"Talvez eu tenha gostado de ser observada."

Cliquei no play, e a música começou.
Dei uma rápida olhada para os meus pais no banco da frente, vendo que os mesmos estavam conversando. Talvez comigo, mas não liguei; só queria me desligar do mundo e escutar minha playlist.
Fechei os olhos, encostando a cabeça no vidro do carro, e passei, por pensamento, a cantar a música que vinha dos fones, estando o volume que eu queria no máximo.
Fiquei feliz pelo fato de meus pais decidirem me levar para a casa nova de Hiccup, apesar de que eu queria ter ido com o meu melhor amigo, mas mesmo assim, aquilo estava sendo bom.
Depois de um tempo da mesma forma, abri novamente os olhos e vi pela janela o pôr do sol, não percebendo o sorriso que se formava em meu rosto.
Fiquei observando a imagem que a janela mostrava, logo soltando um suspiro lento. Estava exausta, embora tenha dormido quase a viajem toda. Mas lógico que o que ajudou para me sentir dessa maneira, foram as horas em que estávamos naquele carro.
Passei então a encarar as várias casas passando ao redor. Eram grandes e todas belas demais, me fazendo ficar surpreendida a cada vez que olhava para uma.
Não tinha nem ideia se estávamos perto, eu só sabia que eu queria chegar logo, aonde quer que seja a nova casa.
Ao contrário do que estava imaginado, não demorou muito para que entrássemos em uma rua grande, e estacionássemos em frente à uma casa vermelha.
Como quando eu observava as outras casa, fiquei bastante surpresa por causa da que estava bem em minha frente.
A casa de Hiccup é realmente muito linda... o que me fez pensar querer ter uma igual.
Mas logo desviei os pensamentos, voltando para a realidade para tirar os fones de ouvido, pausando a música.
—Chegamos!- mamãe falou, como se eu não tivesse percebido.
—Já vi.- digo, tirando o cinto e abrindo a porta do carro.
Escutei meus pais fazendo o mesmo, mas não virei meu olhar para conferir.
—A casa é linda.- comentei, escutando os dois concordarem.
—É... E ela é sua.- papai disse de repente, me levando a olhá-lo curiosa.
—O que?- perguntei confusa.
—É um presente nosso.- mamãe explicou.
—Vocês estão brincando?!- exclamo sorrindo.
—Não. Ela é sua.- o homem disse mais uma vez, também sorrindo.
—Meu Deus!- olhei para a casa novamente, ainda atordoada. Então, direcionei minha atenção para os dois parados lado a lado.- Muito obrigado.- agradeci, indo abraçá-los.
Depositei um forte abraço nos dois, não conseguindo tirar o sorriso do rosto. A mulher e o homem retribuíram ao afeto na mesma intensidade que usei, e logo foram em direção à nova - agora minha - casa, me deixando para trás.
Continuei encarando a porta, onde meus pais haviam acabado de desaparecer, indo para algum canto desconhecido. Eu ainda não conseguia acreditar, já que foi uma completa surpresa.
Mas de qualquer forma, não tinha pressa para seguir os dois, ficando somente parada no lugar.
Não evitei dar uma rápida espiada nas casas vizinhas, notando um garoto na janela de uma das moradias ao lado esquerdo da minha.
Ele estava sentado ao parapeito. Uma perna balançava no ar e a outra estava dobrada, perto de seu corpo. Seu cabelo é castanho escuro, penteado de lado, com a franja caindo um pouco na testa e em seu olho. Tinha um sorriso pequeno no rosto, e me observava de uma maneira estranha. Quase me senti incomodada.
Arqueei as sobrancelhas, antes de fazer a pergunta.
—Perdeu alguma coisa?- digo, elevando um pouco minha cabeça.
Uma coisa da qual eu odiava, era ser encarada, apesar de gostar de fazer tal ato, pois é engraçado deixar as pessoas sem graça. Mas parece que o garoto também gosta de ficar olhando para as pessoas...
—Eu não.- responde, abrindo mais seu sorriso.
—Então não vejo motivo para ficar me olhando.- rebato, logo desviando meu olhar do seu e não hesito em ir em direção à porta aberta de minha casa.
Entrei e dei de cara com a sala enorme. Sorri largo, não demorando em ir explorar o lugar grande e confortável. Depois de fazê-lo, me encontrava agora conversando com meus pais, em um dos quartos.
—Quando vocês compraram a casa?- perguntei.
—Foi mais ou menos depois que você nos disse que iria se mudar com Hiccup.- mamãe respondeu.
—Podiam ter me avisado... eu poderia ajudar a pagar.- respondi, andando até a janela e fechando a mesma, por causa do vento frio que entrava.
—Mas é um presente, Astrid.- meu pai falou.
—Mesmo assim.- respondi.
—Não precisávamos de sua ajuda.- mamãe disse, e meu pai concordou.
Decidi não falar mais nada, pois sei que poderíamos começar uma discussão. Logo comecei a refletir em como minha vida seria naquela cidade, e naquele novo estilo de viver.
—Tenho que arranjar logo um emprego.- comentei baixinho, depois de alguns minutos.
—Ah! Eu sabia que tinha me esquecido de falar algo.- papai disse de repente, atraindo minha atenção para o lugar aonde estava. Ele sempre tinha uns surtos de memória em certos momentos, o que era sempre chato.- Sobre isso, a empresa que você trabalhava ligou para a daqui e falou que você era uma das melhores, e recomendou você para eles. Então você está trabalhando na mesma área.- meu pai explicou.
Eu ia respondê-lo, porém escutei a campainha tocando.
—Acho que é o cara da mudança.- digo, indo até a escada.
Desci os degraus e fui em direção à porta, logo a abrindo rapidamente. Não demoro para dar de cara com o mesmo garoto de hoje de manhã que veio buscar os meus móveis.
—Ah... É você. Pensei que fosse alguém mais importante.- comentei irônica, sorrindo de lado.
Não sei o motivo, mas simpatizei facilmente com o moreno, o que é realmente estranho, já que não acontece com todos que eu conheço.
Ele abre um sorriso brincalhão, antes de me responder.
—E você acha que eu estou feliz em te ver?- pergunta debochado.
O outro dá risada, e eu abro um sorriso.
—Astrid, vamos começar? Está ficando tarde.- meu pai, aparece atrás de mim.
—Vamos pai.- respondo, e o moreno à minha frente logo dá meia volta, indo até o caminhão estacionado.
Deixo a porta aberta, e também caminho até o grande automóvel. E assim começamos a transferência. Com a maior quantidade de pessoas, a mudança ocorre rapidamente. Logo que acabamos de tirar as caixas e os móveis do caminhão, e colocá-las em casa, começamos a tirar as coisas de dentro das caixas, não demorando muito para acabar também.
—Astrid, temos que ir. Vamos pegar estrada, então é melhor irmos embora logo.- falou mamãe.
—Vocês não preferem passar a noite aqui?- perguntei, realmente preocupada.
—Não. Se ficarmos cansados, paramos em algum lugar. Sem contar que amanhã eu tenho que ir trabalhar.- papai respondeu, dando um sorriso, indicando não precisar mesmo.
—Tudo bem então.- eles caminham até a porta, e eu os acompanho, sendo seguida pelo cara da mudança.- Boa viajem, e obrigada mesmo pela casa.
Eles se viram e eu dou um abraço apertado nos dois. Os dois sorriem em minha direção, antes de se encaminharam até o carro, parecendo cochichar entre si, e antes de entrarem definitivamente, viram-se para mim.
—Amamos você!- eles cantam o trecho da música que costumavam cantar quando eu era menor, o que me faz rodar os olhos soltando um risinho, e passar a mão pelo rosto.
Posso ouvir a risada alta do cara da mudança atrás de mim.
—Também tenho que ir.- falou depois de alguns segundos, andando até à minha frente.
—Vai tarde.- respondo sarcástica.
Ele ri, e me abraça levemente.
—Nos vemos depois.- fala, antes de dar meia volta. Logo entra no caminhão, fechando a grande porta.
—É, nos vemos depois.- murmuro baixo, escutando o motor de ambos os automóveis sendo ligado, e assistindo os dois se distanciarem.
Então, estou para dar de ombros, quando escuto seu riso.
—Que fofo os seus pais.- sua voz sai alta, e sei que é por causa da distância. Eu olho para cima, bem para o local onde ele está.
É o mesmo menino de antes da janela, que é meu vizinho. Será ele vai ficar me vigiando mesmo?
—Quem você pensa que é para ficar me vigiando? Um segurança?- perguntei, já alterada e coloquei as mãos em minha cintura.
—Ah... Sou só alguém olhando pela janela.- respondeu, dando um sorriso. Um sorriso um tanto interessante... (?)
—Err... Pois pode parar, tudo bem? Senão eu... vou ligar para a polícia!- digo, me achando uma ridícula um segundo depois de ter falado.
Ele dá gargalhada, fazendo com que eu me sinta mais ridícula ainda.
—Tudo bem. Mas quem te disse que eu estava vigiando você?- perguntou, rindo debochado.
—E você não estava?- respondo cerrando os olhos.
—Talvez. Ou... talvez eu só esteja sentado em minha janela.- ele ainda estava falando com deboche.- Imagino que você se achou demais agora, não?
O que?!! Quem ele pensa que é para falar isso para mim?!
Apertei minhas mãos em punhos fortemente, antes de suspirar pesado. Abaixo um pouco a cabeça, para logo depois levantar na mesma hora e então elevo minha mão, mostrando o dedo do meio para ele.
Saio de lá andando com passos nada leves, e escuto sua risada e sua voz atrás de mim:
—Bem-vinda à cidade, Astrid.- gritou, sendo a minha resposta somente um baque forte da porta se fechando.