Demigods Avengers

{Arco Gênesis} Capítulo Onze – Nova identidade [Afrodite]


Ottawa, Canadá – Horário: tarde, às 16h45min P.M

Eu estava desnorteada ao chegar ao terminal de ônibus de Ottawa, capital do Canadá. Buscando processar e entender o que havia acabado de acontecer comigo. O Apollo estava tentando me proteger de alguma coisa, só não consegui compreender o quê. Eu não tenho família, namorado ou alguém mais que se importe de verdade comigo além do Apollo. Então, decidi esperar, sentada em um dos bancos do lugar, por Apollo durante as horas seguintes.

Eu não tinha certeza do que estava acontecendo, mas, eu confiava o bastante nele para ficar apreensiva com o silêncio dele, ainda mais porque Apollo nunca largava o seu Iphone. Olhei para o aparelho em minha mão, aguardando por algum recado ou ligação. Qualquer coisa que pudesse aliviar a preocupação crescente com o passar das horas.

Depois de muita contemplação e caminhar em círculos em frente ao banco que estive sentada por horas, optei por desbloquear a tela do celular do Apollo e mexer nos aplicativos para ver se achava alguma coisa que pudesse lançar uma luz nessa situação, foi quando eu encontrei um e-mail dele para si mesmo.

“Para Ai-chan,

Se estiver lendo esse e-mail, significa que consegui evitar que minha visão se concretizasse e agora, você está a salvo momentaneamente. Eu preciso que você se esconda no nosso santuário. No momento, os deuses estarão te caçando tanto pelo mundo mortal quanto divino. Não se preocupe que eu nunca irei traí-la quando tenho certeza de sua inocência. Ainda não sei com exatidão a base das provas reunidas por Zeus e Boréas para que você tenha sido acusada de ser uma espiã de Kronos, mas, eu não acreditei nem por um momento nisso.

Eu sei que fugir não foi a melhor saída porque é, muitas vezes, considerado atestado de culpa. Porém, se eu não tivesse agido dessa forma, você teria sido banida do Conselho e seus poderes selados; ou talvez, se ocorresse um julgamento, você poderia ter sido mandada ao Tártaro.

Eu não sei o que o destino reserva para mim depois de explicitamente desacatar Zeus ao te ajudar, mas, eu não quero que se culpe porque agi assim em nome dos vários séculos de amizade e carinho que temos. No pouco tempo que distraí Hera, consegui montar um plano para proteger você no mundo mortal. Ainda que ele seja simplório e pueril, é tudo que tenho. E antes que duvide da minha palavra, eu não preciso dos meus poderes de clarividência para saber que você é inocente, Afrodite. Eu simplesmente sei.

Eu te conheço há mais de um milênio, Ai-chan. Eu duvido muito que você seja capaz de trair por mais que nós – eu incluso – tenhamos te magoado e te ferido muito com o seu casamento arranjado. Agradeço por sempre ter estado ao meu lado, mesmo quando eu não estive ao seu lado para apoiar você e, com isso, eu me refiro aos anos iniciais em que você não me suportava, eu deveria ter sido mais maduro e eu sinceramente sinto muito por isso.

―Eu nunca guardei rancor de você, Taiyō*–chan. Não queria que você tivesse se sacrificado desse jeito por mim, mas, eu serei eternamente grata a você. ― sussurrei ao vento, sentindo algumas lágrimas começarem a escorrer pelo meu rosto. ―Você se tornou um grande e querido amigo que eu nunca imaginei ter. ― enxuguei meus olhos com as costas da mão e continuei a leitura do e-mail.

Antes que comece a se perguntar sobre dinheiro para as necessidades básicas como comida e água. Eu já transferi praticamente toda a riqueza, que eu acumulei ao longo dos milênios, para uma conta particular que fiz em seu nome. As senhas dos cartões de crédito e documentos necessários estão em anexo. No mundo mortal, você é Ariel Áine Masen. Afrodite, a deusa do amor, já não existe mais. Ela morreu hoje, ok?

Desejo a você toda sorte do mundo em seu recomeço de vida, Ai-chan. Minha coleção de mangás do Naruto, One Piece, Kuroshitsuji, entre outros, agora pertence a você. Acredito que não precise avisar já que eu sempre disse que você ficaria com meus DVDs de animes e doramas, caso, algo acontecesse comigo; porém, é sempre bom relembrar. Deixei uma última surpresa pra você na sala de animes. Shiawasena tanjōbi, Ai-chan.**

Espero que um dia possa reencontrá-la para fazermos a maior de todas as nossas maratonas.

Do seu pateta e pesaroso amigo, Taiyō—chan."

Eu conhecia o caminho para o Santuário de Dafne como Apollo batizou o lugar, mas, eu não poderia atrair a atenção dos deuses, então o jeito seria ir pelo transporte mortal. De acordo com o Google, demoraria mais de três horas tanto de carro quanto de ônibus para ir de Ottawa para Quebec. Porém, usando carro, eu iria chegar uma hora mais cedo seguindo pela via Autoroute 50 E e Autoroute 40 E.

Decidi chamar um táxi porque eu nunca gostei de andar por florestas à noite, logo, quanto mais rápido eu chegasse, mais rápido estaria segura. Eu suspirei mentalmente antes de entrar no táxi, me preparando para uma longa viagem sentada em um banco de táxi desconfortável. O motorista tinha uma aparência cansada com suas roupas gastas pelo tempo, linhas de expressão no rosto e o cabelo ralo, praticamente calvo. Pelo que li nos documentos presos ao quebra-sol, o nome dele era Jean Pierre.

―Qual o destino, senhora?― o taxista perguntou com forte sotaque francês enquanto dava uma última tragada em seu cigarro antes de começar a dirigir.

― Magical Winter Forest. ― retruquei fazendo careta e abanando a frente do meu rosto, tentando dissipar o cheiro nauseante de tabaco. ―Depressa, por favor.

―A senhora veio fora de época, se queria ver a floresta coberta pelo manto branco, fazendo jus a sua fama. Mas, ela continua belíssima durante o resto do ano. ― Jean comentou, tentando quebrar o silêncio desconfortável que se instaurou no carro. ―Vai se hospedar em alguma pousada próxima da floresta para explorá-la durante o dia?Eu não vi mala alguma com a senhora.

―Não, o senhor só precisa me deixar perto da floresta e eu me viro a partir de lá. ― respondi indiferente enquanto dava de ombros e olhava a galeria do Apollo. Estava cheia de fotos nossas. Sorri com nostalgia ao ver nossa foto da última Páscoa. Estávamos usando pijamas cosplay de coelho – o meu era rosa bebê e o dele, azul claro. – com dois sorrisos enormes estampados no rosto enquanto segurávamos dois ovos de Páscoa. ―O que posso dizer?Eu prefiro viajar com pouco. ―e sorri amarelo, tentando disfarçar a pequena mentira.

O motorista me olhou estranhado com o meu local de destino e minhas atitudes, mas, eu ignorei e voltei a fuçar o celular do Apollo. Contudo, não havia ligação alguma e muito menos novas mensagens, além do e-mail. Enquanto eu me dirigia para o Santuário, meu novo mantra mental se tornou: “Apollo está bem.” Repetia isso várias vezes tentando convencer a mim mesma de que tudo ia dar certo no fim do dia. Tentei colocar uma das minhas OSTs*** favoritas, [달의 연인 - 보보경심 려 OST Part 1] 첸, 백현, 시우민 (EXO) - 너를 위해, pra acalmar meus nervos durante a longa viagem.

Em algum momento do caminho, meus olhos começaram a pesar e eu adormeci. Só acordei com o taxista me avisando que chegamos a Magical Winter Forest. Eu paguei a corrida com o pouco dinheiro que tinha comigo, agradecendo mentalmente por nunca sair do meu templo sem dinheiro mortal ou divino. Adentrei na floresta e caminhei alguns metros, para ter certeza de que não seria vista usando magia. Provavelmente a minha última.

Quebec, Canadá – Horário: noite, às 21h06min P.M

Quando abri meus olhos, eu estava em frente a uma casa antiga e graciosa. Ela existia escondida na cidade de Quebec há uns cem anos desde a destruição da casa original na Grécia com a erupção do Monte Vesúvio. Apollo quis recriá-la mesclando os detalhes únicos da casa original com os aspectos mais modernos de construção e decoração. Ela era pintada de um branco suave, fraquinho, tinha três andares, era retangular e bem proporcionada. Eu ajudei na instalação das janelas e portas, porém, se eu não tivesse participado, não saberia dizer com certeza se elas eram originais ou fruto de uma restauração muito bem feita.

Pela primeira vez, desde que a obra foi finalizada, eu atravessei o longo portal de entrada sozinha. Normalmente, Apollo me acompanhava para dentro da casa com um sorriso pícaro enquanto me oferecia o braço, ou me aguardava escorado na soleira da porta com o tradicional sorriso zombeteiro, captando cada movimento meu. Por um momento, jurei tê-lo visto na porta, me aguardando como sempre fez, porém, era somente uma ilusão, pois, desapareceu após eu ter esfregado os olhos. Senti um nó começar a se formar em minha garganta, contudo, eu mordi os lábios com força pra não desabar ali no nosso jardim.

Essa parte do jardim foi inspirada em jardins espanhóis, nos quais, o elemento central do jardim é a água e, dela, se articula todo o resto como largas fontes e pelas acéquias para irrigar as árvores ao redor. A enorme fonte de água com uma escultura central da Virgem Maria e seu filho, Jesus, réplica da imagem presente na Fonte de Gaia, na Praça do Campo em Siena. Dois lobos foram esculpidos estrategicamente à direita e à esquerda da escultura principal, a água sai espiralada da boca aberta dos lobos, fazendo uma parábola na frente da imagem da Virgem Maria. Árvores de cerejeira em flor cercam a fonte, em um emaranhado de galhos, formando uma espécie de clareira com uma pequena passagem para a entrada da casa feita de roseiras vermelho-sangue por entre as árvores.

Com a brisa amena, pétalas voavam ao vento e caiam sobre a fonte, criando um clima extremamente romântico e acolhedor. Uma das coisas mais incríveis sobre esse Santuário é que ele é protegido por magia para manter o clima sempre de modo ideal, Apollo nunca me contou como conseguiu fazer isso por mais insistente que eu fosse.

Escondida atrás da fonte estava outra passagem, feita por roseiras silvestres, para mais fundo do terreno. Essa é a segunda parte do jardim, onde tantos as flores quanto as árvores são podadas segundo o conceito pitoresco. Alguns bancos de pedra sob a sombra das várias espécies de árvores dos mais variados frutos posicionadas entre as flores, que estavam espalhadas pelo jardim. Entre as infinidades de flores nas mais variadas tonalidades, havia: begônias rose e champanhe, hibiscos vermelhos e roxos, miosótis azuis, violetas, girassóis, orquídeas amarelas e negras, rosas negras, puyas berteronianas, dálias cor de rosa, entre outras.

As vibrantes tonalidades diferentes das flores criam, de forma estilizada, paisagens idealizadas, parecendo um ambiente altamente abstrato saído de uma pintura surreal. Uma parte do jardim se assemelhava a uma miniatura de jardim de Sunken. Tōrō**** estavam posicionados estrategicamente em vários pontos do jardim para aumentar o raio de iluminação das velas, colocadas dentro das lanternas de pedra.

Esse é o jardim que montamos juntos, onde fizemos piqueniques à luz da lua e dançamos no meio da fonte como dois bobos brincando de ‘faz-de-conta’. O lugar em que tomei banho de chuva e pude me divertir com essas coisas simples pela primeira vez. Aqui, eu podia ser eu mesma sem medo de represálias e pré-julgamentos. Era o meu porto-seguro. As minhas melhores lembranças foram feitas aqui. Entretanto, sem a presença do meu “sol”, o lugar lindo e caloroso que recheava os meus sonhos parece ter dado lugar a um mausoléu frio e sombrio, digno de um pesadelo.

Eu subi as escadas para o segundo andar residência a passos largos e pesados enquanto suspirava, passando mão pelo meu longo cabelo loiro. Por dentro, a casa era muito clara, muito aberta e muito grande. Originalmente, esse lugar tinha dois andares com o primeiro sendo os quartos, porém, Apollo e eu achamos que estávamos perdendo espaço desse jeito. Após a obra, o primeiro andar é somente a garagem, a biblioteca e a lavanderia subterrânea.

Quando reconstruímos o prédio todo com três andares, nós tiramos várias paredes originais para ampliar o espaço da sala e colocamos um piano de cauda negro enorme e maravilhoso de frente para a parede de vidro, no lado leste da sala, com vista para o jardim. O fundo, virado para o sul, tinha parede de vidro mostrando a piscina interna com uma porta de madeira, à direita, para o estúdio de música e outra, à esquerda, para a cozinha.

Uma escada gigantesca – leva para o terceiro andar, onde ficam as duas suítes máster com banheiro privativo, as bibliotecas de animes e de doramas***** que estão interligadas por uma porta – dominava o lado oeste da sala. Debaixo da escada, há outra porta para a sala de cinema, onde sempre fazemos maratona.

As paredes, o teto baixo, o chão de madeira e os tapetes luxuosos, eram todos em tons variando entre o preto, branco e cinza. Mas, a única coisa que me interessava era aquele belo piano de cauda. Eu me aproximei lentamente quase como se estivesse em transe e me sentei sobre o banco.

Eu toquei no piano todas as nossas OSTs favoritas assim como as peças clássicas. Fazia algumas horas que eu tocava sem parar. A música era a única coisa que acalmava meu coração aflito, transportando-me para a época em que não havia problemas que não pudéssemos resolver. Até que decidi tocar as duas músicas que estiveram presentes em todos os nossos momentos ruins para nos dar forçar e superar as adversidades na imortalidade.

Como se eu estivesse sendo guiada pelas mãos fantasmagóricas dele, fechei meus olhos enquanto respirava fundo e comecei a tocar as primeiras notas de ‘You Are My Love – Yui Makino’. O piano continuava perfeitamente afinado, logo, as minhas memórias junto dele começaram a passar como um filme pela minha mente enquanto eu continuava a tocar. Minha voz embargava em alguns versos da música quando o nó na garganta se tornava mais forte e a vontade de chorar, muitas vezes tentava me fazer parar.

Eu desejei que ele estivesse aqui comigo, sentindo grossas lágrimas escorrendo pelas minhas bochechas gélidas por causa da brisa noturna. Porém, eu não ia parar de tocar a nossa música, mesmo sendo incrivelmente masoquista de minha parte. Era como se eu sentisse a presença dele ao meu lado sempre que tocava essa canção.

Tudo nessa casa me lembrava dele e dos nossos anos de amizade. A melodia suave e a letra de ‘Tender Rain – Rena Maeda’ fizeram-me quase parar de tocar de tanto que meus dedos tremiam com os soluços contidos. A letra aparentava ser uma tentativa trazer consolo a alguém querido e eu cantei, sentindo toda emoção por trás dessa música, como se o vento pudesse levar minhas palavras para confortar Apollo, onde quer que ele estivesse. Que, talvez, minha canção pudesse esquentar e proteger o coração dele de um possível dano novamente.

“―It’s a tender rain (É uma chuva gentil)

Anata no moto e kono uta ga (Que essa música que eu canto)

Todokimasu you ni (O alcance onde você esteja)

Donna ni tooku ni hanareteitemo (Não importa o quão longe estejamos)

Shinjiteru tsutawaru koto (Eu acredito que ela vá chegar a você)

Singing in the rain (Cantando na chuva)

Ame no shizuku ga utsukushiku (As gotas de chuva brilham belamente)

Kagayaiteyuku (Em sua volta)

Kanashimi zenbu ga kieru sono toki (E quando a tristeza toda for levada com a chuva)

Sekai wa ugokidasu no (O mundo virá à vida de novo)

Please come the tender rain (Por favor, venha, chuva gentil)... ”

Eu senti meus olhos começarem a pesar e a piscar mais lentamente, então, eu bocejei alto e me encaminhei para o meu quarto. Amanhã, eu irei ver a surpresa do Apollo e se ele não aparecer até o crepúsculo, eu vou dar um jeito de achá-lo. O cansaço estava cada vez maior, mas, eu consegui tomar uma ducha e trocar de roupa.

Vesti o meu pijama do Pikachu e fui para o quarto dele. O ambiente tinha um cheiro familiar e unicamente masculino, exclusivo do Apollo. Antes de adormecer na cama dele, fiz uma prece ao Caos para que meu sol particular estivesse bem e protegido.