Nellie estava sentada em sua cama folheando um livro que ganhou de sua tia e escutando músicas punk em seu iPod, quando de repente ela escuta batidas vindas da porta de entrada na sala.

"Toc, Toc, Toc"

Ela abre a porta e se depara com um homem de terno, cabelos grisalhos e segurando uma maleta na mão esquerda.

— Olá senhorita.

— Oi, posso saber quem é o senhor?

— Claro, sou o advogado William Mclntyre, mas pode me chamar somente de William.

— O.k., acontece William que os meus pais não estão em casa.

— A senhorita se chama Nellie Gomez, não é mesmo?

— Sim, por que?

— Porque isto é para a senhorita. — Ele fala estendendo a maleta para ela.

— Do que se trata? — Pergunta ao recolher o objeto.

— Seus pais vão lhe explicar.

— Meus pais?

— Sim, mas só abra ela quando eles estiverem em casa, eles sabem a senha e fale para entrarem em contato comigo. Ah lembre-se de meu nome.

— William Mclntyre?

— Isso. — Ele se vira e vai se afastando.

Ela fecha a porta e a tranca.

Que estranho...; a garota pensa.

Fica observando a maleta por alguns minutos procurando algum modo de arrombá-la, mas desiste e volta para seu quarto.

— Entregou a maleta para a garota? — Pergunta um homem usando vestes pretas e óculos escuros que estava sentado na mesma mesa de uma cafetaria que William Mclntyre.

— Sim, ela me pareceu meio curiosa e assustada, mas a informei de que apenas poderia abrir acompanhada pelos pais. — Responde o advogado.

— Ela pode não resistir e abrir a maleta não?

— Talvez, mas mesmo tendo uma inteligência fora do comum, acho que não conseguiria descobrir a senha.

— Tem outras maneiras de abri-la.

— Você quiz dizer arrombar, sim tem como, mas está fora dos conhecimentos dela.

— Tenho um pouco de dúvida

Será que devo abrir?; Nellie se pergunta deixando o livro de lado e pega seu iPod novamente.

Esse livro é tão chato...

— Meus pais estão demorando muito. — Mormura em voz baixa.

— Nellie, querida! — Ela escuta uma voz um pouco exaltada vinda da porta e se levanta apressada.

— Mãe, pai?

— Me ajuda com as compras, leva para a cozinha. — Sua mãe Alice Gomez, uma mulher de meia idade com cabelos negros e os olhos azuis e limpos como o céu daquela tarde, a entregava as sacolas enquanto seu pai se recolhia em direção a uma poltrona de frente a lareira.

Pedro Gomez era um homem também de meia idade, porém com alguns fios grisalhos no cabelo em meio a sua grande maioria que eram negros, e seus olhos eram claros como os de Alice.

Nellie ainda se perguntava de qual parente havia herdado os olhos castanhos e cabelos loiros que recentemente foram cortados, repicados acima do ombro e tingido um lado de preto, sua pele era bastante pálida. Faltava apenas uma semana para garota completar 16 anos.

— Nellie, chegou alguma visita? — Pedro pergunta, como todas as vezes que deixavam a garota sozinha em casa ou com sua irmã, ainda sentado de frente à lareira.

— Ah, sim..., mas não foi bem uma visita.

— Como?

— Um homem que dizia ser advogado veio e me entregou uma maleta.

Pedro se levanta rapidamente com uma expressão séria. Alice enrijeceu com o susto e perguntou:

— Você sabe o nome dele?

— Sim, era... William Mclntyre.

— Você abriu essa maleta? — Perguntou Pedro.

— Não, ele disse pra abrir com vocês, e que iam me explicar, e é para entrarem em contato com ele.

— Isso não podia estar acontecendo. — Alice murmura, mas para seu azar, Nellie escuta.

— Por que não? O que está acontecendo?

— Onde está a maleta?

— Na cozinha pai...

— O.k. Traga ela aqui.

— Qual é a senha? — Nellie pergunta para os pais.

— Olha Nellie não devíamos estar te contando a senha, mas nessas circunstâncias...

— De hoje em diante você vai precisar dela. — Diz Pedro Gomez desembaralhando a sequência de números e os repetindo em voz alta. — 39-1507-4.

— O que significam esses números? — Perguntou a garota.

— Minha filha... — Diz Alice. — Só me diga que vai decorar esses números, tudo bem?

— Sim mãe, mas o que significam?

— Explica à ela Pedro. — O homem respirou fundo e começou.

— O número 39 significa a quantidade de ingredientes para a fórmula do soro de Gideon Cahill, ele desenvolvel esse soro há uns cinco séculos para acabar com a epidemia da peste que ocorria na época, porém ele criou primeiramente o soro em partes, cada uma dedicada aos talentos de seus quatro filhos...

— An?... — A gorota parecia confusa, porém ele continuou, sabia que a história era longa, mas Nellie deveria saber cada detalhe.

— ... tais quais os nomes eram: Luke, Jane, Thomas e Katherine Cahill; ao desenvolvê-lo em partes ele concluiu que a opção mais segura era entregar as quatro partes do soro ao seus filhos. A junção dessas partes resultava no soro completo...

— Mas por que era mais seguro? — A garota perguntou parecendo entender um pouco mais a história e Alice permanecia assistindo a cena.

— Porque em partes ou não, o soro desencadeava uma mudança no DNA de quem o bebia, desenvolvendo e apurando os extintos da pessoa, e Damian Vesper, um homem muito poderoso que vivia na mesma ilha aonde Gideon se encontrava, se dizia amigo dele, sabia da existência do soro, e Gideon sempre o mantinha informado sobre o progresso de suas pesquisas, claro não se esquecendo de ocultar os detalhes mais importantes...

— E esse Damian Vesper queria o soro? Sabia que era poderoso?

— ...sim, descobriu através de uma tentativa de assassinato a Gideon, que conseguiu inacreditavelmente escapar ileso, e comprovou pela empregada que trabalhava na casa da família Cahill. Essa mulher tinha ouvido uma conversa entre Gideon e Olivia, no qual o assunto era o término do soro...

— E essa empregada contou ao Damian? Mas como assim o soro altera o DNA de quem o ingere?

— ... Luke era persuasivo e astuto, Jane era criativa e uma artista impecável, Thomas era habilidoso com esportes e atividades bruscas e também inteligente, porém seu raciocínio necessitava de um pouco mais de tempo do que os outros, já Katherine era criativa como Jane e muitíssima inteligente e lógica, essas qualidades serviram de base para o soro e eram meio que turbinadas quando tomavam o soro. Entendeu?

— Acho que agora sim.

— O número 1507 foi o ano da explosão do laboratório de Gideon, Damian tentou junto com seus homens, invadir o laboratório e a única solução pensada por Gideon foi explodir ele para não deixar rastros da fórmula e avisou a Luke para sair com a família da casa, já que as quatro partes do soro foram entregues aos filhos um dia antes...

— Então Gideon morreu na explosão?

— Sim, e todos os seus filhos fugiram da ilha e se separaram.

— E o número 4?

— São os quatros clãs formados depois que se separaram, Tomas, Lucian, Janus e Ekaterina.

— Ata... entendi, mas essa família Cahill é muito importante?

— Sim, acredite sempre teve muita influência sobre a humanidade.

— Alguém conseguiu recriar ou beber o soro completo?

— Não, os Cahill e os Vesper tentaram descobrir todas as pistas e a receita durante todos esses anos, mas não conseguiram; e a única pessoa que tomou O Soro foi o próprio Gideon.

— E... nós somos Cahill?

— Não, mas somos muito próximos a família.

— O que tem nessa maleta?

— Bom, é o que veremos agora... — E abre o objeto.

— Documentos? — Nellie pega a primeira folha e a lê: Dossiê Nellie Gomez: Ao longo de sua vida obteve aulas de pilotagem de avião, direção defensiva, idiomas, primeiros socorros, autodefesa e mergulho. Possuí um domínio prodigioso de idiomas [...] sempre demonstrou muita atitude independente do que exercia... Por que tem a minha vida aqui?

— Bom, assim como somos próximos dos Cahill, nós também mantemos contato com os Vesper. — Alice disse finalmente.

— Mas se eles são rivais, como vocês se comunicam com ambos?

— Apoiamos na verdade os Cahill, mas fazemos alguns favores aos Vesper.

— Favores?

— Como transportar informações sigilosas. — Disse Pedro retornando a conversa.

— Mas isso é errado, isso é traição.

— Aos seus olhos sim, mas somos meio que condicionados a fazer isso.

— Por que?

— Há um bom tempo — Diz Pedro enfatizando as últimas palavras —, nós fomos recrutados pelos Vesper, e sem saber as atrocidades que eles cometiam, nós aceitamos sem hesitar.

— Porém alguns meses depois, após a iniciação, nós realmente descobrimos o propósito deles... — Continuou Alice.

— ...que basicamente se resumiam em poder, destruir os Cahill, e fazer com que o mundo os temesse. Para conseguiram seus objetivos eles não se preocupam em ter o mínimo de consideração aos que vivem em sua volta...

— ...e são tão sanguinários quanto tubarões famintos.

— E decidimos sair do meio deles o quanto antes.

— Mas os Vesper não são uma família? — Dessa vez que disse foi Nellie.

— Não — respondeu Pedro —, eles são "Os Melhores", recrutam pessoas extremamente talentosas, ou que podem ser fonte de informações valiosíssimas.

— Ata, mas vocês conseguiram se afastar deles?

— Bom, fomos nos afastando aos poucos, até que o conselho dos Vesper percebeu e nos chamaram a atenção, eu expliquei que não queria continuar com isso, e para minha surpresa aceitaram. Porém estabeleceram algumas condições.

— Quais?

— Não contar a nenhum Cahill o que fizemos; continuar a manter contato com eles, não direto, mas de maneira que possam tirar proveito de mais algumas informações e...

— ...que ao chegar a idade certa uma de nossas filhas iria ser recrutada. — Completou Alice com dificuldade.

— Como assim? — A garota se exaltou.

— Bom, estiveram acompanhando você e a sua irmã desde a infância, as possibilidades de Isabella se tornar uma Vesper foram descartadas pela enorme timidez dela. Por fim foram acompanhando somente você e decidiram que seria a melhor opção, afinal sempre foi extrovertida, sempre teve muita coragem, atitude... em fim... a gente sabia que esse dia iria chegar — enquanto Alice transbordava essas palavras, Nellie se sentia cada vez mais "sem chão", a sensação era de que estava mergulhando em um enorme vácuo sem fim. —, e tínhamos suposto que esse dia seria essa semana.

— Por isso minha irmã foi pro intercâmbio e eu não?

— Exatamente, agora querida, eu realmente não queria que isso estivesse acontecendo. — Era possível observar as lágrimas se formando nos olhos de ambos que estavam naquela sala. —, mas temo que sua única opção seja aceitar.

— Eu não acredito que você está me dizendo isso mãe — suas lágrimas eram visíveis escorrendo na sua face pálida e agora rosada. — Como minha única opção? Vocês dois sabem que eu nunca aceitaria isso, nunca!

— Sabemos querida. — Continuou o pai da garota, pois a mulher já não tinha mais forças para continuar, parecia inundada pelas próprias lagrimas. — Lhe recomendo que vá para seu quarto, esfria um pouco a cabeça e leia esses documentos exaustivamente, saber cada detalhe deles, esse tem de ser seu único objetivo por agora... e depois terá de nos conceder uma resposta.

— Você sabe a minha resposta - Disse a soluços.

— Isso não foi um pedido! Foi uma ordem! — Pedro teve de se exaltar um pouco com sua filha, mesmo não sendo de sua vontade.

— Mais uma vez eu digo: não acredito que estão me dizendo isso... — E bateu a porta com toda a força que conseguiu reunir ao entrar em seu quarto.

De dentro de seu quarto conseguia ouvir sua mãe desabando em lágrimas e se culpando.

— Não devíamos ter feito isso Pedro!

— Eu sei que não, mas se não fôssemos nós, seriam os Vesper e eu não quero que nossa filha corra perigo.

— Mas mesmo assim ela está correndo perigo! Mesmo se aceitar! Eles não têm piedade com ser humano algum e você sabe!

— Mulher acalme-se! — Ele mesmo não conseguia manter a calma. — Será menos doloroso à ela.

E ao ouvir isso ela constatou que não queria continuar a escutar os lamentos de seus pais, se sentou ali mesmo: no chão e se apoiou à parede. Pegou seus fones junto ao iPod e colocou as músicas no último volume. E lá estava ela novamente sozinha em seu mundo presa ao seus próprios pensamentos, caindo continuamente naquele vácuo emocional.

Sua resposta?

Naquele momento ela não sabia nem quem era.

Mas de uma coisa tinha certeza: de que independente de sua resposta, iria lutar com todas as suas forças para não se deixar mudar, não queria se tornar como uma Vesper. Seria ela mesma.

E essa era Nellie Gomez: uma garota ciente de seus atos, que lutava pelos seus objetivos, não se deixava cair pelas críticas pejorativas que recebia, determinada e que sempre seguiu o caminho do bem, não iria mudar isso por nada.