—Jenna. –Meera chamou, ergui a cabeça, parando de ler uma pasta que Keen havia me entregado. –Vem aqui um momento. –E saiu em direção à sala dela. Joguei a pasta na mesa.
—O que aprontou agora?-Ressler perguntou. Dei de ombros e corri para alcançar Meera. A mulher já tinha chegado na sala e sentado, e fez um gesto para que eu fizesse o mesmo.
—Estou recebendo um puxão de orelha?-Perguntei.
—Não. –Respondeu. –Daniel está pedindo para vê-la há três dias. Como não sabia se seria correto, ignorei, mas ele está insistindo e gritando, então... Achei melhor avisá-la.
—O que ele quer?
—Não sei. Disse que não fala a não ser para você, e se recusa até mesmo de ver o advogado. Alguns dias atrás provocou uma briga, e está numa cela separada.
—Eu tenho permissão para vê-lo?
—Sim, se quiser. Seria bom se o fizesse logo. Daniel não está agindo normalmente.
—Eu... Posso ir agora? Não estamos obtendo sucesso no caso do falsificador de quadros assassino.
—Pode ir. –Me levantei. –Jenna, caso ele fale algo que seja importante...
—Eu aviso.
Saí rapidamente da sala. Daniel não faria tanto estardalhaço por querer dar algumas informações sobre alguma coisa. Ele queria falar comigo. Mas o que? O que podia ser tão importante?
—Jen. –Donald chamou, me parando antes que eu passasse por ele. Eu nem havia o visto. –O que Meera queria?
—Hã... Daniel. Ele quer falar comigo.
—Acha que é uma boa ideia?
—O que é que ele pode fazer? Gestos feios através o vidro? Não vou demorar. –Olhei em volta, garantindo que não estávamos sob o olhar atento de Malik e o beijei rapidamente.
—Eu vi!-Aram disse. –“Nada de interações dentro da base”. –Citou Meera.
—Quer um beijinho também?-Mostrei a língua. –Deixa de ser metido. –Olhei para Ressler. –Não demoro, juro. E você, Aram, é bom manter a boca fechada.
—Ela disse que não pode me ameaçar. –Fui para o elevador.
—O que Meera não ouve... É Jenna Mhoritz fazendo.
***
Me sentei em frente à Daniel e peguei o telefone ao meu lado. Dan já estava com o dele, parecendo muito mais nervoso do que da última vez que nos vimos. O cabelo estava despenteado e um pouco maior. Secretamente eu tinha torcido para rasparem o cabelo dele, que ele tanto amava.
—Estou aqui, Daniel, o que queria?-Perguntei.
—Jen, tome cuidado, muito cuidado.
—Está me ameaçando, seu filho da...
—Não! Não estou! Eu... –Olhou em volta, cobriu a boca e o bocal do telefone com a mão e abaixou o tom de voz. Que diabos...?—Acho que ele vai matá-la. Ele... Ele acha que eu te contei alguma coisa.
—Ele quem?
—Ele fez tudo aquilo, Jen. É complicado. Tem... Tem gente dele aqui, e eles vão me matar. Por isso eu provoquei uma briga, pra ficar sozinho. Mas não tenho muito tempo, em algum momento ele vai dar a ordem, e eu vou morrer.
—Quem? Daniel, de quem você está falando?-Arregalou os olhos, realmente espantado.
—Jen, é ele. É... –Um carcereiro apareceu atrás de Daniel, pondo a mão no ombro dele. A cara dele foi de puro terror. O homem disse algo, então Dan voltou a falar. –Eu... Eu tenho que ir.
—Daniel, de quem você... –Balançou a cabeça negativamente, devagar, os olhos indo de mim, para o homem ao lado dele.
—Se não nos vermos mais... Eu te amo. Desculpa por tudo. –Colocou o telefone no gancho e levantou. O carcereiro fez sinal pra mim, dizendo que a conversa havia acabado, e saiu, levando Daniel.
Tinha alguma coisa muito errada acontecendo ali.
Por que Daniel estava tão estranho? Por que a conversa foi interrompida? De quem ele estava falando? E por que não continuou?
Claro, seja lá de quem ele estava falando... Tinha gente lá dentro. Gente que queria matar Daniel.
***
—Como foi a conversa com Daniel?-Ressler perguntou, enquanto eu colocava dois pratos na mesa e dois copos. A pizza estava tão cheirosa que meu estômago parecia implorar para comer de uma vez. Donald e eu não tivemos como conversar mais cedo por causa do trabalho, nos desencontramos a tarde toda.
—Estranha. Daniel me disse que alguém quer me matar, e matá-lo. Alguém que acha que ele me contou coisas. Ele provocou uma briga só pra ficar sozinho, mas acredita que não vai durar lá. E nem conversamos por dez minutos quando um carcereiro apareceu e interrompeu a conversa.
—Sério?-Olhou pra mim, sentando. –O que aconteceu?
—Não sei, ele disse alguma coisa a Daniel, mas eu não consegui ouvir por causa do vidro. Só sei que... Daniel estava desesperado. Acho que aquele cara o ameaçou.
—Jen, você acredita nele? E se ele estiver tentando enganá-la para que você o ajude a sair de lá?
—Não vai funcionar. Se eu me importasse, o máximo que faria é pedir para transferi-lo. Mas acontece que eu não me importo. –Me sentei, abrindo a caixa de pizza e puxando um pedaço. –Não quero mais falar nisso. Daniel não merece nem um pequeno espaço na minha cabeça, ou na minha lista de preocupações.
—Isso mesmo. –Ri, quase engasgando com um pedaço de pizza.
—Você só está concordando porque não gosta dele.
—Não gosto mesmo. Ele estava te olhando de forma muito...
—Hum, ciúmes. Então o agente Donald Ressler tem ciúme de mim. Gostei isso.
—Não é ciúmes. –Estreitei os olhos na direção dele. –Talvez seja.
—Não tem sentido sentir ciúme dele. Nunca tivemos nada. –Na verdade, não tinha dado certo. Nós tentamos... Mas Donald não precisava saber disso. –E, para registrar: nunca tive nada com ninguém. Você é o primeiro. E o último.
—Bom saber.
—E você lava a louça hoje.
—Lavaria se você tivesse cozinhado.
—Eu pedi a pizza. A louça é sua.
—Não vou ganhar essa discussão, vou?-Sorri.
—Não. Não vai.
***
—E o suspeito?-Perguntei, enquanto Keen me atualizava sobre o caso atual.
—Não quer falar nada.
—Talvez eu deva falar com ele. Fazê-lo falar da maneira Dangerous.
—Não queremos ser processados pelos Direitos Humanos.
—Engraçadinha.
—Jenna. –Meera chamou, do topo da escada. Droga. O que tinha agora?
—Já volto. –Me aproximei de Malik, me preparando psicologicamente para uma demissão ou algo pior. –O que foi?
—Daniel. –Meu coração acelerou. Não. Não. Não...
—O... O que tem Daniel?
—Ele fugiu da prisão.
—Ah. –Respirei aliviada. Depois me perguntei por que me importava se ele vivia ou morria. A verdade foi dura: eu ainda me importava com ele, mesmo depois de tudo. –Alguma ideia de onde ele possa estar?
—Era o que eu ia perguntar a você. Alguma ideia?
—Hum... Tem o apartamento dele, mas não acho que tenha ido pra lá. E a ex-base da Dangerous.
—Quero me dê o endereço dele. Pode ser útil.
—Claro.
Meera não disse, mas eu suspeitava que ela achava que eu estava ajudando Daniel. Isso eu não faria. Ele estava fugindo de uma sentença de morte dada pelo tal “Ele”, mas mesmo assim eu não o ajudaria. Daniel ainda era meu irmão de consideração, mas apenas isso. Nada mais. Ele já não tinha o mesmo espaço de antes.
Dei o endereço à Meera e perguntei se ela queria mais alguma coisa, a mulher negou e me liberou, alcançando o telefone.
Como Daniel havia fugido da prisão? Ele estava sozinho. Bem... Alguém o ajudou ao ataque contra a Dangerous. Daniel não tinha como se fingir de morto e me apagar ao mesmo tempo. Será que ele tinha uma própria equipe? Não havia como fugir sozinho da prisão.
Meu coração apertou, contra minha vontade. Daniel estava sendo ameaçado. E se quem o ameaçou havia posto as mãos nele? Talvez a saída da prisão tenha sido forçada.
Me perguntei se devia contar à Meera. Achei melhor não. Ela não ia acreditar. Daniel tinha ganhado o desprezo dela após tudo o que fez. Ele não valia nem um dólar, na opinião dela. Dela e de muita gente.
—Soube sobre Daniel. –Keen disse, se aproximando. Reparei que estava sentada no quarto degrau da escada. –Acha que ele teve ajuda de dentro?
—Não sei. Eu...
—Mhoritz. –Ergui a cabeça, espiando pelo lado de Keen. Red estava vindo na nossa direção. –Preciso falar com você. –Elizabeth acenou com a cabeça e saiu.
—Que?
—Me contaram que Daniel fugiu da prisão.
—Hum. –Nem tive vontade de perguntar quem havia contado. Red tinha uma rede de informantes impressionante. Ele podia montar a própria agência. Devia sugerir isso um dia. –E...?
—Você se importa com ele, Jen? Se importa se ele vive ou morre?-Parei, franzindo a testa. O que Reddington tinha a ver com isso?
—Por que a pergunta?
—Quando eu pergunto, quero uma resposta, e não outra pergunta, Jenna. –Suspirei.
—Eu não tenho que responder nada. E se você me dá licença... –Levantei. –Tenho muito trabalho pra fazer, por causa da sua listinha negra.
—O que foi que deu em você?
—Ah, Red, vai pro inferno!
—Jenna. –Ress chamou, correndo pra se aproximar. A expressão dele era muito, muito preocupante. –Acabaram de avisar...
—Já sei que Daniel fugiu.
—Não é isso.
—Então o que é?
—Daniel foi encontrado morto, parece que estava saindo da cidade. Ele... –Parei de ouvir. Daniel estava morto. Quem queria matá-lo havia conseguido. Ele não estava mentindo. -... Me ouvindo?
—Que?
—Eu tenho que ir. Alguém tem que reconhecer o corpo.
—Posso fazer isso.
—Jenna...
—Eu cresci com ele, posso fazer isso.
—Tudo bem. Vamos.
***
Nunca entrei num necrotério antes. Foi estranho. E frio. Entrei sozinha com um médico legista. Ressler foi mandado com Keen para o apartamento de Daniel, procurar provas. De que, eu não sabia.
O legista me levou até uma mesa. O homem parecia muito com legista da série CSI. Ele disse alguma coisa, que eu não consegui ouvir, e puxou o pano que cobria o corpo na mesa. Recuei.
Daniel havia sido limpo já, mas os ferimentos ainda estavam ali. Com certeza ele estivera em uma briga feia. E com facas.
—Esse é o seu amigo?-O legista perguntou. Assenti. –Vou deixá-la sozinha por alguns minutos. –E saiu.
Me aproximei da mesa. Daniel parecia estar só dormindo, dava para achar. Mas os machucados, e o corte costurado no peito em forma de V não deixavam esquecer que Daniel Vidar estava morto. Morto assim como nossos irmãos, que ele havia assassinado.
Lágrimas escaparam. Se ele havia feito tudo aquilo, então a amizade que tínhamos era falsa. Eu enfiaria uma faca em mim mesma repetidas vezes antes de ferir letalmente Luke, Ivan e Paul.
—Por que isso, Dan?-Sussurrei. –Por quê?-Me apoiei na mesa, fechando os olhos. Alguém tocou minhas costas.
—Jen, lamento muito. –Me virei, encarando Red e ignorando as lágrimas.
—Quero que me responda uma coisa. E seja sincero. Por que eu vou saber se mentir pra mim. Você matou Daniel?
Esperei. Red não pareceu que ia responder, e não respondeu. Apenas se virou e saiu, sem pressa. Aquele silêncio podia significar qualquer coisa. Temi, muito mais do que ele imaginaria, que significasse um sim.