Deadly Hunt

Desconfianças


“A verdade é que eu não quero dividir você com mais ninguém

A verdade é que só o seu sorriso já me faz tão bem

Eu nem sei o que você tem pra falar

Mas eu queria que parasse pra me ouvir

Sem você eu já nem sei mais respirar

Eu preciso de você pra existir

Essa saudade ainda vai durar demais

Mas eu não posso esperar pra te dizer

Vou te fazer feliz enquanto eu for capaz

Sem mais aindas quero só eu e você”

Ana Vilela – Aindas

Capítulo XIII – Desconfianças

֎

Uma hora havia se passado e eu continuava sem respostas. A cada minuto que eu passava acompanhado do silêncio ensurdecedor do corredor de meu quarto, mais minha mente continuava a criar teorias sobre o que há de errado com a saúde de minha esposa e nenhuma delas me agradava. Eu também me sentia frustrado por não poder fazer nada além de esperar que o maldito cientista que a examinava em nosso quarto nesse momento trouxesse boas notícias.

Ally sempre teve uma saúde invejável. Mesmo com a aparência frágil, eu podia contar nos dedos quantas vezes minha esposa ficou doente em nossos dez anos de casados. E mesmo quando doente, ela sempre se mostrou forte demais para se deixar abater. E era exatamente por isso que a falta de conhecimento sobre o que está acontecendo com ela que me deixava ainda mais apreensivo.

Pelo seu comportamento e a sua teimosia em não procurar o médico de nossa família, não há dúvidas de que algo realmente grave está acontecendo. Nem mesmo quando estava grávida de Enzo, Ally me pareceu tão vulnerável como agora. Os desmaios constantes, os enjoos, a palidez excessiva de sua pele, a preocupante perda de peso e as quedas de pressão só me deixavam ainda mais certo de que Ally não está bem.

— Austin? – A voz suave de Bárbara me desperta de meus pensamentos desagradáveis. – Você está bem?

— Bárbara? O que está fazendo aqui? – Questiono, observando minha prima se aproximar. Ela sorri fraco e me encara com preocupação.

— Eu vim ver se você está bem. Soube que Ally desmaiou novamente. Fiquei preocupada. – Conta a garota, quando está de frente para mim. Ela pega em minha mão e a aperta com firmeza. – Saiba que antes de tudo, eu estou aqui para o que precisar. Se quiser conversar comigo, eu ficarei muito feliz em te ouvir.

As lembranças da maneira fria com a qual Bárbara havia atirado em Ally em meu último sonho invadem a minha mente instantaneamente. Por reflexo, puxo minha mão para longe de minha prima e me afasto. Ela me encara confusa e logo me arrependo de minha ação. Foi apenas um sonho. Não era real. Não havia razão para eu me sentir tão apreensivo como me sinto no momento.

— Obrigado, Bárbara. – Agradeço, sorrindo envergonhado. – Eu estou apenas preocupado com Ally, mas estou bem. Não se preocupe.

— Eu entendo. Eu também estou preocupada com ela. Sei que não somos próximas e que ela não gosta de mim, mas eu a admiro muito, Austin, e é por isso que a observo tanto. Ally é uma mulher incrível e espero me torno pelo menos um pouco da esposa, mãe e rainha que ela é. – Responde Bárbara, aproximando-se de mim novamente.

— Eu realmente fico feliz que pense assim. Saber que Ally é uma influência positiva para você é muito significativo para mim. - Afirmo, sorrindo agradecido para Bárbara, ainda que um sentimento inexplicável continuasse a me incomodar em relação a minha prima mais nova.

— Mas, Austin, eu preciso te perguntar uma coisa. – Fala, parecendo hesitante.

— O quê? – Questiono, curioso.

— Não quero que me entenda mal, por favor. Não estou tentando fazer intrigas, mas estou preocupada com a Ally e, de certa forma, isso também está me afetando. – Começa, incerta sobre como fazer sua pergunta. A forma como ela agia faz com que eu me sinta apreensivo.

— Tudo bem. Apenas me diga o que houve. – Respondo, atento ao desconforto de Bárbara. – Não se preocupe. Apenas pergunte o que está te incomodando, Bárbara.

— É só que... Austin, a Ally e o Oliver se conhecem há muito tempo? – Pergunta a garota, encarando-me com curiosidade.

— O quê? Não. Por que a pergunta? – Questiono, desconfiado.

— Bom, é que eu tenho visto a Ally e o Oliver conversando de forma estranha. Minha mãe até mesmo foi perguntar para Ally se ele estava ameaçando-a ou se estava forçando alguma coisa e o que recebeu como resposta foi uma agressão. É difícil acreditar que ela tenha batido na minha mãe por tão pouco, mas eu lembrei das vezes que os vi sozinhos. Era sempre tão estranho. É como se eles se conhecessem há muitos anos e tivessem um passado juntos. – Conta Bárbara e isso me pega de surpresa. – Quer dizer, imaginei que eles tivessem se conhecido através do rei Enrique, quando houve a reunião para conversar sobre a mortal LP, mas é tão estranho como eles sempre estão se abraçando e ele está sempre rodeando a Ally.

— O que quer dizer com isso? – Indago, ainda que conseguisse ver claramente aonde ela queria chegar.

— Como eu disse, estou apenas preocupada com a Ally. Confesso que fiquei chateada por ela ter batido em minha mãe, mas temo que Ally esteja agindo por influência de Oliver. Ally é sempre tão misteriosa. É como se ela guardasse um universo de segredos para si. E se ela tiver um passado com Oliver e ele estiver chantageando-a? E se ela estiver... bem...

— Estiver me traindo? – Completo a sentença de minha prima e ela balança a cabeça, timidamente, concordando.

— Eu posso estar enganada, mas não acha que eles parecem ter uma ligação? Quer dizer, ela nem mesmo hesitou em trazê-lo para o castelo no mesmo dia em que eles suspostamente se conheceram. Logo a Ally que é sempre tão desconfiada. Ela nem mesmo confia em mim, que sou da família. Por que ela confia em um desconhecido? Eu não estou querendo fazer sua cabeça, nem nada disso, mas estou preocupada com vocês. Krósvia está passando por um momento tão nebuloso. – Explica Bárbara, ansiosa. – Está tão claro que eles estão escondendo alguma coisa.

— Eu... – Engulo em seco, sem saber no que acreditar.

Quer dizer, eu não acredito que Ally esteja me traindo. Isso não é algo que ela faria. Mas os argumentos de Bárbara não são tão ilógico assim. Se ela viu mesmo Oliver e Ally juntos mais de uma vez, não pode ser coincidência que eles se conheçam há mais tempo do que eu achava. Além disso, eu também já o vi mais próximo da minha esposa do que eu gostaria. E Ally realmente anda escondendo muitas coisas de mim.

— Pode ser só impressão minha, mas eu não consigo confiar no Oliver, Austin. Ele age como se fosse o dono da razão. Ele nem é mesmo médico, mas age como se fosse. Do pouco que eu pude ver, ele nem mesmo te respeita, sendo você um rei. A sorte dele é que você é muito bonzinho. Se fosse outra pessoa, ele já teria sido preso por traição a coroa. E juntando todas as peças soltas, não acha estranho que ele também parece guardar segredos demais? – Continua Bárbara, aproximando-se de mim. Ela pega em minha mão mais uma vez e me encara séria. – Eu estou preocupada com você. Temo pela sua segurança e ainda mais por sua honra. Você é uma pessoa maravilhosa. Um rei magnifico. Eu te admiro mais do que qualquer pessoa. E é por isso que estou te contando tudo que eu sei. Porque diferente de todos, eu confio em você e sei que você é capaz. Eu também sei que você não vai permitir que esse cientista falso destrua sua família.

— E não irei mesmo. – Afirmo, tomado pela ira.

— Eu acredito em você, Austin. Você não está errado. Não se esqueça disso. – Fala minha prima, apertando mais a minha mão. Ela então deixa um beijo em minha bochecha e sorri para mim. – Eu preciso ir.

E então ela sai, deixando-me sozinho com a minha fúria. Oliver está mesmo se aproveitando da fragilidade de Ally para se aproximar e destruir minha família. Bárbara tem razão. Todos os sinais sempre foram claros e eu fui o idiota que nunca percebi nada. Mas eu não cometerei esse mais uma vez. Eu ensinarei pessoalmente a ele o erro que ele cometeu ao se envolver com minha família.

A porta do quarto é aberta e Oliver aparece, retirando as luvas descartáveis. Ele me encara com seriedade, no entanto, antes que ele tivesse a chance de dizer alguma coisa, sinto o ódio me consumir e marcho em sua direção, não poupando em minha força ao desferir um soco em sua face.

— Desgraçado! – Profiro, puxando-o para cima para que ficasse de pé de novo para que eu o socasse mais uma vez.

— O quê...? – Oliver tenta dizer alguma coisa, mas é interrompido mais uma vez por mais um golpe em seu rosto.

— Você vai aprender a nunca mais se envolver com a esposa dos outros, maldito! Eu vou acabar com você! – Afirmo, sentindo meu corpo inteiro tremer e ser tomado cada vez mais pela raiva.

Agarro seu pescoço e desfiro mais dois socos em seu estômago. Ele cambaleia, sem ar, e me encara confuso. Sua boca e nariz sangravam, enquanto seu rosto estava completamente vermelho. Corro novamente para derrubá-lo e acabar com ele de uma vez por todas, mas o desgraçado consegue desviar.

— Do...do que vo... você está... falando? – Questiona entre arfadas.

— Agora vai se fazer de desentendido? Pelo menos seja homem para admitir o que você anda fazendo com a minha esposa! A Bárbara me contou tudo, então pare de se fazer de idiota, que isso não vai colar comigo! – Respondo, frustrado com a falta de caráter do cientista, que nem mesmo admitia suas ações.

— A Bárbara? A sua prima? – Questiona Oliver, expressando confusão, enquanto se apoia na parede. Ele mexe em seu queixo, parecendo incomodado com a dor. – Eu não faço ideia do que ela te disse, mas posso garantir que você está equivocado.

— Como pode ser tão cínico? – Pergunto, sem acredito que ele continuava a se fazer de desentendido. – Vai me dizer que você não está perseguindo minha esposa, abraçando-a por aí como se tivesse algum tipo de intimidade? Que você e Ally estão...

— Cuidado com o que você vai falar, Austin. Se quer ser um babaca que acredito em qualquer merda que a sua prima diz sobre mim, vai em frente, mas não vou permitir que fale mentiras sobre Ally. – Oliver me interrompe, aproximando-se de mim à passos duros. Ele me encara de cima à baixo. – Dizem que você é o rei mais inteligente e sensato que Krósvia já teve, mas tudo que vejo nesse momento é um idiota que nem mesmo parece conhecer a mulher com quem é casado há dez anos.

— Não fale como se você me conhecesse. Eu sei o que já vi e ouvi. Você está querendo se aproveitar da fragilidade de Ally para...

Antes que continuasse, Oliver me acerta um soco e de surpresa, acabo indo ao chão. Ele me encara com fúria, enquanto aperta o punho com força.

— Você está me irritando, seu idiota! Você ao menos está ouvindo as merdas que está dizendo? – Questiona Oliver, rindo em descrença. – Eu estou me aproveitando da fragilidade de Ally? A sua esposa é a mulher mais forte que eu já conheci na vida. Ela está longe de ser uma mulher frágil e ingênua que permite que os outros se aproveitem dela e você melhor do que ninguém já deveria saber disso.

— Você gosta dela. – Digo, levantando do chão, ainda um pouco atordoado pelo golpe. Não era uma pergunta. Eu tinha certeza disso. A maneira como ele falava deixava claro seus sentimentos e isso me enfurece ainda mais.

— Sim. Eu gosto dela. – Responde o cientista, prepotente. – Mas isso não muda o fato de que você está sendo um burro influenciável, que prefere acreditar na mimada sem noção de uma menina do que na mulher que você supostamente ama.

E novamente, avanço contra ele. Desfiro alguns socos em suas costelas. Ele arfa de dor, mas logo sinto uma cotovelada em minhas costas. Empurro-o com força contra a parede e bato em seu rosto. Ele se recupera e soca o meu. Aproveitando-se de que eu estou atordoado, Oliver me joga no chão e me dá dois socos. No entanto, uso a força do meu corpo e inverto as posições. Puxo a blusa do cientista, forçando seu tórax para cima, então desfiro mais alguns golpes em seu rosto, antes de sua blusa rasgar e ele acabar batendo a cabeça no chão.

— Mas que droga vocês estão fazendo? – Grita Dez, aparecendo com Ansel no corredor, mas não nos importamos e continuamos a nos bater. – Parem com isso, seus idiotas! Vocês querem se matar?

Dez me tira de cima de Oliver, enquanto o cientista é puxado para longe por Ansel. Nós tentamos nos soltar, mas ambos os homens estavam decididos a nos parar.

— Oliver, pare com isso! – Pede Ansel, apertando ainda mais Oliver para longe de mim. – Se continuar assim, poderá ser acusado de traição ao trono.

— Afaste-se dela! – Exijo e ele ri irônico.

— Você vai continuar insistindo nessa ideia absurda? – Questiona, parando de tentar se livrar de Ansel. – Eu não vou me afastar da rainha, apenas por causa do seu ciúme sem sentido.

— Sem sentido? – Repito, sarcástico. – Você mesmo admitiu que gosta dela!

— Sim. E daí? Eu gosto dela, mas ela te ama e é por isso que eu jamais a desrespeitaria, forçando meus sentimentos. Ally jamais te trairia. – Afirma, surpreendendo-me. – Ela te ama e ama a família que tem, mas é uma pena que ela ame um idiota que se deixar levar pelas palavras repletas de maldade de uma garota que já deixou claro diversas vezes que não tem consideração alguma pela sua esposa. Ela e a mãe dela, devo ressaltar. Não sei o que a princesa Bárbara lhe contou, mas tenho certeza de que não passam de mentiras e palavras repletas de veneno.

— Me solta. – Digo para Dez, que continuava a apertar meus braços, que já estavam machucados, mas meu melhor amigo permanece quieto. – Eu não vou voltar a brigar com ele.

— Acho bom mesmo. – Resmunga, soltando-me. – Será que podem me dizer o que está acontecendo? Por que resolveram brigar como dois animais selvagens?

— Você e Ally já se conheciam pessoalmente antes de vir para o castelo com Enrique? – Questiono a Oliver e ele me encara confuso.

— Claro que não. É verdade que eu já a conhecia e admirava há muitos anos. Na última guerra, as estratégias de Ally salvaram a minha vila em Kenedias da destruição. Quando tive a oportunidade de trabalhar com o rei Enrique graças a um dos remédios que criei que salvou a vida da esposa dele, ele me contou mais sobre os feitos da rainha de Krósvia e como ela, ainda muito jovem, havia liderado diversos reinos e trouxe a paz ao seu povo. Eu passei a procurar mais sobre ela e me tornei um grande fã. E minha admiração por ela vem aumentando cada vez mais convivendo com ela. Ela tem uma força de vontade inabalável. Desistir não é uma opção para ela, que sempre luta pelo que acredita e pela família, ainda que isso possa colocar sua vida em risco. – Conta Oliver com seriedade. – Ally está passando por um momento difícil e sua imaturidade está piorando a situação. Se realmente deseja saber os segredos que ela esconde, então mostre para ela que você é alguém em quem ela possa confiar e não o idiota influenciável que está mostrando ser.

— O que ela tem? – Pergunto, sentindo meu coração se apertar ao ter a confirmação de que seu estado é grave pela expressão dura do cientista.

— Oliver, cuidado com o que diz. – Alerta Dez e eu encaro meu amigo, um pouco magoado. Ele sabe o que está acontecendo. – Não me olhe assim. Isso é algo que Ally deve te contar e não nós.

— Ainda assim... – Digo, decepcionado.

— Ally tem seus motivos para não querer te contar Austin, mas agir como um adolescente irresponsável não fará com que ela se abra com você. – Orienta meu melhor amigo. – Olhe para você. Eu não sei ao certo o que aconteceu aqui, mas o que teria acontecido se Ansel e eu não tivéssemos chegado? Pelo que entendi, você resolveu acreditar em histórias que não condizem com a personalidade de Ally. Muitas pessoas já tentaram destruir o relacionamento de vocês, Austin. Eu não sei o que Bárbara te disse, mas realmente não posso acreditar que você está desconfiando de Ally, depois de tudo que vocês viveram. Você conhece Ally melhor do que ninguém. A última coisa que deveria pensar dela é que ela está traindo você ou algo parecido. Acha mesmo que eu permitiria algo assim também? Você é o meu melhor amigo. É meu irmão de coração. Sendo sincero, estou bastante decepcionado com você.

— Eu... – Tento dizer alguma coisa, mas minha mente estava em branco. Eu realmente havia extrapolado todos os limites. Suspiro, frustrado. – Vocês têm razão. Eu estou agindo igual a quando eu era um rebelde sem causa, baseando-me em histórias. Sinto muito. Eu... eu não sei o que deu em mim.

— Você também deve ter perdido o juízo, Oliver. Eu poderia muito bem te punir por agredir o rei de Krósvia. Tem noção do que suas ações podem significar para o seu reino? Você é um representante de Kenedias, um aliado importante de Krósvia, e como tal, deveria buscar manter a harmonia entre os reinos. – Repreende Dez, encarando o cientista.

— Apesar de tudo, eu não me arrependo do que fiz. – Responde Oliver, encarando-me com intensidade. Ele estava bastante machucado, mas mantinha a pose dura. – Ele me atacou primeiro e de diversas formas. Admito que posso ter exagerado, mas tenho um grande carinho por Krósvia e não poderia permitir que o rei continuasse a perder a cabeça como agora. Então ainda que me puna, ao menos pude fazer o idiota que governa esse país voltar a ter um pouco de juízo.

— Mostre um pouco de respeito, idiota. Dez não acabou de te informa que suas ações refletem muito mais do que somente em você? Ser preso por traição a coroa pode prejudicar a aliança entre Krósvia e Kenedias. Além disso, se o rei ordenar que você seja preso, não há nada que Dez e eu possamos fazer, ainda que ele seja o melhor amigo do rei e saibamos que ele que começou a briga. – Repreende Ansel, dando um tapa na nuca de Oliver, que geme de dor. – É melhor eu cuidar dos machucados desses dois.

— Não. – Pede Dez, suspirando cansado. – Preciso que vá até Prince e conte o que aconteceu por aqui. Com Austin machucado e Ally desacordada, se alguém ver Austin assim, poderemos ter um problema ainda maior. Peça para que ele cuide disso. Não permita que os outros reis e aliados descubra sobre essa briga. E peça a Lawrence que venha até aqui. Preciso conversar com ele e cuidar da segurança de Ally.

— Tudo bem, mas quem vai cuidar dos ferimentos do rei? Seria um problema se alguém o visse assim, ainda que o príncipe Phillip consiga arranjar uma desculpa para os machucados do rei Austin. – Responde Ansel, encarando o ruivo com preocupação.

— Eu cuido dos ferimentos do rei, já que fui eu que os causei. – Responde Oliver, encarando-me com seriedade. – Considere isso como meu pedido de desculpas por ter exagerado em minhas ações.

— Eu quero ver a Ally. – Afirmo e ele revira os olhos.

— Você quer mesmo que sua esposa te veja com o rosto todo roxo e coberto de sangue, logo depois de ter um desmaio por cansaço? – Ironiza o cientista. Bufo, frustrado por ele ter razão. – Ótimo. Vamos para o meu laboratório.

— Se for assim, com licença. – Ansel faz uma breve reverência e vai atrás de meu cunhado, que provavelmente está na festa que ainda está ocorrendo.

— Peguem uma das passagens secretas e não ousem se matar mais uma vez. Irei pedir para que um dos guardas vá para o laboratório para garantir que não irão tentar se matar. – Orienta Dez com seriedade. – Agora vão. Não temos todo o tempo do mundo.

Oliver suspira e começa a andar em direção a passagem secreta que há no quarto ao lado do meu. Inconformado, sigo o cientista, observando Dez entrar no quarto onde Ally está sem olhar para trás. Ele estava realmente decepcionado comigo. Eu teria que conversar com ele depois.

Assim que conseguimos chegar no laboratório de Oliver, ele vai buscar sua maleta de curativos, enquanto eu me sento em uma espécie de maca. Permanecemos em um silêncio desconfortável, apenas por orgulho. Eu estava me sentindo bastante envergonhado pelas minhas ações, mas mais do que isso, minha mente estava em caos. Uma parte de mim se questionava sobre o estado de saúde de minha esposa, enquanto o outro se perguntava o que se passou na cabeça de Bárbara ao vir falar comigo e me convencer sobre uma possível traição de Oliver e Ally.

E mais uma vez, as lembranças de meu pesadelo voltam a me assombrar. Bárbara é apenas uma jovem princesa, certo? Ela não seria capaz de machucar uma pessoa, ainda mais alguém que ela afirma admirar. Mas, porque eu sinto que há algo de errado em seu comportamento?

— Pronto. – Avisa Oliver, terminando o último curativo em meu rosto. Ele me entrega um copo de água e alguns remédios. Em seguida, pega uma bolsa de gelo em uma pequena geladeira que há no laboratório. – Tome esses analgésicos para aliviar as dores e coloque essa bolsa de gelo sobre seu olho por dez minutos para diminuir o roxo e o inchaço. Se as dores intensificarem, volte aqui para fazermos alguns exames. Creio que você não teve nenhuma fratura, mas como você caiu algumas vezes e pode ter batido a cabeça, é melhor não arriscar.

— Obrigado. – Respondo, após tomar os comprimidos. Coloco a bolsa sobre meu olho esquerdo, enquanto ele tira a blusa rasgada e suja de sangue. Sem me encarar, ele começa a cuidar dos próprios ferimentos, olhando para um espelho. Fico em silêncio por alguns instantes, observando-o. Quando creio já ter completado os dez minutos que ele havia informado, deixo a bolsa de gelo sobre a maca que eu estava e o encaro mais uma vez. – Você realmente não é um inimigo de Krósvia?

— Você vai continuar insistindo nisso? – Resmunga Oliver, frustrado.

— Não. É só que eu estou tentando entender o que está acontecendo, já que todos preferem que eu fique sem saber. – Retruco e ele suspira, cansado.

— Não. Eu não sou um inimigo. Eu realmente estou tentando encontrar uma forma de erradicar a LP e impedir que mais crianças morram. E não. Eu não estou tendo um caso com a sua esposa, não planejo destruir seu casamento ou sua família e tampouco estou me aproveitando da suposta fragilidade que você afirma que ela tem. E sim, sua esposa está em uma situação delicada que coloca a vida dela em risco, mas isso é tudo o que eu posso te contar. Eu prometi não dizer nada a você, até que ela mesmo tivesse te contado. Por outro lado, não concordo que você continue no escuro como ela e Dez. – Responde, deixando sobre a mesa o algodão com algum antisséptico que usava para limpar seus ferimentos e finalmente me encara. – Mas, sendo sincero, se você for tão inteligente como dizem que é, basta você pensar um pouco, juntar as peças e não vai demorar para descobrir algo que está causando tantos sintomas em sua esposa.

— Mas...

— Você não queria ver a sua esposa? – Questiona, interrompendo-me, enquanto volta a cuidar de seus machucados. – Apenas tome cuidado para não a estressar. Ela precisa descansar.

— Certo. – Concordo, vendo que nossa conversa havia encerrado. Antes de deixar o laboratório, olho mais uma vez para o cientista e é nítido o seu cansaço. Provavelmente, devido as diversas noites sem dormir. – Obrigado. E...me desculpe.

Oliver não me encara e parece fingir não me ouvir. Saio do laboratório e, acompanhado do guarda que Dez havia mandado para ficar de olho em nós, sigo para meu quarto pela mesma passagem secreta que havia pego antes. Eu não queria ver ninguém nesse momento, além de minha esposa.

As palavras de Oliver continuavam a ecoar em minha mente, assim como eu continuava a repassar minha recente conversa com Bárbara e com Dez. Meu melhor amigo jamais esconderia de mim, uma traição de minha esposa. Eu sabia disso, porque quando Brooke havia me traído, quando tive a estupida ideia de namorar com ela antes de Cassidy, ele me contou e ainda fizemos uma promessa de que jamais esconderíamos assuntos como esse um do outro. E ele e Lawrence são tão desconfiados das pessoas quanto Ally. Com certeza, ambos já investigaram sobre a vida de Oliver. Se aceitaram tão bem a presença dele, é porque Oliver é alguém em quem posso confiar. Pelo menos em relação a segurança de Krósvia.

Oliver também não pareceu mentir sobre não ter tido contato com Ally, antes de ter vindo para o castelo. Então, se Bárbara estiver mentindo e tiver insistido em criar um conflito entre Oliver, Ally e eu, o que ela ganharia com isso? Ally já havia me alertado algumas vezes sobre o caráter de Bárbara, inclusive na última briga que elas tiveram. Minha esposa nunca foi a favor de violência, então por que ela agrediria justamente suas convidadas? Eu sinto que ainda faltam peças para completar esse quebra-cabeça e infelizmente, ninguém parece disposto a me ajudar a desvendar o que está acontecendo.

— Majestade? – Chama o guarda. Levanto o olhar e o encaro, atordoado. – Nós chegamos. Deseja que eu permaneça aqui em vigia?

Somente nesse momento, percebo que estamos de frente a porta de meu quarto. Suspiro e sinto meu rosto doer pelos recentes ferimentos. Eu realmente precisava descansar. O dia havia sido bastante agitado e pelo visto não demoraria muitas horas para amanhecer.

— Não. Dez deve estar dentro do quarto cuidando da segurança dela, então não precisa ficar. Já está perto de amanhecer, então pode ir descansar. Obrigado. – Digo e ele concorda, deixando transparecer momentaneamente o seu alivio. Ele provavelmente também deveria ter tido um dia cansativo.

— Tudo bem. Com licença, Majestade. – O guarda faz uma breve reverência e me deixa sozinho no corredor.

Após respira fundo, ansioso para ver Ally, abro a porta do quarto e a vejo sentada na cama, enquanto Dez encarava a paisagem pela varanda de meu quarto. Minha esposa parecia exausta e abatida. Ao me ver, ela suspira e me lança um olhar repreendedor. Dez provavelmente havia contado a ela o que tinha acontecido entre Oliver e eu.

— Imaginei que estivesse dormindo. – Digo, aproximando-me de minha esposa. Deposito um beijo suave em sua testa e ela me observa com atenção. – Como está se sentindo? Se sente melhor?

— Eu estou bem. E que ideia estúpida foi essa de brigar com Oliver? Vocês enlouqueceram? – Repreende minha esposa, passando os dedos delicadamente sobre meus ferimentos. Seus olhos exibiam uma genuína preocupação. – Por que fez isso, Austin?

— Eu sou um idiota. – Sussurro, deixando um beijo sobre a mão sobre meu rosto. – Você está realmente bem?

— Sim. – Suspira e encara Dez, que nos observava em silêncio. – Pode ir descansar, Dez. Obrigada pela companhia.

— Deixarei dois guardas de vigia. – Afirma o ruivo e pela forma como falava, nós não tínhamos opção. – Se forem brigar, deixe isso para amanhã. Tivemos um dia cheio e você precisa descansar, Ally. E Austin...

— Eu vou me comportar. Eu prometo. – Digo e ele suspira, cansado.

— Ótimo. Eu realmente gostaria de ter um momento de paz com a minha esposa, depois de tantos problemas em um único dia. – Responde Dez, encarando-nos em um apelo silencioso. – Cuidem-se.

— Boa noite, Dez. – Despede-se Ally, sorrindo gentil.

— Boa noite. – Responde o ruivo, deixando o quarto.

Quando estamos sozinhos, Ally tenta se levantar, mas parece ter dificuldade. Ajudo-a com cuidado e a observo mais atentamente. Apesar da palidez e o evidente cansaço, ela continuava linda. Pego um pouco de água na jarra ao lado de nossa cama e entrego a ela. Minha esposa bebe o líquido com satisfação e suspira, saciada.

Coloco o copo de volta ao lado de nossa cama e me sento na poltrona ao lado da cama. Ela me encara em silêncio. Eu tinha muito a perguntar, assim como ela, mas temia que acabássemos brigando.

— Dez me contou o que aconteceu, mas eu ainda estou sem entender o motivo de você ter entrado em uma briga idiota como essa. – Começa minha esposa, encarando-me com seriedade.

— Bárbara me disse algumas coisas que naquela hora fizeram algum sentido. – Respondo, envergonhado. Ally ri, irritada, mas não parecia surpresa.

E diferente do que pensei, ela prefere não falar nada. Provavelmente, também estava evitando que brigássemos por causa de minha prima. Vou para a cama e me deito ao seu lado. Ela me encara e, devagar, deita de barriga para cima, apenas virando a cabeça para continuar me encarando. De repente, ela ri e suspira.

— Isso me lembrou como você adorava entrar em uma briga quando adolescente. – Comenta e eu rio, acompanhando.

— Sim. – Concordo, observando-a.

— Acho que no fundo, nós não mudamos tanto assim. – Comenta, nostálgica, enquanto acaricia a barriga.

Observo essa ação com curiosidade. Ally permanece mais um tempo acariciando aquela parte do corpo, pensativo. Era como se fosse alguma ação involuntária, uma mania que eu só havia a visto ter uma vez. E então minha mente se perde em pensamento mais uma vez, em uma explosão de acontecimentos.

Observo Ally com preocupação, mas havia algo de diferente em minha esposa. Sua barriga passa a brilhar. Com um sorriso carinhoso e amável em seus lábios, Ally ignora a dor em seu ombro e acaricia a região, com lágrimas escorrendo pelo rosto marcado pela batalha. Ela estava grávida. Não consigo evitar que as lágrimas se formassem em meus olhos e caíssem intensamente.

De repente, um novo trovão ecoa pelos céus e um raio cai na plantação de trigo, iniciando um incêndio grandioso. Ally olha assustada para o que acontecia e se levanta para correr em minha direção. Ela estende uma de suas mãos, enquanto a outra continuava sobre a barriga como uma forma de proteção.”

E sim, sua esposa está em uma situação delicada que coloca a vida dela em risco, mas isso é tudo o que eu posso te contar. Eu prometi não dizer nada a você, até que ela mesmo tivesse contado. Por outro lado, não concordo que você continue no escuro como ela e Dez. Mas, sendo sincero, se você for tão inteligente como dizem que é, basta você pensar um pouco, juntar as peças e não vai demorar para descobrir algo que está causando tantos sintomas em sua esposa.”

Em meu último pesadelo, eu havia visto Ally grávida, mas havia ignorado essa informação, porque para mim não parecia fazer sentido. No entanto, Oliver também havia me alertado que a razão era mais evidente que eu pensava. Enjoos, desmaios, perda de peso, barriga mais saliente. Todos sintomas claros de uma gravidez. Eu havia ignorado, porque a gravidez de Enzo havia sido diferente. Ela não havia tido tantos problemas assim e se não fosse pelo atraso na menstruação, nós jamais teríamos notado a gravidez, ainda que os três últimos meses de gestação tivessem sido bastante complicados.

Levanto-me assustado e levo minha mão a barriga de Ally. Minha esposa me encara surpresa e vejo a dúvida em seu olhar. No entanto, ao notar que acariciava a região e parecia tão afetado, não demora a perceber que eu havia descoberto a verdade, ou pelo menos uma parte dela.

— Austin... – Ela sussurra e vejo o medo em seus olhos.

— Ally, me diz a verdade. – Questiono com seriedade. Minha esposa fica tensa e engole em seco, enquanto me olha com intensidade. - Você está grávida?