Dangerous

As Lembranças Roubadas


—Que diabos você tá fazendo aqui?-Perguntei, abrindo a porta. Demetri sorriu.
—Lembra da minha função? Me manter de olho em você.
—Não estamos mais na Rússia. Pode ir embora. –Tentei fechar a porta, ele a segurou aberta.
—Você não deveria estar num daqueles grupos de alcoólicos anônimos?-Minha cara de culpa deve ter me entregado. –Fugiu de novo. Red sabe disso?
—Cala a boca e entra.
Eu estava de volta fazia uma semana. Meera me afastou por causa dos problemas com a bebida, e Red me colocou num grupo de pessoas que não conseguiam se controlar, enchiam a cara, e queriam mudar isso. Eu era uma delas, mas não tinha paciência pra ficar lá. Tudo bem, eu fui apenas em dois encontros e fugi no segundo, então... Bem, é isso aí.
—Reddington vai esganar você.
—Provavelmente. –Me afastei.
—Espera, espera. –Se aproximou, me deixando um pouco surpresa. –Você está cheirando à Vodka.
—Eu estou? Ah, perfume novo.
—Achei que fosse uma mentirosa melhor. –Dei de ombros.
—Eu tô pirando, Demetri. Me afastaram do trabalho, meu namorado me odeia e... –Suspirei. –Tô ficando maluca.
—Um pouquinho.
—Idiota.
—Eu tenho que ir, só vim ver como estava. Volto assim que puder. Acho que tenho um jeito de ajudar você. –Foi pra porta.
—Demetri.
—Sim?-Se virou, a mão na maçaneta.
—Você sempre foi um criminoso?
—Não. Eu costumava servir. O melhor soldado que a Rússia já teve.
—Jura? Não consigo te imaginar no exército. –Sorriu.
—Acho que foi por isso que Reddington me escolheu. –Então foi embora.
***
Red veio algumas horas depois, eu nem precisei abrir a porta, ele mesmo fez isso. Me perguntei como ele conseguiu uma chave extra.
—Você parece muito bem. –A ironia não foi bem recebida, eu estava péssima. Estava encolhida num canto do sofá, lágrimas marcando o rosto.
—Vá se ferrar.
—O que foi agora?-Sentou ao meu lado.
—Tudo. Eu... Preciso de ajuda. Estou em queda livre, Red, e não consigo parar. Não há nada... Nada em que eu possa me segurar e parar a queda. Estou a um passo de ser demitida, o FBI quer me ver longe e meu namorado me acha uma criminosa psicopata. Além de tudo, meu pára-quedas é uma garrafa de bebida. Posso ser doida, mas sei que isso não vai prestar.
—Que bom que pode contar comigo.
—Eu posso? De verdade? Mesmo?
—Que espécie de padrinho eu seria se não o fizesse?
—Você é o pior padrinho do mundo, Raymond Reddington.
—Eu sei, mas estou me esforçando. Você podia colaborar. –Me lançou um olhar afiado.
—É... Foi mal, fugir de novo, mas... Não aguento. Aquelas pessoas... Aquele lugar... Aquilo me deixa entediada. Não ajuda em nada.
—Vamos pensar em outra coisa. Até lá... Não ouse pensar em beber. Ou vou te internar numa clínica, estou falando sério.
—Tá legal. Mas eu fico nervosa, aí quero beber, e não beber me deixa mais nervosa ainda.
—Acho que sei quem pode ajudar.
***
—Você aprendeu isso no exército?-Perguntei, sentada no chão, com pernas cruzadas, de frente para Demetri.
—Não. Aprendi isso após sair do exército, com... Uma amiga indiana. Agora feche os olhos. Tente... Não pensar em nada.
—Impossível.
—Tente.
Esvaziar minha mente era algo que eu nunca consegui fazer. Tentei me imaginar como se estivesse apagando arquivos de um celular. Deletando cada pensamento. Não deu muito certo. Então, aos poucos uma escuridão foi tomando conta da minha cabeça, como um cobertor. Eu sabia que não estava desmaiando, estava apenas fazendo o que Demetri me disse para fazer.
Não sei quanto tempo fiquei daquele jeito. Quando abri os olhos, o russo ainda mantinha os seus fechados. Aproveitei para observá-lo. Ele sempre parecia calmo, como se nada pudesse tirá-lo do sério. Se explodisse, eu ia ficar completamente chocada.
—Você não está fazendo o que eu disse. –Abriu os olhos.
—Fiz, mas já terminei.
—E...?
—Me sinto um pouco mais calma.
—Faça isso sempre que tiver muita coisa na sua cabeça, quando os problemas começarem a soterrá-la.
—Obrigada. Como Red sabia dessa sua... “Terapia”?
—Ele não sabia, eu que me ofereci pra te ajudar.
—Achei que seu trabalho fosse só se manter de olho em mim.
—É, mas não só isso.
—Interessante.
***
Ressler também havia deixado muita coisa no meu apartamento. Peguei uma caixa de papelão e comecei a guardar as coisas, pretendendo devolver. Se ele não havia vindo buscar seus pertences enquanto eu estava presa, então realmente estava com raiva.
Fui devolver as coisas de Donald, me perguntando se ele me expulsaria dali. O porteiro do prédio dele não disse nada quando me viu, então eu não estava proibida de entrar. Coloquei a pesada caixa no chão e bati na porta, esperando. Uma voz, reconhecível à distância veio lá de dentro.
—Acho que tem alguém na porta. –Travei, era Keen. O que...
Nem tive tempo de concluir o pensamento. Me afastei e corri para longe da porta, indo embora antes que Ressler a atendesse. Que raios Elizabeth fazia no apartamento de Ressler?
Parece que eu precisava de uma sessão de relaxamento urgente!
***
—Jenna, nós já conversamos sobre isso. –Meera disse. –Preciso que esteja cem por cento antes de voltar ao trabalho. E nós duas sabemos que não está.
—Mas...
—Jen, por favor. Você é uma das melhores agentes daqui, mas enquanto não melhorar... Não posso deixá-la voltar. Lamento ter que fazer isso. Tive muito trabalho em fazer com que não a demitissem. O mínimo que pode fazer é se recuperar rapidamente e voltar. Entende?
—Entendo. Obrigada por... Não me mandar pra rua. –Levantei. –Prometo voltar assim que possível.
—Estaremos esperando você. –Assenti e saí da sala dela, antes de Cooper.
A base parecia a mesma. Agentes pra lá e pra cá. Nada havia mudado. Desci a escada e passei por Aram, que acenou enquanto eu saía. O elevador parou, e dois agentes desceram. Keen e Ressler. Juntos. Conversando animadamente. Respirei fundo. Não ia surtar.
—Jen, você voltou?-Elizabeth perguntou. Ressler sequer olhou pra mim.
—Não. Meera não quer uma bêbada surtada na equipe, e dá pra entender.
—Jenna, você não é...
—Talvez eu seja. Agora com licença. Tenho que me embebedar. –Passei entre os dois, praticamente empurrando-os para os lados, e entrei no elevador.
Os dois estavam juntos?
***
—... Eu sei que Meera está fazendo o trabalho dela, mas ficar longe do trabalho... Sério, eu vou pirar.
—Está fazendo o que eu mandei?
—Sim. Estou esvaziando minha mente, mas não funciona sempre.
Demetri e eu estávamos indo para uma casa noturna. Ele havia feito o convite, e eu aceitei. Não tinha nada pra fazer mesmo. Meus problemas estavam me soterrando de novo, e só um pouco de álcool podia ajudar. Claro que o russo não sabia disso, ele achava que eu podia me controlar. O inocente não sabia de nada.
O local parecia com qualquer outra casa noturna, mas me fez lembrar imediatamente da de São Petersburgo, onde eu conheci Adrian. Enterrei a lembrança. Não precisava me lembrar disso.
—Não dá pra te imaginar dançando!-Avisei, me aproximando de Demetri para que ele me ouvisse. O russo sorriu.
—Eu consigo imaginar você dançando.
—Red tá pagando você pra ficar de olho em mim em que sentindo?
—Profissional.
—Sei. –Ri, me afastando.
Minutos depois, eu não precisava mais só imaginar. Demetri realmente dançava, e dançava bem.
Escapei de russo, com a desculpa de que ia ao banheiro, e fui para o balcão. Acho que bebi uns três copos de alguma coisa realmente forte, e que fez efeito rapidamente.
Enquanto tentava encontrar Demetri no meio da multidão que gritava e dançava ao som de Cheap Thrills, esbarrei em alguém, e se a pessoa não tivesse me segurado, eu ia cair com tudo no chão.
Minha boca abriu em O perfeito. Não. Podia. Ser.
—Ressler?-A música mudou. Habits (Stay High). A vida gostava de coisas estranhas. –O que está fazendo aqui?
—E o que você está fazendo aqui? Está bêbada.
—Um pouco. –Me soltei. –Está aqui com a Lizzy?-Eu não podia ter dito o nome com mais veneno.
—Estamos procurando um suspeito, que correu pra cá. Jen, o que veio fazer aqui?
—Vim me divertir com Demetri.
—Quem é Demetri?
—Meu amigo. –Ele pareceu querer uma resposta mais completa, mas eu não ia dá-la. Agora as coisas eram diferentes. Ele tinha feito a escolha dele (Keen) e eu a minha (bebidas).
—Jen, você sabe que não pode beber.
—Eu faço o que eu quiser da minha vida.
—Você é muito... –Então pareceu ver alguma coisa, me soltou, e saiu correndo.
—Eu não terminei, Donald Ressler!-Corri atrás dele, seguindo-o por uma porta lateral. Dei de cara com a cena. Um cara no chão, sendo algemado. Keen estava ali, ajudando. –Ah, ele tá acompanhado.
—Jenna. –Ressler largou o homem, e se virou pra mim. Elizabeth levou o suspeito dali. –Você me seguiu?
—Eu sou muito o que? Quero saber.
—O que?
—Vamos. Continua o que você estava falando lá dentro.
—Você é muito teimosa.
—Ah. Ei! Seu... –Não terminei, pega de surpresa. Numa hora estava gritando, na outra, sendo beijava. Eu podia ter empurrado Ressler, podia, mas não queria. Se antes eu queria socar a cara dele, agora queria beijá-lo. Será que isso significava que ele não estava com Keen? Ou que... Bem, que ele era um galinha desgraçado?
—Jenna?-Era Demetri. Ressler e eu nos separamos. –Hum... Desculpa, eu...
—Tudo... Bem.
—Volte pra casa, Jen. –Ressler disse, se afastando. –Sabe que não pode beber.
—Eu...
—Vai. –Engoli o pedido para que ficasse e falasse comigo.
—Vamos, Demetri, vamos embora.
Não me lembro do caminho de volta pra casa. Eu estava irritada, chateada, magoada e bêbada. Não é uma boa combinação. Isso geralmente resultava em coisas estúpidas, irresponsáveis e impensadas. E foi bem o que aconteceu.
Demetri me ajudou a entrar no apartamento e fechou a porta. Assim que se virou pra mim... E o puxei pela frente da camisa e o beijei.
Achei que ele me empurraria, ou não corresponderia, me enganei. Ele correspondeu, e urgentemente, como se fosse se encrencar caso não o fizesse. Talvez estivesse bêbado também, mas não conseguia imaginar Demetri desse jeito.
Caímos no sofá. Havia Demetri em todos os lugares. A bebida ia fazer um estrago daqueles...
***
Acordei num pulo, como se alguém tivesse gritado ou jogado água fria em mim. Eu tinha dormido no sofá. Meus saltos estavam perto da mesinha, lado a lado, e havia uma coberta em cima de mim. Pisquei para a claridade.
Demetri... Arregalei os olhos. Eu havia agarrado o russo e o beijado... Ele correspondeu e...
Não. Não havíamos feito nada mais do que beijar.
Suspirei aliviada e me joguei de volta no sofá. Essa tinha sido por pouco.
Tomei um banho rápido, me vesti e então saí para a cafeteria mais próxima. Precisava de café, e não havia nenhum em casa.
Quando passei pela porta da cafeteria, meus olhos caíram num casal, como se fosse combinado. Nos fundos, havia um homem e uma mulher conversando e rindo. Meu estômago embrulhou. Keen e Ressler.
Saí dali o mais rápido possível. Definitivamente precisava da técnica de Demetri, urgente, ou ia fazer uma besteira.
Donald e eu nem havíamos terminado oficialmente, então ele não devia estar ficando com Keen! Mas será que eles estavam mesmo juntos? Minha colega de trabalho era casada, e não parecia o tipo que traía... Bom, não era da minha conta. Melhor deixar pra lá.
***
—Dessa vez parece melhor.
—Que é agora?-Deixei Red entrar e fechei a porta. Sentou no sofá, segurando um baú pouco maior que uma caixa de sapatos. Flores estavam desenhadas na madeira. Me sentei na frente de Reddington, curiosa. –O que tem aí?
—Não reconhece o baú?-Analisei bem o objeto.
—Não.
—Era seu. Aqui tem... Algumas coisas que ficaram dos quatro anos que ficou comigo.
—Sério?
—Sério. –Colocou o baú no meu colo. Abri a tampa. Havia muitas coisas. Red tirou uma tiara de flores de plástico e a colocou no meu cabelo. –Compramos isso em Nova Déli.
—Fomos à Nova Déli?
—Fomos a muitos lugares. –Comecei a remexer no conteúdo do baú, repentinamente com uma vontade estranha de chorar. Havia fotos, brinquedos, um cachecol vermelho e... Um caderno?
—Que isso?
—Um diário. O seu diário.
—Meu?-Olhei para o diário, um pouco receosa. O mistério tinha chegado ao fim.
—Começou a escrevê-lo quando foi morar comigo. Está tudo aí. –Assenti.
—Por quê? Por que agora?
—Acho que está pronta.
—Eu não tenho certeza.
—Eu também não. –Se levantou. –Mas vamos ver o que acontece.
Depois que Red saiu, fiquei um tempão olhando para o diário. Eu teria coragem de lê-lo? De finalmente saber o que havia acontecido e por que me esqueci de tudo? No momento não.
Tirei a tiara e saí. Precisava ir a um lugar que não ia há muito tempo. Precisava ir ao túmulo de Cassandra e Martin. Meus falsos pais.
***
—Jenna?
—Preciso falar com você.
—Claro. –Segui Elizabeth até a sala dela. Nos sentamos. Depois de sair do cemitério, no dia anterior, eu sentia que havia algo que precisava fazer. E estava começando. –O que precisa?
—Seja direta. Você e Ressler estão juntos?-Ela suspirou.
—Não, não estamos.
—Mas eu vi...
—Jenna, Ressler está machucado, e só você pode curá-lo. Não estamos juntos. Eu amo Tom e Donald te ama. Precisam se acertar.
—Ele não quer isso. Eu... Menti pra ele de novo...
—Se você pedir desculpa, tenho certeza de que vão se acertar.
—Não tenho tanta certeza.
—Espere aqui um momento. –Saiu da sala.
Me senti meio idiota por achar que Donald estava com Keen. Eu devia saber que ela amava o marido dela e... Bem, não tinha certeza se Donald ainda me amava. A porta abriu, mas quem entrou não foi Elizabeth.
—Lizzy disse que quer falar comigo.
—Ah... Eu... É. - Ressler se sentou na minha frente, esperando. Droga, e agora?-Hã... Eu... Queria pedir uma segunda chance, mas eu já a pedi, então... Lamento, de verdade, eu... Devia ter te contado sobre Miguel, mas... Red disse que eu devia guardar segredo, e eu concordei. Cortez não é meu pai, digo, eu não o considero meu pai. Desculpe ter mentido.
—Tudo bem. O importante é que reconhece que errou, e que pediu desculpas.
—Então não está mais puto da vida por eu ter escondido isso de você e não me odeia?
—Não.
—Ah. Isso é bom. –Riu. –Então... Nós... Voltamos?
—Se quiser...
—Eu quero, mas... Você... Depende, quer dizer, eu realmente gosto de você, e não quero que se sinta obrigado a... –Nem vi que Ressler havia contornado a mesa e se aproximado. Só reparei quando me calou com um beijo.
—Acho que agora nos entendemos.
—Agora sim.
***
—Onde está me levando?-Perguntei, olhando pela janela. Estava no banco do carona, com Red, e Dembe dirigia.
—Jenna, eu pedi para que não viesse armada por que sei que pode atirar em mim quando eu te contar uma coisa.
—Contar o que?-Olhei pra ele.
—Não se lembra dos quatro anos que morou comigo por que a fiz esquecer disso.
—Você o que?-Gritei. Dembe olhou pelo espelho, preocupado que eu fosse matar seu chefe. –Por que...?
—Por que era o melhor. Outra hora explico melhor, juro.
—Como foi que...
—Conheci um médico que criou um método de apagar memórias. Esqueceu dos quatro anos que morou comigo facilmente.
—Mas... Eu... Não... Você não podia...
—Agora vou devolver suas memórias.
—Como?
—Para reverter o que fizemos, ele precisa te dar uma... Injeção.
—Injeção? Já mencionei que odeio agulhas?
—Já, quando tinha treze anos. Jen, o líquido que ele injetar em você atuará no seu cérebro, quebrando a “barreira” instalada nele que a fez esquecer do que precisava.
—Você apagou quatro anos da minha cabeça e agora quer enfiar uma agulha em mim? É isso, Raymond Reddington? Roubou minhas memórias!
—Não, não roubei. Elas estão aí. –Apontou pra minha cabeça. –E agora vão reaparecer.
A clínica do médico amigo de Red não era bem uma clínica. Era num enorme galpão atrás da casa dele, que na verdade era um hospital abandonado, que o homem acabou se apropriando. Tudo estava muito limpo, organizado, e tinha até uma recepcionista. Porém, as luzes verdes abafadas me deixavam nos nervos.
—Esse lugar parece um hotel mal assombrado. –Sussurrei, andando ao lado de Red. Dembe vinha atrás de nós.
—Vai ficar tudo bem. –Entramos numa sala. Um homem de cabelos grisalhos e bem cortados nos recebeu. –Chegamos.
—Ela não vai me denunciar, vai?-O homem perguntou.
—Não, doutor. Ela sequer sabe o caminho ou seu nome. –Havia outros jeitos de trazer o FBI ali, mas achei melhor não mencionar. Não tinha por que prejudicar o tal médico.
—Ótimo. Querida, será que pode deitar ali?-Apontou para uma maca. Olhei para Red.
—Vá em frente, Jenna, está tudo bem. –Não, não estava. A luz estava fazendo tudo parecer assustador. Me deitei na maca, nervosa. Red se apressou para perto e segurou minha mão direita.
—Agora, querida, sugiro que olhe para Raymond, e não para mim. Sei que tem medo de agulhas e não olhar pode ajudar você.
—Isso não ajuda muito. –Murmurei.
—Está tudo bem, Jenna. –Red sussurrou, enquanto ouvíamos o médico se preparar. –Isso não vai machucar você.
—Tem certeza?-Hesitou por uns dois segundos.
—Tenho.
A agulha perfurou meu braço. Apertei a mão de Red, sentindo o líquido se espalhar. Parecia tudo bem. Parecia.
—Fox, o que há de errado?-Red perguntou. Eu estava me sentindo distante, mesmo assim percebi que estava tremendo mais que o normal. Meus olhos desfocaram. –O que está acontecendo?
—Eu não sei! Eu não sei! Acho que ela está reagindo.
—Reagindo? Ela está tendo uma convulção! Faça alguma coisa!
—O que quer que eu faça? Ela... –A voz do médico foi abaixando, e sumiu. Ele devia estar apavorado.
—Jen? Jenna, está me ouvindo? Jenna?
***
Eu não conseguia acordar. Podia ouvir tudo o que se passava em volta de mim, mas não podia me mexer ou abrir os olhos. Eu não sabia o que tinha de errado, os médicos nunca falavam do meu estado perto de mim. Temi que estivesse em coma.
Estava num hospital, disso eu sabia. E sempre recebia visitas. No agora, Keen estava comigo. Red chegou pouco depois.
—O que é que você fez com ela, Reddington?-Ela perguntou. –Os médicos a colocaram em coma induzido, não sabem o que fazer! Você tentou matá-la?
—Não. Não tentei.
—Então o que fez?
—Tentei devolver as memórias que tirei dela, mas isso quase a matou.
—Ela vai sair dessa?
—Não sei. Talvez.
—Isso tudo é culpa sua. Não descansou até deixá-la assim. Vai fazer o mesmo comigo?-Som de passos se afastando.
—Lizzy, volte aqui. Lizzy. –Red suspirou, o ouvi se aproximar. –Desculpe, Jen. Nada disso teria acontecido se eu não tivesse roubado suas memórias. Mas se eu não tivesse feito isso... Lamento não ter cuidado bem de você, se tivesse... Não precisaria tê-la feito esquecer. –Do que ele estava falando? Do que eu havia tido que esquecer?
***
—Jen? Será que pode me ouvir como ouvi você?-Ressler. A voz dele me fez sair do escuro de novo, mas não pude acordar. Ele estava segurando minha mão, conseguia sentir isso. –Você vai voltar, não vai? Voltar pra mim? Preciso que acorde. –Eu queria, queria muito acordar, mas não conseguia. –Eu te amo, Jen. –Também te amo.
—Ela vai acordar. –Reconheci a voz. Reddington.
—E se não acordar?
—Ela vai.
—Você fez isso com ela.
—Foi um acidente. Não deveria ter acontecido.
—Quer dizer que ela não devia ter sobrevivido?
—Não. Ela não devia ter ficado desse jeito. Não tentei matar Jenna. Jamais a mataria...
As vozes foram diminuindo, eu estava adormecendo outra vez.
***
—... Era seu livro favorito quando criança. Perdi a conta de quantas vezes o li para você.
A voz veio do meu lado direito. Era Red. Ouvi páginas sendo passadas, então ele começou a ler. Reconheci a história de primeira. Estava gravada na minha cabeça.
—“Alice estava começando a ficar muito cansada de estar sentada ao lado de sua irmã e não ter nada para fazer: uma vez ou duas ela dava uma olhadinha no livro que a irmã lia, mas não havia figuras ou diálogos nele e “para que serve um livro”, pensou Alice, “sem figuras nem diálogos?”...”
Era Alice no País das Maravilhas. Me lembrava vagamente de Red me contar essa história quando era criança, deitada numa cama enorme e rosa, ouvindo atentamente cada palavra dele.
Ouvi os dois primeiros capítulos, então a escuridão me chamou novamente.