Chrono Crusade - After Heaven

Capítulo 5 - Apanhada...?


Quando Rosette entrou na sala de aula que Joshua lhe tinha apontado, ela sentiu-se presa por olhares julgadores.

– Menina Claire. – disse o professor assustando Rosette – Vai-se sentar, hoje?

– Ah…hmm… - Rosette olhou de novo para a sala e viu uma cadeira fazia, mesmo ao lado do seu querido, suposto namorado – Ok.

Com passos pequenos e hesitantes, Rosette caminhou por entre as carteiras de madeira até à última fila e sentou-se ao lado de Tyler. Sorriu-lhe e depois focou-se no professor.

– Agora, meninos… - começou o professor com cabelos brancos – Todos sabemos que a Claire esteve no hospital, por isso sejam simpáticos.

Rosette reparou que houve alguns olhares não muito amigáveis de algumas pessoas o que significava que Claire não era muito querida naquela sala.

– Então, Claire queres começar tu? – perguntou o professor.

Rosette ficou a olhar para o ar durante algum tempo antes de falar. – Começar o quê?

– A responder. – disse o professor apontando para o quadro preto.

O silêncio fez-se outra vez, enquanto Rosette olhava para todos aqueles números e fracções. Depois olhou para Tyler que a tinha tocado para lhe passar um pequeno papel com a resposta.

– Hum…a resposta é 25…? – tentou Rosette olhando diretamente para o papel enquanto o dizia.

O professor limitou-se a suspirar e a abanar a cabeça lentamente. – Tente estudar mais menina Claire. Vou-lhe dar um desconto porque acabou de sair do hospital.

Agradecida, Rosette sorriu e olhou para o relógio de parede, perguntando-se quando é que poderia sair.

A aula demorou mais tempo do que ela estava à espera e depois dessa, veio outra, e mais outra…quando conseguiu sair da sala já passava da hora do almoço.

– E então? – começou Tyler que caminhava ao lado de Rosette – Vais para casa, agora?

– Acho que sim. – respondeu Rosette meio desinteressada – Tenho que comer alguma coisa antes de ir às compras.

– Oh… - Tyler parecia um bocado desapontado –Queres que vá contigo?

Rosette pensou no assunto. Tyler não parecia ser um mau rapaz depois de ver bem e ela não conhecia aquele tempo. No entanto, para além das roupas, também queria comprar armas e voltar ao convento. Não podia fazer essas coisas com um civil ao seu lado.

– Hum…na verdade, acho que só vou passar por um café para comer algumas coisas e depois tenho outras coisas para fazer. – explicou Rosette, continuando a andar.

– Espera, Claire! – Ty agarrou Rosette porque parecia ser o único método para a parar – Ouve, eu quero pedir desculpa.

– Desculpa?

– Sim. – confirmou Ty – Eu não devia ter concordado com a ideia, mas tu insististe e, se calhar, foi por isso que foste para o hospital.

– O quê? – Rosette persentia que aquilo tinha algo a ver com ela – O que é que queres dizer?

– Tu sabes. – disse Tyler um bocado desconfortável – Aquilo…

– Claire.

Rosette virou-se ao reconhecer a voz do irmão e viu-se dividida entre saber mais sobre o assunto do qual Tyler estava a falar ou aproveitar para sair dali sob a desculpa de ter que falar com Joshua.

– O meu irmão…está a chamar-me. – gaguejou Rosette quando começou a recuar, ainda virada para Tyler – Mas…depois conversamos melhor…está bem?

Tyler franziu as sobrancelhas quando ela virou costas e foi a correr até ao irmão.

Havia alguma coisa diferente, ali.

– Onde é que vais comer? – perguntou Joshua depois de Rosette lhe ter contado que tinha de sair depois.

– Não sei. – e não sabia mesmo. Não conhecia nada, ali.

– Ouvi dizer que abriu um café novo há pouco tempo. – comentou Joshua – Queres experimentar?

– Claro. – respondeu Rosette grata pela coincidência.

– Notei que estavas a falar com o Ty. – continuou Joshua. Tinha de descobrir se eles tinham acabado e aquela era uma boa altura – Como é que vão as coisas entre vocês?

– Estranhas. – disse Rosette sinceramente – Onde é o tal café.

– É já ali. – disse Joshua apontando para o fundo da rua – Estranho como? Vocês acabaram?

– “Acabamos”? – Rosette não fazia a mínima ideia do que “acabar” significava – Acabamos com o quê?

– Com a vossa relação. – explicou Joshua um pouco irritado porque pensava que a irmã estava a gozar com ele – A mãe também está preocupada!

Rosette levou uma mão à cabeça. Aquela mulher a quem ele chamava mãe não tinha parecido nada preocupada no outro dia. Que tipo de piada era aquela.

– Não precisas de te preocupar. – informou Rosette – Eu estou ótima. Só estou a resolver algumas coisas comigo mesma.

– Não quero controlar-te. – esclareceu Joshua – Mas, desde que saíste do hospital não pareces bem. Estou preocupado.

Rosette suspirou e desistiu. Afinal, ele continuava a ser o seu irmão.

– Porque é que não vens comigo depois do almoço? – sugeriu Rosette – Vou comprar roupa para completar o meu guarda-roupa e precisava da tua ajuda.

– Precisas é que eu te carregue os sacos. – disse Joshua, mas riu-se na mesma – Está bem, eu vou contigo. Mas não posso ficar durante muito tempo.

– Não faz mal. – disse Rosette – Depois também tenho que fazer umas compras privadas.

– Bem… - Joshua decidiu não comentar porque pensou que ela se referia a lingerie a algum outro produto similarmente embaraçante – Se quiseres posso levar as tuas compras “públicas” para casa.

– Awww… - Rosette ficou realmente comovida – Se não te importares.

– Claro que não. – Joshua desconfiou da simpatia da irmã mas limitou-se a encolher os ombros e parar – Olha, é aqui.

Rosette olhou para o café e sentiu algo estranho, como se estivesse alguma coisa debaixo dos seus pés. Sem dar por isso, olhou para o chão mas só viu alcatrão.

– Vais entrar? – perguntou Joshua a olhar para ela – Está tudo bem?

Rosette olhou para cima e sorriu. – Claro!

Continuando com o sorriso, Rosette entrou mas decidiu não ficar durante muito tempo. Determinada a fazer isso, pediu uma sopa e ficou-se por aí.

– De certeza que estás bem? – insistiu Joshua, enquanto saiam do restaurante – Eu comi mais do que tu e isso não é normal.

– Estou…a tentar fazer dieta. – mentiu Rosette – De qualquer maneira, uma sopa é suficiente para um almoço.

– Devias pelo menos ter comido algum tipo de sobremesa. – disse Joshua um pouco amuado.

Rosette calou-se para acabar com o tema de conversa. Estrategicamente, seguiu Joshua até ao shopping sem que ele percebesse que ela não fazia a mínima ideia de para onde estavam a ir. Quando chegaram à loja, Rosette abriu a boca.

– Bem, aqui estamos. A tua loja favorita. – informou Joshua – Agora, porque é que não vais comprar as roupas que queres, enquanto eu vou ao salão de jogos durante meia-hora?

– Meia hora? – disse Rosette chocada com o tempo que Claire demorava a fazer compras.

– Sim, bem… - Joshua coçou a cabeça – Não estou disposto a esperar mais do que isso, por isso despacha-te.

Joshua afastou-se depois de se despedir e entrou na loja duas portas depois da loja de roupa onde Rosette estava prestes a entrar.

Não demorou mais do que quinze minutos a acabar o que fora ali fazer. Com dois sacos de roupa nas mãos, decidiu usar o tempo que lhe restava para comprar dois pares de sapatos confortáveis. Mesmo assim, só demorou oito minutos e foi ela que teve de esperar por Joshua.

– Isso foi rápido. – comentou Joshua antes de seguirem caminhos diferentes.

Depois de se despedir do irmão, Rosette encontrou um salão de beleza e pediu à senhora simpática que estava a atender para lhe examinar o seu cabelo.

Demorou mais tempo do que pensava lá mas finalmente conseguiu livrar-se das madeixas pretas e ter o seu cabelo de volta.

Sem perder tempo, saiu do shopping e começou a vaguear pela cidade. Demorou um par de horas até encontrar uma loja que vendia armas.

Ao entrar, causou imediatamente um erguer de sobrancelhas ao dono. – Que deseja, menina?

– Oh, só estou a ver. – respondeu Rosette aproximando-se das paredes com montras de armas.

O homem careca, com uma tatuagem no braço direito e um ar ameaçador aproximou-se de Rosette, mas ela estava demasiado entretida a olhar para a variedade de armas.

– Posso saber a sua idade, menina? – perguntou o homem.

– Ah, pode-me mostrar esta arma? – pediu Rosette apontando para a montra, claramente a ignorar o homem.

Com um encolher de ombros, o homem pegou na Beretta 92FS de que Rosette estava a falar e entregou-a. Afinal, não estavam carregadas.

Com um à vontade óbvio, Rosette desmontou algumas partes da pistola com rapidez, avaliou-as, e voltou a montá-la agilmente.

Normalmente as armas seriam fornecidas pela ordem, mas Rosette tinha dúvidas de que isso acontecesse agora. Com destreza, Rosette fez rodar a arma apenas um dedo, atirou-se para o chão e apontou para um alvo imaginário, fazendo o homem abrir a boca.

Levantou-se como se não tivesse feito nada de especial e devolveu a arma ao homem que continuava branco.

– Essa é uma boa arma. Talvez leve duas. – disse Rosette olhando para a montra novamente – Posso ver aquela, agora?

O homem olhou para a Remington M24 e decidiu entregar-lha mais por medo do que por outra coisa qualquer.

Enquanto ela mexia na arma como uma profissional, o homem começava a transpirar. – Você é polícia?

– Polícia? – Rosette deu uma gargalhada fazendo o homem recuar um pouco – Não. Eu sou apenas uma exor…pessoa normal.

– Para uma pessoa normal, parece ter bastante experiência com armas. – comentou o homem. Sentia o medo crescer dentro de si.

– …o meu pai…é caçador. – mentiu Rosette para não arranjar problemas – Habituou-me a mexer em armas desde pequena.

– Ah! – exclamou o homem como se estivesse tudo explicado. No entanto, não se sentia mais seguro – E que idade é que a menina tem?

– Eu tenho 17 anos. – disse Rosette como se não fosse nada de especial estar com uma arma na mão com aquela idade e saber manuseá-la daquela maneira – Então, vou levar as duas armas de que lhe falei e esta também me parece bem. Tem algum tipo de punhais.

– Peço imensa desculpa, menina. – disse o homem com cuidado – Mas não posso vender-lhe armas com essa idade. Aposto que nem sequer tem licença. Porque é que não volta daqui a uns anos?

Rosette dirigiu-se ao balcão, para tirar um cartão de crédito dourado da mala. – Porque é que não negociamos?

Depois de mais de vinte minutos a trocar argumentos, Rosette acabou com um enorme caco preto nas mãos e um cartão de crédito mais leve.

– Parece que está-se a preparar para uma guerra. – comentou o homem antes de Rosette sair.

– Talvez. – concordou Rosette – Mas é só porque quero reaver alguém muito especial para mim.

– Então, boa sorte. – desejou o homem.

– Não se preocupe, eu sou a boa da fita. – disse Rosette com um grande sorriso – Os bons da fita nunca perdem, certo?

Rosette disse isso, mas sabia que era mentira. Já tinha perdido uma vez. No entanto, não tencionava perder outra vez para Aion.

Próxima paragem, Convento de Madalena.

Mais uma vez, foi demasiado fácil entrar no Convento, mesmo com um enorme saco de armas nas mãos. Isso deixava-a um bocado irritada.

Voltou ao mesmo sítio para trocar de roupa e deixou o saco preto debaixo da sua antiga cama. Como já se aproximava da hora de jantar, Rosette decidiu entrar na cantina, servir-se de alguma comida e esperar um bocado na mesa dos seladores.

Para seu azar, foi Bobby que apareceu primeiro, sentando-se mesmo ao lado dela. – Então agora achas que te podes sentar sempre aqui?

Rosette teve que se obrigar a sorrir. – Eu só queria estar com as pessoas que admiro.

– A sério? – perguntou Bobby com os olhos semicerrados – Sabes, hoje, durante a missão, perguntei a algumas pessoas na cidade se conheciam alguém chamada Claire Christian, mas ninguém soube dizer-me quem tu eras.

– Eu não sou uma pessoa muito conhecida. – explicou Rosette.

– Estou a ver. – Bobby anuiu como se tivesse percebido, mas continuou a olhar para ela desconfiadamente.

– Claire!

Quando Rosette ouviu a voz de Myriam quase suspirou.

– Bobby, não estás a perturbar a miúda outra vez, pois não? – perguntou Yura que também se juntou a eles.

– Estávamos só a conversar. – explicou Bobby – Não é, Claire?

– Claro. – disse Rosette para não o arreliar.

Quando todos estavam na mesa, a conversa começou. Estrategicamente, Rosette conseguiu controlar o tema até chegar onde ela queria, mas a resposta não lhe agradou.

– Não há munições!? – exclamou Rosette, chateada.

– Bem, haver há. – corrigiu Myriam – Mas são munições normais.

Rosette franziu as sobrancelhas. Como é que irias conseguir matar demónios com munições normais? O sorriso desapareceu completamente.

– A verdade é que nós não precisamos de manejar armas. – explicou Yura – Fazemos o nosso trabalho apenas com rezas e rituais e, quando há algum problema, o Bobby anda sempre com uma arma.

– Mas as balas não se comparam àquelas que os antigos exorcistas usavam. – continuou Myriam sorrindo – Era fixe que ainda houvessem exorcistas. Gostava de os ver em ação.

– Eles deixaram de existir por razões óbvias. – contestou Bobby – Para começar, eram desnecessariamente violentos. Muitas vezes, acabavam por destruir prédios inteiros.

– Shh, não digas mal da Santa. – murmurou Myriam fazendo Rosette corar.

– Naquele tempo os demónios estavam descontrolados. – justificou-se Rosette – Eles não tinham muita escolha a não ser usar “violência” para acabar com eles.

– Sim, a situação com os demónios estava realmente descontrolada e não era só fora dos portões do Convento. – disse Bobby – Ouvi dizer que a antiga Ordem também fazia pactos com demónios.

Rosette desviou imediatamente os olhos para o prato, chamando a atenção de Bobby.

– Oh, será que a menina Claire sabe alguma coisa sobre o assunto? – perguntou Bobby – Pareces perturbada com o assunto.

– Sim, ficamos todos, Bobby. – defendeu Yura – Como é que és capaz de dizer tal coisa dentro do Convento?

– Eu estou… - Rosette esfregou os olhos porque começava a doer-lhe a cabeça - …realmente cansada. Acho que vou-me deitar mais cedo.

– Mas ainda nem acabaste de comer. – Myriam olhou para Bobby – Viste o que fizeste?

Depois de se despedir, Rosette saiu da cantina e deu de caras com um par de guardas nos portões do convento. Com um trejeito de desagrado, Rosette voltou para o seu antigo quarto e decidiu que a única hipótese era dormir ali.

Se os guardas continuassem lá quando acordasse, teria de pedir ajuda ao Padre para sair dali.

Como se tivesse acabado de chegar a casa, Rosette pousou o relógio em cima da cómoda, puxou os cobertores da cama para trás e viu-se confrontada com o problema de não ter pijama. Depois lembrou-se de uma coisa e começou a procurar nas gavetas. Tal como esperava, a sua roupa estava lá.

Rosette sorriu. Afinal, aquilo era trabalho de Azmaria, já devia esperar isso dela.

Vestiu o seu pijama e deitou-se, adormecendo quase imediatamente.

Os raios de sol tinham-na acordado do sono calmo e sem sonhos.

Levantou-se, espreguiçou-se, bocejou e olhou para o relógio. Esquecendo-se por momentos de que estava noutro tempo, pensou que Chrno já devia estar à sua espera para o pequeno-almoço. Depois lembrou-se e o sorriso desapareceu.

Ainda ensonada, levantou-se, prendeu o cabelo e vestiu o seu antigo uniforme num ato de nostalgia. Depois pendurou o relógio ao pescoço e sentiu-se ela mesma, pela primeira vez desde que tinha acordado para aquela era.

Calçou as suas antigas botas que estavam ao pé da porta e rodopiou um bocado. Mesmo que estivesse ali e fosse suposto ter uma vida normal, queria muito ser uma exorcista outra vez.

Suspirou fundo e decidiu que estava na hora de trocar de roupa.

No entanto, quando estava prestes a tirar a segunda bota, a porta abriu-se.