Deitou-se no sofá. Espero uma resposta. A resposta não veio. Fechou os olhos. Os abriu. Focou-se no visor do celular. Nenhuma mensagem nova. Espreguiçou-se. Nada. Pensou um pouco. Lembrou do que um dia lhe disseram. O tempo era relativo, não? Era só relaxar e passaria depressa. Era só relaxar e, quando menos esperasse, a resposta chegaria. Acomodou-se. Relaxou. Fingiu estar desatenta. Lembrou-se que a morte estava próxima. Coçou os olhos. Assustou-se com os próprios pensamentos. Não quis mais estar distraída. Estalou os dedos. Olhou a profundidade do teto branco. Sorriu. Deu risada. Voltou ao visor. Nada. Nada. Nada.

A impaciência começava a ser incomoda. A sala parecia maior do que antes. O aspecto descuidado não mais a atrapalhava. Não havia muito para observar. Os detalhes se perdiam em sua ansiedade. E o celular não vibrava. Mantinha-se quieto, desapercebido, relaxado, sem qualquer atividade. Para ele, o tempo deveria estar passando depressa. Ah, como devia. E se estava assim tão depressa, por quê raios não acelarava o pequeno relógio?

Ah, maldita relatividade furada. Praquele relógio o tempo deveria estar mais rápido e como deveria.Os minutos eram teimosos e preguiçosos. Andavam lentamente, quase não saiam do lugar. Demoravam horas para se movimentar. Maldita preguiça. Maldito tempo. Maldito celular. Maldita casa desinteressante.

Nada para observar.

Nada para fazer.

Nada para quê se concentrar.

Nada bom para pensar.

O sofá a sua frente estava quase vazio, fora um outro telefone esquecido por ali. O homem magrelo continuava na cozinha, deliciando-se da comida que não comera por anos para poder exibir os ossos. Livia escutou uma vibração. Mas a tela mostrava o mesmo de antes. Nada novo. Observou o sofá oposto. O barulho vinha de lá e do celular que ali estava. Mudou de lugar, largou o próprio telefone e pegou o alheio. O tédio, de repente, se foi. Os segundos passaram a correr depressa...

"Amor, estou morrendo de saudades.", mostrava a mensagem com assinatura de Bruno.

Os olhos de Livia saltaram. A mensagem era clara e denunciadora, principalmente, por uma palavra em especial, a primeira delas. "Amor" provava que Ryan e Bruno teriam um caso, um romance, um namoro ou algo do gênero. Provavelmente, algo do gênero.

Era esta a brecha necessária para que ela pensasse imediatamente em um plano perfeito, sem a ajuda alguma, sem a espera entediante.

Respondeu à mensagem no celular do rapaz, marcando um possível encontro em um bom restaurante da cidade, no horário do almoço. Depois, simplesmente jogou o celular de volta para o sofá de onde nunca aparentaria ter saído e voltou ao seu lugar, esperando, novamente, o tempo passar.

Voltou a pensar na vida, sem o desespero de outrora, lembrou-se do encontro inesperado que surgira em sua casa e refletiu sobre o que aquilo poderia significar. Reuniu aos pensamentos as alegações feitas por Valentine no outro dia e o ceticismo do policial.

Percebeu que nada fazia sentido. A amiga havia lhe dito para se afastarem e já a convidava para uma festa com um ingresso gratuito. O policial tinha razão ao afirmar a impossibilidade de alguém aparecer em um andar tão alto e simplesmente ameaça-la, sem sequer pedir algo em troca ou, simplesmente, executar seu assassinato. A conclussão mais sensata para toda aquela história é de que nada passara de um sonho ruim.

Tinha que ser um sonho ruim. E, como dissera Heitor, Livia não deveria dar atenção ao acontecimento, mesmo se não fosse bem um sonho. Precisava esquecer. A morte era certa para todos. A confusão da mente e o desespero não eram tão certos assim.

Tinha que esquecer. Da mesma forma que as mocinhas de coração partido tinham que esquecer de seus homens. O fato é que nunca esqueciam, mas Livia conseguiria porque nunca fora veemente apaixonada pela ideia de morte. Decidiu que ocuparia a mente.

Demorou, porém, muito tempo para que a conclussão fosse tomada e o relógio, desta vez, correu mais depressa. Quando se deu conta, já era a hora do almoço e, infelizmente (ou não), não tinham o que comer.

- Nossa, me bateu uma fome... - Ryan parecia estar cheio de insinuações.

- Não vou cozinhar. De jeito nenhum! - assumiu o bico de uma criança mimada - Mas podemos sair para comer alguma coisa. Conheço um restaurante ótimo. Você paga, já que você é homem e eu sou mulher. Temos que seguir as regras de etiqueta, finamente.

- Está bem... - se rendia fácil - Só não escolha um lugar muito caro.

E o plano começou a funcionar. Caminharam juntos, ao local escolhido. Livia estava estranhamente mais falando que antes. Talvez mais animada. Tramava algo.