Deep Six

Capítulo XXIX - Bônus: Questão vs. Black Alice


Ele não era o melhor motorista do mundo, mas era um dos mais rápidos com certeza. Passava por todos os outros carros a uma velocidade absurda, ignorando as buzinas e xingamentos de motoristas em quem quase havia batido. Por sorte seu celular estava no viva-voz, então ele mantinha suas duas mãos no volante, tendo mais precisão em suas manobras.

— Sua irmã é quase impossível de se aturar, sabia disso? — ele reclamou. — Ela nem mesmo perguntou se eu estava fazendo alguma coisa, se não estava em um caso importante, simplesmente mandou eu vir atrás dessa Black Alice sem mais nem menos!

— Se estava ocupado, por que aceitou ir na missão? — Cassandra já escutava o detetive há quase vinte minutos e estava com muita vontade de estrangula-lo.

— Porque, de acordo com ela, só eu posso pegá-la por causa dos poderes que ela tem.

— Então para de reclamar e faz o serviço! Por que me ligou de qualquer forma? Achei que me odiasse.

— Odeio.

— Então?

— Você é boa ouvinte.

— Tem sorte por estar longe, Bertinelli! — ela bufou do outro lado, fazendo-o dar uma risada. — Mas se a Mel quer que você faça a missão, é porque tem um motivo, e esse é que ela mesma não conseguiu pegar a Black Alice. Qual é o poder dela?

— Entra na mente de quem olha em seus olhos e assume sua forma. Não pode ser descoberta com facilidade como qualquer outro metamorfo por absorver as lembranças também.

— Então ela estava certa, você é o único de todos nós que pode pegá-la, porque além de não ter poderes e nem habilidades muito úteis, é o mais paranoico, então não será enganado facilmente.

— Entenderei isso como um elogio — o detetive estacionou seu carro em um beco e saiu, andando até um prédio do outro lado da rua. — Vou desligar, falo com você depois.

Encerrou a chamada e guardou o celular em seu bolso.

Passou dias interrogado alguns criminosos, mas não havia sido fácil, pois ela já havia conseguido absorver memórias de pessoas suficientes para se transformar em várias delas, só encontrou uma pista de onde ela morava porque pediu para Ethan localizar seu verdadeiro rosto nas câmeras de segurança da cidade.

Entrou no prédio velho, que parecia mais uma boate, e subiu até o segundo andar. A música alta e as pessoas bebendo, fumando e dançando no meio do corredor o fizeram imaginar que tipo de maluco viveria ali.

Bateu na porta do apartamento 8B e esperou alguns segundos antes de ver uma jovem de cabelos pretos e olhos azuis abri-la.

— Alice? — ele perguntou, tirando-a do estado parcial de choque em que ela havia ficado depois de olhar para o rosto mascarado dele.

— Quem quer saber? — ela se debruçou no vão da porta.

— Questão.

— Isso não parece um nome.

— Black Alice também não.

Epa arqueou uma sobrancelha.

— O que quer?

— Há um mês usou um soro que lhe deu o poder de mudar de forma, mas não sabia que as pessoas que a transformaram em meta-humana estavam controlando sua mente com nanorobôs. Eles foram temporariamente desativados, porém podem ser reativados a qualquer momento, então estou aqui para desliga-los permanentemente — o detetive retirou uma pequena cápsula de seu bolso e a mostrou para a jovem. — Esse antídoto vai acabar com seus poderes, só que também eliminará os nanorobôs de uma vez.

— Tá me dizendo que quer injetar essa coisa em mim e destruir os poderes incríveis que eu ganhei? — ela cruzou os braços.

— Basicamente.

— Sabe quantas coisas legais eu fiz com esse poder? — um sorriso de canto se formou nos lábios dela conforme abria mais a porta e mostrava o interior de seu apartamento, repleto de bolsas de dinheiro, joias e outras coisas valiosas. Ele tinha impressão de que nada daquilo era dela. — Por que eu deixaria você, cara sem rosto, acabar com a minha diversão?

— Está matando pessoas e assumindo a identidade delas, provavelmente vou te jogar na cadeia depois de injetar a cura em você. Tem muita diversão na prisão.

— Só vai injetar essa coisa em mim se conseguir me pegar — Alice mal terminou a frase e já acertou um chute no peito do moreno, o jogando contra a parede do corredor e abrindo caminho para que pudesse correr.

Tony suspirou, irritado com Batgirl por tê-lo colocado para perseguir uma mulher maluca e mais irritado ainda consigo mesmo por concordar em fazer isso. Correu atrás dela no meio da multidão de pessoas no andar de baixo, não vendo-a em nenhum lugar perto. Com certeza já havia mudado de forma e ele estava mais do que ferrado.

O detetive empurrou todos que estavam na sua frente, olhando para a porta por saber que ela tentaria fugir por ali. Viu um homem alto e duas garotas, uma loira e a outra ruiva, saírem do prédio e correu até lá o mais rápido que conseguiu, esbarrando em alguém e quase caindo no chão ao fazer isso.

— Foi mal... — a garota disse, quase dando um pulo para trás ao olhar para o rosto do moreno.

Tony olhou bem para a loira na sua frente e então para a porta. Duas pessoas exatamente iguais, uma delas havia acabado de sair.

Ele deixou o prédio e viu a garota loira atravessar a rua, conversando com a ruiva, decidiu seguir elas e esperar para ver se Black Alice baixaria sua guarda. Quando as duas pararam na frente de uma vitrine de roupas, ele segurou a loira pelo braço, empurrando-a contra o vidro.

— Te peguei — ele disse, vendo-a dar uma risada.

— É melhor do que eu pensava, senhor Sem-Rosto.

— Tive sorte. Agora chega de jogos, não tenho tempo para essa palhaçada — ele viu que a ruiva havia saído correndo no momento em que encurralá-la Alice, percebia que algumas pessoas que passavam na rua lançavam olhares curiosos para eles.

— Só estamos começando — ela ergueu um joelho com força e acertou a área no meio das pernas dele, fazendo-o soltá-la quase que imediatamente e se apoiar no vidro para não cair no chão.

— Isso foi baixo… — ele sussurrou, sentindo uma dor absurda se espalhar por todo o seu corpo.

— Posso fazer pior — ela sorriu e correu para longe dele.

Depois de respirar fundo e ignorar a dor, Tony pegou sua besta e apontou na direção da jovem, mirando bem antes de disparar. A flecha pegou de raspão na lateral da perna dela bem no momento em que Alice entrou em um hotel quase luxuoso, onde parecia estar acontecendo uma festa ou convenção, pois centenas de pessoas andavam pelo hall de entrada e trajavam roupas formais.

Ele tinha que admitir que ela sabia se esconder.

Olhou para o chão e viu uma trilha de sangue. Isso o fez dar um leve sorriso, pois sua ideia de última hora havia dado certo. Ela não conseguia esconder um ferimento mudando de forma, ele poderia encontrá-la facilmente agora.

O detetive seguiu o sangue, passando por várias pessoas que o encaravam assustadas. Aquela máscara não o ajudava a ser discreto, mas mesmo assim ele conseguiu chegar até um grupo de pessoas que conversavam e puxou algumas delas para que saíssem da sua frente.

— Não é tão boa em se esconder com a perna sangrando — Tony disse para um homem alto e moreno a sua frente. A parte inferior de sua calça preta tinha uma coloração vermelha quase imperceptível.

— Você está começando a me irritar — até a voz estava diferente. Ela era boa mesmo.

— Eu ia te dizer a mesma coisa.

Alice, na forma daquele homem, tentou acertar um soco no detetive, que se esquivou rapidamente e o empurrou usando o peso de seu corpo. Os dois acabaram esbarrando em uma estátua e esta caiu no chão, chamando a atenção de todos os convidados. Tony segurou o punho dela quando tentou lhe socar novamente e pegou a seringa em seu cinto, pensando que se ela não fosse concordar com aquilo por bem, seria por mal.

Ao vê-lo fazer isso, ela se desvencilhou dele e correu para o meio da multidão e sumiu da vista dele por um segundo, porém não o suficiente para que ele não a visse se transformar em uma garotinha de uns oito anos com um vestido rosa e um lacinho em seu cabelo preto.

— Como pode mudar as roupas também? — ele colocou a mão no ombro dela e o apertou para que não saísse correndo de novo.

— É uma ilusão de ótica que crio com a minha mente, na verdade ainda estou usando as mesmas roupas de quando saí de casa, mas você vê o que eu quero — ela disse, dando um sorriso que ele achou quase fofo.

— Muda de forma e ainda cria ilusões? Vou admitir que seu poder é mesmo interessante — o detetive a segurou com mais força e a puxou para longe das pessoas. — Agora vamos embora antes que você...

— Socorro! Ele tá me sequestrando! — ela berrou, começando a tentar sair de perto dele e falhando.

— ...resolva fazer um escândalo — ele terminou a frase e pensou em simplesmente ir embora e mandar Melissa ir atrás daquela peste infernal.

As pessoas começaram a olhar e um homem se aproximou.

— O que está fazendo com a menina? — perguntou, mantendo uma certa distância ao achar que Tony não tinha mesmo rosto.

— Não estou fazendo nada.

— Ele tá me machucando! — ela gritou, começando a chorar.

— Alguém faz ele soltar ela! — uma mulher gritou ao fundo.

Tony não tinha paciência para ficar ali e explicar para eles que estava tentando prender uma criminosa, então apenas pegou sua besta e atirou no chão, liberando uma flecha com uma fumaça negra e aproveitando para segurar Alice no colo e sair correndo dali.

— Me solta! Socorro! Socorr... — a voz dela foi abafada pela mão dele e quando o detetive teve certeza de que não haviam sido seguidos até o lado de fora, a levou para dentro de uma rua deserta ao lado do hotel.

— Você é uma ótima atriz, mas o jogo acaba aqui — ele se preparou para pegar a seringa novamente, mas a ouviu dizer algo abafado e em seguida dar uma mordida extremamente forte em sua mão, tanto que aquilo provavelmente deixaria uma marca permanente.

Ele deu um grito de dor contido e a soltou, vendo-a correr para fora da rua e entrar em outra.

— Espero que ela seja vacinada... — ele correu atrás, tento apenas perdido ela de vista por trinta segundos. Porém ela podia se transformar em pessoas diferentes em dois segundos, naquele meio tempo, ela poderia estar em qualquer lugar e ser qualquer um.

Assim que virou a esquina, Bertinelli esbarrou com alguém, fazendo um milkshake cair no chão.

— Ei, seu idiota, eu acabei de comprar isso! — Melissa gritou, encarando o moreno.

— Viu uma garotinha passando por aqui? — perguntou, ignorando o comentário dela.

— Está perseguindo garotinhas agora? Sabia que tinha problemas, mas isso é demais — ela cruzou os braços.

— Não tenho tempo para... — ele parou de falar imediatamente, olhando bem para a morena a sua frente. — O que está fazendo nessa parte da cidade?

— O Damian e eu viemos comprar algumas roupas para ele e acabei parando para comprar um milkshake, que por acaso você acabou de derrubar, e agora eu estou indo encontrar em ele na loja no final da rua — explicou e ele arqueou uma sobrancelha sob a máscara.

Ela poderia estar em qualquer lugar e ser qualquer um, ele se lembrou. Cassy havia dito que Batgirl já havia se encontrado com Black Alice, ou seja, aquela poderia ser ela. Olhou sua colega de equipe de cima a baixo, a viu usando a bota especial de Ethan junto com uma calça jeans vermelha, não conseguia ver se sua perna estava com um corte ou não, então precisaria improvisar.

— Como está o Apolo?

— Bem — respondeu, não entendendo a pergunta repentina.

— Ouvi que ele foi aceito na faculdade de Metrópolis e que você foi com ele ver o lugar — continuou.

— Isso vai ser daqui há uma semana, ainda não fomos.

Certo.

— E aquela festa de aniversário do Ethan no sábado? Foi bem divertida.

— Nós dois ficamos inspecionando a construção da nova base no sábado, não fomos na festa porque eu não gosto de pessoas e você não gosta de festas.

Certo... de novo.

— Tem certeza de que não tá mais maluco que o normal? Por que o interrogatório?

— Não é um interrogatório, é uma conversa amigável — ele ia fazer mais perguntas, cada vez mais recentes, quando seu celular tocou. — Um minuto.

— O Damian está me esperando para...

— Tenho certeza de que ele pode esperar um pouquinho mais — Tony deu um passo para o lado e atendeu, não tirando os olhos dela. — Alô?

— Kill Bill é um filme violento? — Cassy perguntou logo que ele atendeu.

— O que você está fazendo nesse momento? — ele perguntou, ignorando a pergunta dela.

— A Mel, o Damian e eu vamos assistir um filme e eu não quero que eles tenham nenhuma ideia assassina, por isso tô perguntando se o filme é violento — a confirmação o fez sentir uma vontade enorme de comemorar por ter acertado que aquela na sua frente era uma impostora. — Me responde, Bertinelli!

— Olha o nome do filme! Acha que Kill Bill não é violento?! — as vezes ele duvidava que o QI dela fosse de 152.

— Você é um babaca! Também não me pede ajuda para... — a voz dela foi cortada bruscamente quando um chute acertou a lateral do rosto dele, fazendo o telefone cair no chão.

Depois de dar um chute circular no rosto do detetive, Alice o empurrou contra uma parede de um prédio com força.

— Ótimo, agora entendi porque a Batgirl me mandou atrás de você, porque ela mesma levou uma surra — ele voltou a focalizar a imagem da jovem na sua frente e viu que ela continuava na forma de sua companheira de equipe.

Agora ela tinha as habilidades da heroína e ele estava muito ferrado.

Ela avançou contra ele com vários socos seguidos e enquanto o moreno os defendia, não viu a perna boa dela acertar um belo chute na lateral de seu corpo, tão forte que ele ficou sem ar. Isso o fez cambalear para o lado e ela aproveitou para acertar uma joelhada no rosto do detetive, seguida por um golpe de cotovelo para baixo que acertou a nuca dele e o fez cair no chão.

Tony sabia que Melissa lutava bem melhor do que ele, mas também não conseguia se forçar a revidar. Não queria machucar sua amiga, mesmo sabendo que aquela não era ela.

— Acho que vou ter que me livrar de você, ou não vai sair do meu pé — ela se aproximou dele e quando o viu levantar o rosto, acertou um chute no mesmo, fazendo-o perder a consciência.

Quando acordou a primeira coisa que notou foi que estava sendo arrastado. Olhou para frente e viu que Alice, ainda na forma de Melissa, o puxava na direção dos trilhos de um metrô parcialmente vazio. As pessoas ao redor pareciam achar estranho, mas permaneceram caladas.

Antes que ela chegasse mais perto dos trilhos, ele puxou suas pernas e a empurrou para frente usando os pés, fazendo-a cambalear para frente. Se levantou rapidamente e no mesmo instante defendeu um soco desferido por Alice.

— Aceita que perdeu, idiota! — ela gritou, irritada quando ele começou a desviar de seus golpes rapidamente.

Eles ouviram o som do metrô se aproximando e isso a fez dar um sorriso. Se moveu para trás dele com destreza e envolveu seus braços ao redor do pescoço dele, lhe dando um mata-leão. Ele bateu com as costas contra uma pilastra para tentar fazê-la sair, mas a jovem continuou lhe enforcando.

— Sua carona chegou, Questão — ela gritou, tentando fazê-lo ouvir sua voz por cima do som do motor do metrô.

Ele a jogou por cima de seu ombro com violência, mas no momento em que Alice caiu no chão, lhe deu uma banda e, quando ele ainda estava caindo, ela acertou um chute em seu peito e o fez ser lançado na direção dos trilhos. O detetive teve sorte por cair na área não eletrizada dos mesmo, ou teria virado churrasco, mas já que aquilo não o matou, o metrô vindo em sua direção terminaria o serviço.

Antes que pudesse pensar em se levantar, sentiu uma mão agarrar seu sobretudo e puxá-lo para cima rapidamente, bem no instante que o metrô passou.

Tony sentiu seu coração quase pular do peito com o susto, se acalmando ao ver Alice desmaiada no chão e com sua verdadeira forma.

— Precisa parar de quase morrer, não vou estar sempre lá para te salvar — Greg disse, estendendo a mão na direção do detetive.

— Eu tinha tudo sob controle — Tony aceitou a ajuda e se levantou. — Como me achou?

— A Cassy me ligou e disse que você estava com problemas. Que estava levando uma surra da Black Alice — ele se lembrou que não havia desligado a chamada e que Cassandra provavelmente ouvira a luta entre os dois. — A Waller já estava de olho nessa daí há muito tempo, você nos ajudou a pegá-la.

— Sugiro que aplique o soro nela, não vai querer uma zumbi meta-humana andando por aí se esses nanorobôs forem religados — o detetive viu alguns homens armados levarem Alice para fora do metrô.

— Nós vamos dar um jeito para ela se comportar. Ter habilidades como essa no Esquadrão vai ser útil — Greg deu um leve sorriso.

— Hum... Então, já mudou de ideia quanto a entrar para o DS? — Tony limpou suas roupas, tentando parecer desinteressado.

— Não sou herói, cara, sabe disso. Mas sempre que precisar de ajuda é só me chamar — Dent deu um tapa amigável nas costas do amigo. — Você tá bem?

— Meu nariz está sangrando e eu posso ter fraturado algumas costelas, mas vou sobreviver — Tony estalou as costas. — Até mais.

Greg o viu sair do metrô e seu celular tocou segundos depois.

— E então, salvou o traseiro dele? — Cassy perguntou do outro lado da linha.

— Sim, como sempre — o moreno também começou a subir as escadas para voltar para a rua. — Ele estava calmo demais... Não contou pra ele que o Jeff e a Jane voltaram para a cidade.

—...Eu ia contar... Na hora certa...

— Tô vendo que essa história não vai ter um final feliz — Greg subiu em sua moto e olhou para os agentes da ARGUS que colocavam Alice dentro de um carro preto.

— Nem ligo para o que aconteceu, quero meus melhores amigos juntos de novo nem que eu precise amarrar eles juntos!

— Cassy, me promete que vai ficar longe do Jeff? Depois de tudo o que aconteceu eu não confio nele...

— Tchau, Greg — antes que ele pudesse dizer algo mais, ela desligou.