Dangerous

No Fundo do Oceano


Corri o mais rápido que consegui. Ressler estava mais à frente, e logo eu o perdi de vista. Bufando, eu apertei a arma e continuei correndo. Então parei. Merda, merda. Eu tinha perdido Donald e o criminoso que estávamos perseguindo.

O caminho se dividiu em dois. Qual dos lados eu ia? Decidi arriscar e ir pela direita, quando alguma coisa acertou minha cabeça com força, me mandando pro chão. Isso definitivamente não era bom.

***

Me obriguei a sentar e a me orientar. Eu estava de frente pra Ressler, que tinha um corte na testa, e parecia meio tonto. Estávamos no que parecia um prédio abandonado. Lá embaixo eu podia ver o rio, e ao longe, as luzes da cidade. Era noite agora. Droga, quanto tempo passamos apagados?

—Ress. –Chamei. Ele olhou pra mim. –Você ta bem?-Fez que sim. –Sabe o que aconteceu?

—Sem conversa. –Veio a voz atrás de mim. Rick Donovan. O cara que estávamos perseguindo. Um nome da lista de Red. Um assassino de aluguel bem estranho. –Vejo que o casal já acordou. Ótimo. Que graça teria se estivessem apagados enquanto morrem?

—Você está ferrado, Rick. Vamos acabar com você. –Se virou pra mim, sorrindo.

—Não está me intimidando, querida. Se esforce um pouco mais.

—Vá. Para. O. Inferno. Você e essa sua certeza de que vai se safar. Todos são pegos uma hora. Você também. –Comecei a tentar me soltar, discretamente. Manter Rick falando. Soltar meus pulsos. Imobilizar o criminoso. O plano parecia bom.

—Eu vou me safar. Ninguém nunca me pegou. Só vocês ficaram na minha cola, mas vão dançar. –Revirei os olhos, conversei com o cara por menos de cinco minutos, e o jeito dele já estava me irritando.

—Jura, criminoso do gueto? Não está parecendo tão certo disso?

—Será?-Tirou a arma da parte de trás do jeans. –Quer apostar?

Foi muito rápido. Ressler se levantou em segundos, avançando na direção de Rick. O criminoso se virou e atirou contra Donald, que foi obrigado a recuar, por causa do tiro no peito, então Donovan o chutou.

Ress praticamente voou pra trás, caindo pela janela na direção do rio. Gritei, levantando, ainda com as mãos amarradas. Rick apontou a arma pra mim, mas levou um tiro no ombro, de Elizabeth. Um grupo do FBI entrou.

Não vi quem me soltou, mas depois disso corri feito doida escadas abaixo, e saí do prédio. Ress. Ressler havia caído.

Me aproximei do rio, pronta pra saltar e ir atrás de Donald. Meera puxou meu braço, segurando com força.

—O que está fazendo, Mhoritz?

—Ressler!-Gritei. –No rio! Donovan o chutou pela janela! Mande alguém lá!-Meera se virou para alguns agentes, sem me soltar. Ela sabia que eu ia me jogar atrás de Ress assim que estivesse solta.

—Mandem uma equipe de busca atrás do agente Ressler, agora!-Olhou pra mim. –E você, Jenna, fique aqui. –Me soltou.

Me afastei de Meera e me sentei numa pedra, vendo uma mega operação ser iniciada. Logo, mergulhadores e um barco estavam na água, procurando por Ress.

Elizabeth se aproximou, varrendo os olhos pelo local, até me localizar.

—Como você está?-Perguntou.

—Como deveria? Ressler pode estar... –Parei.

—Eles vão achá-lo. Você devia ir pra casa.

—Ficou doida? Não sei se entendeu, mas meu namorado levou um tiro e foi jogado num rio! O que faria se fosse Tom lá?-Suspirou.

—Tenho certeza que vão encontrá-lo, Jen. Vá para casa. Ficar aqui não vai ajudar. Eles vão ligar quando acharem Ressler.

—Não saio daqui até o trouxerem pra cá. –Se sentou ao meu lado.

—Então eu espero com você.

—O que? Não, você não precisa...

—Nem você.

Foi uma noite longa. Em algum momento eu peguei no sono, e acordei com a cabeça apoiada no ombro de Keen. Me afastei rapidamente e me espreguicei. Era dia. Havia amanhecido.

—Ressler... –Levantei. A equipe de busca estava na margem agora. –Eles o acharam?

—Não. –Elizabeth respondeu. –Não encontraram nada. Talvez tenha saído, ou... –Fez uma pausa longa, evitando olhar pra mim. -... Ou foi arrastado pela correnteza. –Me apoiei na lateral do prédio. Não. Se tivesse acontecido a última coisa que ela disse... Quais as chances de Ress sair vivo? Meu estômago vazio embrulhou. –É melhor você ir pra casa...

—Não. Vou entrar naquele rio e procurar...

—Jenna!-Ficou na minha frente. –Se a equipe de busca não o encontrou, por que você encontraria? Eles vão voltar a procurá-lo. Vá pra casa, coma alguma coisa e descanse... –Fiz que não. –Ficar aqui não vai trazer Ressler de volta. –Isso fez parecer que ele estava morto, o que me deu vontade de vomitar, mesmo que eu não tivesse comido nada fazia horas.

—Talvez tenha razão. Pode me dar uma carona pra casa?

—Claro, vamos. –Começou a andar, olhei mais uma vez para o rio, então a segui.

***

—Lamento por Donald. –Ergui o olhar, cruzando os braços.

—Assim faz parecer que ele está morto, Red. –Me apoiei no balcão.

—Não tem notícia alguma?

—Nada. Estão me mantendo longe porque acham que ele está morto.

Cinco horas atrás Keen me deixou no meu apartamento, perguntando se eu ia ficar bem. Saí sem responder.

Tomei um banho e fiz um sanduíche, mas não consegui comer. Ressler havia sumido. Engolido pelo rio. Morto. Todos achavam que ele estava morto. Me preocupei, estava começando a achar também. Se não haviam o encontrado, era porque não havia o que encontrar, não é?

Reddington apareceu, provavelmente imaginando que era capaz de eu me afundar na bebida pra tentar me acalmar. O pior era que eu estava mesmo planejando encher a cara.

—Se ele estiver vivo, vão encontrá-lo. –Garantiu.

—Esse “se” é o problema. –Bocejei.

—Você dormiu?

—Um pouco, enquanto estava fora. Dormir agora parece impossível.

—Tem que descansar. E se preparar caso...

—Caso ele esteja morto. É. Parece uma facada do destino, não parece? Forjei minha morte pouco tempo atrás, e agora...

—Jen, isso não é um castigo.

—Karma. Karma é a palavra. Fui uma filha da mãe, e agora meu namorado está morto. Uma bela vingança do destino.

—Vá dormir, Mhoritz, e pare de falar besteiras.

—Não vou dormir nem que me paguem. Fico me lembrando dele atravessando a janela... E... –Fechei os olhos, cobrindo o rosto com as mãos.

—Ficar relembrando não vai te ajudar. –Me puxou pelo pulso até meu quarto. –Durma, isso sim vai ajudar.

***

Não sei em que momento peguei no sono. Só sei que quando acordei, continuei de olhos fechados, sem mover um músculo sequer, querendo voltar a dormir, a cair na escuridão reconfortante do sono. Um telefone tocou, parecia longe, mas não era, eu estava apenas adormecendo de novo. Aquele momento em que ficamos presos entre a realidade e o sono. A porta abriu e luz invadiu tudo.

Alguém sentou perto de mim. Uma mão tocou meu ombro.

—Jenna. –Era Reddington. Não gostei do tom da voz dele. Permaneci imóvel. –Ressler foi considerado morto.

Continuei quieta, presa na semi-escuridão. Então adormeci, com o coração apertado e dolorido.

***

Quando acordei de novo era de manhã. Continuei na cama, querendo apagar mais uma vez e não acordar nunca. Não tinha sonhado com o que Reddington disse. Ressler estava morto. Não haviam encontrado o corpo dele. Se não encontraram... Era por que ele devia... Sei lá, estar no fundo do rio agora, ou foi devorado por peixes que comem pessoas mortas, ou no fundo do Oceano Atlântico.

Se ele tivesse só sido jogado no rio, talvez estivesse vivo, mas, além disso, levou um tiro no peito. Agora estava morto. Morto e muito longe.

Meera disse que eu podia ficar um tempo afastada, mas voltei assim que consegui. Ficar em casa não ia me fazer bem algum.

—Jenna...

—Não, Meera , não começa. –Interrompi. –Me diga que temos algum caso iniciado ou em andamento, por favor. –Suspirou.

—Você e Ressler são iguaizinhos.

***

ALGUM TEMPO DEPOIS...

—Tá vendo o cara?-Perguntei, olhando em volta.

—Não. –Pegou o celular. –Red, tem certeza que é aqui? Já são 14:10 e nada. Não. Não tem... É a Jenna que está irritada. –Olhei pra Keen e cruzei os braços. Desligou o telefone. –Ele nos mandou esperar. O “entregador” deve chegar logo.

—Estou começando a achar que ele está nos enrolando.

—Lembre-se: nada de atirar. Apenas prender.

—Tá, tá.

Dois meses haviam passado desde a morte considerada de Ressler. Foram dois meses horríveis. Eu vinha tentando me focar no trabalho e só nisso. O apartamento dele ainda estava como antes, ninguém tinha coragem o suficiente para tirar as coisas de lá, mas sua sala do esconderijo estava limpa. Meera perguntou se eu queria ficar com ela, mas eu recusei, e agora invadia a sala de Keen pra fazer meus relatórios. Ela nunca reclamou.

—Ali. –Avisei, a mão tocando a arma por cima do casaco. O “entregador” olhou na nossa direção, e então correu. –Parado!

Ele não parou, como sempre. Corri na direção dele, Keen fez o mesmo, gritando ordens no celular. O alvo corria pra caramba. Entrou numa rua estreita. Corri o mais rápido que pude. Keen saiu da minha linha de visão.

Parei. O cara tinha sumido. Girei. Havia muitos lugares para se esconder. Dei alguns passos, alguém saiu de uma ruazinha lateral e se virou. Congelei completamente. Não. Não. Não. Agora eu via fantasmas, definitivamente.

—Ressler?-Olhou pra mim, sem reação. A camisa branca estava manchada de sangue e sujeira. A calça rasgada nos joelhos e na bainha. Estava machucado, e descalço. –Ress?-Aí ele fez a última coisa que eu esperava que fizesse: correu. –Ressler!

Ok, eu estava no meio de uma perseguição, mas era Ressler! Eu tinha certeza de que era ele! Fiz a única coisa que podia: guardei a arma e corri atrás dele. Pra um fantasma, ele corria muito.

—Ressler, espera! Sou eu, Jenna!-Não parou de correr. Ele não lembrava de mim? Ou não era ele?-Ress, para! Sou eu! Donald!-Virou numa curva e sumiu. O perdi de vista. Meu celular tocou, era Keen.

—Onde você está?

—Eu... Eu...

—Pegamos o suspeito, vamos levá-lo. Cadê você?-Eu podia dizer que tinha perseguido meu namorado morto, e passar por louca. Ou ficar quieta.

—Estou voltando pra praça, perdi o suspeito de vista, mas continuei procurando.

—Ok, volte, vamos buscá-la. –Desliguei o celular e olhei por cima do ombro, para a rua vazia.

—Vou encontrá-lo, Ress. Eu juro.

***

O “capanga” de Red abriu a porta e acenou com a cabeça, um gesto me mandando entrar. Assenti e passei por ele. Rick Donovan estava amarrado na cadeira, mãos para trás. Ele havia fugido da prisão, e agora estava ali, esperando pela sentença que eu daria.

Tirei a arma do cinto.

—Sabe o que fez dois meses atrás, Rick?-Perguntei. Ele ergueu a cabeça, tentando parecer confiante. –Tirou de mim a pessoa que eu mais amava no mundo. A única pessoa em que eu confiava cem por cento, sem pensar. A única pessoa que me amava, mesmo que eu seja totalmente imperfeita. Você fez isso.

—E quer o que? Que eu peça desculpas?

—Não. Quero que arda no inferno.

Ergui a arma e disparei contra a cabeça dele.