Grissom e Sara conversaram pouco nos dias seguintes, e o que falavam era estritamente sobre as crianças. Parecia haver um elefante na sala, e nenhum dos dois parecia ter vontade de tocar no assunto. De um lado tinha Sara, que não estava arrependida de sua decisão, porém se sentia desconfortável de estar na casa de Gilbert depois de tudo que haviam falado, ainda sim, não podia sair de lá, e não podia dizer que tudo ia ficar bem, pois sabia como ele se sentia. E de outro estava Grissom, com coração partido, mas que ao mesmo tempo entendia que não podia obrigar ela a amá-lo.

Grissom não sabia o que fazer, queria dizer para Sara que tudo estava bem entre eles, mas ele não se sentia assim. Ele nunca havia gostado de ninguém após Laura, e quando seu coração finalmente se abriu para um novo amor, ele estava indisponível e pertencia a outro. Ele não sabia se devia lutar por ela, se devia tentar conquistá-la, ou lutar por ela. Roberto havia lutado por ela desde o primeiro segundo que pôs os olhos nela, era atencioso e estava presente, e ele não havia feito nada. Agora não sabia se fazer qualquer coisa teria diferença, ou se era tarde demais. Sentia-se velho para essas coisas, enferrujado e sem prática.

Ele se enterrava mais e mais no trabalho. E Sara se dedicava as meninas e a sua gestação. Ela não havia voltado ao trabalho, e mesmo contra gosto, deixou que Grissom cuidasse da parte financeira até que o bebê nascesse e Julia não corresse mais risco de vida. Então, dentro de um ano ou um pouco mais, quado tudo desse certo, tudo poderia voltar a normalidade.

Sara estava sentada em sua cama, pensativa, enquanto Julia tinha aula com a preceptora. Ela vinha somente três vezes na semana, para não cansá-la, e ajudava Julia a colocar as matérias em dia. A ideia havia sido de Grissom e havia funcionado muito bem: Dar uma rotina e distração para Julia, havia ajudado ela a esquecer o quão forte e díficil era o tratamento para a leucemia. Então, ela seguida forte e sem intercorrências, além das demais. As Julias já haviam se adaptado bem as perucas e trocavam uma com a outra com frequência. Não dava mais apra usar a cor do cabelo para identificá-las, uma vez que cada dia, cada uma estava com a peruca loira e castanha. Nesse dia, em especifico, Jujba utilizava a sua cor original, loira, enquanto Ju havia ido para escola com a castanha.

A preceptora, Rafaela, era uma mulher jovem, bonita, de cabelos escuros e olhos verdes. Ela era gentil, inteligente e tinha muita paciência com a menina.

— Sara, está tudo bem? – A preceptora perguntou ao fim da aula de Julia, quando já havia liberado a menina para brincar fora do quarto.

— Claro, está sim.

— Desculpa a intromissão, é que você está meio quieta hoje. Está tudo bem com a Jujuba?

— Está sim. Ela está ótima. Eu só estou com alguns problemas na cabeça.

— Bom, eu no seu lugar estaria surtando. – Ela sorriu. – Desculpa, não quis parecer intrometida. Mas se quiser conversar, estou aqui viu.

— Tudo bem. É só Gilbert e…

— Roberto. – A menina deixou escapar sem querer.

— Como você… – Sara parecia desconfiada.

— Desculpa. – Ela disse visivelmente envergonhada. – Eu juro que nã queria me meter. É que a casa tem muitos empregados e as vezes rola umas conversas e eu acabei ouvindo um por aí, e eu juro… juro… – ela enfatizou – que eu não falei nada.

— Tudo bem. – Ela sorriu.

— Bom, agora que eu já me intrometi mesmo. Eu diria que, apesar de não conhecer o senhor Roberto, eu conheço o senhor Grissom, e ele é um homem… Como posso dizer isso sem ser extremamente antiprofissional?

— Gostoso pra caralho? – Sara riu.

— As palavras são suas, não minhas. – Rafaela riu.

— Bom, esse é o Roberto. – Ela pegou o smartphone e mostrou para a preceptora.

— Nossa isso é um problema. – Rafaela disse após ver a foto do Roberto. – Mas como eu queria estar em um dilema desse. – Ela se abanou.

— Não tem dilema. Eu gosto do Roberto, só que depois que falei isso para o Gilbert, digamos que as coisas estão meio estremecidas. Ele é o pai das meninas e o pai do bebê. E eu, sinceramente, não queria que a gente estivesse assim. E eu também, não sei se quero levar essa relação com Roberto tão a sério, a gente saiu uma vez, foi muito legal, mas as crianças são minha prioridade agora, principalmente a Jujuba e eu tenho que manter esse bebê seguro para poder salvá-la.

— Você sabe que uma coisa não anula a outra não é?

— Gilbert me disse exatamente a mesma coisa há algum tempo.

— E ele está certo. Mas eu no seu lugar, faria diferente.

Sara não respondeu, apenas aguardou que continuasse.

— Eu provava um pouco de cada antes de me decidir. – Ela piscou.

Sara riu. Achou engraçado o que Rafaela havia falado, não que em algum momento qualquer, ela já não tivesse pensado nisso, mas ela não era assim.

— Grissom está sempre no trabalho, indisponível, ele é uma pessoa boa, mas é fechado, as vezes acho que ainda não superou a morte de Laura. Roberto é atencioso, carinhoso, está sempre disponível, quando eu preciso ele está lá.

Ainda antes que Rafaela pudesse responder, Esther apareceu na porta. A empregada era visivelmente deslumbrada pelo chefe, e por esse motivo, não gostava muito de Sara. Era uma antipatia gratuíta, apenas por saber que o seu chefe se interessava pela morena. Ela deu dois toques na porta.

— Chegou isso para a senhora. – Falou com desdém.

— Oh, obrigada.

Sara se levantou rapidamente e foi pegar o que estava nas mãos de Esther, sem dar muita atenção a seu tom de voz. Ela sempre ignorava. Era um pequeno vaso com uma planta, muito bonita e uma caixa de bombons de chocolate que ela gostava muito. O cartão estava fechado e pelo visto ainda não havia sido violado. De qualquer forma Esther estava ansiosa para saber de quem era.

— Já pode ir.

O sorriso de canto de Sara foi um pouco vingativo, ela não se importaria de abrir na frente de Esther, mesmo ela sendo fofoqueira, mas era uma pequena vingança pessoal, por ser tão antipática sem motivos. Esther saiu com uma expressão de poucos amigos e a morena pode voltar ao presente. Foi até a cama e Rafaela já estava curiosa.

— É de Roberto?

— Eu não sei.

Pegou o cartão e abriu o envelope. Ela já havia reconhecido aquele cheiro, nem precisava abrir para saber que era de Grissom. Quando abriu, no entanto, o que estava escrito foi o que a surpreendeu realmente.

“Querida Sara,

Eu não devia ter dito o que disse aquela noite. Eu sou ruim com as palavras e não posso pedir mais desculpas, pois o que eu disse foi imperdoável. Para mim é difícil admitir meus erros, mas ainda pior é admitir meus sentimentos, principalmente quando tenho que estar frente a ti e mergulhar em seus olhos. Sei que não deveria me esconder atrás de um cartão, mas creio que essa foi a forma que encontrei para me redimir, para me expressar e dizer que o que eu sinto é profundo e verdadeiro.

Sara, eu não posso desistir de você. Mesmo com tudo que me disse, abrir mão de você, é como abrir mão de meus sentimentos e me afundar novamente na tristeza e no sentimento de perda. Meu coração ainda é duro, é sofrido e machucado, eu não nego, e por esse motivo as vezes não sei como agir ou me expressar. No entanto, estar com as meninas e com você me faz mais forte, mais feliz, e pode até ser egoísmo, mas não quero deixar de sentir as sensações que sinto quando estou perto de você.

Desejo, profundamente, ainda ter alguma chance de estar em seu coração da mesma forma que se encontra hoje no meu.

Gilbert Grissom”

— Isso não me parece algo de um homem indisponível, Sara. – Rafaela constatou após terminar de ler. – Nossa, tô até arrepiada.

— Eu… Estou… Impactada. Acho que essa é a palavra. – Sara ainda segurava o cartão.

Rafaela foi embora em seguida, mas Sara ficou imóvel e perplexa, sentada na cama, com o cartão na mão enquanto olhava a planta e os bombons. Em alguns momentos tinha tantos pensamentos que mal podia ordenar eles, em outros ela não pensava em absolutamente nada. Ela não sabe quanto tempo ficou assim, cinco, dez minutos ou até mais tempo. No entanto, quando a voz de Roberto soou por trás de si, ela deu um salto que a tirou do transe.

— Sara, está tudo bem?

— Oi, está sim.

Roberto então viu o cartão nas mãos de Sara, em seguida a planta e os bombons sobre a cama. Ele ficou curioso e até um pouco enciumado. Ao mesmo tempo que Roberto analisava o que estava acontecendo, embora já tivesse alguma suspeita, Grissom, que havia chegado em casa naquele momento, logo queria ir até Sara, saber se havia gostado do que ele havia enviado. Ele não sabia exatamente o que perguntar, ou se deveria falar algo, ou apenas esperar que ela falasse, ainda sim, instantaneamente ele estava no caminho do quarto da morena. Estava prestes a entrar, quando ouviu a voz de Roberto de dentro do quarto.

— De quem são esses bombons e esse cartão?

Ele sabia que deveria entrar e dizer que eram dele, ainda sim, não queria colocar Sara em uma situação de estresse e fez o que ele geralmente não faria: Ficou ao lado da porta, escondido, a espreita para ouvir o que Sara iria dizer.

— Sara… – Ele percebeu que a morena não responderia. – Eu sei que não me deve nenhuma satisfação, mas eu realmente gostaria de saber quem te deu isso.