Come Back

Apenas levante-se e grite


- Está se sentindo bem Shay? – Shannon apenas confirmou com a cabeça e se apoiou em mim, o que ela aparentemente disse ser uma simples tontura, agora parecia ficar mais forte. – Eu disse pro Owen não te deixar tomar nada de forte, tomou alguma coisa sem que ele visse?

- Já disse que não porra, por que não confia em mim?

- Eu confio, só quis averiguar. Não vou perguntar mais.

Os braços dela se entrelaçaram com mais força em meu tronco.

- Gigante eu não quero morrer... eu disse que eu queria, mas eu estava mentindo. Eu não quero morrer.

- Para de falar besteira, você não vai morrer. Vamos entrar okay? Descanse um pouco, tome um banho, se ainda estiver se sentindo mal eu mesmo te levo pro hospital, pode ser? – Mais uma vez, Shannon apenas confirmou com a cabeça e seguiu caminhando até a entrada de casa abraçada a mim. Naquele momento eu sentia uma sensação muito estranha, como se pela primeira vez eu começasse a realmente me sentir como pai dela. – Tomou o diazepam hoje?

- N-não tenho certeza...

- Deve ser isso, o diazepam é um dos piores, ele deve causar dependência sei lá. Quando eu não tomo também fico mal. Assim que entrar tome logo ele e descanse okay? Sua dor logo vai passar.

Abri a porta e deixei que ela subisse sozinha para o banheiro, em seguida tirei o casaco e me deixei cair cansado no sofá. Por mais que eu estivesse tentando não manter aquilo em minha mente, era algo impossível. Joe não é meu filho. Não tem meu sangue, não tem minha cardiomegalia, não foi fruto de uma noite de amor entre eu e Allie. Ele é filho do Sam.

Na hora que aquilo ficou claro pra mim, eu não tomei nenhuma atitude, Joe não tinha culpa nenhuma. Me segurei por um bom tempo enquanto digeria aquela informação, mas depois de pensar muito a respeito, eu enfim havia chegado a uma conclusão.

Me levantei e caminhei a passos firmes até o quarto de Sam, o mesmo que uma vez havia sido de Allie. Não bati na porta, a abri de maneira quase brusca e como eu imaginava, ele ainda não estava dormindo. Aparentemente estava sentado na cama com um livro na mão, mas ao mesmo tempo parecia atento aos ruídos da casa.

- Por que Shannon não estava caminhando sozinha quando entrou em casa? – disse em tom rígido, sem dar chance para que eu dissesse logo o que eu queria. – Você drogou minha filha não foi?

- Ela não é sua filha, nem nunca vai ser, ela tem o meu coração. Sim, ela veio caminhando com a minha ajuda e a culpa é minha, mas só por que eu passei meu gene defeituoso pra ela.

- Você é tão cheio de si James, será que você se escuta enquanto fala? Eu cuidei da sua filha por toda a sua vida. Não me importa se o “gene defeituoso” dentro dela é seu, ela ainda assim é minha. – cerrei os punhos tentando conter uma enorme onde de raiva.

- Por que a Allie teve um filho seu? – disse com tom semelhante ao dele, mas aquilo não pareceu surpreendê-lo.

- Eu preciso mesmo contar pra você a historinha de onde é que os bebês vêm James?

Aquilo foi o suficiente para que o pouco de controle que eu ainda tinha sobre minha raiva se esvaísse por completo, apertei mais meu punho com tanta força que pude sentir minhas unhas curtas se apertarem contra a palma da mão. Uma raiva que eu nem sabia que eu guardava dentro de mim então explodiu, juntamente com o movimento rígido do soco que deferi no rosto de Samuel, forte o suficiente para fazê-lo cambalear dois passos para trás.

O rosto dele se recuperou com um sorriso ensangüentado, o nariz escorria um fio grosso de sangue.

- Quer saber? Eu fiz um oral nela!

Investi contra ele com puro ódio dominando todos meus movimentos, mas dessa vez Sam também deu seu golpe. Um soco forte no meu estômago não fez nem com que eu parasse de me movimentar, eu era consideravelmente maior e mais forte do que ele e naquele momento meu corpo parecia anestesiado. Outro soco certeiro no nariz, um na boca do estômago e mais uma vez ele estava cambaleando, chutei sua canela com força e o derrubei no chão. Um soco no maxilar e mais sangue dele sendo expelido como um chafariz.

- EU VOU TE MATAR FILHO DA PUTA!

Agarrei seu pescoço com ambas as mãos e o pressionei com força.

- Isso... me mata! – disse com a voz entrecortada, cuspindo com dificuldade o sangue acumulado na boca e fazendo com que um fio espesso de saliva ensangüentada escorresse por sua maçã do rosto – Sua filha não tem mais ninguém se eu morrer!

Soltei imediatamente seu pescoço, mas não sem antes bater sua cabeça contra o chão.

- Seu merda! Não é certo você ter tudo que é meu, você é um canalha! Um ladrão! Roubou tudo que era meu! – Falei entre dentes com o rosto próximo ao dele.

Me levantei logo em seguida e o encarei de cima com desprezo, só eu sabia os pensamentos imundos que passavam em minha mente naquele momento.

Samuel se virou de bruços e tentou colocar força nos braços e joelhos para se erguer do chão.

- Sabe de uma coisa James? – se colocou sobre os cotovelos, com o corpo tremendo e quase sem forças. Não respondi sua pergunta. – Eu não sou um ladrão, eu nunca te roubei nada, sabe por quê? Porque nada disso é seu, era pra você ser um saco de ossos em um caixão agora. Você era pra ser só mais um drogado famoso no fundo de um cemitério. ERA PRA VOCÊ ESTAR MORTO JIMMY! MORTO! Por que não faz um favor a todo mundo e morre logo de uma vez? MORRA!!!! FILHO DA PUTA!

Um chute certeiro em suas costelas fez com que ele caísse de uma vez no chão. Não moveu mais nenhum músculo e por um instante achei que ele havia perdido a consciência.

- Você pode... – tossiu ferozmente e cuspiu mais um pouco de sangue – Você pode me bater o quanto quiser James, aquela ainda vai continuar sendo a melhor noite da minha vida. Eu a amei Jimmy, de um jeito que esse seu coração estragado nunca vai poder amar. Uma única vez na minha vida ela aceitou o amor que eu tinha pra dar. Não a culpe por isso, não a culpe por ter me amado um único dia. Ela te ama durante todo o ano, o que é um dia pra você?

- Você deixou uma criança dentro dela.

- Uma criança que preferia que você o tivesse feito! Sabe o quanto isso é perturbador? Entrar no quarto do seu filho e ver dezenas de pôsters com a sua cara? Ele o idolatra! Aquele bastardo!

- Cala a boca! – o chutei mais uma vez, na altura das costelas.

- Eu nunca tive nada Jimmy! Até meu filho prefere você. Eu não sei o que as pessoas vêem em você, será que eu sou o único que realmente te enxerga como realmente é? Um vândalo drogado, você não é gênio nenhum, só um homem estúpido.

- Você adoraria ser eu não é mesmo? Ter a minha vida? Todos aqueles a quem você ama preferem a mim a você. – O rosto dele se virou para mim, a escuridão dos olhos parecia transbordar em ódio e sangue – Deve ter tido uma vida muito miserável.

- Vai se foder James Sullivan! Vai se foder “The Rev”! Eu te odeio!

- O sentimento é recíproco.

2013

Max

- Aonde pensa que vai?

- Pro laboratório – respondi enquanto afivelava o cinto com um pouco de dificuldade.

- Você precisa ficar em repouso Max!

- Relaxa Freak, eu já estou me sentindo bem, além disso, há muito o que fazer por lá – agitei rapidamente a cabeça tentando evitar os reais motivos de eu já estar de pé mesmo com meu corpo inteiro crepitando carne queimada como num churrasco – Sem contar que eu preciso logo arranjar outro lugar pra morar, já que a minha casa virou carvão.

- Sabe que pode ficar aqui o tempo que precisar, você é meu irmão Max. – Allie me segurou pelos ombros e me encarou, seus olhos castanho-avelã pareciam suplicar por algo que eu conseguia imaginar o que era. Estava muito aflita e o meu acidente só deixara tudo pior, se eu contasse a ela o perigo que eu estava correndo era capaz até de ficar catatônica.

- Eu sei disso Allie. – soltei um suspiro e relaxei os ombros, com o braço bom lhe abracei com cuidado. Eu estava com medo de continuar ali e colocar ela e Shannon em risco, não perdoaria nunca se algo acontecesse a elas. – Sabe que eu te amo né? Não precisa se preocupar comigo okay? Seus problemas já são mais do que suficientes. Vai assinar o divórcio hoje? – ela confirmou com a cabeça – Qualquer coisa é só me ligar okay?

Dei um beijo em sua testa e saí do quarto, sentada no sofá, Lali já me esperava. Não parecia menos tensa do que eu.

- TIO MAAAAAAAAX! – uma mini coisa que eu conhecia bem pulou com muita vontade na minha perna queimada, me fazendo soltar um grito choroso de dor seguido de alguns gemidos e olhos marejados.

- MEU DEUS SHANNON! SEU TIO AINDA ESTÁ MACHUCADO. – Allie ralhou.

Rapidamente me soltou como se eu fosse infeccioso e levou as mãozinhas à boca surpresa.

- Oh, me desculpa tio!

- Que isso minha baby freak, não foi nada. – eu disse isso quase chorando de dor.

Lali por sinal quase se acabou de sorrir, já estava ficando rosa e quase sem ar. Depois disso, dei um abraço suave em Shannon, com meu braço bom, em seguida Lali foi minha motorista até o laboratório. Johnny já havia ido embora para Huntington há alguns dias e depois disso Lali me pareceu um tanto robótica? Sim, ela parecia uma andróide programada para caçar bandidos. Eu sabia que ela estava com problemas, mas ela nem sequer entrava no assunto. Preferi não forçar a barra por enquanto, mas de certo modo eu me sentia incomodado, uma vez que Syn estava interessado nela e pela segunda vez, uma mulher acabara saindo do caminho dele para entrar no meu. No mínimo aquilo era uma situação desconfortável.

Chegando ao laboratório, como eu esperava, havia uma relativamente grande comitiva de repórteres e guarda-costas me esperando. Aparentemente o incêndio da minha casa já começara a ser questionado como algo criminoso, os guarda costas nada mais eram do que de minhas visitas precavidas que já me aguardavam lá dentro.

Passei por eles com um pouco de dificuldade, mas dentro do laboratório não estava menos tumultuado.

- Sr. Maximillian Turner? Já era hora! – Um homem alto, moreno, com leves entradas no couro cabeludo e um bigode bem aparado caminhou a passos largos em minha direção e apertou minha mão com firmeza. – Sou o Agente Ray Foster, nos comunicamos há alguns dias por telefone.

- Claro, é um prazer conhecê-lo pessoalmente Sr. Foster. Esta aqui é Lali Whisper, uma amiga que conhece relativamente meu carrasco.

- É um prazer conhecê-la Srta. Whisper. Ah meu caro, sinto muito pelos seus ferimentos, obras do seu carrasco hein? – O homem soltou uma leve gargalhada que fez suas bochechas tremerem – Ora, se fosse mesmo carrasco estaria morto agora, meu jovem!

Meu Jovem. Por que é que eu odeio tanto essa expressão? Só porque não sou tão velho quanto eles? Imbecis. Retribui o riso sem muito entusiasmo, afinal não era ele que estava com metade da bunda cheia de pomada.

- Precisamos conversar senhor, vamos lá para o escritório. – Indiquei o caminho a Lali e ela me ajudou a subir as escadas até o escritório. Nos sentamos em torno de uma mesa média e oval no centro da sala, assim que me acomodei, rapidamente comecei a falar.

- Agentes Russos é?

- Sim, Mikail Veselov e Catelyn Morrison, mas acho pouco provável que os nomes sejam reais.

- Não custa tentar. Você parece bem assustado garoto, tem algo que ainda não está nos contando?

Suspirei fundo e troquei um olhar rápido com Lali.

- Eles sabem toda a minha rotina Sr. Foster, conhecem minha família e o um delas eu quase... eu não quero que meus amigos e minha sobrinha corram risco.

- Claro Sr. Turner, colocaremos a melhor equipe para proteger sua família.

- Não é o suficiente pra mim, eu preciso tirar Allie e Shannon da cidade... e você também Lali.

- Não! – como eu imaginava, um protesto sonoro e rígido – Eu não vou a lugar nenhum! Você pretende o que? Ficar aqui sozinho? Não mesmo.

Revirei os olhos, eu sabia que Allie também não aceitaria aquilo com muita facilidade.

- Sr. Foster...

- Por favor, me chame apenas de Ray, me sinto muito velho quando me chama de senhor.

Ah claro, porque eu sou quase uma criança para ele.

- Tudo bem, Ray, eu também vou precisar de uma guarda de confiança, eles incendiaram minha casa e eu tenho uma porção de cicatrizes que provam que eles não estão apenas brincando. Eu não vou deixar que atrapalhem minhas pesquisas muito menos que destruam minha máquina. Eu dei muito de mim naquilo.

- Ninguém vai destruir máquina nenhuma, rapaz. Não vamos permitir isso. Se me der licença, preciso conversar com minha equipe.

- Claro. – depois disso, Ray se levantou e saiu do escritório. O ar enfim pareceu amenizar e deixei minha cabeça pender para trás.

- Pareceu que você tinha uns quarenta anos enquanto conversava com esse homem.

Voltei meu rosto para ela, havia um sorriso brando em seu rosto.

- Sério? Eu me senti com uns doze anos enquanto falava com ele. “Rapaz” – soltei um grunhido – Acho que ele pensa que eu sou um adolescente.

- Para de ser bobo Max, você tem a metade da idade dele e uma inteligência muito maior.

- Acho que sim... Lali, quanto ao que eu disse antes, acho que você devia considerar sair da cidade com Allie e Shannon. Não só pra ficar segura, mas pra conversar com o Synyster. Não quero que ele me culpe por mais uma garota que eu distanciei dele.

- Eu não vou embora Max, não adianta insistir. Eu e o Brian... bom, nós vamos esperar tudo isso acabar.

- Ah é? Então por que eu tenho a impressão de que está fugindo dele como o diabo foge da cruz?

- Não é isso eu... – ela não conseguiu terminar a frase.

- Tudo bem Lali, não vou mais insistir. Você faz o que quiser. – eu estava exausto até para discutir, ultimamente eu não havia dormido muito. Precisava de alguma saída para não perder o que construí caso algo acontecesse comigo. Eu só queria saber como...

- O que vai fazer com Allie e Shannon? Elas estão próximas demais da linha de fogo.

- É isso... Jimmy volta amanhã, vou me assegurar de que ambas partam com ele de volta para Huntington Beach. Pelo menos lá elas ficarão protegidas.

- Ah... é uma ótima idéia. – notei Lali abaixando levemente o olhar e mordendo o lábio inferior.

- Você também pode ir se quiser.

- Já disse que não! Você precisa de mim, eu sei muito a respeito do Kail. Eu só preciso de um emprego para me sustentar enquanto estou aqui.

Era isso! Mas seria uma boa idéia?

- Lali, eu quero que trabalhe para mim.

- O quê?! Ficou maluco? O que eu vou fazer nesse lugar? Eu sou uma bartender esqueceu?

- Deve ter algo por aqui que uma bartender consiga fazer.

- Tem certeza? Nesse momento vai precisar de pessoas aptas!

- Não, nesse momento eu preciso de pessoas de confiança.Vou ligar para Sam, ele é forte, talvez aceite ficar na minha guarda.

- Tem certeza?

- Tenho. Eu quero te mostrar a máquina. Se alguma coisa acontecer comigo ao menos você não deixará a informação se perder.

- Não vai acontecer nada com você Max!

Exibi um sorriso sem muito humor e me levantei da cadeira.

- Anda, vem comigo, eu vou te mostrar.

Brian

- Merda! – respirei fundo e recomecei os acordes, mas assim como na primeira vez meus dedos pareciam não obedecer meus comandos – Ah caralho!

- Gates? Está tudo okay?

- Pau no cu arrombado do caralho, esse solo é uma merda! – Por fim coloquei a guitarra sem muita delicadeza sobre a mesa e me levantei enfurecido.

- Vou considerar isso como um não. – Zacky também deixou a guitarra de lado e veio atrás de mim. Já puxava um cigarro do bolso e iniciara uma luta com o isqueiro. – Ah, será que eu tenho que fazer tudo por aqui?

Zacky tomou o isqueiro da minha mão e facilmente acendeu a ponta do meu cigarro, acendendo um para si logo em seguida.

- Não te pedi pra fazer nada por mim. – disse ríspido.

- Vai tomar no seu cu Haner, eu to tentando cumprir meu papel de amigo aqui, okay? É a Lali?

- Não.

- É a Michelle?

- Não.

- Então o que é porra?

- Meu pau na sua bunda.

Zacky acertou imediatamente um tapa forte na minha cabeça.

- Fala direito comigo, seu arrombado!

Deixei um leve sorriso escapar enquanto soltava uma baforada no ar.

- Eu não vou dar uma de emo agora okay?

- Okay, sua época emo ficou em 2002.

- Pelo menos eu não pintei meu cabelo de roxo!

- E daí? Era melhor do que aquele seu cabelo de princesa. Ainda tem os malditos chapéus?

- Quase todos, meio difícil desapegar.

Aquilo serviu para que nós dois soltássemos algumas risadas. Aquela sempre foi uma das coisas que eu mais gostava nos meus amigos, não importava qual deles fosse, se eu estivesse com problemas, eles sempre me fariam rir das minhas próprias encrencas. E então tudo pareceria muito mais fácil e simples do que era antes.

- É tudo Zacky, por que eu não me sinto mais como eu me sentia antes? Parece que de repente nada mais se encaixa na minha vida. Antes tinha uma fila de mulheres na minha porta e agora elas fogem de mim? Tem alguma coisa errada com a minha cara? E porra, onde é que está o Jimmy?

- Não tem nada na sua cara além dessa tua feiúra de nascença aí, talvez você e a Lali só precisem de um tempo. E para de ficar chamando pelo Jimmy que eu fico com ciúme!

- Seu gay! – ri da cara dele e chutei o toco do cigarro para longe – Não acho que Lali precise de um tempo, acho que ela precisa de distância. É isso, ela quis me ver longe. E eu não vou mais estender meu casamento com a Michelle, não consigo mais.

- Sabe o que é isso Gates? Você está ficando velho man. Acho que o lance da brincadeirinha de trocar parceiro chegou a um limite né? Achei que esse dia nunca ia chegar – Zacky disse com uma risadinha – Você mudou man, percebi isso no dia em que parou de usar blusa de macho pra usar gola V.

Dei um soco em seu braço e resmunguei algo. O som de vozes no andar superior fez com que encerrássemos a conversa ali.

- Shadows chegou, deve ter trazido o Johnny, vamos lá falar com eles.

Saímos caminhando para sair do porão que eu ás vezes gostava de usar como estúdio, mas enquanto subíamos as escadas, Zacky acertou algo na minha cabeça.

- Se falar que os solos da minha banda são uma merda outra vez eu enfio uma baqueta no seu cu, seu viado.

- Da sua banda é? – disse rindo e ele me bateu outra vez.

No andar superior, Matt e Johnny aparentemente tinham se desviado do trajeto original para tomar café com Suzy. Ambos segurando pequenas xícaras com os dedos mindinhos devidamente erguidos, Shadows ainda tinha o agravante de estar com as pernas cruzadas.

- Hey Suzy, não vai apresentar suas novas amigas? – Zacky disse tentando em vão controlar o riso. A risada dele às vezes me dava nos nervos, era aguda e meio muda dependendo da intensidade que ele ria, mas quase sempre era mais engraçada do que a piada. Johnny apenas mostrou o dedo do meio e continuou tomando o café.

Me joguei ao lado de Matt e roubei uma torrada que estava num pequeno prato para ele.

- E então Matt, alguma notícia do Jimmy?

- Não, nenhuma. Estranho, ele nem ligou nem nada, será que aconteceu alguma coisa? – me encarou por um instante e notei uma preocupação sincera em seus olhos.

- Bom, ele disse que em duas semanas voltava. A semana ainda não acabou.

- Acho bom ele voltar, o lançamento do álbum é semana que vem e vamos encarar uma turnê monstro outra vez. Precisamos dele aqui.

- Relaxa man, ele provavelmente já deve estar voltando pra Madison pra brincar com a bonequinha dele. Logo ele aparece por aqui. – Johnny disse assim que terminou seu café e depositou a xícara na mesa de centro.

- Eu realmente espero que seja assim. – eu realmente precisava do meu melhor amigo naquele momento, aquele cabeçudo era mais sábio do que aparentava.

Allie

O elevador parecia reduzir minha respiração que já estava curta pela metade, o ar parecia algo quase sólido naquele instante. Minha advogada já estava a minha espera quando enfim me libertei do elevador e entrei na sala. Samuel ainda não estava lá.

Um medo estranho tomou conta de mim, e se ele não aparecesse? Tudo que eu havia feito de errado até ali teria sido em vão e eu ia me sentir mais imprestável do que eu já estava me sentindo. A única coisa que me parecia positiva de tudo aquilo era o divórcio que ele havia me prometido, mas e então? Em que aquilo me seria favorável? Eu me sentia na obrigação de contar a verdade para Jimmy e obviamente ele nunca mais sequer olharia na minha cara. Não havia nada favorável naquele divórcio. Não havia nada favorável para mim em lugar algum.

- Tem certeza que ele vem? – disse insegura para a advogada dele.

- Ele confirmou a presença aqui hoje Sra. Wade, presume-se que ele venha.

Engoli seco e apertei as minhas mãos entrelaçando os dedos. Mais alguns minutos se passaram e ele apareceu, vestido de maneira formal, com o cabelo preto e espesso penteado meticulosamente para trás, os olhos negros rodeados por sutis olheiras escuras e o rosto pálido como marfim.

- Bom dia – disse de forma solene logo antes de se sentar diante de mim – Me desculpem pelo atraso, o trânsito estava ruim.

Os olhos dele se esbarraram longamente nos meus, havia uma pena ou uma súplica estranha neles. Logo em seguida começamos a discutir a respeito do divórcio.

Ele abriu mão de muita coisa, no fim das contas ficou apenas com um pequeno apartamento na região sul da cidade, que era meu quando eu era mais nova, e seu carro. A casa maior, em que moramos, e o outro carro ficaram para mim. Quando o assunto chegou à guarda de Shannon, ambos nos remexemos na cadeira.

- É sua, eu não tenho direito nenhuma de roubá-la de você.

- Eu sei disso.

- Mas eu quero vê-la, em períodos regulares.

- Claro, acho que nem seria saudável privá-la do contato com você tão de repente, mas eu tenho uma exigência a fazer.

Os olhos dele se abriram um pouco mais, Sam parecia um tanto cansado, mais velho do que realmente era. De fato me perguntei o que ele andou fazendo durante essa semana que se passou depois do que aconteceu.

- Que exigência?

Eu sabia que aquilo iria magoá-lo, droga, ultimamente é só isso que eu tenho feito. Magoado pessoas, decepcionando a expectativa de todo mundo, inclusive a minha própria. Quais seriam as chances de que Max me deixasse voltar no tempo e consertar tudo aquilo?

- Eu quero que a Shannon seja registrada pelo pai verdadeiro.

Ele não disse nada, não precisou dizer. Seus olhos eram tão negros quanto expressivos e mostravam todo o turbilhão de sentimentos que ele estava sentindo naquele momento.

- Como quiser Alison.

2026

Jimmy

- Se sente melhor?

- Sim.

- Está falando a verdade?

- Sim.

-Então por que está com essa cara péssima.

- Não finja que não sabe! – fitei meus olhos zangada.

- Ah, por causa daquilo.

- Pelo menos devia pedir desculpas!

- Não, ele mereceu. Na verdade ele merecia muito mais do que um nariz quebrado.

- Ele teve que operar!

- Não é grande coisa perto do que eu pensei em fazer com ele!

- Você só pode estar brincando!

- Escuta Shannon – peguei suas duas mãos e as segurei dentro das minhas – Eu sei que você gosta do Sam e tem grandes motivos para isso, ele foi o seu pai quando eu não pude ser, mas eu e ele temos uma guerra antiga e um dos meus maiores erros foi acreditar que um simples aperto de mão colocaria um fim nisso. Eu não gosto do Samuel e nem ele gosta de mim. Isso nunca vai mudar. Ele fez algo muito errado, algo que me desagradou muito.

- Eu? – Ambos nos voltamos para trás e nos deparamos com Joe, de pé, com as mãos no bolso do grosso casaco e os cabelos esvoaçando bagunçados ao vento. Havia uma mágoa dolorida em seus olhos.

- Não é você Joe, é o que eles tiverem que fazer pra que você nascesse.

- Então sou eu! – alterou levemente o tom de voz e percebi um tom triste ali.

Me levantei imediatamente e o abracei. Era tão pequeno, magro e frágil ali junto ao meu corpo enorme e truculento, parecia que se eu o abraçasse com muita força ele facilmente se partiria em dois.

- Não se preocupe Joe, nada disso é sua culpa. Eu gosto muito de você.

- Eu queria que você fosse meu pai.

Aquilo me pegou de surpresa, mas logo abri um sorriso. Me coloquei sobre um dos joelhos e deixei que ele me abraçasse de igual altura, mesmo ele ficando alguns centímetros mais alto. Foi um abraço apertado e sincero, e então eu me dei conta do quanto eu fiz falta para aquelas duas crianças.

De um jeito muito irônico, eu, James Sullivan, baderneiro, vândalo, ladrão de conveniências, antigo usuário de drogas, baterista sem noção e alcoólatra, era um bem necessário e ausente na vida daqueles dois. Não havia nada mais irônico do que pessoas me amando e precisando de mim.

- Eu vou ser o seu pai Joe, eu prometo.

Me levantei e fiz um aceno para que Shannon se juntasse ao abraço, ai invés disso ela pulou nas costas do Joe.

- AAAH! Sai de cima sua gorda.

- Puta que pariu, vai quebrar o moleque no meio!

- Gorda é a minha mão na cara de vocês!

- Isso é jeito de se falar com o pai menina?!

Ainda soltamos algumas risadas e depois baixamos o filme do Godzilla na internet. Assistimos juntos no hotel em que eu tinha me instalado, não dava mais para ficar na mesma casa que Sam.

- Meu deus que filme horrível! – Shannon reclamou – Isso nem um lagarto de verdade é só um boneco, que gráficos horríveis!

- Como ousa profanar a magnitude do grande Godzilla?!?

- Ela tem razão Jimmy, esse filme é horrível!

- Era um grande sucesso nos anos 80 okay? É um clássico! – Olhei rapidamente no relógio de pulso – Hum, acho que está na hora de irem para casa. Logo vai escurecer e não é bom que andem sozinhos pelas ruas à noite.

- Pai... você vai embora hoje? – Só então tinha me dado conta de aquele era meu último dia ali no futuro.

- Sim Shay, é hoje.

- Ah...

Ela abraçou as próprias pernas e fitou o chão, Joe também tinha os olhos baixos.

- Querem que eu leve algum recado para a mãe de vocês?

- O quê? Dá pra fazer isso? – os olhos de ambos se iluminaram.

- Claro!

- Diz pra ela não me colocar no balé com a prima do Owen! Aquela menina é uma vaca!

- Você fez balé? – eu disse rindo.

- Só por um mês, depois que eu quebrei um dos espelhos com a cabeça da Amanda eu fui expulsa.

- Essa é minha garota! E você Joe, o que quer que eu diga?

- Só... só diz pra ela não sumir. Eu quero pelo menos ter algo pra me lembrar dela.

- Anotado, agora venham aqui, quero um último abraço antes de ir embora, dar um beijo nessas cabeças piolhentas de vocês. Se cuidem okay?

Depois de uma longa despedida, ambos voltaram para casa. Minha hora também estava próxima, daqui a seis horas eu devia estar adormecendo no mesmo lugar em que eu cheguei. Só esperava que nenhum guarda me interceptasse outra vez.

Ainda precisava me despedir de mais algumas pessoas antes de partir.

- Ah você veio, achei que já tinha desaparecido outra vez!

- Sem me despedir das minhas moças? Não mesmo. – baguncei o cabelo escuro e espesso dele e em retribuição ganhei um empurrão para dentro do quarto.

- Você está fedendo a groselha cabeçudo, andou dando uma de babá outra vez?

- Claro, tenho feito muito isso recentemente – me joguei sobre a cama bagunçada deles – Pra onde estão indo dessa vez?

- Hum, acho que St. Louis.

- Você acha? Não tem certeza?

- Só tenho certeza quando eu chegar lá!

Ri de leve e me sentei para encará-lo.

- Sua cara continua a mesma.

- Ainda bem! Minha vida depende dela.

- O que aconteceu com você? Quer dizer, durante esses anos todos. O que aconteceu com a sua vida Brian?

Vi seu sorriso desvanecer levemente em um vislumbre.

- Um monte de merda que você não vai querer saber.

- Se não quisesse saber eu não perguntava! Tem alguma coisa pra beber aí?

Ele apontou uma garrafa de whisky pela metade no chão ao lado da cama e eu a peguei.

- Muita gente morreu Jimmy, mais gente do que eu gostaria.

- Hum... não está mais casado? Não tem filhos? – Brian negou com a cabeça – Porra eu sempre achei que seria o primeiro a ter um moleque, considerando que você sempre foi o que mais tinha fogo no cu!

- Vai se fuder! – atirou um tênis fedorento em mim e eu o atirei de volta com mais força.

- Eu sinto muito man...

- Você vai voltar mesmo no tempo hoje Jimmy?

- É, eu vou voltar pro meu tempo.

- Se puder... mude as coisas Jimmy e com sorte eu não esteja tão lamentável agora.

- Eu vou fazer o que puder bro. Anda, cadê meu abraço?

Brian me abraçou apertado e depois fui até o quarto de Matt com ele. Zacky e Johnny também estavam lá, jogando algum jogo com Owen em um console tão estranho que eu nem sabia se realmente havia um console ali.

Foi uma despedida com gosto de reencontro, Johnny chorou mais uma vez, Zacky me mostrou a ultrassom do bebê de Gena, Matt tentou me ensinar a jogar o tal jogo, mas rapidamente trocamos a partida por um velho jogo de cartas e cervejas. Owen perguntou brevemente por Shannon e depois pediu que eu desse alguns conselhos sobre tatuagens. Gena apagou na cama de Matt antes de fazer meia hora que eu estava ali e Val se despediu com um dos seus abraços mornos, tão maternais que me faziam ter vontade de pular em seu colo, mas se eu o fizesse ela provavelmente quebraria algum osso. Arin não apareceu.

Ás 23h saí dali e voltei para o meu quarto. Peguei minha mochila e tomei um dos remédios pro peito, era estranho eu não ter sentido dor alguma enquanto eu estava ali no futuro. Talvez fosse o ar, sei lá.

Fechei a conta no hotel e saí caminhando pela rua fria, uma leve geada caía do céu, àquela hora a água do lago era negra como alcatrão. Me sentei no chão no exato lugar em que eu chegara uma semana atrás. Não havia quase nenhum movimento na rua. Peguei o pequeno objeto que Max me entregara antes da partida, semelhante a uma palheta com um único botão, olhei o relógio e aguardei os dois minutos que faltavam para a meia noite.

- Hora de voltar para casa Jimmy. – sussurrei para mim mesmo e então os dois ponteiros do relógio se encontraram no número doze e o botão foi pressionado.