Esteja Onde Estiver

Anahi: Capítulo 3


Naquela noite eu fiquei pelo menos uns cinco minutos parada em frente ao prédio dele pensando se deveria ou não subir, e me perguntando o que eu estava fazendo lá. Eu poderia ter deixado que a organizadora entregasse aquele convite assim como ela faria com todos os outros. Mas ao ver o nome dele, peguei o convite e coloquei na bolsa sem que ninguém percebesse.

Eu sabia que era loucura eu estar ali. Já havia meses que nós dois não nos víamos pessoalmente, que nos falamos por telefome apenas algumas vezes. Desde que a banda acabou, nosso contato foi limitado e talvez com isso meu sentimento por ele tenha sido finalmente extinto. Eu precisava enfrentar isso, precisava provar a mim mesma que já não o amava, e que fiz a escolha certa. E queria ouvir dele, e ver nos olhos dele que ele também já não sentia nada por mim.

Peguei minha bolsa e sai do carro, ativando o alarme em seguida. Ao me aproximar do prédio, a porta de vidro foi aberta, então subi a escadaria até a outra entrada de vidro. Ao passar pelo porteiro ele sorriu e me desejou boa noite. Ele já me conhecia, por eu ter frequentado tanto aquele prédio anos atrás. Eu correspondi o sorriso e também desejei boa noite. Perguntei se Christopher estava em casa. Ele disse que sim, e disse que eu podia subir. Mordi o lábio inferior na dúvida entre pedir para ser anunciada ou subir e bater na porta dele de surpresa. Optei pela segunda opção, para o caso de eu desistir antes de chegar à sua porta.

Enquanto subia pelo elevador, não pude deixar de lembrar. Uma vez, saímos da Televisa e fomos para o apartamento dele. Quando estávamos no elevador, fiquei olhando para a câmera enquanto algo me passava pela cabeça, ele me perguntou o que eu tinha, então perguntei se o porteiro desconfiava de nós dois. Ele disse que além dele ser um senhor que não parecia ligar para esse tipo de coisa, se fosse de importância mesmo, já teria saído algo na imprensa. Falei com ele que se era assim, então nós poderíamos ficar agarradinhos ali dentro. Ele me chamou de louca, então o chamei de bundão.

"Quer ver quem é o bundão?" - ele disse largando as nossas bolsas no chão.

Ele se aproximou de mim, me segurando firme pela cintura, me apertando entre ele e a parede fazendo meu coração acelerar. Nossas faces estavam bem próximas e nossas respirações já se misturavam. Ele olhava dos meus olhos para os meus lábios.

"Bundão" - eu disse séria, olhando para os lábios dele.

Ele uniu nossos lábios e os movimentava de maneira rápida e intensa. Meu coração bateu ainda mais acelerado. Eu levei minhas mãos até seus cabelos e mergulhei meus dedos por entre seus cachos, puxando-os de leve a cada sensação que me invadia.

Ele desceu seus beijos para o meu pescoço me fazendo permanecer com meus olhos fechados sentindo, e finalizou com uma mordidinha. Aproximou-se do meu ouvido e ficou mordendo e passando os lábios ali.

"Quem é bundão agora, hein?" - ele disse baixinho no meu ouvido.

Eu não respondi. Permaneci de olhos fechados por mais um tempinho tentando normalizar os batimentos no meu peito. Quando abri meus olhos, ele estava na minha frente, me olhando. Suas mãos ainda estavam na minha cintura.

"Você" - respondi colocando minhas mãos no bumbum dele.

Ele deu um sorriso torto e se afastou quando a porta do elevador se abriu. Eu saí e comecei a caminhar na direção do apartamento dele enquanto ele pegava nossas bolsas no chão. Logo o senti atrás de mim.

"Agora acho que mais uma pessoa sabe sobre nós" - ele disse enquanto pegava as chaves no bolso.

Ao sair do elevador, fui até a porta do seu apartamento e fiquei parada olhando-a enquanto mordia meu lábio inferior. Eu desejei ser forte o suficiente para não deixar minhas emoções me trair. Minhas mãos suavam, então as esfreguei no meu jeans e toquei a campainha de uma vez. Ouvi um "Espere um minuto", o que me deixou ainda mais nervosa, e quase recuei e fui embora um instante depois, se ele não tivesse aberto a porta.

Ao abrir a porta, ele ficou surpreso em me ver ali diante de si. Ele arrumava a blusa, que provavelmente acabara de vestir, mas parou ao me ver. Ele vestia um jeans e estava descalço. Ensaiei um sorriso, tentando parecer calma e natural.

"Você costuma deixar seus amigos no corredor?" - ainda em silêncio, ele me deu passagem para que eu entrasse - "Espero não está atrapalhando"

"Não, cheguei a pouco tempo" - disse fechando a porta.

"Tudo bem?"

"Tudo, e com você?" - perguntou se aproximando e me cumprimentando com um beijo no rosto, relaxando mais o clima.

"Também... tem tempo que não nos vemos"

"Verdade... Senta?!" - me indicando o sofá.

"Estou bem de pé, não vou demorar" - ele assentiu.

"Como está tudo? A novela, o CD..."

"Estou terminando de gravar a novela, e o CD está vendendo bem, estou bem contente. E você?"

"Estou terminando de gravar meu CD, no meio da produção do filme, e o livro sigo escrevendo, fazendo uns ajustes.... Em breve já posso publicar"

Olhei em volta e notei que havia uma taça com vinho sobre a mesa de centro, e ao lado seu notebook, e uma música suave soava do aparelho de som. Surpreendi-me por um segundo por vê-lo ouvir esse tipo de música.

"É para relaxar" - o olhei com uma expressão confusa - "A música... É para relaxar. Estava trabalhando no livro quando você chegou"

"Então, estou realmente atrapalhando, verdade!? Serei breve" - eu prometi antes dele dizer qualquer coisa - "Vim te entregar isto" - peguei o convite do meu casamento dentro da bolsa e o entreguei. Ele analisou por alguns segundos, primeiro sério para depois dar um sorriso torto.

"Pensei que seu convite seria rosa, cheio de fadas e não sei mais o que" - disse e deu uma gargalhada rouca em seguida.

"Há! Muito engraçado!" - fiz uma careta.

"Obrigado por convidar" - ele agradeceu, balançando o convite segundos depois de ficarmos em silêncio.

"Você vai, verdade?"

"Vou tentar"

"Você precisa ir. No dia só terá as pessoas que mais amo presente"

"Annie..." - ele não terminou, e então vi sua mandíbula tremer.

Neste instante, uma música começou a tocar. Sem palavras para dizer, ficamos calados, nos mirando.

"En un beso quedo para siempre, nuestro amor sellado en un instante"

Ele estendeu sua mão direita para mim, dando um sorriso torto.

"Uma última dança?" - franzi o cenho.

"Está louco? Esse tipo de coisa não tem nada a ver com nós dois" - disse rindo.

"Vai aceitar meu pedido ou vai me deixar no vácuo com a mão estendida para você?"

Mexi nas minhas pulseiras, joguei meus cabelos para trás... e sorri, por fim. Larguei minha bolsa e minhas chaves em cima do sofá e uni minha mão à dele. Ele me puxou para junto de si. Descansei minha cabeça sobre seu coração, ouvindo os batimentos ritmados, enquanto nos movíamos vagarosamente pelo espaço que nos cercava. Seus lábios acariciavam o alto dos meus cabelos.

"Cuantas veces intente decirte, lo que siento cuando estamos cerca, pero mis palabras se perdieron, como el agua se pierde en la arena"

"Você ainda não me respondeu" - sussurrei.

"O que?"

"Se vai ao meu casamento"

"Melhor que eu não vá"

"Vou precisar de você este dia"

"Para que?"

"Para me ajudar com o vestido, quando eu estiver pulando a janela" - ouvi sua risada sussurrada - "Não estou brincando"

"O dia nem chegou e já pensa em fugir?"

"Para, Christopher" - ele ficou sério, e me apertou ao seu corpo - "Você sabe do que falo. Só voc-"

"Shh.." - ele não deixou eu terminar.

"Y estoy aqui, estoy contigo, te sigo amando, te quiero y grito, que estoy aqui, con la locura, con la ternura, amandote hasta el fin por siempre..."

"Por que está fazendo isso?" - perguntei, sentindo um nó se formar - "Eu preciso ouvir de você"

"Shh.." - acariciando meus cabelos.

"Faça 'shh' para sua avó" - me irritei, e tentei me afastar, mas ele não deixou. Só neste instante percebi que já não estávamos dançando a um tempo - "Não fica calado, Chris. Diz o que quer dizer de uma vez" - apoiei minhas mãos em seu peito, e descansei minha bochecha ali, entre elas.

Ele permaneceu em silêncio. O nó que se formara em minha garganta doía e queimava, já não podia suportar. Soltei-me dele, peguei minha bolsa e minhas chaves e saí do apartamento batendo a porta atrás de mim. Ele não me impediu. Enquanto esperava o elevador chegar, lutava contra as batidas no meu peito e contra as lágrimas que ameaçavam cair. Apertei meus olhos e me chamei de fraca mentalmente, várias vezes. Ao longe, ainda podia ouvir a música soar me perturbando ainda mais, e me fazendo querer fugir o mais rápido possível daquele lugar. Fora um erro ir até ali.

"Cuantos sueños por vivir quedaron, escondidos en rincones nuestros, pero hoy esta cancion nos pide, que empezemos a vivir denuevo...

... La mañana nos traera temprano, otro tiempo con caminos nuevos.."

Levantei-me num instante para interromper aquela música que me perturba tanto, de uma vez. Primeiro um soco, depois dois tapas, para enfim meu dedo acertar o botão. Ainda que minha respiração seguisse agitada e meu coração estivesse batendo muito rápido, estava me sentindo um pouco aliviada pelo silêncio do quarto. Voltei para a cama e peguei meu celular na mesa de cabeceira. Ao achar o número na agenda, apertei o SEND.

"Clau, preciso de você" - choraminguei - "Pode vir aqui?"

Quando ela chegou, deitei minha cabeça em suas pernas e contei tudo; todas as lembranças que rondaram pela minha cabeça durante todo o dia, sobre o convite de Pedro para a série, sobre a estória e por fim sobre a música que me fez ter aquela maldita lembrança do dia que fui lhe entregar o convite do meu casamento. Ela me ouviu todo o tempo sem me interromper, apenas sussurrava alguns "mm-hn's".

"O que eu posso dizer? Quero dizer, eu saí de casa pronta para te dá um tabefe por ter me tirado da cama. Afinal, me levanto às 5hrs para ir para a TV Azteca, você sabe. E durante todo o caminho eu pensei no ângulo perfeito para que bagunçasse todo o seu cabelo perfeito" - a olhei e ela fez uma careta, então ensaiei um sorriso. Palhaça..! - "Repetia mentalmente que tinha que ser por algo realmente grave" - a olhei novamente e fiz um beicinho - "Agora estou aqui pensando.. Um tabefe não.. Você precisa de um balde de água gelada na cara e de um tratamento psiquiátrico" - disse e me deu um leve tapinha na testa.

"Eu precisava de verdade desabafar..."

"Se eu pagar um parque de diversões para te deixar um dia inteiro naquele brinquedo 'Labamba', será que no fim do dia seus miolos voltam para o lugar?" - ela perguntou mais para si que para mim - "Só me diz, por favor, que você aceitou o convite do Damián. Vai! Eu ainda tenho esperanças em relação a você" - disse fechando os olhos e cruzando os dedos.

"Você acha que eu vou aceitar depois de ouvir essa música? Eu disse que iria pensar, mas já me decidi. Nem se Rodri deixasse, eu-"

"Peraí, peraí" - ela não me deixou terminar - "Rodrigo tem que deixar alguma coisa?"

"Ele é meu marido"

"Ah, que bom você se lembrar disso, porque desde que eu cheguei você só falou de outro cara. Wera, é sério. Aceita esse convite, volta a fazer o que você ama. Quem sabe esta seja a chance que a vida está te dando para que você volte a ser feliz. Sem contar que é algo totalmente diferente do que você estava acostumada. Não era o que você sempre dizia estar esperando, tipo uns mil anos atrás?!" - a olhei e ela piscou - "E de quebra para de pensar no passado"

"Eu não quero reviver nenhum passado" - lamentei.

"Então manda esse passado se ferrar"

"Não consigo... É como se fosse algo inacabado, sabe!?"

"Sinceramente? Inacabado só se for para você. Há quanto tempo não tem notícias dele?" - eu ia dizer que fazia quase um ano, quando conversei com a mãe dele e ela me disse que ele estava trabalhando e estava bem, mas ela não me deixou falar - "Estou perguntando dele, quanto tempo faz que ele não te manda notícias?"

"Bem, cinco anos..."

"Cinco anos que ele não te manda notícias, nem e-mail, nada?! E você ainda fica com essa ladainha de 'algo inacabado'? Acorda para a vida, Anahí!" - ela estalou os dedos na frente do meu rosto - "Inacabado aqui é o seu cérebro, pelo amor de Deus!"

"Eu sei... parece loucura..."

"Tenta entender de uma vez por todas, amiga; a história de vocês acabou no momento em que terminaram o namoro, e esse fim foi concretizado a partir do momento em que você aceitou namorar com o Rodrigo, e tempos depois, noivar"

"Eu só queria que ele tivesse falado algo na última vez que nos vimos. Qualquer coisa. Talvez eu não estivesse assim..."

"Você está se destruindo, e nada disso vale a pena" - ela disse, acariciando meus cabelos - "O cara te deixou casar com outro homem, e foi embora sem dizer uma palavra. Ele te mandou para o quinto dos infernos, de uma maneira indireta. E sabe o que é pior?" - a olhei para ouvir a resposta - "Você foi tão otária, que obedeceu ele direitinho. Porque meu Bem, se o que você vive não for um inferno, então nunca me chame para uma temporada no seu céu!"

"Te ouvir falar tudo isso em voz alta dói mais e faz parecer ainda mais difícil do que quando eu penso sobre tudo o que me aconteceu. É difícil esquecer que eu acreditava que ele fosse o homem da minha vida, entende?"

"Essa sua obsessão pelo Christopher é irritante. Vou te falar pela milionésima vez: esquece esse cara. A essa altura, ele deve está casado, com uma penca de filhos catarrentos chutando a canela dele, e a última coisa que poderia passar pela cabeça dele é a sua ex namorada do México que ele namorou há uns mil anos atrás e que foi uma vaca que o traiu"

"Clau, você é tão amarga às vezes. Talvez seja por isso que não tenha filhos até hoje"

"Annie, primeiro que eu não sou amarga. Sou realista, é diferente. Do que adianta viver um passado que nem mesmo aconteceu? E segundo que se não tenho filhos, é porque eu e Yahir não queremos. Não vou desperdiçar minha juventude presa a filhos, quero aproveitar ainda mais nossa vida a dois. Quando eu achar que estou pronta, com certeza um bebê será bem vindo" - ela disse, firme e séria.

"Desculpe, Clau. Não queria ser uma idiota"

"Tudo bem. Na verdade isso me deixa um pouco aliviada" - a olhei franzindo o cenho - "Te faz parecer com a velha Annie. Aquela filha da puta que falava o que queria e o que pensava na cara das pessoas, e quem não gostasse... que se danasse. Escuta.. O que acha de sairmos sábado?! Só nós duas como nos velhos tempos. Bebemos até cair e voltamos para casa de táxi, depois de dançar a noite toda!? Podemos chamar a Angel e a Maite, se quiser.

"Rodri não vai gostar, você sabe..." - disse fazendo uma careta.

"Quem se importa? É tempo de mudar... Começa a treinar um 'vai à merda', para quando ele te proibir de sair com sua amiga"

"Clau..? Mm.." - me sentei, olhando para o colchão enquanto coçava meu pulso.

"Desembucha! Eu sabia que Deus seria bondoso comigo e faria valer realmente a pena ter vindo aqui para ouvir a novela de sempre"

"É que assim... tem algo que eu nunca... mm... contei"

"Ual! Obrigada, Virgenzinha!" - disse juntando as mãos e olhando para o teto.

"Clau, cresce!" - disse revirando os olhos.

"Já sou bem crescidinha para ouvir sobre sexo!"

"E quem te disse que o que tenho para contar é relacionado a sexo?" - perguntei franzindo o cenho.

"Você está quase abrindo um buraco no seu pulso. E há mais de dez anos, quando você fica assim... Mmm..." - e riu.

"Okay, é sobre sexo!"

"Ain, vaca! Eu sabia! Conta logo" - cruzou as pernas com um travesseiro em cima.

"Sabe essa última recordação que tive?" - ela assentiu - "Não acabou aí, quero dizer... eu não entrei no elevador e simplesmente fui embora..."

"Ai-meu-Deus!" - disse pausadamente, e depois levou o dedo indicador à boca, comendo o cantinho da unha esperando que eu terminasse de contar.