Elementar

A Joia dentro do coração


Jimmy

Nunca se sentira tão desorientado. Lidar com a morte de seus pais foi algo terrível, mas a situação atual também lhe trazia uma sensação ruim. Depois de muito tempo, sentia medo de verdade. Onde ele estava? Quem eram aquelas outras pessoas deitadas na grama? Duas garotas e um garoto, ele contou.

O menino, o jovem que estava mais perto dele, despertou angustiado, a mãos chacoalhando para um lado e para o outro, batendo e arranhando o peito, como se estivesse algo errado ali. Ele disse algo como “tiro”, mas Jimmy realmente estava preocupado em planejar uma rápida fuga para dentro da floresta. Do outro lado da clareira, a primeira garota, com os olhos encharcados de lágrimas e os cabelos loiros bagunçados, se encolheu entre duas rochas, murmurando algo para si mesma enquanto abraçava suas próprias pernas.

A última garota, na ponta mais distante da clareira, se levantou decididamente, os olhos analisando cada um dos jovens, até que parou em Jimmy. Ela foi a primeira a falar.

— Vocês estão bem? Acredito que tenham passado por alguma situação com aqueles espíritos...

As palavras socaram o estômago de Jimmy. Ele tentou falar, mas naquele instante, apenas um urro de angustia saiu de sua boca. Lembrou-se do homem em chamas, abraçando-o, depois usando o seu corpo para espancar Gareth.

— O que eu fiz com o meu pai? — A garota loira também se levantara. Ela gritava, perguntando o que estava acontecendo, parecia bastante assustada. — O que aquele monstro fez com o meu pai?

—Gina, você disse que ele mereceu. — Uma potente voz partiu do lado aposto da clareira, para onde ninguém tinha olhado anteriormente. Quando se virou, Jimmy pôde ver quatro seres lado a lado. Um estava pegando fogo. Outro era apenas esverdeado, com plantas trepadeiras enroscadas em seus braços. Um terceiro parecia se desmanchar com frequência, como o vento, e por último, uma áurea azulada, que falava diretamente com Gina.

O garoto que estava do lado de Jimmy levantou e começou a correr para dentro da floresta. No momento que estava prestes a desaparecer entre as árvores, uma rajada de vento circulou pela orla gramínea e trouxe o jovem para o lugar que estava antes. Ele gritou:

— Me deixem em paz, agora!

— Pode ir Carl, mas saiba que se voltar, a cicatrização do tiro que tomou será rompida e você morrerá, provavelmente. — A criatura ventânica surgiu na frente do garoto. O coração de Jimmy gelou. O espírito de vento tocou o peito exposto de Carl, onde havia uma enorme cicatriz. — Posso desfazer essa magia de cura, você que sabe...

— Acho que ficarei aqui mesmo. — Carl, como havia sido chamado pela mulher-vento, agora falava com o corpo trêmulo, olhando para os pés. Ela retornou para o lado dos outros seres.

Ficaram um tempo calados, então o homem em chamas começou a falar.

— Nós escolhemos vocês para abrigar os nossos corpos, os nossos poderes. Não quero que vocês façam nenhuma pergunta até que eu termine. — Ele acrescentou quando Gina tentou falar algo. — Vivíamos em um reino conhecido como Zear. Infelizmente ele fora atacado há algumas semanas. Quem o atacou? Serpentes, malditas Serpentes. Elas procuravam por isso. — Cada um dos seres abriram as mãos e mostraram uma joia, cada uma com uma cor diferenciada. — Essas joias são de extrema importância para o universo, pois são elas que simbolizam o equilíbrio da natureza.

— Com as nossas joias, as Serpentes poderiam enfraquecer a natureza e provocar um caos imenso nos dois mundos. Acho que querem saber o que somos, não é? — A mulher de água perguntou. — Somos espíritos elementares, cada um de nós tem o controle de um elemento da natureza, fomos destinados a cuidar dessas joias, não podemos deixar que ninguém ruim as pegue! Viemos para o mundo humano em uma fuga bastante perigosa, abandonamos Zear e todas as criaturas que vivem lá para permitir a segurança desses artefatos.

— O problema é que também existem Serpentes no mundo humano. Nossos poderes ficam muito mais fortes e notórios aqui, elas já devem estar a caminho para um combate, então precisamos que vocês colaborem e entendam a parte em que vocês entram: Para disfarçar o nosso poder e o poder das joias, decidimos que nos esconderíamos no mundo humano, dentro do corpo de humanos. — O espírito da terra comentou.

Nesse momento, Gina sussurrou um “Ai meu Deus, isso não é possível!”, seguido por mais uma tentativa de fuga de Carl. Ele estava branquíssimo, os olhos arregalados como nunca. Jimmy precisava fazer alguma coisa.

— Então é por isso que vocês entraram em nossos corpos! Como se fôssemos esconderijos!

— Garoto esperto! A nossa única dúvida, a princípio, era que, a partir do momento que entrássemos em seus corpos, nossos poderes seriam compartilhados com vocês. Então precisávamos escolher as pessoas certas para esse tipo de coisa. Então selecionamos vocês! — O espírito do fogo pigarreou.

— Então a única coisa que precisamos fazer é deixar que vocês entrem em nossos corpos mais uma vez para disfarçar o rastro dos seus poderes? — A garota morena perguntou seriamente.

— Não. Infelizmente, da próxima vez que entrarmos no corpo de vocês com as joias, nossas memórias serão apagadas. Entraremos tão fundo na essência e alma de vocês que iremos nos transformar em um só. Não poderemos mais dominá-los como antes, vocês que terão que nos dominar. Não poderemos conversar por pensamento, pois pensaremos com um só. Terão os poderes, mas não saberão usá-los, então precisarão treinar para isso, caso alguém tente matá-los. Iremos no enraizar na parte mais funda de seus corpos, como hospedeiros.

Carl berrou, depois perguntou.

— O que você quer dizer com treinar?

— Deixamos uma carta dizendo tudo que precisarão fazer quando entramos em seus corpos, já que nossas memórias serão apagadas e não nos lembraremos do que precisará ser feito. — O espírito do ar parou por alguns minutos. — Sim, nós vamos entrar, caso vocês queiram ou não! A vida de vocês está destruída, de qualquer forma. Não tem como esquecer isso, não tem como regressar! Não se trata da vontade de vocês, se trata da sobrevivência de toda a humanidade e da vida no nosso reino! Acham que estamos mentindo?

Dessa vez ninguém protestou, nem mesmo Carl, ao contrário, Jimmy disse:

— Eu irei ajudar vocês. Permito que o espírito do fogo entre em meu corpo. — Ele se aproximou da áurea em chamas. Talvez estivesse se precipitando ao fazer isso. E se esse fosse o lado errado de toda história? E se tivessem persuadindo eles para algo muito maior?

O espirito flamejante sorriu e foi sugado para dentro de sua joia de cor vermelha.

— Pegue a joia, aceite-a. — O espírito do ar mandou.

O garoto atravessou o gramado da clareira. Como aquelas palavras haviam saído de sua boca? Tudo fluiu tão rápido. As dúvidas se foram de um minuto para o outro, sentia-se tão motivado com tudo aquilo. Pegou a joia do fogo no chão, imaginando o que tinha que fazer. No momento que seu dedo a tocou, o poder fez com que tudo se tornasse mais claro. O espírito do fogo não foi até ele, Jimmy que teve que fazê-lo. Aceitar a joia e o espírito, pensou.

Sem mesmo perceber, passara o artefato pelo seu peito. A joia entrou em seu corpo como se ele fosse feito de água. Mesmo sendo cientificamente impossível, Jimmy sentiu tudo aquilo dentro do seu coração. Quando terminou, chamou o espírito mentalmente, mas ele não respondeu. Agora eram um só.

A sensação de energia foi instantânea. Apesar de baixa, Jimmy sentia as forças do espírito do fogo dentro dele. Ficou triste ao pensar em Madeline e em seus pais. Seu tio iria procura-lo, assim como a amiga, mas não iriam o encontrar. Precisava deixar coisas para trás, o novo o atraia, o sobrenatural enchia os seus olhos. Uma palavra ardeu em sua mente: Zear.

Os outros, incluindo Carl, também fizeram isso. Minutos depois, estavam todos sozinhos na floresta. Sam, como a garota morena se chamava, encontrou a carta que o espírito do ar mencionara, dentro de uma caixa de madeira, atrás de algumas rochas.

— Não tem só a carta aqui. Encontrei um mapa! — Ela avaliava o mapa atenciosamente. — Parece um pouco distante, precisaríamos de algum veículo.

— Acho que teremos que usar esse aqui. — Carl levantou uma gaiola com uma coruja branca dentro, ela também estava atrás das rochas. O animal piava enfurecidamente até que, em questão de segundos, a gaiola se partiu e os quatro comtemplaram uma coruja dez vezes maior que eles, com assentos confortáveis de madeira instalados entre o espaço de suas asas.

O animal se curvou, permitindo que eles subissem até os assentos. Isso não aconteceu. Uma Serpente gigantesca, maior que a coruja, saiu de dentro da floresta, sibilando palavras agitadamente. A criatura esticou o corpo esverdeado e observou cada um dos jovens. Jimmy nunca tinha visto um animal daquele tamanho. O chão tremeu abruptamente quando Sam arremessou rochas no inimigo.

As pedras não chegaram a acertar o monstro. Erravam desajeitadamente o alvo e se chocavam contra alguma árvore ao fundo. Jimmy ergueu as mãos, imaginou-se na escola, batendo em Gareth. Esferas surgiram ali, mas elas estavam fraquíssimas, sem muita potência.

— É só isso que vocês podem fazer? — A Serpente sussurrou. — Considerem-se mortos.