Dias Mortos

42: Ruínas, ossos e poeira...



Não sabia ao certo onde estava, se parecia com um lugar bem elegante e com um decorador de muito bom gosto. Casper, que me guiava pelos corredores sinuosos me contou que era o “calabouço” uma das “torres” de vidro de Christabel.

- Acho que necessito dessa decoração em minha torre -argumentei, enquanto olhava para as paredes vermelha escura e os tetos de vidro, com belos desenhos antigos.

Casper riu, enquanto descíamos uma escada cheia de curvas.

- Acho que você com esse temperamento um tanto explosivo não se daria bem com Sir. Dakrmund.

Fiz uma careta, enquanto as luzes da iluminarias em forma de rosas iluminavam nossos passos.

- Já não gostei do nome do cara.

Enquanto passávamos por um salão oval, uma sombra branca me chamou atenção. A senhora estava ali, contemplando algo pela janela enquanto sua imagem refletia um sorriso triste nos lábios pálidos. Parei rapidamente, Casper olhou para mim, ele certamente sabia o que eu queria fazer, pois apenas assentiu em silêncio.

- Sabe, Christabel até que não era tão ruim.

- Ele era sim -disse com minha voz ecoando por toda torre -Como se chama?

Ela se virou para mim, olhando para além, como se tentando lembrar de algo.

- Acho que...bem, sou Gallia, mas Christabel sempre me chamava de senhora G.

Engoli em seco, enquanto eu sabia exatamente que tinha de fazer alguma coisa por essa mulher, a qual eu fui culpada de perder a alma. Peguei o colar que trazia comigo, com seus vários cristais brilhando na luz pálida da noite eterna, e arranquei um, o colocando na palma enrugada da mão da senhora.

- Você sabe o que fazer.

Ela estava surpresa enquanto me encarava, com um sorriso dançante nos lábios enquanto o brilho voltava para dentro dos seus olhos. Ali dentro do pequeno cristal, uma pequena bruma vermelha dançava, onde um garotinho e uma garotinha riam enquanto corriam pela neve, com um ser de asas brancas e cabelos claros os vigiando.

Eu.

- Sabia, a senhorita nunca foi ruim! eu sentia, sempre soube! Aquilo...aquilo era um truque para acabar com Christabel certo!

Era bom ter o poder de devolver a alma para seus devidos lugares, e eu devia muito a Gallia.

- Bem, no fim não consegui meu objetivo naquela época, mas agora tudo está acabado. Você Gallia, pode voltar para casa, viver tudo que perdeu ao lado do seu irmão.

Ela apenas piscou, deixando uma lagrima cair sobre o cristal, que aos poucos fora se tornando azul, até ficar insuportável de olhar. Dei um passo para trás, enquanto aos poucos a senhora sofrida, dava lugar a uma garotinha sorridente com um fita verde nos cabelos.

- Agradeço a você Lilith, sei que sempre estará olhando por nós, em nossos sonhos....

Sorri, sentindo meus olhos arderem com a intensidade da luz.

- Claro que sim -foi tudo que consegui dizer, antes que ela sumisse a o silêncio da torre vazia me abraçasse.

De qualquer forma, apesar de estar sem asas ou completamente expulsa do meu lugar de origem, eu sabia que de certa forma esse era o lugar certo para mim.



- Agora, definitivamente é a hora em que você nos expulsa da sua fortaleza! -sugeriu Ilanda, enquanto mordiscava seus unhas, Dorpet ao seu lado massageava seus ombros com um olhar pesado em minha direção.

- Claro que não, alias como podem pensar isso -disse lhes dando um abraço e me sentindo quase fraquejar, enquanto lembrava que estava sem dormir, comer e usando aquele assustador vestido, agora imundo.

Ora, até mesmo mestiços das trevas tem suas necessidades.

- Seu coração minha jovem, é puro como os cristais que traz em seu colar.

Sorri pronta para dizer algo bonito a Dorpet, mas Ravenna e seu novo melhor e inseparável amigo Julian, chegaram correndo. Eu tinha já apertado os dois em meus braços, e reclamado o quanto eles estavam imundos, e também contei toda história, ao invés de ficaram traumatizados, até gostaram.

- Lilith! Você tem que ver isso!

- O que foi? -perguntei assustada, temendo o que estava por vir. Sério, eu não aguentava mais.

Julian sorriu travesso para mim.

- Dessa vez é algo bom!

Tentei falar alguma coisa, mas eles me pegaram pela mão, me fazendo correr pelo salão bem iluminado pela luz alaranjada de fim de tarde. Casper novamente tinha tomado chã de sumiço.

Passamos por um jardim que estava começando a florescer, onde antes era árvores de almas negras se arrastando, agora nada mais eram que árvores normais verdejantes cheias de trepadeiras sobre elas.

Com certeza, estava sendo um novo tempo. Eu me sentia mais forte, para mudar as coisas.

Uma leve garoa começou a cair, pingos grossos e frios, que deixavam uma estranha harmonia sobre nós. Com o por do sol chegando, e o leve aroma de terra molhada que parecia rodar sobre nos, com uma brisa perfumada e quase mágica. Ravenna ria, enquanto pulava sobre troncos com musgo e fiquei feliz ao compartilhar esse momento junto a eles, Julian sorria, enquanto acompanhava a mesma e as vezes me dava olhares sorridentes e brilhantes.

- Você me parece extasiada -sorrio enquanto chutava a grama e me viro para trás, onde Casper me mostrava um brilhante sorriso, não se importando da chuva estar lhe encharcando por completo.

- Não sei, apenas sinto que as coisas estão ficando boas.

Ele me pegou pela cintura, me fazendo estremecer enquanto me guiava até a entrada de Egerver.

- E tendem apenas de melhorar.

Sorri com estranheza, enquanto ouvia sons não muito longe. Alguma coisa dentro do meu peito se agitou, mas antes que eu perguntasse a Casper o que estava havendo, a escuridão da passagem pelo mausoléu nos engoliu.

Mas dessa vez, não parecia assim tão assustadora. Nem sei como podia temer isso tudo, acho que isso foi apenas um sonho, ruínas de um passado distante e assombroso, cheio de poeira e ossos de acontecimentos que certamente faria qualquer um ficar louco.

Enquanto passávamos em um silêncio feliz pela escuridão, eu sentia que quando pisasse em Egerver e suas ruas cinzentas, seria apenas o começo de uma nova era.