A caminho de Berlim, 15 de Abril de 2008

Embarcamos no vôo umas 7:00 da manhã de uma terça feira. Será que isso é um sonho? Pensava comigo mesma. Sophie estava do meu lado e de vez em quando falava comigo.

- Precisa de algo, Aniela?

- Não querida, estou bem.

- Está ansiosa?

- Muito.

- Meu avô fala muito na senhora. Minha avó também sabia que ele não a amava, mas mesmo assim, ficou do lado dele até o último dia de sua vida. Apoiando ele. Eles tiveram 2 filhos. Meu pai e tia Sara. Eles eram mais amigos do que marido e mulher.

- Eu era assim com meu falecido marido.

- A senhora voltou pra Polônia depois que foi embora?

- Nunca mais minha filha. Antes que Deus me leve, quero ir pra lá. Ver como as coisas estão. Sinto saudades.

- Eu fui pra lá uma vez. Quando estava na faculdade. Fiz História. É um país muito bonito. Sabe que lá na Alemanha eles têm vergonha de Hitler? Eles nunca dizem que ele era Alemão. Sempre que era Austríaco. Que ironia. Muitos dos que apoiavam sua ideologia estão vivos e têm vergonha agora.

- As pessoas mudam de opinião como trocam de roupa querida.

- Isso é verdade. Sabe, gostaria que a senhora desse uma palestra a meus alunos do 2º ano. Eles estão justamente aprendendo a 2ª Guerra e a senhora foi uma sobrevivente. Eles adorariam que a senhora dividisse essa experiência.

- Eu adoraria.

-Obrigada.

- A gente não vai chegar não?

- Calma. Já estamos chegando.

- Que demora.

- Estamos no avião faz só 20 minutos.

- Tá parecendo 20 horas.

- A senhora é engraçada.

- Isso se chama humor irônico.

- aha!

- Atenção senhores passageiros, apertem os cintos que o avião vai pousar, no aeroporto internacional de Berlim.

- Finalmente! Minhas pernas já estão inchadas.

- Meu marido vem nos buscar.

- Excelente! Preciso tomar um banho.

- Podemos ir pra minha casa antes.

- Pode ser.

Descemos do avião e pegamos nossas bagagens, o marido de Sophie, Thomas estava nos esperando.

- Oi amor! Que saudades!

- Oi querida! Senti sua falta!

- Querido, quero que conheça Aniela. Aniela este é Thomas, meu marido.

- Você é a Aniela que Stephan fala todos os dias? É uma honra conhecê-la.

- É um prazer te conhecer também.

- Vamos?

- Claro.

Fomos até a casa de Sophie, eu tomei um bom banho e ela fez um café com pão para comermos. No dia seguinte, ela me levou até a casa de Stephan.

Eu estava nervosa é claro. Nervosa quando Stephan e eu nos beijamos pela primeira vez. Há exatamente 69 anos. Eu podia sentir o gosto de sua boca na minha. Com todo esse tempo.

- Bom, vou deixá-los aqui. Não preciso ficar aqui. Vocês tem muito o que conversar. A casa dele é a azul. Eu insisti pra ele vir morar conosco mais ele não quis.

- Obrigada Sophie.

Bati duas vezes na porta. Mãos suando, pernas tremendo. Era assim que eu estava.

Alguém abriu a porta.

- Posso ajud... Aniela?

- Stephan?

- Você não sabe o quanto eu esperei por esse momento minha menina... Entre.

- Minha menina? Eu já sou uma velha. Disse dando-lhe um abraço.

- Pra mim você sempre será minha menina. Doce e inocente. Sente-se

- Obrigada Stephan.

- Minha neta lhe encontrou! Que alegria! Eu queria te ver antes de morrer. Era meu único desejo. E você está aqui...

- Deixe de bobagens! Estamos juntos novamente.

- Eu vou morrer Aniela. Eu tenho câncer. Como sua mãe.

- Antes de você morrer, vamos viver. O que não vivemos no passado. Vamos viver agora meu amor.

- Que saudades que senti de sua voz. Tão suave. Sabe, eu senti sua falta. A cada batida de meu coração. Meu amor.

- Eu releio esta carta toda noite antes de dormir, antes de sua neta bater na porta da minha casa rezava pra que Deus te concedesse um bom lugar no céu. Achava que estava morto. O que aconteceu?

- Bom... Eu fui preso. Fiquei preso por 20 anos. Eu fui te procurar quando sai. Na antiga casa dos Masen. Vizinhos disseram que vocês haviam ido embora e não disseram pra onde. Voltei pra Berlim pra reconstruir minha vida. Casei-me. Porém eu nunca te esqueci. Sempre tinha lembrança desses seus olhos verdes em minha mente. Pensei em você cada segundo de minha vida.

- Eu também pensei em você cada segundo de minha vida. Também me casei, Tive 4 filhos. Mudamos para Liverpool. Fiz faculdade e dei aulas de Literatura por mais de 40 anos. Meu marido faleceu em 1999, de parada cardíaca.

- Minha esposa faleceu em 2003, de leucemia. Igual a mim.

- Você tem leucemia?

- Sim.

-Eu sinto.

- Não sinta querida. Vou fazer dessa pouca vi que me resta inesquecível. Com você ao meu lado.

- Não podemos perder tempo.

- Nenhum segundo.

Ele me beijou. Como nos velhos tempos. Meu Stephan. Meu. Agora, não tinha nenhuma Guerra pra nos separar. Éramos apenas nós dois. Tentando viver o pouco de vida que ainda nos restava com intensidade. Com vigor e com amor. Um amor que foi ameaçado por uma guerra e que foi recuperado, depois de 69 anos...