Tudo está como cinco meses atrás. Há uma mesinha branca e quadrada no hall de entrada ao lado da porta com um vaso de lírios em cima. O cheiro fresco e suave do produto para limpar carpete sempre presente. A escada de madeira para subir para o segundo andar sempre lustrada. O enorme sofá vermelho formando uma roda ao redor do tapete branco de pelos e o raque de mógno com a grande televisão em cima.
–Não se sente mais em casa? -Sean pergunta perto do meu ouvido e eu levo um susto.
Olho para ele e sorrio de lado.
–Não sei. É...
–Esquisito. Eu sei.
–Acho que não condiz comigo. Não mais.
Sean assente e eu olho para frente quando escuto a voz do meu pai dizendo:
–Olha quem está aqui!
Sorrio e vou abraçá-lo.
–Oi pai!
Meu pai está vestindo uma calça cáqui e um suéter azul escuro.
–Como foi de viajem?
–Bem. Dormi o voo inteiro.
–Típico da Ally, não é papai?
Olho para Sean e mostro a língua. Ele faz o mesmo. Me dirigo ao meu pai e olho para a cozinha bem equipada com tudo em inóx.
–Onde está a... mãe?
–Quem diria que ela ia perguntar de mim.
Olho para trás e vejo minha mãe afofando - como sempre - seus cachos louros até os ombros.
Respiro fundo e meu pai diz em tom de aviso:
–Cecile.
–Está tudo bem pai. É claro que eu ia perguntar por você,por mais que você seja... - paro de falar e suspiro. - Bom, eu vou subir para o meu quarto e tomar um banho.
–Tudo bem, vamos esperar você para o almoço. -meu pai diz e acaricia minhas costas.
Concordo com a cabeça e passo ao lado de minha mãe. Ela mexe em sua corrente no pescoço e olha para meu pai.
Pego minha mala e Sean diz:
–Você quer que eu leve?
Olho para ele. Já estou no primeiro degrau da escada.
–-Não, pode deixar. Não está pesada. Obrigada.
Subi os degraus de madeira lustrados e encarei o corredor de quartos. Me diriji até a última porta, onde sempre foi meu quarto.
Quando abro a porta branca sou invadida por um sentimento estranho. Talvez saudades. Fecho a porta atrás de mim e dou uma olhada ao redor. Meu quarto sempre foi meu refúgio. Suas paredes eram forradas com um papel de parede branco com desenhos de ramos de flores azuis, na janela havia um acolchoado, aqueles sofás pequenos de couro sintético branco com almofadas azul escuro. Minha estreita, porém grande estante de livros de madeira ao lado da porta estava arrumada impecavelmente do jeito que eu deixara. Minha cama de ferro branca forrada com um edredom branco e travesseiros da mesma cor e as luzes brancas de natal enroscadas pelas curvas da cabeceira da cama me provocam lembranças.
Sinto meus olhos arderem e eu deixo a mala em frente a porta. Vou para a minha cama e me deito nela de barriga para baixo. Era bom estar ali. Passei tanto tempo naquele quarto que ele tinha até um significado importante para mim. Eram lembranças de uma época em que as pessoas não me drogavam com um pedaço de brownie , uma época em que eu não tinha que ne preocupar em ficar na amizade de dois amigos e que minha maior preocupação eram os testes de inglês.
Fecho os olhos e sinto uma única lágrima escorrer por meu rosto. Não sei porque de repente eu ficara emotiva. Não é como se ali fosse perfeito. Eu não gostava de estar em casa por causa da minha mãe principalmente, mas era bom estar de volta ao meu quarto antigo e ver que ele demonstrava quem eu era. Uma menina que, nas sextas-feiras, sentava no sofazinho na janela e pegava um romance inglês para ler enquanto comia alguma guloseima escondido. Ás vezes eu sentia falta dessa menina.
Fungo quando ouço meu celular tocar. Pego-o e leio o nome de Kyle na tela. Deslizo o dedo por ela e levo o aparelho até o ouvido.
–Oi boneca, já chegou?
–Oi. - digo visivelmente rouca. - Já sim. Cheguei quase agora na casa dos meus pais.
Ouço ele hesitando do outro lado da linha.
–Está tudo bem? Você está com uma voz estranha.
Fecho os olhos enquanto mais lágrimas caem.
–Ah estou. - fungo novamente e respiro fundo. - Já ouviu falar em ataque de choro repentino?
–Não.
–Bem, é o que está acontecendo comigo agora. Mas não se preocupe. - me apresso a dizer - Não aconteceu nada, só... tive uma espécie de nostalgia ao entrar no meu quarto.
–Sentiu falta do seu quarto? - Kyle pergunta como se eu fosse louca.
Dou uma risadinha.
–Ah Kyle, é um ótimo quarto. Depois entro no Skype pelo meu notebook e te mostro.
Ouço-o sorrir.
–Nossa... isso é esquisito. Mas gostaria de estar aí pra não deixar você chorar.
Sorrio amareladamente enquanto meus olhos ardem. Pisco várias vezes.
–Talvez você devesse deixar eu chorar. Por mais que seja esquisito.
Ficamos em silêncio por um tempo até que eu quebro o silêncio e, após suspirar, digo:
–Eu estou bem. Desculpa não ter ligado logo depois que desembarquei. Só estava muito distraída com Sean. Podemos nos falar mais tarde? Quero tomar um banho, ir comer alguma coisa e depois dormir um pouco.
–Tudo bem. - Kyle responde. - Ally?
–Sim. - me sento na cama e encaro o edredom branco forrando o colchão que estou sentada em cima.
–Eu te amo, tudo bem?
Sorrio.
–Eu também. Até mais tarde.
–Até.
Encerro a chamada e olho em volta do meu quarto novamente. Ainda com o celular na mão,vou para a caixa de mensagens e leio mais uma vez a mensagem de Matt. Respiro fundo e digito uma resposta rápida.
"Acho que posso concordar com você; pra variar".
Decido deixar o celular de lado e ir tomar um banho. Não posso deixar de me sentir esquisita por ter respondido a mensagem de Matt. Ele poderia pensar que isso era uma espécie de encorajamento. Debaixo do chuveiro grande e quente no banheiro do meu quarto, sento-me no chão e fecho os olhos; o barulho da água caindo é tudo que quebra o silêncio mais do que bem vindo.