Evangeline trazia os olhos arregalados e assustados. Vira, ainda tão nova, a morte de perto. Era como se tivesse sentido uma bala passando quase de raspão por seu peito; assustando-a, sem sequer tocá-la. Seu coração ainda se mantinha disparado e parecida que não desacelaria tão rápido. Compensava toda a sua aflição e medo no braço do mais velho, apertava-o com força, escondendo o rosto nele e, principalmente, tentando esconder seu nariz. O cheiro de formal vindo do corpo da moça a ser carregada era tão forte quanto incomodo.

Segurava-o como se fosse um amuleto da sorte, capaz de protegê-la de qualquer mau, apesar de nunca tê-lo visto proteger ninguém efetivamente. De todo o modo, a promessa estava feita e, em toda a sua ingenuidade, Evangeline acreditava nela.

O homem dava passos firmes e intensos, apesar da noite cobrir com seu manto de escuridão tudo o que podiam ver. De alguma forma, parecia que ele era capaz de saber para onde estavam indo. As duas, certamente, estavam igualmente inconscientes a respeito da situação e do caminho a que seguiam... Meramente, se deixavam guiar... Livia involuntariamente... Evangeline... quase dessa forma.

Invadiram as profundezas de uma floresta escura e adentraram em uma caverna dificilmente visível até mesmo durante o dia. A passagem era estreita e o caminhar se tornava claustofóbico. As paredes pareciam ter vontade própria e invadiam o caminho quando tinham vontade, num gotejar quase sólido do teto em direção ao chão e, em alguns casos, na direção oposta. Chegaram até onde o sol jamais seria capaz de bater, onde os ratos e aranhas que infestavam o caminho outrora desistiram de seguir pelo simples fato de, por ali, não existir qualquer forma de alimento.

Os limites do local tinham formato circular, pequeno. O teto era tão baixo que Evangeline sentiu-se dentro da tão lendária casa dos sete anões. Ruan deitou docemente Livia no chão e sorriu, observando ambas. Não demorou para que Livia despertasse, era como se o tempo tivesse sido calculado milinesimamente.

- Essa será a sua nova casa - Dizia observando as belas moças diante de si, com um pequeno gesto de reverência a elas.

- Oi... - dizia Livia ainda mal acordada, em um tom pouco sóbrio que a fazia parecer um tanto quanto dopada.

- Oi! - respondeu Evangeline, educadamente.

- Evangeline, tudo o que eu tenho a te dizer é que te protegerei, com minha vida se for preciso, como foi prometido. - olhou para a outra - e Livia, você será treinada para ser uma grande dama de sangue, terá a honra de servir ao nosso Caim cujo nome é tão digno que não pode ser citado. O resultado de seu trabalho influenciará o maior dos líderes dos Ugûyaffinos. Precisará de coragem, braveza e muita determinação. Este é um sonho almejado por muitos. Espero que tenha ciência do tamanho disso e que aproveite a oportunidade. Nesses dias, eu serei seu treinador.

Os olhos da menor brilharam com inveja. De certo, não sabia o que exatamente seria uma dama de sangue, mas o nome lhe enchia a alma. Parecia importante e espetacular. Parecia gigantesco e colossal. Parecia necessário, fundamental para muitas outras pessoas. Parecia ser alguém cuja ausência é facilmente percebida. E, também, parecia muito mais importante do que ser uma mera protegida.

Evangeline observava com cuidado as feições de Livia. Analisava-a, cuidadosamente, como era capaz. Via ali nada mais do que uma mulher estranha, mexendo os dedos das mãos e estralando-os como se tivesse passado muito tempo sem exercita-los. O rosto era pálido e tinha um aspecto frágil e enfermo. Os olhos pareciam perdidos. A mulher nem mesmo parecia saber como chegara ali e nem por isso tentara questionar o homem sobre qualquer coisa.

Fora trazida inconsciente, sem qualquer consentimento e não se queixava, como faziam as bonecas levadas de um canto para outro, sem poder reclamar. Enquanto a loirinha, chegara caminhando pelos próprios pés, através de sua própria escolha e seu próprio risco. Achava-se uma mocinha diante do comportamento tão infantil da mais velha.

Considerava-se muito mais apta a ser alguém importante. Sentia-se muito mais capaz, muito mais forte (talvez mais forte não, mas, com certeza), muito mais jovem.

- E o que é uma dama de sangue? - perguntou Evangeline, com bastante firmeza em seu intrometimento.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.