Dia seguinte: Aula normal, problemas normais.

Outros tantos dias seguintes: Aulas normais, problemas nem tão normais assim.

Dois meses depois: Aulas e problemas nada normais. Definitivamente.

Juliana viu o tempo voar diante dos seus olhos. Assim que deu adeus a fevereiro, março pareceu dar um salto a distancia e a primeira quinzena de abril já havia ido embora junto com mais alguns dias. Maio já estava impaciente esperando sua hora, e era agora que as coisas começariam a ficar mais agitadas.

As aulas nesse meio tempo afora, na medida do possível tranqüilas. Ela conseguiu fazer a classe evoluir um pouco e dessa forma já começava a sentir certo orgulho de si mesma. Talvez ela não fosse um fracasso na sua profissão. Só talvez.

Ela estava em uma sala do segundo ano, aplicando a revisão que viria antes da sua segunda prova do trimestre. Os alunos pareciam estranhamente concentrados aquele dia. Talvez a maioria deles devesse estar com muito sono e estivesse apenas fingindo prestar atenção. Mas contando que estivessem em silencio e garantissem medias boas para mais da metade da sala, a professora estaria tranqüila.

Ouviu o telefone tocar dentro da bolsa e decidiu depois de ponderar bastante que seria bom atender. Vai ver era importante.

-Me desculpem pessoal, volto em instantes._Ela disse e a sala começou a conversar um pouco, dando a entender que alguns deles ainda estavam em estado consciente.

-Alô?_Ela perguntou assim que atendeu ao telefone.

-Bom dia. Somos consultores de seguros e gostaríamos de te oferecer a apólice que cobre desde colisão com carros desgovernados, até acidentes com caminhões e motoristas embriagados...

Juliana encarou o telefone em sua mão, respirando fundo antes de desligar o telefone e poupar a si mesma da mensagem eletrônica completamente sem sentido que provavelmente te tomaria uns bons minutos. Revirou os olhos e estava pronta para voltar para a sala de aula quando notou a coordenadora assustada passar por ela a passos rápidos.

-Algum problema Vanessa?_Ela se referiu a mulher que diminuiu os passos e apenas assentiu.

Juliana resolveu a seguir e ver se poderia ajudar a resolver o problema desconhecido que estava deixando a mulher tão assustada.

Ela viu Vanessa seguir para a quadra e aumentou os passos assim que viu um grupo de alunos parados em volta de alguma coisa, ou alguém, que estava no chão.

Antes de chegar ao local, no entanto se viu empurrada levemente por alguém que passava correndo por ela.

Ela notou ser Gabriel no instante em que ele voltou um olhar rápido de desculpas para ela que apenas assentiu, ainda sem entender a situação. Viu ainda o rapaz abrir caminho por entre as outras pessoas e logo ela conseguiu se aproximar também.

-Mas que droga Miguel._Ela ouviu a voz de Gabriel soar nervosa._você está bem.

-Olha cara, dependendo do que você considera bem, eu não estou muito não._O garoto sentado no cão disse tentando sorrir e fazendo uma carreta enquanto mantinha as duas mãos apoiadas na perna.

-O que houve Vanessa?_Juliana voltou a perguntar a mulher que agora estava ao seu lado.

-Parece que o garoto caiu enquanto jogava futebol e um outro garoto aproveitou para dar uma “ajuda” e pisar na perna dele._Vanessa disse observando Gabriel tentar levantar o rapaz.

-O que estão esperando para levar ele para um hospital?_Juliana perguntou observando Gabriel apoiar os braços do rapaz em cima dos seus ombros e o impulsionar no intuito de levantá-lo do chão._Alguém poderia ajudar o Gabriel a levantar o rapaz?_Ela pediu e viu outros dois garotos se aproximarem.

-Juliana, será que você pode levar o menino para o hospital?_Vanessa perguntou e viu a outra a olhar confusa._Gabriel quer levar ele, mas todos sabemos que ele nem tem carteira de motorista ainda.

-Por que não chamam a ambulância?

-Já chamamos, mas parece que aconteceu um acidente serio na estrada e por isso estamos sem ambulância por enquanto.

-Vamos._Ela disse apontando para Gabriel e os outros que ajudavam a carregar o rapaz.

Ela segui a passos rápidos para o estacionamento do colégio e viu os outros terem uma pequena dificuldade em acompanhar seus passos. Abriu a porta de trás do carro e logo viu o garoto sentado no banco de trás com uma careta de dor. Gabriel se aproximou dela e abriu a porta da frente do carro, se jogando lá dentro em seguida.

- O que está fazendo Gabriel?_Ela perguntou assim que o viu entrar no carro.

-No momento esperando você entrar e dirigir até o hospital._Ele respondeu parecendo um pouco impaciente e preocupado.

-Por que você acha que vai também?_Ela perguntou estranhando a expressão séria do rapaz.

-Por que você acha que eu deixaria o meu irmão sozinho?_Ele perguntou e Juliana finalmente entrou no carro.

-Irmão?_Ela repetiu apalavra em tom de pergunta e Gabriel revirou os olhos.

-Sou Miguel Sant’Anna, irmão do Gabriel, muito prazer._Foi o mais novo quem respondeu e Juliana apenas sorriu.

-Mas eu dou aula pra você e nunca notei isso._Ela disse parecendo indignada por não notar um dos seus alunos.

-Não se preocupe professora, eu disse apenas que era Miguel Neves, e omiti o Sant’Anna._Ele disse e sorriu e Gabriel mais uma vez revirou os olhos.

-O pirralho tem mania de esconder o último sobrenome, para os professores novos não perceberem que ele é filho de uma das professoras, que costuma se apresentar como professora Marieta Sant’Anna apenas._O mais velho disse e o mais novo revirou os olhos.

Juliana sorriu. Observando os dois poderia se dizer que eram bastante parecidos, apesar de Miguel ainda ser visivelmente de uma aparência mais infantil. O garoto tinha apenas quinze anos, enquanto o irmão já passava um pouco dos dezessete.

Ela acelerou o carro assim que percebeu as caretas de Miguel se tornarem mais feias. Gabriel pareceu sorrir.

-Agüenta ai maninho, porque se depender da nanica, você vai chegar lá assim que eu completar dezoito anos e puder pegar o carro para te levar de volta para casa.

-Cala a boca moleque, eu dirijo muito melhor que você.

-Mas é claro que sim. Em um dia onde eu leve uma pancada bem forte na cabeça, ou algo parecido.

-Vai se f...._Antes de Juliana completar a frase, ambos ouviram a risada sonora do rapaz do banco de trás.

-Do que é que você esta rindo?_Perguntaram juntos e o rapaz pareceu perceber a risada inoportuna. Olhou par aos dois, e olhou em seguida para a perna machucada e voltou a fazer caretas de dor.

-Nada, nada, eu não estava rindo, estava chorando._Ele disse e Juliana fez uma careta.

Não demorou para que chegassem ao hospital e a dificuldade maior foi na hora de sair do carro.

-Miguel, seu infeliz._Gabriel reclamou._Andou comendo pedra? Pesa mais que um chumbo seu obeso.

-Não fale assim do seu irmão Gabriel._Juliana disse segurando a risada.

-Não tenho culpa se você é um fracote maninho._Miguel disse se apoiando no mais velho._Não agüentaria nem se eu fosse uma garotinha.

-Não fale assim com seu irmão Miguel._Juliana agora se direcionou ao mais novo.

-Tudo bem mamãe._Os dois disseram em uníssono e a mulher revirou os olhos.

Não demorou para que fossem atendidos e logo estavam apenas Gabriel e Juliana na sala de espera.

A passos rápidos um casal se aproximou dos dois e logo a mulher começou a falar.

-Onde está seu irmão Gabriel?_A mulher perguntou e o rapaz ficou de pé com o susto.

-Mamãe?

-Mas é claro._A mulher revirou os olhos._Meu filho esta no hospital e ninguém tem a decência de me avisar. Por que não me ligou?

-Não se preocupe senhora Sant’Anna, o Miguel já está sendo atendido._Juliana interferiu e se arrependeu assim que viu o olhar furioso da mulher sobre si.

-Não sei por que , mas toda vez que encontro com você, um dos meus filhos está machucado...Preciso dizer que isso me incomoda?

Juliana a encarou perplexa e Gabriel arregalou os olhos já prevendo o que viria.

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Conheçam o Miguel Sant'Anna