-Tá’ legal galera... – Ele mesmo quebrou o silencio incomodo. – Eu correria agora mesmo se não fosse pela minha perna quebrada. Vocês já podem parar de me olhar assim.

Juliana demorou alguns segundos para absorver o choque que veio com as palavras do rapaz. Gabriel soltou um risinho sem graça e rapidamente se levantou de onde estava sentado.

- O Miguel já está entregue, acho que está na minha hora. - Ele disse e caminhou em direção a porta da saída da sala.

Juliana continuou encarando o rapaz, mas agora de uma maneira diferente. O olhar cheio de emoções se tornou vazio em instantes e Gabriel notou isso no segundo em que a encarou. Ele soltou um suspiro frustrado e a encarou novamente antes de dizer as palavras que fizeram uma avalanche de emoções preencher novamente o coração da mulher a sua frente.

- Foi bom te ver Juliana. – Ele disse e ela o encarou descrente.

-Não tão rápido moleque. – Ela o alcançou antes que ele passasse de vez pela porta.

-Desculpe... – Ele começou a falar, mas ela logo o interrompeu.

- Não pense que eu me esqueci disso. – Ela falou sorrindo e tirando do bolso o celular que estava com ela desde o dia anterior.

- Oh... É verdade. – Gabriel sorriu e puxou o aparelho das mãos dela. – Eu me esqueceria com toda certeza se você não tivesse lembrado.

-Eu sei que sim. – Ela disse e devolveu o sorriso a ele.

-Mas tem uma coisa que eu não me esqueci. – Ele falou e ela voltou a ficar um pouco séria.

- E o que seria essa coisa? – Ela perguntou agora fingindo desentendimento.

-Me lembro de alguém ter dito que apagaria meus contatos ontem. – Ele disse simplesmente e ela sorriu ainda mais. – Espero que tenha ao menos deixado o número lá de casa, por que se não nem sei o que vou fazer. Eu nuca decoro nada.

-Se é só isso fique tranqüilo. – Ela falou e foi a vez dele sorrir. – Eu me certifiquei de deixar os números importantes muito bem gravados.

- Espero que isso inclua o seu número também. – Ele disse e voltou a se distanciar, voltando a posição inicial em seguida com a câmera do celular apontada na direção dela, que o encarou assustada ao perceber o que ele faria. O barulho da fotografia sendo feita logo foi ouvido. – Para colocar no seu nome nos contatos.

-Mas eu estava desprevenida. Assim não vale. Devo ter ficado horrível. – Ela falou tentando pegar o aparelho da mão dele sem sucesso nenhum, e se afastando rapidamente assim que viu que alguns outros alunos já estavam entrando na sala também.

- Não se preocupe. – Ele sussurrou antes de sair de perto dela. – Eu deixo você tirar uma outra foto depois. Mas se você quer uma foto bonita, vai ter que me convidar para estar nela.

-É nessa hora que alguém me ajuda a não morrer de vez?- Miguel disse e os outros o encararam sem entender. – Ok. Deixa para lá.

Gabriel sorriu para Juliana e deixou a sala rapidamente indo em direção a sua sala de aula. No caminho abriu o link no menu do aparelho de celular que indicava os contatos. Foi até a letra “J” a procura do nome da moça e estranhou não encontrar registro dela. Desceu um pouco mais com os nomes dos contatos e quase gargalhou ao notar o que ela havia feito. Nos últimos nomes um novo contado chamava a atenção. “Tampinha”. Era essa a nomenclatura que ela havia usado. Era o apelido que ele mesmo havia dado a ela. Gabriel passou pelas aulas que vieram a seguir sem notar ao menos qual professor estava em sala. Segundo seus amigos, ele provavelmente havia esquecido sua alma em casa e apenas seu corpo ocupava o lugar na carteira da escola.

Não demorou muito para que as aulas chegassem ao fim. Afinal, tudo passa rápido demais quando se sente como se estivesse voando. Juliana se pegou sorrindo para o nada algumas vezes naquele dia. Se sentiu como já não se sentia a tempos. Era como ser novamente uma adolescente. Uma adolescente apaixonada pelo colega de classe. Mas é claro que seria mais fácil se ele fosse realmente um colega de classe e ela fosse mesmo uma adolescente. Na realidade, o fato de ela ser uma professora e ele seu aluno deixava as coisas um pouco mais difíceis. Ela não sabia ao certo quando havia deixado de fingir que era indiferente a ele. Para ser sincera consigo mesma,ela havia aceitado a idéia de que ele havia chamado sua atenção desde o começo. Mas não foi naquele dia que ela se apaixonou por ele. Isso começou a acontecer com a convivência. A beleza dos gestos simples e do sorriso maroto. Do corpo de homem pertencente a um grande menino bobo. A forma divertida de encarar as coisas e a maneira como os olhos dele brilhava quando estava concentrado em algo ou ficavam dispersos quando ele estava entediado. Cada pequeno gesto era uma nova descoberta e um novo encantamento. Porém, esse se dissipou um pouco assim que ouviu alguém repetir seu nome em um tom de voz bastante alto.

-Me desculpe. – Ela falou encarando a dona Joana que sorria enquanto a observava.

- Eu é que me desculpo por assustar você menina. Não foi minha intenção. – Mulher disse um pouco sem graça.

-Eu sei que não. Pode falar. – Juliana disse sorrindo.

- A senhora diretora mandou chamar a senhorita para falar com ela um pouco. – Dona Joana disse, mas tratou logo de continuar notando a expressão de curiosidade se formar no rosto da mais jovem. – Mas não liga não. Ela já chamou quase todos os professores hoje.

-Tudo bem, obrigado por avisar. – Juliana agradeceu enquanto se levantava. – Vou ir depressa então por que estou com fome. Quanto antes eu for antes eu volto para casa. – Ela falou e a mulher a acompanhou em uma risada sonora. – Foi bom ver a senhora.

-Foi bom ver você também menina. – A mais velha disse e sorriu para ela antes de começar a varrer a sala de aula.

Juliana foi rapidamente em direção a diretoria. Bufando um pouco no caminho, já que ela falava realmente sério quando disse que estava com fome.

Assim que chegou a sala notou a porta aberta e se aproximou recebendo em seguida o chamado da diretora para que entrasse rapidamente.

-Professora Juliana, eu sei que o horário não é apropriado, mas te chamei aqui por ser estritamente necessário. - Ela começou e Juliana apenas assentiu. – Eu tenho conversado com alguns professores sobre uns pequenos problemas com alguns alunos. Separei esses em grupos de acordo com as suas necessidades e a senhorita ficou a cargo de um caso bastante especial. Temos um aluno que estuda conosco desde muito pequeno e sua mãe é até mesmo professora por aqui. Esse mesmo aluno foi diagnosticado alguns anos atrás com TDAH* , e confesso que a escola não tenha dado real tenção a isso. É um exímio esportista e não costuma causar graves problemas, esse ano, porém ele vem apresentando um desempenho satisfatório em sua disciplina. Por isso, estou aqui para pedir a senhorita que trabalhe com esse aluno em um horário alternativo, tendo noção é claro de que lhe daremos os créditos por isso. O que a senhorita me diz?

-Fico feliz em saber que estou sendo útil. Ficarei ainda mais feliz em ajudar. Mas gostaria de saber quem é o aluno.- Juliana disse curiosa.

- É o senhor Gabriel Sant’Anna.