E se tudo mudar?

I'm falling all over myself


A horas foram se passando e os dois permaneceram trancados na base. Amy sentia como se estivessem planejando uma conspiração contra ela, primeiro quase foi sequestrada, segundo seu irmão foi sequestrado e terceiro estava presa com Ian Kabra enquanto Natalie poderia estar sendo mais uma vítima de um novo sequestro. Será que minha vida gira em torno de sequestros? ; perguntou à si mesma indignada.

Cada minuto parecia uma eternidade. Ian se mantinha preocupado com Natalie. A todo o momento ele fitava Amy, não se importava que ela percebesse, apenas não conseguia desviar o olhar.

Ela se sentia constrangida e envergonhada por estar sendo alvo de olhares e mais olhares de Ian, a todo o momento desviava a sua atenção para seu relógio de pulso, como se pudesse acelerar o tempo apenas com o olhar. Ele percebeu sua inquietude e se sentiu curioso, em todas as reuniões Cahill que o mesmo comparecia Amy estava usando o aparelho, assim como o colar de jade — que combinava perfeitamente com seus olhos —, mas sobre o colar ele já sabia que fora uma herança de Grace.

— E esse relógio? — perguntou curioso.

— Como assim?

— Você sempre está o usando. Foi um presente de alguém especial? O Hiago que deu? — perguntou mais uma vez, só que agora seco.

Hiago. Desde que Amy viajara ela não recebia notícias dele, sabia o porquê, mas também se sentiu culpada por não estar se lembrando muito dele, e se sentiu culpada também pelo beijo. Não deveria ter beijado Ian, está namorando o Hiago. Mas era como se o momento tivesse tomado suas próprias conclusões.

— Sim, foi um presente, mas não é do Hiago.

— Seria muita intromissão de minha parte se eu pergutasse de quem foi?

— Tio Fiske me deu quando fomos à Suíça.

— Suíça — disse como se estivesse refletindo para si —, é um país encantador.

— Já esteve lá?

— Sim. Gostou dos chocolates?

— Como não? São magníficos, mas não fomos para turismo ou férias. Tínhamos assuntos bancários a tratar.

Assuntos bancários...; pensou ela.

Disse a verdade, afinal sua viagem para a Suíça foi para receber uma herança de sua avó Grace. O anel de Gideon. Para mantê-lo seguro, Fiske resolveu o adaptar à um novo relógio. O objeto deveria permanecer à vista em qualquer circunstância, mas teria de se manter indetectável aos olhos do inimigo, que no caso são os Vesper. Durante dois anos esse plano deu certo e continua indo bem.

Sempre que olhava o objeto sentia uma angústia, se lembrava das tardes ensolaradas que passava com Dan e Grace, dos piqueniques, passeios, do dia em que foram à um aquário e ao chegarem do passeio Grace perguntou para Dan todas as espécies de peixes que haviam observado. Ela já estava apurando a memória fotográfica dele; pensou; Que saudade... agora não tenho nenhum dos dois, não posso deixar que façam mal ao Dan. Tenho que recuperá-lo o quanto antes.

Seus olhos começaram a marejar, Ian percebeu e foi de encontro à ela.

— Está bem?

— Você sabe que não... — disse seca — ...me desculpa, é que tenho que arrumar um jeito de encontrar o Dan, eu não posso perdê-lo.

— Eu já disse que vamos encontrá-lo — disse ele levantando o rosto dela levemente. — Já temos uma pista de algo relacionado aos Vesper.

— E se for falsa? Se não tiver nada a ver com isso? Aí, voltaremos ao ponto de partida.

***

— E a menina? — perguntou Isabel ao telofone.

— Está conosco. O voo vai demorar um pouco, mas logo estaremos aí.

— Ótimo, e atenção redobrada, não tire os olhos dela. Se ela fugir eu juro que...

— Não se preocupe! — disse o homem assustado.

— Se ela acordar me avisem, não quero imprevistos.

— O.k.

Está tudo em minhas mãos, tudo têm de correr bem..., aos poucos vou conseguir a confiança de Damien e arranjar um jeito de me tornar Vesper Um. Pegarei também o segredo do soro e possivelmente o anel, não sei bem para o que ele o quer, mas irei descobrir, e quando isso for feito todos terão que temer à mim. Minha capacidade para comandar os Vesper é muito mais superior do que ele imagina. A vida é como um jogo... cada um por si.

***

— Amy...

— Sim? — responde contendo um bocejo. Ambos estavam sentados ali mesmo no chão lado a lado e sonolentos. Não imaginavam a hora de saírem e poderem descançar.

— Quantas horas?

— Hm... são três e meia.

— Acho melhor você dormir um pouco.

— Não posso, e se chegar alguém?

— Eu te aviso.

— Não confio em você Cobra — disse semicerrando os olhos.

— Duvido que você vá aguentar ficar acordada por mais meia hora.

— Não duvide de mim, mas você tem razão.

— Um ponto para mim.

— Você não está com sono?

— Um pouco. Sou acostumado a ficar acordado até mais tarde.

— Por?

— Insônia.

— Ah... bom, então se não se importa. — disse ela acomodando sua cabeça às pernas do garoto e deitando o corpo no chão.

Ele achou engraçada a atitude Amy.

— Ei! — Ian exclamou tentando parecer indignado e não rir.

— Shiu! Como você disse preciso dormir, então boa-noite, ou melhor, boa-madrugada.

Apenas suspirou como resposta.

Ele mal podia acreditar no que seus olhos estavam vendo, a garota que ele tanto despresou e agora ama, estava ali, deitada em seu colo dormindo serena... se soubesse o que se passava no subconsciente da ruiva iria ficar assustado com tamanha confusão.

Amy estava em um ambiente totalmente escuro, exceto por um único feiche de luz no qual ela se mantinha sob ele.

Ao seu lado esquerdo apareceu um garoto alto, cabelos castanhos e olhos azuis, Hiago. Imediatamente ela se aproximou e ao mínimo toque, ele desapareceu como nada mais que um vapor, uma fumaça que se difundiu ao ambiente negro.

Mais uma vez estava sozinha no centro do feiche de luz, e para aumentar a sua confusão apareceu ao seu lado direito um garoto também de estatura alta, cabelos negros, pele cor de canela e olhos cor de âmbar, Ian. A ruiva fez menção de se aproximar, mas a figura de Hiago retornou, ambos os garotos a fitavam com um olhar vazio e frio. Começaram a murmurar algo como: "se descida", "se descida", "se descida"...

Seu olhar alternava de um para o outro de acordo com que as palavras eram ditas e seu desespero aumentava, mas quando achou que não suportaria mais, as figuras viraram vapor. Diante de si apareceu uma garotinha de aparentemente sete anos, de mãos dadas com um menino que não parecia ter mais que quatro anos de idade.

Nesse instante ela compreendeu, estava presenciando a noite do incêndio que matara seus pais. A menina gritava pela mãe, mas ela não voltou, o menino estava sentado na grama úmida e chorando.

"Dan, meu irmãozinho, não chore, mamãe já vai voltar" ela dizia, mas o menino continuava chorando. "Eu vou cuidar de você, sempre..."

E nesse momento ela acordou como se tivesse levado um susto. Se sentou como antes e começou a encarar o vazio da parede à sua frente.

— Amy... — Ian estranhou o súbito despertar dela.

A garota se virou como se fosse naquele momento em que realmente havia despertado.

— Ian... — suas lágrimas começaram a escorrer livremente pelo seu rosto e ambos se abraçaram ao mesmo tempo — ...eu não... eu não cuidei dele... — Dizia em meio às lágrimas, com a voz abafada pelo abraço.

— Amy, pare de se culpar, você sempre o protegeu.

Ela levantou o rosto e enxugou as lágrimas que eram substituídas por novas.

— Ian... muito obrigada, obrigada por tudo — soltou-se do abraço —, você está me apoiando bastante.

— Não precisa agradecer Amy, sei que se fosse ao contrário você faria o mesmo.

Um sorriso contido se formou ao rosto dela.

Escutaram vozes vindas do lado de fora da base e imediatamente levantaram e começaram a gritar "Aqui!", "Estamos presos!" entre outros. Até que Anália escutou e como ela possuía o código, abriu e os soltou.

— Céus! O que estavam fazendo aqui presos?

— A Natalie! Você viu ela? — pergutou Ian preocupado.

— Eu ainda não a vi, deve estar dormindo.

— Vamos! — ele chamou Amy. Subiram as escadas rapidamente ignorando a pergunta de Anália e pararam em frente a porta do quarto de Natalie.

— Acho melhor bater... — disse Amy.

— Tem razão — ele bateu algumas vezes a porta, mas não obteve resposta, tentou chamar a garota, sem sucesso.

Amy a abriu e chocou-se com o que estava presenciando. A cama se encontrava em total desordem, as roupas de cama pendiam quase caindo. Já a janela estava escancarada, quase como uma prova concreta de uma fulga rápida, mas como desceriam daquela altura com a menina inconsciente? Talvez fosse uma alternativa desconsiderada. Talvez.

Ian, por sua vez, agora realmente entendeu o que a ruiva sentiu quando seu irmão fora sequestrado. A sensação era indescritível, como se o mundo ao seu redor se fundisse ao seu desespero, como se uma parte de si tivesse sido levada assim como a vítima, como se sua vulnerabilidade fosse maior do que em qualquer outro momento de sua vida... como se uma parte fundamental para sua vida tivesse sido ocultada, e a outra dependesse dela para continuar com seu propósito de sobrevivência.

Ele fora criado e treinado por Isabel, com o propósito de não demonstrar o que sentia em momentos como esse. Por isso, como ele fora condicionado a tal atitude, a única demonstração sentimental foram seus olhos marejando e o choque de não conseguir pronunciar se quer uma palavra durante esses instantes.

Amy sabia que ele não iria se deixar cair aos prantos na sua frente, e sabia também que mesmo não demonstrando, estava em total desordem emocional.

A dor física não se compara a dor psicológica, ao transtorno...

— Ian, er... vou ver no closet e banheiro.

Ele segurou sua mão direita e disse:

— Não precisa, você sabe que não vai adiantar.

Ela se surpreendeu por ele ter dito tal frase sem ao menos gaguejar. Ian inalou todo o ar que conseguiu e o soltou, buscando se controlar e soltou a mão da garota.

Ele continuou:

— Não vai adiantar ficarmos aqui parados.

— Ah, bem. Podemos procurar algo, não é possível que não deixaram alguma pista ou indício.

— Concordo — essa foi a única palavra que ele disse antes de começarem a procurar algo que os sequestradores pudessem ter deixado escapar.