Chrono Crusade - After Heaven

Capítulo 4 - Os Seladores


Rosette acordou realmente decidida a salvar Chrno do Pandemonium depois de sonhar com ele pela segunda vez no espaço de 24 horas.

Saiu da cama, vestiu a mesma roupa que tinha vestido no dia anterior e fez a cama tal como tinha feito tantas outras vezes na sua “outra vida”. Resolveu que era melhor não falar com o Padre durante algum tempo pois ele só ia dissuadi-la de ir procurar Chrno. Em vez disso, iria diretamente aos seladores, o que quer que eles fossem.

Amarrou o cabelo como costumava fazer depois de penteá-lo competentemente. Tinha madeixas pretas misturadas com os cabelos loiros que provavelmente tinham sido pintados. Pensou que podia tratar disso mais tarde, depois de falar com os seladores, arranjar algumas armas e comprar mais roupa.

O que tinha acontecido na noite anterior envergonhava-a e impedia-a de sair facilmente do quarto para ir tomar o pequeno-almoço. Fiore entrou antes de ela juntar coragem suficiente para sair.

– Madame Claire, porque é que fez a sua cama? – perguntou Fiore como se fosse uma coisa estranha – Demorei demais no quarto do Senhor Joshua?

– Não. – respondeu Rosette com um pouco de pena da empregada. Pela cara dela, devia estar a pensar que tinha feito algo errado – Eu…só tinha tempo e decidi experimentar.

– Se é assim… - disse Fiore – Por favor, perdoe-me pela intrusão. O pequeno-almoço está servido. Pode descer quando entender.

O mais rápido que conseguiu, Fiore deixou Rosette sozinha, a pensar se os seus “pais” estariam presentes para a castigarem pelo seu comportamento da noite anterior. No entanto, quando desceu, apesar de estarem todos lá, ninguém mencionou a noite anterior.

– Bom dia, Claire. – cumprimentou Joshua e Rosette fez o mesmo antes de se sentar ao lado dele.

– O teu pai vai pôr dinheiro na conta hoje para comprares alguma roupa de jeito. – começou a mulher sem sequer olhar para o marido que lia o jornal atentamente…ou fingia ler – Espero que tenhas bons gostos, desta vez e não te atrases para a escola.

– Não nos vamos atrasar. – respondeu Joshua – Não precisa de se preocupar, mãe.

A mulher bebeu um pouco de café com uma expressão solene, suspirou e olhou para Rosette seriamente.

– Se o melhor que podes arranjar o Tyler, e eu acredito que é, sugiro que não o trates como o trataste ontem. – disse a mulher magoando os sentimentos de Rosette – Nem o dinheiro que temos pode compensar essa tua personalidade.

– Mãe! – exclamou Joshua tentando defender a irmã. Era escusado. Os danos já estavam feitos.

– Bem, fique a saber que eu tenho melhor! – gritou Rosette levantando-se bruscamente porque, de alguma maneira, sentia que eles tinham acabado de ofender Chrno – Agora, por favor, se me dão licença, eu ainda tenho que passar por outro lado antes de me dirigir para a escola.

Joshua olhou para a irmã com tristeza mas, sobretudo, confusão, tal como a mãe o fazia, agora. Normalmente, Claire limitar-se-ia a responder à mãe com um comentário desagradável e acabaria a refeição.

– Jason. – chamou a mãe – Tens conhecimento de algum envolvimento que a tua irmã tenha com outro rapaz?

Joshua abanou a cabeça. – Não, mas é verdade que ela saiu ontem à tarde e só voltou antes do jantar.

– O que é que achas que ela foi fazer? – perguntou a mulher, mais curiosa do que preocupada.

– Não sei. – respondeu Joshua – Mas posso descobrir.

Rosette já tinha entrado em vários sítios à socapa mas suspeitava que entrar no convento iria ser um dos seus maiores desafios. Por um dos portões laterais que, por falha, não tinha nenhum sistema de segurança, Rosette trepou sem dificuldade depois de olhar em volta.

Saltou para lá para dentro e perguntou-se onde poderia encontrar uma roupa de freira par conseguir falar com um selador sem dar nas vistas.

Deu com eles mesmo sem querer, atrás da igreja num armário de metal. Lembrou-se que o seu quarto não era usado, por isso podia trocar de roupa lá. Apressou-se a ir para lá e a mudar de roupa e pensou que eles tinham baixado demasiado as defesas. Era verdade que podiam já não haver demónios a andar pela terra mas podiam sempre aparecer. Se isso acontecesse, o que é que eles fariam? A Ordem de Madalena continuava a ser a sede dos exorcistas e, por isso, o alvo principal dos demónios.

Trocou-se rapidamente, voltou a colocar o relógio ao pescoço e saiu. A roupa ficava-lhe um pouco larga mas nada que se transformasse num desastre. Se tivesse sorte, ainda estariam a comer, na cantina da Ordem. Se tivesse azar, o Padre também estaria lá.

A roupa continuava a ser azul, apesar de agora ser de um azul mais escuro e o pano a cobrir o cabelo era menor.

Ela entrou na cantina e olhou em volta, hesitante, sorrindo quando verificou que o Padre não estava lá. Havia mais movimento agora do que havia da última vez que tinha almoçado ali com todos os seus amigos…Azmaria e Chrno.

Tentando não pensar mais no assunto pois só ia deprimi-la. Continuou a analisar a sala. Os homens separavam-se das mulheres e ninguém falava demasiado alto. O único grupo misto estava a um canto com caras sérias e um silêncio assustador. Rosette decidiu que aqueles eram os seladores e dirigiu-se a eles com um sorriso enorme. Puxou uma cadeira de outra mesa como se nada fosse e sentou-se no meio de um homem assustador e uma mulher com cara autoritária que olhavam para ela, desconfiadamente.

– Podemos ajuda-la? – perguntou o homem imediatamente farto do sorriso de Rosette.

– Ah, desculpem. – pediu Rosette imediatamente – Eu sou nova aqui e não sei bem onde me sentar.

– Oh, que querida. – disse a mulher, ironicamente – Bem, não te podes sentar aqui.

– Espera, eu já não te vi antes? – perguntou uma rapariga que comida à sua frente.

– Não. – disse Rosette simplesmente – Eu nunca estive aqui antes…recentemente.

– Acho que me lembro de te ver numa fotografia. – pensou a rapariga, puxando pela memória – E numa bastante antiga. Tens a certeza que nunca apareceste em alguma revista ou qualquer coisa?

– N-não. – gaguejou Rosette sem querer – Bem, vocês não são os seladores?

Uma sensação de orgulho percorreu o grupo por estarem a ser reconhecidos por uma novata no seu primeiro dia. As expressões faciais mudaram imediatamente. Menos a do homem ao seu lado que não tinha gostado do facto de a cara dela ser-lhe demasiado familiar.

– Como é que te chamas? – perguntou a rapariga ao seu lado muito mais afetuosamente – Eu chamo-me Myriam.

– Eu sou a Rose…Claire. – corrigiu Rosette antes de lhes dar mais motivos para suspeitarem – O meu objetivo é ser como vocês. – mentiu Rosette vendo o orgulho a aumentar cada vez mais – Vocês são bastante famosos.

– Bem, não é para me gabar. – começou a mulher ao seu lado – Mas nós é que fazemos o trabalho todo, por aqui.

– Eu gostava imenso de conhecer melhor o vosso trabalho. – Rosette mentiu mais uma vez. Ser exorcista fora tudo o que alguma vez desejara ser e já o era. No entanto, mentir tantas vezes em tão pouco tempo estava-a a incomodar.

– Acho que podíamos levar-te connosco em algumas missões. – propôs Myriam olhando em volta para obter confirmação. Todos concordaram à exceção do homem ao lado dela.

– Qual é o teu último nome…Claire? – perguntou o homem olhando-a de lado.

Rosette abriu a boca mas não saiu nada. Qual era o último nome da Claire? Alguém lhe tinha dito? Não podia hesitar agora. Teria que inventar qualquer coisa.

– É Christ…ian. – conseguiu Rosette achando que aquela não era a sua melhor invenção.

– Claire Christian? – perguntou o homem erguendo uma sobrancelha – Esse é um último nome bem peculiar para o meu gosto.

– Não posso culpar os meus pais. – disse Rosette rindo desajeitadamente.

– Muito bem, Christian. – disse o homem salientando o nome dela – Qual é o teu passado?

– Vá lá, Bobby! – exclamou Myriam mencionando o nome do homem – Ela é só uma caloira a tentar aprender. A maioria das pessoas nem fala connosco.

Bobby cruzou os braços e desviou os olhos de Rosette porque continuava a suspeitar dela.

– Então, caloira. – começou a mulher ao seu lado – O meu nome é Yura.

Yura não parecia ter mais de 30 anos tal como Myriam mas Yura parecia muito mais experiente que a colega.

– Muito prazer. – disse Rosette esticando a mão.

Depois de se cumprimentarem, agora mais pacificamente, Rosette concluiu que já fazia parte do grupo.

– Porque é que não te juntas a nós?...na próxima missão. – explicou Myriam – Se a tua supervisora deixar, é claro.

– Sim, eu posso falar com ela, se quiseres. – voluntariou-se Bobby vendo uma oportunidade para desacreditar a rapariga – Quem é ela?

– Ahm… - gaguejou Rosette – Não posso ficar durante muito tempo mas…

– Não te preocupes. – pediu Myriam – Nós sabemos que não deixam as caloiras andar connosco. Porque é que não te mostramos o relatório da missão quando voltarmos?

– Sim. – concordou Rosette mais feliz – Eu agradecia imenso.

Rosette ia-se levantar para se despedir mas Bobby agarrou-lhe o relógio fazendo-a parar imediatamente. Teve que ignorar todos os seus instintos para não agarrar o braço dele e deitá-lo ao chão.

– Este é um colar bastante invulgar. – comentou Bobby – Uma imitação?

– Imitação? – Rosette estava confusa.

– Sim. A Rosette Christopher usava um colar igual a este quando andava na antiga Ordem. – explicou Bobby inutilmente – Muitas freiras usam uma réplica para se sentirem mais próxima dela. – Bobby analisou a réplica – No entanto, a que elas usam é algo diferente.

Bobby passou o polegar pelo vidro preto que indicava a extinção da vida que um dia tinha estado lá dentro para ajudar um demónio. Se as freiras soubessem disso, talvez não o usassem.

– Por favor. – pediu Rosette calmamente – Pode largar isso?

– Objetos não te aproximam de ninguém. – disse Bobby – Muito menos de uma freira morta há mais de 50 anos.

Rosette arrancou o relógio das mãos de Bobby e virou costas sem dizer mais nada. Não tinha de dar explicações a ninguém sobre usar o seu próprio relógio! E estava atrasada para a escola…

– Uhm…Até logo, Claire. – disse Myriam vendo Rosette sair. Depois olhou para Bobby – Tu afugentas sempre as novatas! – amuou ela – Nunca posso ter amigas novas!

– Fiz-te um favor. – concluiu Bobby – Eu conheço aquela rapariga de algum lado e, se ela não nos quer dizer quem é, alguma coisa deve estar mal.

Rosette correu pelo jardim do Convento, saltou os portões sem sequer abrandar e, num segundo, já estava do outro lado sem ninguém notar.

Ah! Queria ver os seladores fazerem aquilo…

Tirou o pano de cima da cabeça e travou a fundo quando viu Joshua ao fundo da rua, a olhar para ela com os braços cruzados.

– Estás atrasada para a escola. – disse Joshua num tom de voz ameaçador – Onde é que estiveste? E onde é que foste arranjar estas roupas.

– Hum…Jason, eu…

– Não venhas com “Jason, eu…” – interrompeu Joshua – A mãe está…preocupada contigo. Estás estranha desde que chegaste do hospital.

– Jason, temos que ir! – exclamou Rosette – Se não, não vamos chegar a tempo.

– Nós vamos falar sobre isto, Claire! – gritou Joshua quando Rosette começou a correr outra vez.

A primeira vez estava feita. Tinha ganhado a confiança de quase todo o grupo dos seladores. Só tinha de descobrir que técnica é que eles usavam para fazer os selos e depois descobrir como reverter o processo.

E, depois, podia salvar Chrno.