Shing se encontrava em um restaurante já a quilômetros da grande muralha, desfrutando seu café da manhã. O gato sabia que Vet fora procurar por Tigresa e que provavelmente já estivessem longe do Vale da Paz. Não conseguiria acompanhar os passos dos dois.

A esta altura, já poderiam até ter encontrado Liang porque é perto do vale. Ele mesmo havia passado para Vet mais ou menos a região onde o tigre se encontrava.

“Tenho que intercepta-los, só assim vou conseguir achá-los antes que recolham as outras pedras e também, Vet disse que só me contaria seu plano quando juntassem todos eles”, pensava ele com o olhar perdido levando o pão à boca num movimento automático.

Olhou para o copo de chá e o pegou para tomar um gole, pensando em onde poderia encontrar seus amigos. Era só uma questão de tempo para que eles fossem à procura de Carlengo e Kayla, mas não sabia por qual deles, o grupo procuraria primeiro.

“Hm, eu poderia esperá-los por aqui, é o único caminho para sair da China e independente pra que lado escolham ir, só podem ir por aqui”, pensava ele concluindo que seria melhor ficar em alguma pousada próxima e atento ao que acontecesse à sua volta. “Só com os três, será fácil o suficiente saber o paradeiro das outras joias e com o dinheiro que Anastásia me deu, poderei ficar o tempo que quiser e comer o que quiser”, sorriu e levantou a cabeça saindo de seus pensamentos.

- Garçom – levantou a pata para que fosse visto -, mais um prato de bolinhos, por favor.

Estava viajando e se divertindo às custas da vilã. Já que ela queria seus serviços, ele deveria desfrutar, porque era arriscada demais essa vida de agente duplo.

-

Andando por mais de três horas, os guerreiros deveriam parar para fazer seu almoço, já que o estômago de certo panda pedia por isso.

Num lado da estrada, os guerreiros, Vet e Liang encontraram um espaço para armar uma fogueira para que Po pudesse cozinhar. Depois de juntar gravetos e a brasa arder, o panda abriu sua bolsa e de lá retirou algumas panelas enquanto pediu que Víbora retirasse os pratos, copos, uma toalha, a faca para cortar os legumes que ele estava retirando de uma sacola onde também estava o macarrão e os palitinhos.

- Nossa, como cabe tudo isso aqui? – Perguntou Liang.

- Não sou eu quem arruma a mala

- Se fosse ele, seria uma bagunça – brincou Macaco, recebendo uma expressão de desagrado do panda como resposta.

- Posso ajudar a Víbora a tirar as coisas da sua bolsa?

- Claro – voltou sua atenção à comida.

Liang ficou sem palavras, aquela mala parecia um buraco sem fundo de onde não paravam de sair utensílios de cozinha, visto que ainda haviam chopsticks extras, trocas de roupas num compartimento separado, uma pintura de um ganso ao lado de um filhote de panda que ele decidiu ignorar e também, coisas curiosas...

- O que é isso? – Perguntou ele confuso, retirando uma figura de ação da bolsa – Tigresa, que é isso? Parece com você.

Os olhos de Po se abriram mais e ele correu até a bolsa, enquanto a felina se colocou em choque e nela formava um rubor, mas felizmente seu pelo pôde esconder.

Enquanto Vet olhava incrédulo para o pertence do panda, nenhum dos amigos dele conseguiu conter o riso, que foi mais pela cara do novo integrante do grupo do que pelo fato de o panda estar com suas figuras de ação em plena viagem.

- Nada, nada, não é nada...

- Ha ha ha, não acredito que seu pai colocou isso aí de novo! – Dizia Louva-a-Deus entre risadas e foi assim que caiu do ombro do primata.

- Eu nem sabia que ele tinha colocado isso aqui – pegou com delicadeza a figura da pata de Liang e a guardou, sem se quer olhar para ele de vergonha – não precisam rir assim.

- Mas é que você não prestou atenção na cara do Liang.

- Que que tem a minha cara?

- A sua cara de surpresa, você nem sabia que o Po tem essas coisas – disse Macaco, em melhores condições de falar do que os outros.

- Já chega, gente. Vamos parar e deixar o pobre Po cozinhar – pediu Víbora gentilmente.

- Ah, sempre acaba com a brincadeira.

- Como é, inseto? – Silvou a serpente.

- Eh... que... – balbuciava ele olhando para os lados – você tem razão – sussurrou.

- Claro...

Po terminou de cozinhar e comeram o mais rápido que podiam para prosseguir viagem. Depois de guardar as coisas novamente na mala dele, voltaram a andar e o sol ainda estava alto quando chegaram à uma aldeia.

Parecia bem tranquila e Liang garantiu a eles que Karina estava lá.

Eles deveriam procurar naquele lugar a casa dela. Liang não se lembrava no que ela trabalhava, mas sabia que ela estava por ali.

- Ah, que legal. Troca cartas com ela e nem sabe onde ela trabalha...

- Não me lembro, Vet. Tá legal?

- Hm. Deveria saber.

- Se você conhece a Karina, deve lembrar que ela não deixa muitas pistas pra nada e não tem como encontrá-la antes que ela te encontre.

- Como assim? – Perguntou Po.

- Desculpe, Po, eu me esqueço ainda que você não nos conheceu. A Karina era a espiã do nosso grupo. Ela conseguia se infiltrar nas armações de todos sem dar pistas que era de fora. Quando alguém estava descobrindo o plano dela, ela já tinha terminado e quando alguém descobria que era a infiltrada, ela já tinha acabado com a organização ou já estava prendendo os bandidos – respondeu com um sorriso.

- Então quer dizer que ela é show!

- Hey! – Grunhiu Tigresa.

- O que?

- Hm, nada.

- Uh, sei, sei – disse Macaco cotovelando levemente a felina, brincando com o ciúmes dela

Tudo que recebeu foi uma palmada que o mandou alguns passos para o lado, enquanto Po e Liang riam.

- Não falei nada de mais, Ti.

- Só estou brincando, Po – sorriu ela.

- Mas... sim, concordo com o panda, ela é show – sorriu Liang – bem, vamos ver algum lugar para passar a noite e deixar nossas coisas, assim que estivermos instalados, vamos procurar por alguma confusão.

- Confusão? – Perguntaram os outros.

- Sim – respondeu – ela provavelmente está no meio delas, sempre tentando pegar o líder.

Chegando a um local que parecia amigável, estavam á ponto de entrar quando ouvem gritos e aldeões correndo na direção contrária à eles.

Ainda com seus pertences em suas costas, os guerreiros, Vet e Liang se dirigiram ao local, que era a joalheria da aldeia. E quando chegaram, puderam ver alguns lobos sair voando porta a fora lançados, vão os deuses saber por quem, em direção à uma parede do outro lado da rua. Ao atingirem o alvo, alguns já estavam inconscientes.

Ao parecer, eles levaram uma boa surra.

Quando pararam de sair lobos, o grupo se aproximou e cada um deles colocou a cabeça na porta quebrada, avistando então uma felina que estava de costas com um q’pao verde claro com detalhes de flor em dourado por ele, enquanto a bainha era adornada com cetim da mesma cor do bordado.

Ela estava de costas, mas as cores de sua pelagem não escondia sua espécie, ainda mais pela cauda bicolor que balançava lentamente de um lado a outro. Estava acalmando sua respiração e quando ouviu a aproximação dos guerreiros, sua orelha se contraiu captando os ruídos nada sutis.

- Desculpe, gente. He he – disse Po, que pisou sem cuidado algum em um pedaço de madeira atirado no chão, e ficou ainda mais sem graça e vermelho com todos os olhares sobre ele.

- Quem está aí...? – Antes que pudesse terminar de falar, a criatura de voz suave virou-se revelando uma tigresa branca de olhos de um verde claro e os abriu ao máximo ao avistar seus amigos e os outros guerreiros do palácio.

Correu a abraçar todos eles.

- Ah, gente, quanto tempo! Que saudade de vocês! – Dizia ela agarrada ao pescoço de Tigresa, Liang e Vet.

- Karina... sufocando... – disse Liang com o pouco ar que lhe restava.

- Me desculpem – disse soltando-os – me empolguei. Estou com tanta saudade do nosso grupo. Amo tanto vocês. Que saudade – não resistiu e os abraçou novamente, soltando-os novamente para abraçar Garça, Víbora, Macaco e Louva-a-Deus e chegando em Po – espera, eu não me lembro de você.

- Ah, eu sou novo no Palácio de Jade – disse ele sem graça.

- Entendi... espera, você... é o Dragão Guerreiro!

- É...

- Nossa, fico muito feliz em conhecer – curvou-se.

- Vai ter que se acostumar com isso, Po – disse Garça colocando a asa no ombro do amigo.

- Odeio interromper esses momentos de honra, mas vamos embora, precisamos correr.

Depois de ajudar o dono da joalheria com a arrumação da maneira mais rápida que puderam, todos seguiram Karina à sua casa. Era uma casa simples e bonita, branca por fora e por dentro feita na arquitetura tradicional chinesa e haviam flores em torno dela.

Eles entraram e haviam três quartos, um era dela e os outros, eles iriam dividir.

Os meninos acomodaram suas coisas em um e as meninas em outro e logo foram todos para a sala porque Liang tinha algo importante a dizer.

Se acomodaram nos sofás dela e a esperaram voltar da cozinha, de onde ela trazia copos e uma jarra com água para os amigos matarem a sede por agora, já que mais tarde seria o jantar.

- O que é, Liang? – Perguntou Vet.

- É isso – disse ele colocando a pata fechada sobre a mesa e quando a abriu, puderam ver a pedra preciosa que estava com ele.

- A Gota Rubi! – Disseram Vet, Tigresa e Karina em uníssono.

- Como você arrumou isso? – Perguntou Víbora – deveria estar com meu pai.

- Ele me deu quando voltamos para a China e estou com ela há anos. A guardei comigo por segurança, o Grande Mestre Víbora me pediu.

- Entendo.

- Mas o que significa essa pedra? Eu nunca soube – disse o inseto.

- Ela simboliza o veneno do meu clã que é o mais poderoso entre os clãs de serpentes da China. O de Anastásia é um dos mais poderosos, porque ela tem habilidades para acertar os inimigos mais rápido do que minha família e também pode acertar de longe, mas o nosso pode ser letal ou não. Temos esse controle do veneno e por isso, é o mais poderoso. Foi feita com uma gota do veneno e magia.

- Magia? – Perguntou Po.

- Sim, magia para que fosse uma pedra com o mesmo poder do veneno. Usá-la demais pode fazer mal, tem que ter cuidado.

- Nunca imaginei que seu clã tinha uma pedra, isso significa que é um dos mais fortes da China – disse Garça.

- Isso, mesmo – sorriu ela gentilmente.

- Voltando ao assunto... – cortou Vet – guarda ela de onde você tirou. Temos que tomar cuidado com isso.

- Temos que disfarçar pra viajar. Aquela quadrilha de lobos, eram assaltantes e dessa vez queriam joias, ainda mais porque há algum espião da Anastásia por aqui, algum contato que contou a eles sobre o poder das joias e eu tive que trabalhar.

- Quem será que os enviou?

- Não sei, Vet. Hey, tá faltando o Carlengo e a Kayla, não tá? – Perguntou Karina – onde eles estão?

- Ele na Índia e ela no Nepal.

- Uh, é longe.

- Não resmungue, temos que ir...

- Não sei não, deixar o povo aqui sem ajuda...

- Mas a China precisa de nós, é nossa missão.

Enquanto Karina e Vet discutiam, os outros observavam e sentiam como o clima tenso se formava.

- Você não quer ir? – Perguntou Tigresa.

- Não sei...

- Por que? – Perguntou Garça – a gente mal sabe sobre as armações da Anastásia...

- Precisamos de você – completou Liang pela ave – você é a melhor espiã do mundo - sorriu.

Liang e Karina se olharam nos olhos e a felina esboçou uma expressão de desagrado, mas assentiu com um suspiro.

- Tudo bem, eu vou. Vou arrumar as minhas coisas e pedir pra vizinha que cuide do meu jardim – levantou-se – eu já venho, vou conversar com ela. Não quebrem nada e não falem sobre eu ser agente, só essas duas sabem porque são da família de uma das poucas autoridades da cidade sabem. Eles me contratam para me infiltrar nas quadrilhas.

Dito isso, ela saiu deixando todos em choque. Era um pouco, digamos, possessiva com suas coisas e gostava de deixá-las em seu lugar, detestava bagunça e ainda era a mesma Karina divertida e ainda era a tigresa durona, responsável e selvagem que eles deixaram há muito tempo. Como sempre, deveriam ter cuidado com o que fizessem à ela.

Depois de uma pequena conversa com a ovelha idosa e sua filha que cuidava dela, foi feito um acordo entre elas que ambas ovelhas cuidariam da casa de Karina em pagamento à ajuda que ela lhes deu.

A tarde chegava a seu fim e com isso, Po foi preparar o jantar acompanhado de Tigresa que lhe passava os ingredientes, às vezes mostrava um leve sorriso para ele.

No sofá, esperando pela comida, estavam os outros conversando.

- Hm, impressão minha ou eles tem alguma coisa?

- Estão juntos, Karina – respondeu Liang sorrindo.

- Sério? Sem nossa ajuda? – Perguntou ela em choque, fazendo Liang rir.

- Como assim, sem sua ajuda? – Perguntou Víbora curiosa.

- É que há sete anos...

- O jantar tá pronto – chamou Tigresa com um tom potente de voz.

Seus ouvidos captaram a conversa no outro cômodo e não podia deixar que soubessem de seu passado desse modo, não pela boca de outra. Se alguém deveria contar, seria ela e primeiramente para Po.

- Ti, eu ainda nem coloquei nos pratos – disse o panda estranhando a reação dela.

- Eu ajudo, é rápido – sorriu escondendo totalmente o nervosismo.

Os outros entraram na cozinha e sentaram-se como puderam em torno da pequena mesa. Começaram a comer em silêncio, até que Louva-a-Deus resolveu matar sua curiosidade.

- O que você tava falando na sala Karina?

Tigresa ficou tensa e Po nem se quer percebeu, ao contrário de Vet e Víbora.

- Ah, é que... vocês estão juntos, certo? – Perguntou ela olhando de forma simpática para Tigresa e Po.

- Sim – respondeu o panda soltando os chopsticks ao lado de seu prato para tomar a pata de sua namorada e sorrir, o que a fez se acalmar no mesmo instante.

- Então, quando Tigresa era mais nova, ela não tinha muita facilidade em conversar ou se aproximar de ninguém, muito menos de outros meninos e eu tentava ajudar. Sempre deu errado.

- Dessa vez, parece ela conseguiu sozinha – disse Vet da forma mais natural que pôde – não deve ter sido tão difícil pra ela conseguir o panda.

- O que você quer dizer com isso? – Perguntou Po.

- Deixa ele pra lá. Ele não se conforma de ela ter escolhido voltar pro Palácio de Jade – disse Liang – sabendo da história sobre o Dragão Guerreiro eu sei como vocês se conheceram, mas quem pediu?

- Ninguém, só aconteceu. Então, você poderia dizer que os dois quiseram e se esforçaram – respondeu a felina e voltou a comer.

- Então, como você conheceu a Ti? – Perguntou novamente Po.

- Quando eu e meu pai voltávamos para a China e pedimos abrigo no Palácio de Jade. Ainda me lembro da Tigresa filhote, tão quietinha e tímida. Só pensava em kung fu e treinava o tempo todo – dizia Karina com a lembrança de sua amiga ainda pequena e Po olhava embobado a felina que ainda comia seu macarrão - Mestre Shifu quis que ela brincasse um pouco comigo, mas as duas estávamos com vergonha e como ela só gostava de um jogo, eu aprendi pra podermos nos conhecer.

- Damas – disse Tigresa sorrindo para Karina.

- Isso.

- Mas não se engane, ela não é exatamente uma flor...

- Tigresa!

- Só falo a verdade. Ninguém podia mexer com a gente ou fazer piadinhas que ela colocava pra correr. Sempre foi assim.

- É, isso é verdade. Só não assustou a gente, porque éramos amigos – disse Vet rindo com os outros.

Todos resolveram ir dormir deixando Karina e Liang sozinhos, incumbidos de tirar a mesa. O panda teve de ser arrastado ao quarto quando não entendeu que deveria deixar a tarefa para eles.

Eles ficariam de vigia primeiro para o caso de espiões rondarem a casa.

- Quanto tempo eu não te via... – comentou Liang.

- É, alguns meses que a gente não se vê. Estava um pouco ocupada me infiltrando em organizações criminosas.

- Qual foi a última? – Perguntou ele olhando para ela enquanto lavava alguns pratos.

- Nessa quadrilha, eu fingi ser namorada de um dos lobos.

- Fingiu o que?!

- Ah, você me entendeu... – disse ela observando Liang se levantar da cadeira da cozinha e caminhar até parar na porta – mas foi por uma boa causa. O que há de errado?

- Nada – respondeu ele sem encará-la encostado no batente – é que, o tempo todo que a gente esteve em contato, você nem me disse sobre esses caras, eu poderia ter ajudado e você não precisaria fazer isso.

- Já passou – Karina levantou-se e o segurou pelos braços da melhor maneira que pôde –, não tem porque ficar bravo - sorriu.

Ao vê-la sorrir, Liang deixou a raiva de lado e se deixou guiar por Karina de volta à mesa. Conversaram até que seu turno acabou e então foi a vez de Macaco e Louva-a-Deus vigiarem.

Na manhã seguinte, os meninos tiveram que acordar Po que não ouviu o gongo da aldeia tocar. Quando estavam prontos pra sair, Karina entrego a chave da casa para a vizinha e então puderam ir.

Em dois dias, estariam nas muralhas e com a missão de encontrar Kayla que estava no Nepal e dali, seria caminho para a Índia, atrás de Carlengo e eles nem sabiam o que havia lá fora, se seria perigoso ou não. Só saberiam ao sair e que os deuses os guiassem, a sorte foi lançada.