpo - "Quer que eu chame um taxi?"

"Não... vou com meu carro"

"Niña..." — disse, preocupada - "Consegue dirigir?"

"Sim, Conchis. Não se preocupe. Vou devagarzinho"

"Por favor... Se cuida, sim?" - assenti, sorrindo, enquanto solvia mais um pouquinho de chá.

"Nana... Eu não estou indo para a casa dos meus pais... Vou para o apartamento do Christopher" - ela me olhou preocupada - "Já liguei, e ele está me esperando. Depois vou para a casa da minha mãe. E... Conchis..., amanhã ou no mais tardar depois de amanhã vou te ligar ou vir aqui para conversarmos sobre você... Se você vai comigo... Ou vai ficar aqui" - terminei a frase sussurrando, de cabeça baixa.

"Se você me quiser... Vou sempre onde você for minha menina" - deixei a xícara sobre a mesa ao lado, e a abracei tão forte, sem poder conter o carinho e o amor que eu sentia por aquela senhora tão linda, pela minha Nana - "Agora vá" - disse, desfazendo o abraço e fazendo o sinal da cruz em mim - "Vai dar tudo certo, vou ficar aqui pedindo à Deus e à Virgem"

Quando cheguei ao seu prédio, ainda fiquei dentro do carro por alguns minutos tentando conter o choro. Não sei como cheguei até lá, nem quanto tempo passou desde que me despedi de Conchita. Eu só precisava ouvir a voz dele, e dos seus braços me protegendo e dizendo que estava tudo bem. Eu não conseguia deixar de pensar que Rodrigo estragou não só os últimos anos da minha vida, mas também e principalmente, aquela noite, que eu havia desejado e idealizado com tanto carinho.

Não podia deixar de pensar que ele arrancou toda a ansiedade e paixão que enchiam o meu peito por aquela noite, e no lugar colocou dor. Eu queria apagar tudo o que aconteceu, e recomeçar aquela noite como eu tanto queria. Mas não conseguia, eu não podia apagar da minha memória os últimos momentos que tive, porque o meu corpo era o reflexo deles, e minha alma ainda sentia o gosto amargo da dor.

Enxuguei as lágrimas e peguei minha bolsa. Ao pedir o porteiro para ser anunciada ele disse que eu podia subir, pois já estava avisado da minha chegada. Enquanto subia, tentei me lembrar de respirar e manter a calma, enquanto mantinha meus olhos fechados, impedindo que novas lágrimas caíssem.

Mas, ao chegar à porta do seu apartamento, meu peito subia e descia acelerado enquanto o esperava vir abrir.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.