“Eu me escondo atrás de um sorriso, enquanto um plano perfeito toma forma”

Joohyun olhou-se no espelho uma vez mais, certificando-se de que tudo estava perfeito. Seu vestido, sua maquiagem. Encarou o próprio reflexo, mas evitou olhar seus próprios olhos. Tinha medo do que encontraria no fundo deles e pior ainda, tinha medo de já não encontrar nada.

Ouviu a mãe chamando seu nome na porta do quarto e desviou os olhos do espelho rapidamente, como uma criança pega fazendo algo que não devia. Mas o rosto de sua mãe estava calmo e ela apenas avisou-a que deveria descer em breve antes de fechar novamente a porta.

Sentou-se na cama e pegou o celular na cômoda, procurando por mensagens de Seulgi, mas não havia nenhuma. Ela ainda estava evitando Joohyun por não aceitar o noivado com Oh Sehun.

Fechou os olhos, cansada. Não havia dormido direito nos últimos dias e agora sentia o peso da falta de sono em cima de si, e tudo que queria era se enrolar no edredom e esquecer sobre o jantar que teria que enfrentar em alguns minutos.

Abriu-os e levantou-se lentamente, andando até a porta a passos lentos. Ao abri-la, ouviu o som de vozes altas e suspirou profundamente antes de sair e fechá-la atrás de si.

***

O sorriso polido de Joohyun foi retribuído com outro tão aberto que em nada se assemelhava com a rigidez estampada em seu rosto e espelhada no de seus pais. Cumprimentou a mãe de seu noivo com um abraço tão leve que sequer parecia um toque, e o pai com um curto aperto de mão e uma pequena reverência.

O sorriso de Sehun era tão vazio quanto o de Joohyun, contudo. Sequer se tocaram, trocando apenas reverências e cumprimentos formais. Sehun desviou os olhos, não querendo ver o olhar preocupado de sua mãe. Sendo o único de frente para Joohyun, foi capaz de ver seu sorriso vacilar por um milésimo de segundo antes de se voltar para cumprimentar os pais de sua - em breve - esposa.

Seguiram para a sala de jantar, Sehun um tanto nervoso e Joohyun aparentemente calma, ainda que só quisesse sair correndo, talvez encontrar Seulgi e pedir que impedisse aquilo. Mas Seulgi não estava ali e ela não podia envergonhar os pais ou não cumprir o que lhe fora planejado.

Sentaram-se, o silêncio predominando e deixando o ambiente um tanto estranho. A expressão do pai de Joohyun era séria e sua mãe sorria, enquanto Joohyun apenas esboçava um sorriso fraco. O jantar foi anunciado.

Não demorou muito tempo para que os homens começassem alguma conversa sobre empresas e investimentos, Sehun incluso, e as duas esposas iniciassem alguma conversa entediante sobre alguma pessoa que estava causando problemas para a família. Joohyun abaixou os olhos e forçou-se a comer, ainda que não tivesse apetite. Tudo se resumia apenas a isso, ela não podia causar problemas para sua família. O orgulho e os negócios vinham acima de tudo.

***

Após o jantar, foram para a sala de estar e Joohyun sentiu intensamente arrepios percorrerem sua espinha. Sentaram-se, Sehun novamente a seu lado, e o cômodo ficou em silêncio por alguns instantes, até que o pai de Sehun levantou-se.

— Bom, a noite de hoje marca algo que há muitos anos foi planejado, mas só agora pode se tornar oficial. A união de nossas famílias é esperada a muito tempo e tenho certeza de que todos estamos orgulhosos de saber que isso vai acontecer mais rápido do que imaginamos. - Sorriu para o casal, recebendo leves sorrisos de lábios cerrados de ambos. Sehun levantou-se.

— Sou grato ao senhor Bae por ter me dado sua permissão, assim como a senhora Bae por me deixar tirar sua filha de si. Mas principalmente a Joohyun, por ter me aceitado. - Voltou-se para a garota, sorrindo um pouco mais sinceramente antes de ajoelhar-se e segurar sua mão, colocando o anel de prata em seu dedo.

Joohyun nunca sentira sua mão tão pesada antes. Sentiu Sehun puxando-a levemente e levantou-se com ele, deixando-se ser abraçada e observando os rostos sorridentes dos demais adultos presentes na sala. Exceto por seu pai, que parecia apenas entediado.

Sentaram-se, sabendo que ainda não era o fim. A mãe de Sehun levantara-se agora, parecendo animada.

— Sabemos que Sehun sempre foi muito ocupado e vocês nunca passaram tanto tempo juntos quanto um casal deveria. - Joohyun não se importava nem um pouco com isso. Na verdade era a única vantagem que via em ter Sehun como namorado. - Nós decidimos que daremos um tempo de férias para vocês antes que se casem. Como uma lua de mel adiantada, será seu presente de noivado.

Joohyun já sabia, mas isso não deixava a coisa menos surreal. Tudo o que ela não queria era passar mais tempo do que o necessário com qualquer pessoa que fosse, à exceção de Seulgi. E agora, teria que passar um tempo ainda indeterminado apenas com seu agora noivo.

Corrigiu a expressão ao notar o olhar crítico de sua mãe, sorrindo e agradecendo polidamente, assim como Sehun. Virou o rosto para observá-lo, assustando-se um pouco ao notar que ele já a olhava intensamente. Iria perguntar se havia algum problema, mas foi interrompida.

— Devemos dar uma volta pelo jardim? - Sehun perguntou, em um tom suave. Não foi capaz de responder a pergunta devidamente também.

— É claro que devem, acabaram de se tornar noivos, devem ficar um tempo sozinhos.

Mais uma vez aquele sorriso brilhante que começava a deixar Joohyun enjoada, pois até então só o vira ao receber notícias desagradáveis para si. Sentiu Sehun segurar sua mão e puxá-la para fora da sala de estar pela porta de vidro que levava ao jardim, e soltá-la tão logo saíram do campo de visão de seus pais.

— Me desculpe por isso. - Sehun parou, passando uma das mãos pelos cabelos. - Eu só queria sair daquela sala.

E Joohyun o entendia.

***

Caminharam em silêncio até um dos bancos do jardim, sentando-se lado a lado. A mesma atmosfera tensa presente entre eles.

— Acha que faremos funcionar?

O silêncio foi cortado pela voz de Sehun, mas nenhum deles tinha a vontade de virar-se para encarar o outro. Sua resposta foi apenas um menear de cabeça leve por Joohyun.

— Porque está fazendo isso? - Insistiu, incomodado.

— E porque continua fazendo perguntas desnecessárias? Não há espaço para nenhum “acho” ou “se”. É algo que precisamos fazer, não há segredo.

A voz soou firme, em um discurso tão ensaiado. Mas Sehun riu, surpreendendo-a.

— Você é interessante, não posso negar. Realmente gostaria de conhecê-la melhor. Não importa quanto tempo tenhamos passado juntos, sempre tenho a impressão de estar com você pela primeira vez. Porque tão fechada, Joohyun? - Virou-se, encarando apenas o perfil de seu rosto.

E foi respondido com o silêncio. Desviou o olhar, conformado.

— Talvez eles estejam certos. Realmente precisamos de um tempo nosso. - Tentou outra vez, e novamente recebeu silêncio.

A vibração do celular de Sehun soou alta naquela atmosfera, e ele o tirou do bolso como uma espécie de redentor. Seus momentos com Joohyun eram sempre assim: vazios e sem significado, ainda que estivessem “juntos” há alguns anos.

Joohyun virou-se, não perdendo o brilho nos olhos de Sehun ao olhar para a tela e um pequeno sorriso surgir ao atender o telefone, levantando-se e andando alguns passos para não ser escutado.

Observou-o por um tempo e então entendeu a curiosidade de Sehun, até então novidade para si. Ele estava interessado em saber como ela se sentia porque aquilo era algo que ele já não queria fazer. Ele já sabia a resposta da primeira pergunta e ainda assim a fez.

Não, eles não fariam funcionar.

Mas não tinham escolha.

***

Joohyun sentou-se na grama fria no centro do círculo de rosas uma vez mais, pela primeira vez sem a presença de Seulgi para amenizar, mesmo de forma inconsciente, a tempestade que lutava tanto para manter trancada apenas em seu interior.

Ventava, mas não era incômodo. Sentia como se as leves rajadas ocasionais a acariciassem, a tocassem de uma forma que há anos já não permitia que qualquer pessoa fizesse. Fechou os olhos e abraçou os joelhos, deitando a cabeça sobre os braços. E perguntou-se quanto ainda poderia aguentar.

Estava cansada. Cansada de fingir ser tão vazia quando havia tanto gritando dentro de si. Cansada de fingir não se importar quando as menores coisas já eram capazes de provocar feridas tão grandes, porque estava tão sensível. E cansada de não conseguir demonstrar o que era importante para si.

Mas estava tão cansada que não tinha forças para mudar a pessoa que se tornou. Admitia dolorosamente sentir certa inveja de Seulgi... Ainda que jamais conversassem sobre suas respectivas famílias, Joohyun sabia que não havia diferença na maneira como cresceram. No entanto, como podiam ter se tornado duas pessoas tão diferentes?

Sentiu a ardência das lágrimas que se formavam em seus olhos. Abriu-os, permitindo que descessem. E chorou, no silêncio da madrugada, deixando para o vento o trabalho de secar seu rosto. Chorou porque naquela noite, naquele instante, se permitiu sentir verdadeiramente todas as emoções que a dominavam. Deixou que se juntassem naquele nó conhecido em sua garganta, que era sempre empurrado para baixo com uma força sobre-humana, mas que agora era desfeito de uma forma ambígua: por um lado libertador, por outro muito mais doloroso. Chorou, porque depois que os desconhecidos iam embora, quando podia tirar o sorriso do rosto e agir naturalmente, ela não o fazia, tão habituada estava à máscara de impassividade.

Chorou porque quando seus pais subiam sem dizer uma palavra e as luzes da casa se apagavam, tudo o que havia era vazio. Dentro da casa e dentro de si.

***