Come Back

Eu preciso de um lugar para ficar longe de você


- Lali? Você está bem? – A voz de Johnny era um fio distante, quase imperceptível, eu estava quase em transe – LALI?!

Com um salto me virei rapidamente para ele.

- Está tudo bem sim Johnny. – Caminhei até ele e me sentei ao lado da garotinha, Shannon. Meus olhos permaneceram em Kail por mais um instante. Ele havia mudado muito pouco, ainda era o mesmo de quatro anos atrás, inclusive seu olhar ameaçador continuava o mesmo, apesar de manter sempre um riso orgulhoso nos lábios.

Ao vê-lo com Catelyn, eu tive a certeza de que Max estava envolvido em briga de cachorro grande e talvez nem soubesse direito disso.

A porta do quarto de abriu e Allie olhou em volta, ao me ver, abriu um sorriso suave e me chamou.

Olhei rapidamente para Catelyn e ela sustentava um sorriso cretino nos lábios, só eu sei o quanto eu estava me segurando para não fazer um escândalo ali.

- Ele quer te ver – Alison falou baixo para mim e apenas assenti com a cabeça e entrei no quarto, assim que fechei a porta atrás de mim, atravessei o quarto correndo.

- Que porra está fazendo aqui Whisper? Era pra você estar dentro de um ônibus se pegando com o Gates em alguma cama dentro do ônibus da banda.

- Cala a boca – puxei a coberta da cama e o analisei rapidamente, apenas um lado do corpo estava queimado. – Queimadura de terceiro grau? – disse preocupada.

- Não, de segundo, eu estou bem Lali, um pouco dopado agora, mas eu estou bem. Não devia ter voltado para me ver.

- Meu instinto me disse pra ficar Max, e ele estava certo!

- Do que está falando?

- Onde está seu telefone?

- Sei lá, chamuscado dentro da minha casa, ou no meu carro, eu não sei!

- Precisamos ligar pra alguém do governo, você precisa de proteção.

- Espera Lali, está sabendo de alguma coisa? Você está tremendo.

Eu estava em pânico.

- Max, não é só a Catelyn tentando te prejudicar, é gente grande Max, gente muito perigosa.

- Como você sabe?

Puxei a manga da blusa com cuidado para não raspar nos pontos do meu corte recente e exibi minha cicatriz antiga. Os olhos de Max ficaram um pouco confusos.

- Eu já encontrei com um deles antes Max.

A porta imediatamente se abriu e eles entraram.

- Olá Max! Oh, pelo visto interrompemos a hora da história, como vai Whisper?

- O que está fazendo aqui? – Max disse entre dentes, notei que ele se enrijeceu na cama, ele estava com medo – Quem diabos é você? – Se referiu a Kail.

- Olá Maximillian, meu nome é Mikail Veselov, e eu gostaria de conversar com você.

Max olhou para ele e em seguida para mim, puxei a manga da minha blusa para baixo novamente e olhei para o chão, o sotaque forte dele me inundou de lembranças que há muito eu me empenhava em esquecer.

Flashback on

Assim que entrei no cômodo, algo pesado me puxou com força, me deixando com o rosto colado na parede.

- O que está fazendo aqui? – disse entre dentes e com tanta fúria que quase não compreendi o que ele dizia.

- E-eu vim te ver...

- Eu não disse pra você que não podia vir aqui?

- Eu não pensei que... Me desculpe.

Ele me virou com força para que eu ficasse de frente para ele, os olhos cor de cobre líquido pareciam flamejar, ele era tão lindo, o homem mais lindo que eu já havia visto.

- Isso é uma reunião particular Lali, não pode ficar aqui. Vá embora.

Desde o dia que ele chegara aqui na cidade, ele exibia uma pose autoritária, atendia a telefonemas e andava com aquele ar esquisito. Em parte foi aquilo me deixou interessada nele, jovem, bonito, com pose de pessoa importante. Mas eu pensava que tudo não passava de um clube, ou no máximo algo relacionado à polícia. Um homem nas primeiras unidades da casa dos 20 anos, não podia estar envolvido em coisas tão grandes. Sorri pelo nariz de um jeito totalmente inapropriado enquanto olhava para ele.

- Ah, por favor, vai me dizer que é espião agora? Você parece mais novo do que eu Kail.

Me puxou pelo braço com tanta violência que achei que meu braço fosse deslocar, com o canto do olho, vi três homens atando coletes de bala ao corpo e uma porção de armas. Prendi a respiração assustada, Kail me conduziu para fora do prédio e enfim soltou meu braço.

- VOCÊ É TÃO BURRA! EU DISSE UMA COISA, UMA ÚNICA COISA PRA VOCÊ, “NÃO VENHA ATRÁS DE MIM NO TRABALHO” E VOCÊ... – ele soltou um urro furioso.

- M-me desculpe Kail.

Kail enfiou a mão dentro do casaco e puxou uma pistola, meus olhos quase saltaram das órbitas, recuei um passo, mas ele me puxou com agressividade novamente e me jogou contra a parede. Apertou meu pescoço com o antebraço e colocou o cano da pistola contra meu peito.

- Você tem idéia de como eu lamentaria ter que acabar com a vida de uma mulher tão bonita como você Lali? – engoli seco, meu coração estava disparado – Mas você é tão estúpida que me dá vontade de perfurar sua carne aqui mesmo, no meio da rua.

- Kail eu te amo, não faz isso, por favor...

- Cala a boca, ficou maluca? Você ama o meu pau, é isso que você ama, sua idiota. – As lágrimas já desciam fortes pelo meu rosto, eu tremia aterrorizada. – Eu cansei de você, você é bonitinha, fode bem, mas não vou ser comprometido por causa dessa sua cabeça de vento idiota. Sua puta, quem você pensa que é? Você não é nada. Olha pra mim, eu tenho meio mundo em minhas mãos, acha mesmo que você, uma lagartinha do meio desse país de gelo pode zombar de mim? Eu sou mais novo e mais esperto do que você Whisper – ouvi o som da pistola sendo engatilhada, a boca dele encostou-se ao meu ouvido – E eu posso te matar em dois segundos.

- Não, por favor...

Imediatamente o corpo dele saiu de perto de mim, recolocou a pistola dentro do casaco e disse com a voz inalterada.

- Some daqui, não quero mais saber de você me enchendo o saco. E se você abrir a boca sobre o que aconteceu aqui, eu encontro você até no inferno, te fodo e te mato. Mulher estúpida, você não é mais do que nada.

Depois disso ele saiu caminhando para dentro do prédio novamente e eu caí de joelhos no chão, tremendo, chorando e completamente destruída.

Flashback Off

- Lali, será que pode nos dar licença, por favor? – Mikail disse em um tom que o fazia soar extremamente amigável para qualquer outra pessoa, mas não para mim.

- Eu não vou deixar o Max sozinho com vocês.

- Whisper, minha querida, pensei que eu tivesse sido bem clara com você da última vez que nos encontramos.

- Pode me matar se quiser, eu não vou sair daqui.

- Não quero que se machuque Lali, sai daqui – Max disse.

- Vão ter que me tirar à força.

- Tudo bem, podem deixá-la aqui, mas ela vai ter que saber o risco que vai correr. – Troquei um olhar rápido com Kail, mas ele logo se desviou para Max. – Eu vim fazer um aviso amigável, a você Max.

- Que aviso?

- Você precisa parar. Construa outra coisa, esqueça essa idéia louca de máquina do tempo. Você não tem o direito de alterar o destino das pessoas, isso é contra a ordem natural das coisas, precisa parar, destrua a máquina.

- Você não pode estar falando sério. Tem idéia de quão grande já está meu projeto?

- Está dizendo que não vai parar?

- Não! Eu dediquei muito de mim naquela máquina pra que você simplesmente me mande parar!

- Tudo bem – deu as costas e se dirigiu à porta – Aliás, boa sorte procurando outro lugar para morar.

Assim que os dois saíram me voltei para Max.

- Max eu tenho medo, não quero que nada aconteça com você, eles são perig...

- Esse filho da puta explodiu minha casa!

- Max isso é sério, você precisa fazer o que ele disse, precisa parar!

- Eu não vou parar Lali, ele vai precisar de mais do que uma explosão pra me assustar.

- Max! Pelo amor de deus, sua família! A Allie e a Shannon, pensa nelas, ele pode fazer qualquer coisa...

- Lali, será que pode me deixar sozinho, minha cabeça...

Soltei um suspiro longo.

- Tudo bem, você precisa descansar, me desculpe por surtar.

Ele assentiu com a cabeça e fechou os olhos. Quando eu saí, Kail e Lyn já não estavam mais ali, me senti aliviada por isso. Shannon dormia no colo de Johnny enquanto ele também cochilava com o pescoço deitada para trás. Allie parecia uma pilha, ela estava totalmente diferente da mulher serena que eu encontrara três dias atrás.

- Allie, se quiser ir para casa, eu fico aqui com ele. Acho que a Shannon precisa da cama dela agora dela.

- É, tem razão. – ela se levantou e pegou a menina no colo, nem ela e nem Johnny acordaram. – Tem certeza que pode ficar aqui Lali?

- Tenho sim, pode ir tranqüila.

- Obrigada.

- Ele também é meu amigo – dei de ombros e ela saiu em seguida. Olhei para Johnny e me lembrei de Brian. Provavelmente ele estaria me odiando com todas as forças. Peguei o celular e respirei algumas vezes antes de enfim ligar para ele.

2026

Jimmy

- Parem de me bater porra! – por mais que eu tentasse proteger meu rosto fazendo uma barreira com meus antebraços, eu estava sentindo dor, mas ao mesmo tempo não conseguia parar de rir. Os quatro não sabiam se me batiam, choravam ou me abraçavam, apesar de que eles estavam levando a primeira opção mais a sério.

- Filho... da... Puta!! – Brian xingava quase sem fôlego, e eu já estava rosa de tanto rir, eles estava muito a cara do pai.

- Chega! Parem com isso, eu também quero abraçá-lo! – Valary falou emburrada. – Entrem na casa, parem de ficar rolando aí no chão.

Enfim eles pararam de me bater, Matt estendeu a mão para me ajudar a levantar do gramado, ainda me dando alguns petelecos na cabeça, que eu revidei sem muito sucesso. Johnny ficou parado lá para trás.

- Que foi Fat Johnny? – acabei de inventar esse apelido, putz, ele tava um boi de tão gordo – Vai ficar aí parado?

- Você está vivo man! – o viado estava chorando, escondendo o rosto entre as mãos – Esse é o melhor dia da minha vida!

Depois ele quase correu (ou rolou) na minha direção e me abraçou choramingando. Olhei para Brian, Zacky e Matt, eles pareciam ter a mesma euforia no olhar, mas eles três sempre se contiveram mais do que Johnny.

- Eu não morri Johnny, agora me solta, tenho medo de que esses seus hormônios da menopausa passem para mim.

Entramos na sala novamente, e Valary pulou sobre mim, aquela magrela desgraçada, não engordou nem uma grama.

- Oh meu deus Jimmy, sentimos tanto a sua falta! Por onde esteve?

A afastei do abraço e a segurei pelos ombros para fitá-la, o cabelo estava mais loiro do que o normal, talvez para disfarçar os primeiros fios brancos, o rosto parecia um pouco mais ossudo e quando ela sorria muitas linhas de expressão apareciam, mas mesmo assim, ela estava em ótima forma para uma quarentona.

- Uma pergunta de cada vez DiBennedetto! Onde está Michelle?

- Ah, bom, ela não viaja mais com a gente...

- Ah...

- Jimmy, e eu? Não ganho abraço?

Gena estava grávida! Putz, parecia uma bola de boliche ambulante, mas estava linda. O rosto um pouco mais redondo e os olhos azuis pareciam um pouco menores, ainda mais quando ela sorria, mas continuava perfeita. A abracei com cuidado e lhe dei um beijo na testa.

- Você está linda Gen.

- Ah me poupe, eu pareço o Peter do Family Guy!

Soltei algumas risadas e beijei sua bochecha.

Shannon desceu as escadas com uma cara horrível, seguida de um rapaz tão alto quanto ela, forte, de cabelos de um loiro escuro quase para o castanho, um pouco mais curto que o cabelo do Joe, mas um pouco mais desgrenhado, olhos verdes e o nariz pingando sangue.

- Que diabos aconteceu lá em cima? – Falei olhando para eles – Quem diabos é você, moleque?

- Jimmy, esse é o Owen, meu filho. – Matt disse com um tom notável de orgulho na voz.

- Owen? Puta que pariu! Da última vez que eu te vi você ainda cagava nas calças! – O garoto exibiu um sorriso, parecendo levemente ter uma noção de quem eu era.

- Você é o Jimmy? The Rev? – ele caminhou na minha direção e eu o abracei.

- O próprio!

- Você é mais gordo do que eu imaginava.

- Cala a boca moleque desgraçado.

Rimos um pouco e assim que o soltei do abraço olhei para Shannon, ela olhava absorta para o teto.

- Shannon? – ela olhou para mim – O que aconteceu?

- Eu estava tentando evitar que ele te visse.

- Você fez isso com ele? – apontei para o nariz do garoto – Meu deus Rocky Balboa, e eu achando que você não tinha nada da sua mãe.

- Vá lavar isso Owen, antes que o sangue coagule – Val deu uns tapinhas no ombro do rapaz e ele foi em direção à cozinha.

- Vai ajudar ele Shay... – ela abriu a boca para protestar, mas não deixei que ela falasse – Anda!

Ela olhou para Sam, esperando que ele me contrariasse ou intercedesse por ela.

- Seu pai mandou, não posso fazer nada. – Samuel parecia conter um riso, e Shannon então foi para a cozinha quase fazendo buracos no chão, tamanha era a força que fazia ao pisar.

Feito isso me virei para eles, o ar agora parecia mais pesado, eu podia ver um milhão de perguntas nos olhos de cada um.

- Então... – eu não sabia por onde começar, mas estava feliz por tê-los visto. – Por que não se sentam.

Eles o fizeram, cocei a barba, estava um tanto grande já, mas eu até que gostava desse look barbado, apesar de que eu achava que os caras estavam olhando para mim como se eu fosse o náufrago.

- Dude... – Matt começou – Que porra aconteceu com você, digo, onde esteve esse tempo todo?

Soaria muito gay se eu dissesse que o Matt estava a coisa mais fofinha do planeta? Parecia um homem direito, um papai, estava menos marombado, a musculatura parecia um pouco diferente, o cabelo ainda era escondido por um boné para trás, mas eu tinha quase certeza de que a cabeça continuava raspada. Os olhos faziam pequenas linhas de expressão ao sorrir, mas eram bem poucas, ele ainda tinha cara de bebê.

- Matt como você está fofo

Ele sorriu

- É sério man..

- Eu não sei como te explicar...

- Putz mano, nós vamos ter que demitir o Arin! – Johnny disse para Zacky.

- Aquele moleque sempre foi estranho demais mesmo. – Zacky deu de ombros

- Espera, o Arin está no meu lugar?

- É dude, quando o Larry o levou até a gente uns meses depois do seu desaparecimento a gente nem quis ficar com ele, por causa daquele lance do hotel, mas o moleque toca bem e a gente já estava meio que sem alternativa.

- Por que fugiu sem dar notícia cara? Podia ao menos ter deixado um bilhete falando “Fui embora seus filhos da puta!”. A gente ficou louco Jimmy, sem saber o que aconteceu com você. – Brian falou, eu notei que a mágoa na voz dele era compartilhada por todos eles. – Pensamos que tinha morrido no dia do massacre no laboratório do Max, mas não tinha nenhum corpo. Foi a coisa mais esquisita do mundo.

- Gente, eu não posso explicar o que aconteceu, por que eu ainda não sei o que aconteceu. Olha, eu sei que isso vai soar muito estranho, mas eu vim do passado. Eu não pertenço a esse ano, e eu não vou poder retomar meu lugar na banda.

- O quê? De que porra está falando Jim? – Zacky parecia perturbado, ele não gostava de não compreender logo as coisas.

- É cara, como assim não vai voltar pra banda? Seu lugar é com a gente. – Matt disse um tanto magoado.

- Olha, eu sei que essa barba de Jesus Cristo me faz parecer mais velho, mas eu ainda estou com 32 anos galera, eu vim pro caralho do futuro.

- Você está drogado man? Eu vou entender se estiver e tal... – Brian disse.

- Eu estou falando sério, eu só tenho mais alguns dias aqui.

- Você vai morrer?

- Não, eu vou voltar pra 2013. – respirei fundo – Lembram quando a gente voltou do Canadá e eu decidi ficar uns dias em Madison antes de voltar para Huntington, por que eu disse que precisava fazer uma viagem? – Eles se entreolharam tentando buscar na memória. – Essa é a viagem.

- Então... Você está morto agora? – Zacky perguntou

- Eu não sei, sinceramente não sei. Samuel disse que eu desapareci, fiquei preso no tempo, mas eu não faço a menor idéia do que aconteceu.

- Puta que pariu! – Johnny levou as mãos à cabeça – Eu acho que vou vomitar.

- Não no meu sofá, por favor! – Samuel disse de algum lugar atrás de mim.

- Isso é tão fudido – Matt disse tirando o boné e coçando a cabeça.

- Eu sei que é estranho, acreditem, eu sei bem como é a confusão que estão sentindo, mas eu realmente quero aproveitar esse momento com vocês. Eu só tenho mais uma semana aqui, não fodam com tudo agora. – soltei um longo suspiro e os observei – Como foi que todos vocês ficaram tão gordos? Sério Zacky, você parece um presunto ambulante.

- Vai tomar no seu cu James! Eu tentei emagrecer uns dez anos atrás okay? Mas meu metabolismo não ajudou muito.

- Metabolismo? Você está falando como a minha mãe! Hey falando nisso, como estão meus pais? – Todos eles abriram a boca e arregalaram os olhos em silêncio – Que caralhos aconteceu com meus pais?

- Ahm, bom, a dona Barbara está indo bem, ainda mora em Huntington, com um monte de gatos, faz caminhadas, recicla. Suas irmãs perderam um pouco de contato com a gente, elas se mudaram, acho que estão em Los Angeles, não tenho certeza.

- A Katie teve um filho não teve? – Brian disse apontando para Matt.

- Sim, Scott o nome do moleque.

- E o meu pai? – falei um pouco ríspido ao perceber que eles tentavam abrandar o assunto.

- Ahm, Jimmy...

- Ele está morto, não está? – Matt confirmou com a cabeça. Soltei um palavrão mudo e coloquei a cabeça entre os joelhos, meu peito começou a bater forte, não queria chorar ali – Q-quando aconteceu? – minha voz saiu mais embargada do que eu esperava, não me lembro de quando foi a última vez que eu chorei por alguma coisa.

- Março de 2014, um mês depois do seu aniversário.

- Sinto muito Man... – Acho que Brian disse isso, o Johnny, sei lá, as vozes pareciam as mesmas para mim

Naquele instante, a porta da frente se abriu.

- Hey Man, será que eu posso usar o banheiro daqui? O do ônibus está deplorável.

O olhar dele correu rápido pela sala e ao chegar em mim, seus olhos quase saltaram das órbitas.

- QUE DIABOS ESTÁ FAZENDO AQUI?

- Oh fuck, vai começar outra vez.

- Falei que esse moleque era surtado. – Zacky e Johnny cochichavam.

Me levantei um tanto sem forças, meu corpo parecia pender.

- Oi Arin.

- VOCÊ NÃO PERTENCE A ESSE LUGAR – ele imediatamente gritou feito um louco.

- Arin, fica calmo Bro!

- Pode deixar Brian, eu e ele já passamos por isso outra vez. Ele é um pouco sensitivo, e o fato de eu estar aqui deixa ele meio louco por que é um desvio nas coisas como deviam ser. Abre esse punhos Man, você não quer me bater.

- Vai pegar meu lugar? – disse entre dentes

- Não.

Ele relaxou um pouco, quase nada, mas relaxou. Fiquei um pouco aliviado, não conseguiria bater nele, meu corpo inteiro parecia que ia desmoronar.

- Eu vou ao banheiro – ele disse baixo e subiu as escadas.

- Esse cara é estranho. – Brian disse por fim.

Caí sentado no sofá ao lado de Zacky e comecei a perguntar sobre a vida deles.

- E a banda Man? Como anda?

- Vai bem, melhor do que a gente podia imaginar, mas você devia estar com a gente. Seu lugar é naquela bateria, nada contra o Arin, como baterista ele é ótimo, mas ele não é você dude.

- Eu sou o melhor, eu sei – disse sorrindo, mas não sei explicar, eu estava me sentindo mais estranho agora. Como se tudo estivesse errado. Porra, tudo estava errado! Que diabos!

- Hey man – senti a mão de Brian sobre meu ombro – Eu sei que está se sentindo estranho, mas eu nem consigo explicar como eu estou feliz de te ver. Faz mais de dez anos que eu não vejo essa sua cabeça de rato, eu amava o seu pai, você sabe disso, quase tanto quanto o meu, mas você vai voltar pro seu tempo e ele ainda está vivo lá.

- Mas ele vai morrer....

- E eu também. Zacky, Matt, Johnny, você, todos nós vamos morrer. Não era você que estava surtado profetizando que ia morrer? Pensei que você lidaria com a morte melhor do que ninguém.

- É porque não sou eu morrendo, é o meu pai!

- Não vamos pensar sobre isso agora, okay?

Assenti com a cabeça e Gena soltou um gemido.

- Será que podemos ir para um hotel? Meus joelhos e meus pés estão inchados.

- Jimmy, por que a gente não sai mais tarde pra beber alguma coisa? Acho que agora precisamos descansar em uma cama decente um pouco.

- Por mim tudo bem. A Shannon pode vir comigo? Ainda não tive tempo de sair com ela.

- Claro.

- Pra um bar? – A voz de Sam se manifestou.

Shannon pareceu notar que falávamos dela e saiu da cozinha, meio avermelhada, mas não tinha certeza do motivo. Ela parecia que ia espancar meio mundo.

- Se não quiser que ela vá eu vou entender.

- Um bar não é bem o lugar para alguém da idade dela.

- Ah pai, por favor, eu faço 17 daqui a uns meses, eu já sei me cuidar okay?

- Sim, mas não quero você usando drogas, pensa que eu não sei o que acontece nesses lugares?

- Ela não vai estar sozinha okay? Vamos ficar de olho nela.

- De olho? Eu tenho medo que você seja o primeiro a oferecer alguma coisa a ela!

- Eu não faria isso, seu imbecil!

- E quem me garante?

- CALEM A BOCA! – A voz dela saiu aguda e pareceu perfurar meu ouvido – Eu não vou usar porra nenhuma, e eu quero ir. Não é como se eu fosse uma maluca irresponsável.

- Você pula de pontes. – Owen passou caminhando calmamente pela sala.

- Cala a boca Sanders!

- Okay, eu não vou brigar mais – O olhar de Samuel caiu sobre mim, era severo, negro – Eu vou confiar em vocês hoje, mas se alguma coisa acontecer...

- Você tem permissão para me matar. – me virei para os caras – Vocês me pegam aqui às 21h?

Eles confirmaram e depois cada um me deu um abraço apartado, murmurando uma porção de coisas como “tava com saudades bro” ou algum palavrão amigável qualquer, exceto Arin, que mal olhou na minha cara. Eu sou obrigado a concordar com o Zacky, aquele moleque era estranho.

Assim que a porta se fechou, Sam e Joe foram lá para cima, Shannon e eu permanecemos ali. Ela se jogou no sofá e fechou os olhos, a observei por um breve instante e então caminhei até ela e a derrubei do sofá.

- Hey!

Me sentei nele e fiz sinal para que ela se sentasse ao meu lado, ela se deitou nele e apoiou a cabeça no meu colo.

- Eu ouvi o que vocês estavam falando... seu pai morreu?

- Tecnicamente ainda não, mas ele vai morrer.

- Eu sei como é isso.

- Sabe? – passei a mão pelos cabelos dela e olhei para seu rosto.

- Eu sempre achei que você estivesse morto.

- Mas você tem o Sam...

- Eu sei, e eu o amo, mas em certos momentos ele olha para mim como se...

- Como se você fosse eu.

- Acho que sim, acho que a coisa que ele mais tem medo na vida é de eu seja como você.

- Eu tenho que concordar com ele Shannon, não quero que seja como eu. Vai sofrer muito se optar por ser assim.

- Eu tenho de orgulho de você gigante, eu não teria vergonha se eu fosse como você.

- Eu sou um idiota Shannon, você é muito mais esperta do que eu, esperta o suficiente pra saber o que é errado e evitar.

- Você não sabe o que é errado?

- Sim eu sei, mas eu não evito. Você pode fazer melhor do que eu.

- Às vezes dói tanto...

- Eu sei, e sinto muito por isso, eu nunca quis passar isso pra você. Não importa o que você faça, a dor não some.

- Mas se eu morrer...

- Você tem dezesseis anos Shannon, a morte está muito longe pra você. Eu não quero que seja mais uma nota no noticiário de uma adolescente morta por overdose. Sabe como isso soa triste? Eu não quero isso para você. Você é muito mais forte do que eu já fui a minha vida inteira.

- Seria mais fácil se você e a mamãe estivessem aqui.

A abracei com força, tão forte que quase pude sentir o coração desritmado dela batendo perto do meu.

- Eu te amo.

- Eu também te amo pai.

Dei um beijo em sua testa e a encarei.

- Ei, você e o filho do Matt já se pegaram?

- Ah me poupe! – Se levantou prendendo uma risada e subiu as escadas correndo.

Quando fiquei sozinho, Joe veio à minha mente. De quem era aquele menino? Subi as escadas e fui até o quarto dele, onde eu também estava dormindo, já que Shannon insistira para que eu ficasse ali na casa com eles. O menino parecia cochilar na cama, mas assim que eu fechei a porta atrás de mim, ele se virou de barriga para cima de olhos abertos.

- Hey dude. – eu disse e ele sorriu de volta – Parece que você tem uma coleção boa aqui no seu quarto.

- É, com você dentro do meu quarto, ter a coleção parece meio embaraçoso.

- Não é não man, ser fã nunca é embaraçoso. Sabe, quando eu tinha uns quinze anos, uma vez eu sonhei que eu beijava o Vinnie Paul na boca, mas isso não é vergonhoso, eu era um fã!

- Isso é totalmente vergonhoso cara – ele soltou uma gargalhada rouca.

- É talvez seja, mas quem liga? Hey man, que coisa é essa no seu teto? Parece vômito.

Joe gargalhou mais uma vez.

- Não, isso era de uma infiltração, mas ela já foi consertada, o papai é que sempre se esquece de pintar a mancha.

- Sabe, eu já morei em uma casa que a infiltração tinha o formato do Godzilla.

- Que diabos é Godzilla?

- COMO ASSIM VOCÊ NÃO CONHECE O GODZILLA? – Nós dois começamos a sorrir – Ele é tipo um lagarto gigante que invade a cidade e destrói tudo.

- Que irado! É um filme?

- É sim. A gente podia assistir qualquer dia desses.

- Legal!

Joe se animou todo, ficou bem empolgado de ver um filme antigo comigo. Se sentou na cama e coçou os cabelos, parecia que ele tinha uma farofa de cabelos na cabeça, olhando para o rosto dele, eu via muito da Allie, talvez mais do que havia em Shannon, o nariz, as bochechas, os dentes. E de mim? Ele tinha alguma coisa?

- O que está olhando?

- Estou tentando descobrir se você é meu filho. Você é?

O sorriso dele se desfez lentamente. Ficou em silêncio por um instante e olhou para mim.

- Você sabe qual é a marca principal da família Jones?

- Os olhos?

- É um gene dominante, eu estudei isso em genética na escola. Os olhos dos Jones são tão negros, que você não consegue ver a pupila sem passar um bom tempo procurando.

- Onde quer chegar Joe?

O menino se levantou, um tanto pesaroso.

- Olha aqui nos meus olhos e tente achar minha pupila.

2013

Brian

- Posso me sentar aqui com você?

- Não.

- Brian, nós precisamos conversar.

- Não, nós não precisamos.

- Bri...

- Sai Michelle, não quero ser grosso com você.

- Você já está sendo.

- Então é melhor sair antes que piore.

Ela ainda ficou alguns segundos hesitando no mesmo lugar, talvez sem ter certeza se me obedecia ou fazia o que tinha vontade, mas depois ela acabou cedendo e me deixando sozinho outra vez.

O que eu podia dizer? Eu não estava triste, eu estava com raiva, muita raiva. Por que ela me fez de idiota desse jeito? Eu parecia uma granada prestes a explodir quando meu celular tocou. A princípio nem me dei conta de que ele tocava, só ouvi porque Zacky atirou uma das suas chinelas na minha cabeça.

- Atende o telefone ou desliga Gates, eu quero dormir caralho!

Peguei o celular e atendi sem nem ver quem era.

- Alô?

- Brian? – A voz dela era rouca, grave, trêmula.

- Lali? Por que caralhos resolveu me ligar agora?

- Eu preciso te explicar...

- Não precisa, eu já entendi okay? Você não quer nada comigo, eu sou só um amigo babaca que te ofereceu uma carona e você aproveitou pra fazer de idiota.

- Não é isso, seu idiota, me deixa falar porra! – Fiquei em silêncio, dando sinal para que ela prosseguisse – Brian, minha vida está uma bagunça agora, e a do Max está muito pior. Tem gente muito perigosa envolvida nisso, perigosa de verdade e ele precisa de mim.

- Você não tem nada a ver com isso Lali, não é da sua conta!

- Ele é meu amigo Brian.

- Você conheceu ele ontem!

- Eu também te conheci ontem, seu babaca! – ela soltou a respiração e pude ouvir o som do ar saindo de sua boca e batendo conta o telefone – Eu gosto de você Brian, eu gosto muito de você, mas eu não tenho certeza se eu e você... eu não sei, tudo me pareceu rápido demais, e você tem a Michelle.

- Eu e a Michelle...

- Têm um assunto inacabado. Nem você sabe o que sente por ela. O Max precisa de mim mais do que você agora, quando tudo acabar, eu pego um avião pra onde quer que você esteja e nós falamos a respeito do que sentimos um pelo outro. Agora eu não posso arriscar a vida de um amigo por alguém que eu nem sei se gosta mesmo de mim, ou é só mais um querendo me ferir.

- Eu nunca machucaria você Lali!

- Quem me garante?

- Eu garanto!

- Não sei se isso é o suficiente pra me fazer acreditar.

- Eu não sou seu ex Lali.

- Eu sei... é por isso que eu prometo voltar pra você.

- Quando?

- Quando isso acabar.

- Eu não posso esperar por você para sempre.

- Eu sei.

2026

Shannon

Eu não estava conseguindo respirar dentro daquele bar, havia um misto de fumaça de cigarro, gelo seco, aroma de comida e perfumes fortes que me deixava sufocada. Me perdi do meu pai alguns minutos atrás, ele conversava enérgico com os amigos e nem notou quando eu resolvi caminhar pelo lugar, ninguém notou. Talvez se eu refizesse meus passos o encontraria com facilidade, mas naquele instante eu só queria respirar.

A luz neon sobre uma porta indicava a saída, caminhei aos tropeções até ela e praticamente pulei para a escuridão da noite. Puxei o ar gelado e o senti preencher e purificar meus pulmões de uma única vez. Ar. Como eu te amo oxigênio.

A rua estava vazia, a não ser por algumas poucas pessoas na entrada do bar que conversavam e se pegavam. Me sentei na calçada e abracei os joelhos, eu não era muito boa em permanecer no meio de multidões, ficar sozinha sempre me deixou muito mais confortável.

- Ficou sufocada? – aquela voz rouca e doce soou atrás de mim como uma canção, ou uma praga.

- Ah não, você de novo não.

Ele sorriu de um jeito travesso e se sentou ao meu lado.

- Ah eu de novo não. Sinto muito, seu pai me encarregou de ser seu guarda costas e cuidar para que não se meta em confusão.

- Mentira, ele nem me viu saindo.

- Por isso que ele me pediu. Acho que ele pensa que somos amigos.

Eu não queria olhar para ele, mas eu tinha certeza de que ele olhava para mim.

- Meu pai é um idiota.

- Ele descobriu sobre o Joe?

- Sim.

- E como ele reagiu?

- Bom, acho que ele tentou ser o mais natural possível, mas eu notei que ele ficou um pouco decepcionado por ele não ser filho dele.

- E você? Como está com o seu o pai aqui?

- Parece um sonho sabe? Eu nem sei explicar, ele sabe tudo o que eu sinto sem eu nem precisar falar.

- Isso é muito legal, eu fico feliz por você.

Voltei o olhar para ele, estava visivelmente com frio, o cabelo estava escondido por um gorro preto e as bochechas estavam avermelhadas pelo sangue quente.

- É melhor você entrar, está congelando, garoto do sol.

- Não, eu tenho que ficar de olho em você, garota de gelo.

Um riso idiota escapou da minha boca.

- Você é estúpido!

- Não muito mais do que você. – ele fez uma pausa para puxar mais para cima o zíper do casaco – Nós estamos bem?

- Nós nunca vamos estar bem Owen.

- Tem certeza? Por que ás vezes parece que seus olhos dizem outra coisa.

- O que meus olhos dizem? – O fitei nos olhos, eram de um verde cinzento e opaco, quando a luz batia, tons de dourado se acrescentavam nessa composição. De jeito nenhum eu poderia dizer que ele não era bonito.

- Seus olhos dizem que você me ama.

- Você está enganado. – Me coloquei de pé e fiz sinal para que ele fizesse o mesmo. – Anda, vamos entrar, você vai congelar se continuar aqui.

As mãos dele seguraram meus braços, estavam geladas como metal.

- Shay.

- Owen, por favor, não me faça quebrar seu nariz dessa vez.

- Pode quebrar, acho que uma plástica nele não ia fazer mal.

Os lábios dele tocaram os meus com um calor que naquele momento só existisse em sua boca, ele tremia por completo. Tentei me afastar do beijo, mas ele me segurou pela nuca, me mantendo presa ele. Ele estava tremendo de um jeito tão assustador, puxei o zíper do seu casaco e o abracei, ele tremeu mais algumas vezes com o corpo junto ao meu, mas logo depois seu corpo parou. Seus lábios se soltaram dos meus e eu desviei o rosto em seguida.

- Shannon, pare de lutar, por favor.

Soltei o corpo dele do abraço e sai caminhando de volta para o bar.

- Você vai entrar ou não?