Entre Irmãos

O dia em que tudo mudou.


Eu estava em mais uma das entediantes aulas que antecedem as férias quando a diretora me chamou. Pensei em tudo que já tinha feito de errado na minha vida. Tentei encontrar um motivo para ter sido chamada, não encontrei.

Sou uma boa aluna, nunca troquei mais do que duas palavras com qualquer um naquela escola. Eles me excluem pelo fato da minha mãe ser drogada e por eu não esconder de ninguém que odeio os seres humanos. Ando pela escola com se fosse um fantasma, ninguém me nota. Os professores nuca lembram quem sou. Eu adoro ser excluída.

–Hannah está me ouvindo?-Perguntou a diretora tirando-me dos meus pensamentos. – Pode ir para sua casa querida. Você é boa aluna, não precisa ficar aqui nessa semana. Vá para casa e descanse. Entregue esse papel ao guarda e até o ano que vem.

Sem dizer nada peguei o papel e voltei para a sala. Entrei peguei meu material e sai. Como sempre ninguém me notou.

Mesmo a escola sendo apenas a duas quadras da minha casa eu não estava com vontade de ir até lá. Comecei a andar sem rumo, pensando na minha vida.

Sou uma adolescente de quinze anos. Minha mãe é drogada e pode morrer a qualquer momento, meu pai nos deixou quando eu era pequena, o resto da minha família está em outro país ou morto. Não me importo se estão vivos ou não. Eu nunca tive amigos. Minhas únicas companhias são meus fones e meus livros. Adoro desenhar, mas não é algo que faço muito.

Percebi que estava na esquina da minha rua. Olhei para minha casa fiquei chocada com o que via. Ela estava cheia de policiais e médicos. Dois homens saíram de lá carregando um corpo que reconheci ser o da minha mãe.

Eu não sabia o que fazer. Sabia que isso poderia acontecer a qualquer momento, porém não estava preparada. Corri até lá chorando e gritando coisas sem sentido. Ajoelhei-me na calçada sem saber o que aconteceria a partir daquele momento. Senti mãos me carregando e alguém injetando algo em mim.

Acordei em um lugar branco demais. Em uma poltrona do lado da minha cama tinha um homem loiro que estava lendo um livro que não reconheci.

–Onde estou? – Perguntei mesmo sabendo a resposta. –Quem é você?

–Você está em um hospital e eu sou Willian, mas pode me chamar de Lian. Agora que já sabe quem sou, você tem que ir.

–Ir para onde?

–Para o seu novo lar- Disse me levando até a janela. – Vá antes que alguém chegue.

–Está me dizendo que vou fugir de um hospital?

–Sim. Pule e vá até o estacionamento. Lá vai encontrar um carro todo preto, vai ter um garoto te esperando.

Sem outra opção eu pulei. Chegar ao estacionamento não foi difícil. Difícil foi saber qual dos carros pretos era o certo. Fui até o único que tinha um garoto. Quando ele viu que eu me aproximava perguntou:

–Você é Hannah? – Apenas assenti. –Entre vou te levar para o acampamento.

Sem dizer mais nada ele entrou no carro. Assim que entrei, ele ligou o carro e começou a dirigir. Passamos meia hora em silêncio até que ele falou:

– Estou com fome. Vamos parar no posto e comprar alguma coisa comestível.

–Por mim tudo bem.

Demorou uns dez minutos para chegar ao posto. O garoto estacionou e desceu do carro. Fiquei ali sentada imaginando como seria minha vida depois daquele dia. Não cheguei a nenhuma conclusão.

O garoto voltou trazendo coca-cola e salgadinho. Comemos e depois seguimos a viagem. Não me lembro ter dormido, mas acordei com ele dizendo que estávamos no acampamento.

–Vamos subir a colina a pé.

–E o carro? – Não achei nenhuma maneira de aquele carro subir.

–Meu pai vem buscar. Como gosta de ser chamada?

Eu não esperava essa pergunta. Nunca ninguém me chama. Meu nome também dispensa apelidos.

–Pode trocar de nome se quiser.

–Posso te falar quando chegarmos lá em cima?

–Pode. Não demore muito, pois vou ter que te apresentar para o Sr. D.

Seguimos até o topo em silêncio. Apesar de não gostar do meu nome, nunca pensei em mudá-lo.

–Acabou seu tempo. –Disse o garoto quando chegamos em frente a duas colunas.

–Katie. Esse será meu novo nome. Como é o seu?

–Nico. Agora vamos. Quero me deitar e não posso fazer isso antes de te entregar ao Sr. D. – Disse friamente.

Fomos caminhando em direção a uma casa grande. Ela era bonita, com varandas e com um velho sentado em uma mesa tomando Coca.

–Eu não venho aqui desde que meus amigos morreram na guerra. Faz séculos que isso aconteceu.

–Que amigos? Que guerra?- Perguntei tentando ignorar a parte dos séculos.

–Não era para você ter ouvido isso. Não me pergunte mais sobre eles. – Ele respondeu tentando ser frio, mas eu consegui enxergar a tristeza em seu olhar. A dor e a tristeza pareciam que iam transbordar daqueles olhos. Confesso que fiquei com pena. – Sr. D. trouxe a garota que o senhor me mandou buscar.

–Obrigado Nico. Come se chama minha querida?

–Katie, senhor.

–Já contou tudo para ela Nico?

–Ainda não senhor. Posso contar a ela agora se quiser.

–Não é necessário criança. Eu mesmo conto. Vá descansar, fez uma longa viagem.

–Obrigado Sr. D., preciso mesmo dormir. – Depois se virou para mim e falou – Se precisar de mim estarei no chalé 13. Boa noite.

Só me dei conta que era noite quando ele falou as duas ultimas palavras. A lua cheia estava bem visível no céu sem nuvens.

–Venha garota, vamos entrar. Tenho uma história para te contar.

–Que horas são Sr. D.? –Perguntei enquanto de dirigia para dentro da casa.

–Já são vinte e uma horas, criança. Sente-se vou buscar uma Coca para você.

A sala era pintada de um amarelo claro com faixas marrons. O sofá era marrom da mesma cor das faixas.

–Aqui está querida. – Disse ele me entregando uma lata de Coca-cola. – Tenho uma noticia para te dar antes de te contar a história.

–Pode dar a noticia.

–Você é uma semideusa.

Ao ouvir a última palavra meu mundo desmoronou.