28 dias depois

Dia 55

Dali de baixo o mundo lá fora parecia outro, reduzido na vista da pequena janela.

Calmo, mergulhado em meio ao inverno novo-irlandês em que o rigoroso frio, ao congelar todo o cenário com uma neve fina, deixava tudo estagnado.

Mas o interior do gigantesco e majestoso Palácio estava vivo e agitado como nunca antes.

E a cozinha, no subsolo, mais ainda.

A ala da padaria da cozinha era uma névoa quente com fornos trabalhando incansavelmente. Envolta também dos baques das massas sendo viradas nas mesas, uma senhora cantarolando mais ao fundo em escocês, um senhor roncando e um grupo de funcionários cansados de trabalhar, mas totalmente dispostos a fofocarem.

Kevin observava Clarice de canto de olho, incomodado, porém sem dizer nada. Até que não conseguiu mais se reprimir. Horrorizado, exclamou:

—Qual é o seu problema com esse pobre tecido?

Tomou a roupa de suas mãos e a esticou cuidadosamente sobre a mesa, observou o trabalho da costura e, pegando a agulha com maestria, começou a corrigir o erro.

—Você está descontando sua raiva nos vestidos de sua selecionada, querida?

A jovem surpreendeu-se e se recostou na cadeira, sem saber o que fazer com as mãos depois de ter sido poupada de seu trabalho.

Ela prendeu uma mecha do cabelo curto atrás da orelha, insegura.

—Não é isso. Não estou fazendo isso...

Kevin olhou em sua direção e ergueu uma sobrancelha, sugestivamente. Clarice então suspirou, derrotada como acontecia toda vez que alguém trazia uma resposta às suas indecisões.

—Eu não tenho nada contra minha selecionada! A srta. Armstrong-Jones é muito educada, simpática e divertida... O que eu não consigo entender é como alguém como ela veio parar na Seleção! E como pode permanecer nela depois de tanto tempo!

Lauren, outra jovem da mesma idade que também trabalhava como criada de uma das selecionadas, se inclinou por sobre a mesa e tocou o antebraço da amiga.

—Qual é o problema, Clarice? - Perguntou num tom notavelmente provocativo, apenas para animar a colega. - Você não acha o Príncipe Liam atraente?

Ela se esquivou do toque, corando intensamente, como se a suposição fosse ultrajante.

—Não é esse o ponto... - Observou sem um pingo de convicção na voz.

—A questão é a Dinastia Éire. - Tomas esclareceu, sua voz grave que sempre assumia uma entonação audaciosa quando estava prestes a defender suas opiniões. Ele tinha a mesma idade que elas, mas trabalhava como guarda no castelo e, naquele momento ocupava-se em ajudar na cozinha, carregando pesados sacos de farinha para a área de padaria, em que os preparativos para a recepção dos convidados exigem todos os esforços possíveis. Ele bateu uma mão na outra para limpá-las e aproximou-se da mesa em que as meninas e o estilista sentavam-se. Ele passou uma perna pelo banco e sentou-se como se monta em um cavalo, virado na direção de Lauren. Tomas se justificou: - A Princesa Sinead e o Duque Norbert Éire foram péssimos regentes, afundaram Nova Irlanda. E todos sabem disse. - Ele afirmou, convicto, apontando um dedo para Clarice que ficou novamente corada de vergonha. - Não é à toa que muitos guardas e outros funcionários pediram demissão do Palácio.

A senhora escocesa parou de cantarolar sua música e se virou para eles empunhando o rolo que utilizava na preparação das massas. Gritou algo em escocês que ninguém entendeu. Mas o grupo já conhecia a habilidosa cozinheira bem demais para saber que aquilo fora um xingamento. Definitivamente não estava contente com os garotos improdutivos em sua cozinha.

—Ela provavelmente entende a nossa língua. - Lauren sussurrou, fazendo fofoca, mas não querendo ser pega fazendo-a. Olhando de soslaio para a senhora e vendo um funcionário se aproximar da cesta de pães, aproveitando da distração da cozinheira para fugir rapidamente com um pãozinho. Lauren completou a frase para os amigos no mesmo tom provocativo que era de seu feitio usar. - Aposto que ela disse que nós já estaríamos "na rua" pois estarmos aqui sem fazer nada, se não fosse pela carência do Palácio de funcionários e serviços.

Clarice riu sem entender direito a colocação e Tomas sorriu de um modo quase orgulhoso, mantendo seu olhar fixo em Lauren por um longo e intenso minuto significativo.

Kevin arquejou e revirou os olhos.

—Você parece o meu avô, garoto! Passado é passado. William.... Digo, Liam provavelmente nem conheceu sua ancestral. Sinead é o que? Sua tataravó?

—Bisavó. - Tomás corrigiu automaticamente, desviando o olhar de Lauren para assuntos mais sérios. - Não é tanto tempo.

—Sinead morreu jovem... - Claire resmungou, colocando outro pedaço de pão na boca. De boca cheia, comentou olhando para os amigos: - Mal posso esperar para ver o príncipe todo perdido na Semana da Paz.

Kevin arquejou de novo, dessa vez mais alto. Largou a linha e a agulha, enfim incomodado.

—Parem de condenar o pobre menino. Vocês no lugar dele não faria melhor. - Ele arrumou a postura e empinou o nariz. - Já contei sobre o que ele me disse quando nos conhecemos?

Os três jovens funcionários suspiraram e reviraram os olhos.

Quase em coro responderam: 'Só um milhão de vezes".

—Ele é um bom garoto. - Kevin concluiu e logo voltou ao seu trabalho com a linha e a agulha, com os lábios pressionados um no outro. - Mas ele é desengonçado mesmo.

As garotas riram imediatamente, preenchendo o pequeno ambiente com suas calorosas gargalhadas. A cozinheira virou-se para elas e, mais uma vez, xingou alto em escocês, empunhando o rolo de macarrão para o alto como se fosse arremessá-lo. Mas isso não impediu as risadas das moças. O silêncio, porém, apenas se estabeleceu quando Tomas, com uma postura séria e cética, soltou mais um comentário ousado:

—Ele vai errar da mesma forma que os Éire já erraram antes.

Feito o silêncio, a tensão foi imediata, junto de uma nova presença que eles não haviam notado em meio ao som das gargalhadas.

Ronan Irish.

O guarda do Príncipe Herdeiro em questão.

Com uma expressão fechada, o guarda observou os seus colegas de trabalho e conhecidos do Vilarejo dos Trabalhadores. Seu olhar deixou claro que ele havia ouvido o último comentário e sabia do que se tratava a conversa. Mas era educado demais para comprar uma provocação em uma conversa que não participava.

Clarice engoliu em seco e desviou o olhar e Lauren fingiu agir com naturalidade, mordiscando o pãozinho. Tomas observou Ronan se aproximar da cesta de pães sobre o balcão e pegar um que estava por cima, sem desviar o olhar. Sentiu a provocação palpitar na ponta de sua língua, mas acabou engolindo-a com esforço.

A geniosacozinheira viu o gesto do rapaz, mas não ousou dizer uma só palavra.

Por mais que Ronan fosse um funcionário que estava fielmente favorável à ascensão da Dinastia Éire, ele ainda era um trabalhador como todos eles. Teve uma vida extremamente parecida, com dificuldades econômicas, discriminações racistas, tragédias familiares e grandes obstáculos que com muito esforço foram ultrapassados. E Ronan sempre fora o perfeito exemplo dessa superação.

Mesmo não gostando de vê-lo apoiar Liam Éire baseado nas suas próprias intuições e certezas, Tomas gostava ainda menos do que aquilo significava.

De que, de fato, haveria um motivo realista na escolha de Ronan Irish em apoiar o herdeiro. Um motivo que talvez tivesse suporte nas próprias ideologias do cético Tomas.

E isso o fazia se perguntar: Será que eles conheciam a fundo quem era esse Liam Éire?

♕ ♕ ♕

O funcionário saiu da cozinha e subiu as escadas para o primeiro andar e depois de algumas curvas tomou a segunda escada para o andar superior. Era uma escada em espiral, estreita, restrita apenas ao uso dos funcionários. Já acostumado a subi-la e descê-la todos os dias, ele distraiu-se com a casca torrada do pãozinho que segurava. Parecia muito crocante...

E numa questão de segundos o pequeno ambiente preencheu-se com o som de risadas e conversas... e de treze pares de pés descendo apressados as escadas.

Ele grudou-se na parede para não ser atropelado e viu, extremamente surpreso, as treze selecionadas de Príncipe Liam Éire passando bem próximas de seus olhos.

—Não me apresse, Branka! - Riley reclamou, guiando o grupo pelas passagens mais discretas e desconhecidas do Palácio.

O funcionário observou as jovens passarem diante de seus olhos, usando vestidos longos e de manga comprida, volumosos o suficiente para preencherem a largura do corredor.

—Já imaginou se eu caísse aqui? Antes da chegada das famílias reais? - Mirelle Smith vinha em meio as outras meninas, erguendo a barra da saia até o joelho, tendo dificuldade de pisar nos degraus estreitos com suas pernas esguias e saltos altos.

—Apenas não pense, Elle! - Ali sugeriu, vindo logo atrás da amiga com passos apressados. Os braços erguidos arrumando alguns fios de cabelo que caíram de seu penteado. - Só precisamos chegar antes do Rei e da Rainha!

As duas fizeram a curva, uma atrás da outra, e saíram rapidamente da vista do jovem ainda colado contra a parede e chocado demais com aquela múltipla aparição repentina. Era como um estouro de animais, só que todas fêmeas, de vestidos longos e saltos perigosamente altos.

—Se uma cair todas vão cair em sequência. Como um dominó! - Anne pensou em voz alta, já se sentindo apertada e com calor dentro do vestido, descendo as escadas logo atrás delas, não deixando de ouvir a conversa das duas. - Por favor ninguém brinque com a Veronika de que há mariposas aqui dentro.

—O QUE?

A dona da voz logo estava diante do funcionário, cabelos castanhos e cacheados e um longo vestido vermelho chamativo. A garota loira que passou antes dela ergueu os braços, assustada quando a outra gritou, e rapidamente falou algo para não desesperar Veronika.

—Nada! Você não ouviu nada! - Moreena apressou o passo, com medo da colega comer a descer mais depressa e derrubá-la, tomada pelo pavor de estar num pequeno lugar junto de uma mariposa. Seus cachos loiros voaram às suas costas quando ela acelerou o passo e aumentou sua distância entre ela e a srta. Égan.

A jovem de vestido vermelho estremeceu e resmungou para si mesma, enojada:

—Também, o que mais poderia se esperar de um lugar como esse.

Logo em seguida Andressa e Gwendolyn desceram uma atrás da outra.

—Tem certeza de que Riley está com a gente? Que ela não se perdeu do grupo?

—Certeza. - A de cabelos coloridos assegurou com convicção. - Ela que está nos guiando, Dressa! Conhece esse castelo melhor que qualquer um... Sabe-se lá o porquê!

Brianna desceu em seguida, deslizando a mão pela curva interna da escada para não perder o equilíbrio enquanto preocupava-se mais em lembrar o nome dos convidados que descer com segurança.

—Então o Rei Owen está doente e não poderá vir. Seu herdeiro é o Príncipe Christian, irmão do Príncipe Caleb o noivo... - Ela chacoalhou a cabeça, definitivamente não querendo entrar no assunto da "carta desaparecida" de novo e toda a discussão que se seguia a ela: Como o segundo príncipe do Reino de Gales irá agir diante de Sienna? Quem está sabendo do término? Ela quase perdeu o equilíbrio ao voltar a esse raciocínio. - E a Princesa Isidora é a esposa do herdeiro e foi ela que...

—... fez plástica no nariz. "Mas nunca mencione esse assunto". - Charlotte completou com um longo suspiro, descendo logo atrás da amiga. - Sim, Brie, você lembra de tudo! Apenas se concentre em descer a escada, por favor!

E então finalizando a fila das treze selecionadas, Skyla Armstrong-Jones I ajeitou seu colar ao redor do pescoço enquanto desceu a escada circular balançando seu vestido azul de um lado para o outro.

Ela recuou ligeiramente quando notou a presença do funcionário, já praticamente fundido à parede para deixar as jovens passarem por sua frente. Foi a única a notá-lo ali.

A selecionada de Mayo sorriu e diminui o ritmo dos passos para atrapalhar o funcionário em seu próprio caminho.

—Oh, desculpe. Nós... pegamos um atalho. - Ela sorriu novamente e após passar por ele, voltou a andar mais agilmente, ciente de que tinham pouco tempo. - Precisamos ir... Tenha um bom dia!

E como todas as outras, sumiu tão rápido quanto apareceu.

O funcionário olhou para cima e para baixo da escadaria circular, certificando-se de que nada mais passaria por ali e depois continuou o seu caminho, comendo seu pão automaticamente e lembrando-se de que a Semana da Paz estava apenas começando.

Chegaram exatamente um segundo antes do Rei Donavan no saguão de recepção do Palácio. As selecionadas se curvaram numa reverência para cumprimentar o monarca, que sorriu satisfeito com a pontualidade das moças, e Caitlin Dublin, disfarçadamente ergueu as mãos para o céu e agradeceu pelas meninas terem chegado a tempo.

—Fico contente que estejam todas aqui para receber nossos convidados de honra. - Ele comentou, sorridente, sem perceber que elas ofegavam. Observou os presentes com um olhar orgulhoso: Rainha Kiara, Princesa Éileen, Duque Douglas e Duquesa Maire... Mas seu sorriso diminuiu quando ele percebeu que ainda faltava algumas pessoas ali. Suspirou, sabendo que sua felicidade seria tomada pelo estresse rapidamente: - Onde está Lady Sienna, os irmãos Seamair e... - Outro longo suspiro. - Onde se enfiou o Príncipe Liam Éire?

♕ ♕ ♕

Percorreu as teclas do piano numa fração de segundos, combinando e unindo notas de escalas diferentes, e logo em seguida, passado a animação inicial que sempre tinha ao sentar-se frente a um piano, começou a tocar uma música de doce melodia.

Lady Sienna franziu as sobrancelhas e lançou um olhar divertido para o pianista Álan Seamair, achando curiosidade sua expressividade por trás da música. Como resposta, ele apenas sorriu para ela.

A atenção da jovem logo se desviou e ela levou um pequeno susto quando Liam Éire colocou descuidadamente uma pesada caixa de documentos sobre a cauda do piano negro.

Ela olhou para ele e suspirou, cansada.

—Liam, você provavelmente já olhou e analisou todos os materiais existentes sobre as invasões a Wicklow Hills dos últimos cem anos! - Ela suspirou de novo. - É praticamente tudo o que você fez nesse último mês... E eu não acredito que você irá encontrar a solução na literatura existente sobre o assunto!

Também presente no cômodo, Finn Seamair, apoiado sobre o outro lado do piano, esfregou as mãos na testa como para tentar clarear os pensamentos confusos que ocupam sua mente. Ele observou os milhares de papeis comn minúsculas letras e palavras de difícil vocabulário espalhados por toda a cauda do piano e para os novos documentos que Liam trouxera numa caixa de papelão.

No último mês, depois da visita de Álan e Sienna à caótica Wicklow Hills, os quatro sentiram-se na responsabilidade de tomar uma atitude em relação à situação e desde então debruçaram-se sobre todos os documentos que haviam no Palácio a respeito da queda da Irlanda do Norte na Guerra e de todas as medidas políticas e militares tomadas pelo governo da província de Wicklow, como também da própria Nova Irlanda.

Finn compreendeu muito bem o que Sienna dizia: Havia muitas informações e eles não pareciam chegar a lugar nenhum.

—Estou com fome. - Foi o seu comentário inteligente.

—Quando você não está? - Álan retrucou, ainda distraído com as teclas do piano.

—Não! - Liam respondeu, convicto. Levantou o rosto dos papeis e olhou para cada um dos amigos. - Nós temos que estar próximos de entender melhor o que está acontecendo. - Subitamente, voltou-se para os documentos, espalhando-os para todos os lados enlouquecidamente, talvez procurando algo... talvez não. - Poderíamos focar nos pontos que temos mais dúvidas, aqueles que parecem não fazer sentido.

Álan e Finn se entreolharam e depois Álan e Sienna fizeram o mesmo, e por fim, até Finn e Sienna trocaram um olhar apreensivo.

Eles não tinham certeza o quanto a preocupação e dedicação de Liam para com a causa era benéfico o suficiente para tomar-lhe tanto o tempo e o raciocínio.

Enquanto nenhuma solução fosse encontrada, Álan, Finn e Sienna não deixariam que Liam trabalhasse sozinho. Eles ofereceriam sua ajuda e dividiriam suas preocupações.

Assim, sem precisarem de uma única palavra, cada um agarrou uma folha ao acaso e voltaram-se novamente às meticulosas análises.

Porém, antes que pudessem estar engajados nos estudos novamente, as portas duplas se abriram de súbito e uma furiosa Rainha Kiara Hibernia adentrou o aposento.

—Posso saber o que os senhores ainda fazem aqui? - Ela exige, com o queixo erguido e a voz potente. - Os convidados já passaram pelos portões do Palácio! - Ela observou a bagunça da sala de música e os documentos espalhados para todos os lados. Ela fechou os olhos e suspirou. Quando os abriu novamente, não havia perdida a postura impaciente. - Nunca pensei que diria isso, mas já chega de estudos por hoje.

Ela virou-se de lado, para deixar a passagem livre para os quatro jovens.

—Vamos. Agora.

♕ ♕ ♕

As carruagens que pararam em frente a imensa escadaria que levava ao saguão de entrada monumental do Palácio da Nova Irlanda eram contraditoriamente caras limusines escuras.

Mas de dentro delas saiam verdadeiros príncipes e princesas.

Funcionários bem uniformizados abriam as portas dos veículos e cordialmente recepcionavam os novos hóspedes que logo subiam pelos degraus revestidos por um majestoso tapete vermelho colocado ali sempre que havia eventos importantes. E aquele era um dos eventos mais importantes de todos os reinos.

A Semana da Paz era uma celebração anual em comemoração ao fim da última grande guerra e consequente reconciliação dos reinos. Unia as famílias reais durante sete dias em um dos cinco reinos que se revezavam em seu Palácio Real: Inglaterra, Escócia, Gales, Illéa e, sede naquele ano, Nova Irlanda. Era marcada por eventos distintos que possuíam relevância política, social e principalmente cultural; além de que aconteciam na última semana do ano e comemorava-se o Ano Novo com promessas de renovar a aliança entre os países e pôr em práticas ações que realizariam no próximo ano em conjunto.

Ao redor da escada, um enorme grupo de fotógrafos e repórteres de diversas nacionalidades – que sob hipótese poderiam ser impedidos de registrarem aquele momento - não deixavam nem um segundo passar despercebido de suas potentes câmeras e capacidades especulativas.

Dentre eles e sabendo que não poderia estar em qualquer outro lugar senão aquele, a jornalista Mirela Fitz Patrick narrava ao vivo a chegada dos primeiros convidados.

—O País de Gales é o primeiro a chegar! A Princesa Isidora, esposa do Príncipe Herdeiro Christian, é a primeira a pisar no tapete vermelho... com seus saltos finos feitos sob medida... e que provavelmente serão a nova tendência do próximo ano... - Ela se movimentou, mais empolgada, quando outros convidados descem da limusine. - Logo atrás temos o próprio Príncipe Christian e seu irmão mais novo e também noivo da nossa Lady SiennaHibernia, Príncipe Caleb. - Ela fez uma pausa para observar melhor a situação. - Não parece haver mais ninguém com eles... - Fez outra pausa, averiguando suas hipóteses. - Não. Não há mais ninguém. Definitivamente o Rei Owen não veio à celebração. - Ela se voltou para a câmera quando os convidados subiram as escadarias e deixaram de atrair sua atenção. - Parece que temos aqui, Nova Irlanda, uma confirmação de que o monarca galês não está em condições de viajar. A situação de saúde do Rei Owen pode ser mais séria do que imaginávamos.

Aquele poderia ser o jornal de maior peso no reino, digno na apresentação ampla de diversos fatos atuais como também de seus minuciosos detalhes. Mas aquela, sob hipótese alguma, era uma jornalista imparcial. E com suas incríveis habilidades de persuasão, Mirela Fitz Patrick conseguia instigar a sede de fofoca de toda a população nova-irlandesa.

Em Clare, sua província natal, que ficava à oeste de Dublin, Elizabeth Adams Morris riu com ironia.

—Essa mulher sabe como estragar uma festa.

Ela se remexeu quando derrubou uma pipoca sobre o livro aberto de anatomia que pesava em seu colo. A jovem pegou a pipoca e a enfiou na boca ao mesmo tempo que esticava as pernas e as apoiava sobre o colchão da cama a sua frente. Ela sabia como usufruir do conforto.

Observou a televisão novamente, mas dessa vez, não estava mais atenta às especulações da jornalista. Seus pensamentos estavam em outro lugar.

Na Seleção. Nas amigas que fizera no Palácio Real.

Naquele momento, seu coração se apertou, sentindo extrema falta das garotas, da dinâmica de atividades e de Caitlin Dublin, a qual, ela gostava de chamar de "a criatura mais fofa desse universo".

Elizabeth não trocaria um só momento em que viveu dentro daquele castelo – foi a melhor experiência de sua vida, ela nunca negaria isso. Gostaria de poder ter ficado mais tempo e, principalmente, estar vivenciando a Semana da Paz como as outras garotas estavam. Mas ela não se arrependia de sua eliminação.

Acontecera algumas semanas atrás, logo após ela ter contado ao Príncipe Liam Éire que seu interesse em medicina se sustentava na condição enferma de sua mãe, acometida por um grave câncer há algumas semanas antes da inscrição para a Seleção começar. Ela, de seu modo sem "papas na língua", acabara contando também que o motivo pelo qual entrara para a Seleção era ajudar a mãe de qualquer forma que pudesse.

E foi então que Liam a eliminou.

Bem, de formas grotescas, ele havia realmente a mandado para casa, Elizabeth pensou, com um meio sorriso divertido no rosto. A colocação era tão absurda que por pouco ela não gargalhou.

Pois, a verdade foi que Liam enxergou a verdade mais claramente que Liz. O príncipe sempre teve um grande e indiscutível apreço pela sua própria família e ele não conseguiria ficar longe de sua mãe se ela estivesse acometida pela mesmo condição que a mãe da jovem. Disse que o melhor a se fazer por ela no momento seria estar ao lado dela.

E impulsivo como qualquer garoto de vinte anos e com o poder que agora tinha em mãos, Liam Éire pagou por uma intensificação no tratamento de Abigail Jensen Morris, cobrindo todas as lacunas que Elizabeth não conseguia cobrir com o dinheiro que ganhava sozinha.

Elizabeth girou o rosto na direção da cama em que estava com os pés apoiados e observou sua mãe adormecida num sono calmo. Os aparelhos ao lado dela traziam sinais normais para sua saúde - a própria jovem conferira, e a poltrona em que Elizabeth passava várias noites dormindo não era nem de longe tão confortável como as camas das acomodações do castelo, mas traziam um tipo de conforto diferente, que acalmava seu coração.

Ela estava feliz com o rumo que as coisas tomaram e ainda mais feliz por ter conhecido o ilustre garoto que de súbito tornou-se príncipe, tendo a certeza de que ele era um rapaz de boas convicções.

Porém, ainda assim, Elizabeth não conseguia parar de se perguntar: O que estariam fazendo as meninas no Palácio naquele momento?

♕ ♕ ♕

O saguão de entrada encheu-se com convidados ilustres de diferentes lugares do mundo. Todos chegaram ali ao mesmo tempo, em voos orquestradamente sincronizados e depois, em limusines pretas idênticas que seguiram uma atrás da outra pela majestosa entrada principal do Palácio Real da Nova Irlanda, decorada apenas pela neve que caíra sobre a grama na noite anterior.

A família real escocesa talvez fosse a maior em número comparada com à classe mais alta da nobreza nos outros reinos. Sem contar com primos e parentes mais distantes, os quais de todas as famílias eram demasiadamente extensos, a Rainha Rowena, com mais de sessenta e cinco anos, veio acompanhada de seus três filhos e dois netos.

A rainha cumprimentou Kiara, acompanhada de sua primogênita e herdeira do trono escocês, Princesa Davina. Kiara conversou com elas com extrema simpatia, mas não conseguiu se controlar quando os filhos gêmeos da princesa, Lady Alice e Lorde Logan, de seis anos de idade, foram apresentados à monarca de Nova Irlanda. Ela se ajoelhou na frente deles, para ficar em suas alturas, e ficou entretida em uma conversa com as crianças que deixou Rainha Rowena e a Princesa Davina sem saber ao certo como agir.

—Crianças! - Mirelle cantou, entusiasmada. Fazia muito tempo que não via crianças e, pega pela boa surpresa, sua voz saiu um pouco mais alta do que deveria e alguns olhares foram atraídos na direção das meninas que se localizavam, enfileiradas, mais ao fundo do saguão, onde provavelmente seriam as últimas a serem cumprimentadas.

Corada, ela cruzou as mãos em frente ao corpo e mordeu a língua.

Veronika a olhou de canto de olho e assoprou a franja para longe do rosto, arrogante. Inclinou-se na direção da menina e sussurrou:

—Apenas não lhes dê açúcar. Ouvi dizer que eles viram pequenos demoniozinhos.

O comentário deixou Mirelle incomodada e ela afastou-se alguns centímetros de Veronika, não tentando manter apenas a garota longe, como também as suas ideias.

Os outros filhos da Rainha Rowena, Príncipe Maxwell e Princesa Susana, foram imediatamente cumprimentar o mais novo herdeiro da Nova Irlanda.

Após as reverências, Liam e Maxwell apertaram as mãos, igualando o nível de tratamento entre eles e, como era o propósito da Semana da Paz, estabelecer e fortalecer o vínculo entre as famílias reais; e Liam também se viu inclinando-se para beijar o dorso da mão da princesa.

Em todas as festas que comparecera no Palácio Real quando era mais novo e seu título não tinha grande relevância nas interações entre a nobreza, ele nunca tivera que apertar ou beijar a mão de ninguém. O cumprimento limitava-se a uma reverência. E como um bom garoto que preferia passar o seu tempo brincando de pega-pega ou jogando videogame, ele gostava da simplicidade característica da cordialidade que era obrigado a cumprir na época... e agora ele já começava a sentir falta disso.

Não pode deixar de pensar que era estranho beijar a mão de uma princesa sendo que ele mesmo era um príncipe. Ou melhor, que o gesto era absurdamente estranho considerando que logo ao lado e, extremamente atentas à cena, estavam suas treze pretendentes à esposas.

Riley se inclinou na direção de Brie e sussurrou:

—Ouvi boatos de que Maxwell não é um "filho legítimo" do antigo rei... Mas desse ponto de vista, - ela brincou, referindo-se a posição privilegiada que as duas estavam para observar o filho da Rainha Rowena. - ele me parece muito bem com um príncipe.

Brianna engasgou e corou fortemente com o comentário. Esse era o tipo de coisa que, quando ela pensava, se esforçava para manter dentro de sua própria imaginação, mas com uma amizade como a de Riley, até os seus pensamentos mal formulados eram facilmente extraídos.

Felizmente ou não, Caitlin Dublin se inclinou na direção delas, colocando a cabeça entre o ombro das duas e lhes ordenou que se comportassem.

A Princesa Susana sorriu amplamente com o cumprimento de Liam e jovem lutou para soterrar o pensamento de aquilo era estranho demais no fundo de sua mente.

—Tenho a impressão de que já nos vimos antes. - Ela comentou, mexendo em seu brinco casualmente. - Você já esteve em festas aqui no Palácio antes, estou certa?

Liam engoliu em seco.

—Não em festas com convidados internacionais.

—Oh, certo. - Ela fez perceptivelmente decepcionada com o fato implícito de que Liam não tinha os privilégios que têm hoje quando não era o herdeiro.

O olhar de Susana rapidamente mudou de direção para os primos de Liam. Álan e Finn encontravam-se logo atrás do príncipe, próximos ao Duque e da Duquesa Éire.

—E os senhores são...? - Ela quis saber, sedenta por mais introduções. Seu irmão lhe acompanhou com as mãos no bolso sem dizer nenhuma palavra.

Álan, de canto de olho, observou Sienna, não muito distante dali e a pegou atenta à introdução da Princesa Susana. Ele achou engraçado sua curiosidade e ela, corada, desviou rapidamente o olhar quando percebeu que fora flagrada.

Quando arrumou sua postura novamente e olhou em direção à porta, a família real galesa já havia terminado seus cumprimentos com o rei e os três membros da mais alta nobreza do Reino de Gales vinha em sua direção.

Sienna definitivamente não esperava pelo abraço que recebeu de Princesa Isidora.

—Finalmente nos encontramos de novo! - Ela exclama próximo de seu ouvido e com os braços ao redor de seus ombros. A morena de vinte e sete anos se afastou um pouco para olhar Sienna e sorrir amplamente. - A última vez que nos encontramos não foi na melhor das circunstâncias...

O velório do Príncipe Keegan, o fato subentendido foi claro para ambas e Sienna não poderia discordar da colocação da futura monarca do trono galês.

—Definitivamente eu prefiro que nos encontremos em momentos como esse. - Sienna concordou, sorrindo também, porém como a estranha sensação de um dévà ju. Tanta coisa mudara em Nova Irlanda e também dentro da própria lady no último mês que encontrar com Isidora, uma de suas maiores confidentes, foi como encontrar uma figura de um passado muito longe e remoto do qual ela sequer tinha certeza de que um dia existia.

E esse sentimento tomou maiores proporções e transformou-se numa confusão de memórias, hormônios e incertezas quando uma voz mansa e charmosa interrompeu o reencontro das duas moças.

—Não monopolize minha noiva, Isidora.

Sienna mal percebeu a amiga se desvencilhando dela e se afastando o suficiente para o cunhado se aproximar. A lady teve toda a sua atenção concentrada apenas no Príncipe Caleb Maddox.

Com sua postura altiva, seu corte de cabelo perfeito e o terno feito sob medida, Caleb parecia ter saído de um conto de fadas moderno. Um do qual pertencia ao passado de Sienna.

Em todas as maneiras que imaginou esse reencontro, não esperava sentir o coração palpitar diante a beleza do príncipe outra vez. Ela esperava que a raiva das últimas notícias do relacionamento dos dois fosse tomar maiores proporções, ou melhor, que ela finalmente conseguiria esclarecer a situação após semanas de incerteza e colocar um ponto final naquela história.

Mas a questão é que a história, como ela não esperava, era tão viva e real como uma poderosa árvore que se segurava à terra por antigas raízes.

E Sienna definitivamente não conseguia pôr ordem aos seus pensamentos para esboçar a reação mais adequada.

Caleb ficou bem próximo de Sienna e tomou a mão dela nas suas antes de se inclinar para um beijo delicado em sua bochecha.

—Como tem passado? - Perguntou discretamente.

Os olhos de Sienna faiscaram em sua direção e ela demorou alguns segundos para compreender que aquilo estava mesmo acontecendo. Que Caleb, depois de muitas semanas sem nenhuma comunicação, estava ao seu lado. E quando recuperou um pouco da percepção do mundo a sua volta, ela retorceu os lábios num modesto sorriso.

—As coisas andaram agitadas... mas tudo bem. — Ela respondeu, olhando diretamente para o seu... noivo.

Queria buscar nele qualquer traço que denunciasse uma centelha de vergonha ou arrependimento, ou minimamente que ele de fato lhe enviara uma carta de "término de relacionamento". Mas a expressão de Caleb nada entregava. Era como se ele nunca tivesse lhe escrito nada.

Como se a carta nunca tivesse existido.

E Sienna começou a perder a cor do rosto ao sentir que, pouco a pouco, nada mais fazia sentido.

Ela conseguiu mascarar o desconforto quando o Príncipe Christian, irmão mais velho de Caleb se aproximou para cumprimentá-la e novos assuntos fáticos foram imediatamente estabelecidos para evitar uma possível conversa estranha e ainda mais desconfortável.

Entre Caleb, Isidora e Christian o desconhecimento da carta parecia algo comum a todos, e diante dessa situação desconfortável, Sienna Hibernia clareou um único pensamento em sua mente: Em meio à conversa fática e total ignorância ao término do relacionamento, Caleb Maddox estava contando uma grande mentira, pois ele ainda não havia jogado todas as suas cartas na mesa.

Os outros convidados logo estavam ali no saguão de entrada, todos juntos, na reunião que todo ano era a mais aguardada, acompanhada e celebrada por todo o mundo.

A rainha e o rei da Inglaterra, Genevieve e Anthony, vieram acompanhados dos pais da monarca, Bernard e Candace, antigos soberanos do reino e atuais arquiduque e arquiduquesa.

Illéa, em meio a crises sociais decorrentes das alterações estruturais nas castas que estavam em um demorado processo de eliminação, mandou sinceras desculpas pela sua indisponibilidade de comparecer ao evento. Em nome do reino, enviou o seu embaixador, um sujeito bem engravatado e sério que viera tratar de assuntos políticos e desfrutar de boas comidas e bebidas nas festas, mas que definitivamente não representaria Illéa nos Jogos Regis.

Em suma, as nações ali presentes eram o Reino da Escócia, o Reino da Inglaterra e o Reino de Gales. E claro, seu anfitrião: Nova Irlanda – com uma "família" perceptivelmente mais extensa em relação ao ano anterior.

A recepção durou longos minutos que para alguns pareceram durar horas. Logo em seguida de seu término, os convidados foram apresentados aos seus aposentos na ala oeste, que possuía a estrutura para acomodar tais hóspedes. Todos se reuniram novamente no demorado jantar de boas-vindas.

Embora o cansaço do primeiro dia, as selecionadas não conseguiram dormir, agitadas e ansiosas demais com a semana que estava por vir. Cada vez que fechavam os olhos, imagens vívidas das interações com os nobres repetiam-se e repetiam-se em seus sonhos.

Sienna fitou o teto de seu quarto a noite inteira, compartilhando da insônia que parecia acometer os morados do castelo - tão contraditório aos idílicos contos de fadas. Tinha seu pequeno baú de memórias apoiado sobre o colo.

Não monopolize minha noiva.

Minha noiva.

Caleb não saía de sua mente.

E Liam Éire estava nervoso.

Ele nunca pode conhecer todos aqueles nobres antes, pois não tinha um nível hierárquico alto o suficiente para isso; e agora ele era o único príncipe de Nova Irlanda. O herdeiro ao trono e, no futuro, ele tomaria as decisões importantes junto de outros grandes líderes.

Aquela realidade nunca o atingiu com tanta força antes.

♕ ♕ ♕

Eu não diria que foi sangrento.

É claro que sangue foi derramado, mas não além do que já era característico do conflito. Muitas vidas foram poupadas.

Ainda assim, não garantiu à história um final feliz.

O Conselheiro Sean se contraiu, assustado com um barulho repentino. A caneta escorregou pelo papel manchando as antigas páginas com fresca tinta – ele não deveria acompanhar a leitura com uma caneta destampada. Ele ergueu os olhos do pequeno diário e voltou sua atenção em direção à porta.

Em completo silêncio pode ouvir o barulho de antes se repetir. Havia alguém lá fora.

Vagarosamente, mas habilidoso o suficiente para não fazer ruídos, ele afastou a cadeira que estava sentado da escrivaninha e pôs-se de pé. Tirou os óculos pequenos da ponta do nariz e o guardou cuidadosamente no bolso da camisa.

Pé ante pé ele se aproximou da porta e olhou o corredor deserto.

O gabinete do rei fica logo ao fim do corredor e os dois oficiais que guardavam à porta, os quais podiam ser vistos apenas num estreito ângulo de onde estava, não pareciam ter se movido – continuavam com a mesma postura de sempre.

Sean então olhou para o outro lado do corredor, na direção dos gabinetes de outros funcionários do Palácio, e teve outro sobressalto.

Escondeu-se atrás da porta por impulso e depois voltou a olhar a movimentação.

Cautelosamente, a Conselheira Almirena fechou e trancou a porta de seu próprio gabinete. Tinha um celular grudado à orelha e seus lábios se moviam muito pouco para conseguir extrair deles alguma palavra.

Mas graças ao silêncio dominante, Sean pôde ouvir com certa clareza.

—... não ligo para a garota. Ela tenta seguir os passos da irmã, mas é só uma amadora. - Ela girou os olhos e bufou. - E daí? Todos sabem que eu também não gostava dela. Eu posso me provar melhor que ambas. E acredito que eu já esteja fazendo isso, não concorda? - Ela parou com a mão na cintura, desafiando alguém mesmo à distância.

Sean apertou os olhos, a observando com mais cuidado – com mais de noventa anos de idade, sua visão não era mais tão confiável.

Mas ele já esteve na presença da Conselheira Almirena inúmeras vezes antes, portanto, o que precisou fazer naquele momento foi juntar as memórias que tinha de sua fisionomia com o inusitado comportamento que demonstrava.

As maçãs do rosto altas, os olhos grandes e amendoados, o pescoço fino e longo... A determinação, a postura, a audaciosidade... Tudo aquilo, na verdade, lhe resgatava memórias ainda mais antigas. Demasiadamente antigas. - Ah, sua memória também não era mais como antes!

Almirena bufou.

—Ah, por favor, a Seleção é só um teatrinho. Você acha mesmo que ela vai conseguir alguma coisa dessa "competição"? - Ela aguardou um momento e revirou os olhos novamente e respondeu teimosamente: - Claro, como você quiser, irei ajudar a garota.

Sem dizer mais nada, ela desligou o celular e o enfiou no bolso do casaco. O som de seu salto alto batendo contra o chão foi ficando cada vez menos intenso e logo Sean se viu em meio ao silêncio da noite novamente.

Voltou para dentro do cômodo e olhou para o pequeno diário que lia sob a luz fraca de uma luminária. Depois deixou seus olhos correrem por todo o cômodo.

Aquela já foi uma sala mais movimentada e convidativa. Sempre entulhada de documentos e outros artefatos de certo valor histórico à família real, que atraiam diferentes pessoas a desenterrar o passado para compreender o presente. E assim, mantendo o costume do ambiente, Sean voltou à escrivaninha certo de que era sua vez de cavar fundo em antigas memórias.