Dark Ways

Abandonados Pela Vida


Vagar a cidade dando voltas e mais voltas parecia ter mais sentido que viver a minha vida, não tinha mais sentido andar por ai sendo o que as pessoas costumam chamar de “ser humano”, meu capuz me trazia o conforto de um lar e meu casaco junto ao meu corpo frio e gélido por conta do clima, foi a coisa mais próxima de um abraço nesses últimos dias.
Decido entrar no café, passar por ele e ver os seus confortáveis bancos acolchoados de frente as janelas e o aquecedor ligado me deixou tentada. Entrei e me sentei no banco do lado esquerdo a porta e nem me liguei em cardápios, com meu capuz deitei a cabeça no encosto e fiquei lá sentindo o ar quente bater no casaco que me aquecia confortavelmente, na temperatura ideal.
Sentia meu sono chegar cada vez mais perto... Como o ar quente me fazia sentir protegida, dançando pelos ares e chegando como uma doce bailarina, gentil e delicada, passando a mais pura e perfeita, porém simples paz. Como uma sereia o sono me puxava cada vez mais para fundo com sua paz encantadora sem eu nem ao menos perceber a morte chegando cada vez mais perto, mas o canto da sereia anula qualquer dor…
-Marina?- a sensação foi de ver a sereia ser esfaqueada na minha frente. Levantei meus olhos com o pesar de como se levantasse um carro, e vi o rosto da doce, boa e velha Margaret me olhando, o olhar mais preocupado e perturbador que já havia visto, mas ao mesmo tempo de felicidade.
-Oi Mag- disse me encostando de novo, a senhora de 60 anos tinha a cara mais jovem que muitas, leve inveja, a última vez que me vi num “espelho” (que era uma poça suja de água de chuva) me senti mais velha e acabada que aquela cidade, minha expressão era cansada e pálida, não havia mais vida e cor em meus olhos, e minha aparência era de 100 anos no olhar e na expressão.
-Querida…- quando ela disse isso eu já saberia o que estava por vir-... Sabe que eu adoro você… Mas se te virem aqui tão relaxada, ficará mal para mim- como ela é delicada… ela sería indiciada a pagar uma multa mortal por me acobertar- Daqui a pouco alguém logo vai te identificar e te denunciar, meus empregados só não o fizeram porque não permiti, mas todos estão muito nervosos quanto a você estar no mesmo ambiente que aquele cartaz- ela apontou para o quadro de avisos do café e tinha um papel com meu nome e um retrato desenhado escrito procurada, virei os olhos para a direita com desgosto, o que aquela cidade tem contra mim? Não vou para um orfanato nem que me matem e levem meu corpo-...e...sabe o quanto eu amava suas irmãs.
Já chega, aquela conversa já estava chegando aonde eu não quería.
-Também tenho consideração pela senhora- me levantei fria e seca e joguei minha última nota de dinheiro, 10 dolares, mas logo que ela virou o rosto para o balcão, ví seu rosto perder a expressão e ficar palído, segui com os olhos o que ela olhava, e tudo começou a rodar em câmera lenta. Uma garota com cara da minha idade ou mais nova, ruiva de trança e sardas tinha um telefone fixo no ouvido direito, e pelo seu olhar… Sabia exatamente com quem ela falava. Saí rapidamente daquele lugar. A sensação ruim daquelas últimas palavras da senhora me perseguiram como se fosse uma massa escura e pesada de angústia por alguns segundos antes de sair daquele lugar, e o grand finale um arrepio que desmontou cada pedaço de mim. Comecei a dar passos rápidos, mas logo um arrepio cortou cada centimetro de mim. Sirenes… Puxei o capuz mais ainda como se adiantasse algo, e apressei mais ainda meus passos, como se fosse um lobo ouvi os passos de cada policial adentrar aquele lugar, aproveitei para correr.
Percorri algumas esquinas mas logo ouvi um
-Alí! Pare, é a polícia- então tirei as mãos do bolso e comecei a correr, senti que um sentimento de desespero, medo, angústia me perseguia ao meu lado a cada passo que ouvia de algum policial me perseguindo incansavelmente. Mas logo me lembrei… Quem melhor do que eu conhece essa cidade? Entrei no beco estreito a minha direita e com cuidado para não fazer barulho, porém rapidamente abri uma porta verde. O senhor Monteaur sempre deixa ela aberta, silenciosamente enquanto os policiais ainda se davam conta que eu havia fugido eu saí pela janela e corri mais um pouco.
Ainda agitada comecei a pensar onde passaria a noite hoje, tinha dormido esses meses nas ruas, embaixo de toldos de vendinhas da cidade. Passando frio e fome… Mas com a polícia me procurando mais que o normal agora, tenho que ter um teto. Então resolvi voltar para onde menos queria… Onde fiquei escondida meus primeiros meses depois da tragédia… Minha casa… Então respirei fundo, e procurei me acalmar, era a única e a última opção.

Logo já andava novamente, com muito medo, mas andava calmamente. Parei instantaneamente de frente a construção cinza e morta. A grama era alta já, e tudo naquela casa já havia perdido a vida. Policiais haviam a fechado, mas voltei logo depois sem cerimônia alguma, é muita burrice Jesus. O lugar mais obvio do mundo, minha casa. Quem olha pode até achar ela assombrada… Na verdade as crianças do bairro já dizem isso, mas graça a isso eu posso agradecer o fato de nenhuma passar próximo ou querer entrar.
Enfiei a mão no bolso e tirei a chave e rapidamente entrei, liguei a luz e pendurei meu casaco, fechei os 7 cadeados da porta e liguei o ar condicionado da sala e a TV, não há mais risco de ligar a luz, minha casa está toda coberta por fora de panos brancos e velhos, e madeiras nas janelas, barricadas próximos as portas. Fiz um gato para ter energia durante esse 1 ano inteiro que praticamente nem usei. De fato por fora ela “está abandonada”. No noticiário da cidade só passava merda, e logo chegou o que eu esperava, como não tem nada para se falar nessa cidade, lá estavam os cretínos dos policiais que me perseguiram, contando que me perseguiram e que consegui escapar novamente e bla bla bla e bla. Novidade, esses policiais são um bando de pamonhas.
-Nós temos um aviso para Marinna Kathe Stuarts, nós não queremos seu mal, e realmente não sabemos porque você foge, mas é o melhor para você, é para o seu bem- mudei para um canal nacional, se fosse preciso fugiria até meus 18 anos seus imprestáveis.
Aumentei o volume e fui para a cozinha, que é uma cozinha americana, não tem divisa entre ela e a sala, abri a geladeira, e o que eu mais temia está próximo de acontecer, a comida acabar. Não tenho emprego, sou menor de idade, estou sendo procurada, e me falta comida. Eu mereço senhor. Peguei um pão algumas fatias de queijo e um ovo, e pela lógica eu fiz?... Pão com ovo e queijoo! (ganhei tudo isso de um funcionário da padaria, amigo meu)
Ai eu to falida
Mas até que eu gosto bastante, eu comia isso direto no jantar… Mas sinto muita falta do Spaghetti da Mari… Minha irmã mais velha de 25 anos nos sustentava. Enquanto o pão estava no micro-ondas me aproximei da bancada e segurei o porta-retrato em que tinha eu, Marianna e Marie. Tentei ao máximo não olhar pro rostinho de Marie mas não pude conter e uma lágrima caiu sobre a fotografia, ela só tinha 7 anos… Com pesar e raiva coloquei a fotografia no mesmo lugar e me aproximei da tesoura da cozinha, e sussurando tentando ao máximo soltar alguma palavra, mas minha raiva não deixava falar quase nada, sussurando entre os dentes com alguns murmuros de esforço e raiva foi o que conseguiu fazer

A culpa…. éhg… sua…

Você destruiu nhg… uma… família...

Você é… uma… assassina… filha da puta…. UMA FILHA DA PUTA DE UMA ASSASSINA

Gritava com raiva e força entre os dentes, mas era um grito aprisionado, não podia gritar alí se um vizinho a ouvísse era polícia na certa.

Entre os sussurros a tesoura percorria pelo meu braço, fazendo desenhos e formas, enquanto meu sangue descia.
Aquele sangue podre não cobriria nada do sangue derramado dos anjos que eram minhas irmãs. E infelizmente por mais que quisesse, aquilo não pagava meu crime, nem de longe. Com esforço engatinhando me aproximei e peguei a fotografia de cima da bancada e escorreguei minhas costas nos armários até que estivesse sentada no chão. Coloquei ela delicadamente no chão a minha frente, e entrei em transe.

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FLASH

Olhava pela janela o tempo passar e as pessoas vivendo as suas vidas, mas eu? Ha, eu tenho que sobreviver a minha. Minhas últimas lágrimas escorriam pelo meu rosto enquanto ouvia Radioactive com o volume no máximo apenas com um fone no ouvido para poder ouvir se Marianna me chamasse.
Por que ela acha que tem tanto direito sobre a minha vida? Por que ela faz questão de pisar em mim e me destruir? Por que ela disse aquilo tudo na frente da escola inteira?? POR QUE ELA FEZ ISSO COMIGO?
Essas eram os tipos de perguntas que passavam pela minha cabeça, meu olhar para a janela era sério e sem expressão, não sei mais o que dizer nem falar. Tudo foi destruído alí, na frente daquela vagabunda da Ana. Já não fosse o suficiente ela me chamando de coisas que até o diabo se sentiria ofendido, Marianna ainda me deu uma bronca, e me tratou como uma criança de 4 anos com tamanho de 16. Como se ela mandasse em mim, ela foi o check-mate daquela treta, ela praticamente apareceu para batalhar ao lado da Vagaputa.
Ter dado uma surra na Ana tería feito sentido na cabeça da minha querida irmã, se ela tivesse me escutado, parado para me ouvir. Mas ela ficou me mandando calar a boca e que iria ME DEIXAR DE CASTIGO? NA FRENTE DO COLÉGIO, ELA NÃO ME DEIXA DE CASTIGO NEM FUDENDO, ELA ME FEZ PASSAR DE RIDÍCULA PARA TODO MUNDO.
Chegar em casa eu vou me jogar na cama me trancar e falar com a Mia, que foi a única naquele colégio inteiro que não riu da minha cara, ela e Marie.
Olhei para o meu lado esquerdo e ela estava dormindo como um anjo na sua cadeirinha grande, com seus cabelinhos meio ruivos com castanho chocolate, só que mais claros. Lisos no comprimento e cacheado em sua ponta, com sua blusinha da barbie com lantejoulas e seu casaquinho jeans e sua saia cor-de-rosa. Sorri, ela parecia uma boneca. Endireitei sua cabeça e puz um travesseiro para sua cabeça não cair para o lado. Vi pelo retrovisor Marianna me observar, me senti suja em olhar nos olhos dela e voltei a minha posição na janela do carro, séria e sem expressão.
Até o olhar dela estressado é engraçadamente (caso não exista, eu mesma inventei essa palavra) bonito. Com seus olhos azuis cristais meio violetas, sobrancelha bem feita, rímel, batom cor da boca, cabelo liso e ruivo meio castanho preso em um coque desarrumado perfeito e uma blusa bege com um casaquinho de lã verde musgo bem confortável por cima e uma calça jeans escura. Minhas irmãs são lindas, e Marianna é a “patricinha” ela compra roupas o tempo todo, ela se empeteca toda para ir para qualquer canto e ela sempre está arrumada e maquiada. Tem um porte fino e educado.

Mas isso não muda o fato de eu estar com raiva dela

-Por que pelo amor de Deus, você bateu tanto naquela garota?- ela disse com pose de dona da razão.
-Porque ela é uma vagabunda- minha resposta saiu curta e seca.
-Sabe qual a definição de vagabunda?
-Não sou burra, você me tratou como uma pirralha de 4 anos na frente de todos, mas caso não saiba, eu estou no segundo ano do ensino médio, e eu tenho 16 anos- completei seca ainda séria.
-Não seja exagerada, não tinha quase ninguém lá- tive até vontade de rir, será que minha irmã tem catarata?
-Então apostemos que quando chegarmos em casa eu serei a notícia do blog da escola, que tal?- ela silenciou e fez uma cara de merda- será que vocẽ precisa usar óculos irmã? SERÁ QUE PAROU PARA OLHAR AO SEU REDOR ANTES DE ME TRATAR DAQUELE JEITO NO COLÉGIO??- perdi minha sanidade e controle, a raiva já havia consumido minhas proteções e não pude segurar por muito tempo. Vi seu olhar enfurecer pelo retrovisor, ela não admite que “aumentem o tom de voz” com ela, fiz uma cara bem de merda e desprezo também para revidar.
-Abaixe esse tom de voz mocinha… Você teve, o que mereceu- aquelas palavras doeram mais no meu peito do que se fosse uma faca, então eu mereço ser tratada como uma cadela? Obrigada então. Ela constantemente olhava pelo retrovisor e para o trânsito. Cansei, não tinha mais nada para falar, tá certo então- E nem adianta me chingar mentalmente.- ela disse já sorridente, o que me deixou incrivelmente mais irada.
-Mentalmente não, eu abomino você, se um dia me tornar alguém como você, eu vou me benzer na igreja. Eu te odeio- tudo girou em câmera lenta, ela fez um olhar chocado que não me convenceu, e percebi depois que Marie havia acordado e me olhava com uma carinha de quem não entendia nada, então eu olhei para frente e vi dois fárois muito próximos, e tudo aconteceu. Tudo ficou mudo e só pude ver tudo voar e logo depois eu dormi ou apaguei