“- Não te preocupes, Rosette. Eu vou estar sempre contigo.”

Rosette olhou para Chrno com uma expressão de dor na face. Ele estava tão pálido e parecia tão cansado…no entanto, dizia para ela não se preocupar. Estava tudo negro à volta deles, ela estava com medo.

“- Não te preocupes, Rosette. Eu prometi que não te ia deixar morrer.”

Rosette sentiu uma pontada no peito quando ele sorriu. Queria falar, perguntar onde ele estava, mas não conseguia. Quando ele pousou uma mão na cara dela, apeteceu-lhe chorar.

“- Não chores, Rosette. Eu vou estar sempre aqui…”

E, no mesmo momento que disse isso, começou a desfazer-se em pó, tal como o Aion tinha-se desfeito depois da batalha entre os dois.

Ao tentar agarrá-lo, desesperada, caiu no chão e começou a soluçar, irritada por não conseguir falar.

-Claire!

Rosette abriu os olhos e percebeu que estivera a sonhar. Depois precisou de mais alguns segundos para se lembrar que aquele já não era o seu Joshua e que todos pensavam que ela era maluca sempre que dizia o seu nome.

- Estás bem, Claire? – perguntou o irmão, um pouco em choque – Estavas a chorar.

Rosette levou uma mão à cara e sentiu a pele molhada por baixo dos olhos. – Eu…eu disse o nome de alguém?

- Eu não ouvi nada. – disse o irmão encolhendo os ombros – Olha, se é por causa do Ty, nós já falamos e ele disse que era tudo um erro.

- Quem é o Ty? – perguntou Rosette, a medo.

- Tyler. É o teu namorado, Claire. – Rosette ficou totalmente branca quando Joshua disse aquilo – Parece que tiveram uma discussão antes de entrares em coma, mas ele está arrependido.

Como se tinha esquecido de respirar depois da palavra “namorado”, Rosette teve que inspirara bem fundo antes de falar outra vez.

- Ah, sim! – exclamou Rosette – Esse Tyler.

- Ele mandou-me uma mensagem a avisar que ia estar em nossa casa. – disse ele, abrindo a porta do táxi – À espera para te pedir desculpa.

- Em casa?

Rosette olhou em volta mas não reconheceu a Ordem de Madalena nem o orfanato…aquela não era a casa dela.

- Onde é que estamos? – perguntou ela enquanto o irmão pagava ao táxi.

- Tu adormeceste no carro, Claire. – disse ele como se ela fosse uma idiota – Já chegamos a casa.

- Ok…? – Rosette saiu do táxi e olhou, pela primeira vez em toda a sua vida, para a grande casa amarela-esbranquiçada de três andares – É…….bom estar em casa.

- Vem! – exclamou Joshua estendendo-lhe a mão – Os pais não puderam ir visitar-te ao hospital mas devem estar ansiosos para te ver!

Rosette entrou na propriedade delimitada por portões enormes e sentiu-se como uma criança ao entrar naquele jardim cheio de flores e relva verde. A felicidade foi tão pura, que se esqueceu de tudo o resto, por um momento.

- Wow! Nunca te vi sorrir assim. – apontou Joshua depois de ver o sorriso brilhante da irmã – De maneira tão sincera e….

- Desculpa. – pediu Rosette, apesar de achar que não tinha de fazê-lo – Só estou contente por estar em casa.

- Então anda. – Joshua agarrou a mão dela e começou a correr – Os pais também vão ficar contentes.

O interior da casa não era mais acolhedor do que um consultório médico.

Rosette tinha a sensação que não podia tocar em nada sem ser repreendida e tudo ali parecia tão valioso que, se calhar, até era mesmo melhor não tocar.

Joshua parecia totalmente à vontade, ali. Mas ela não sabia por onde se havia de virar.

- Lisa! – chamou Joshua, obtendo a atenção de Rosette – Os meus pais estão em casa?

Ela susteve a respiração ao ver a pequena empregada com cabelo curto e preto a entrar na sala. Aquela…era a irmã da Satella!

- O Senhor está numa reunião. – explicou Lisa – E a Senhora saiu para fazer ioga. Só vão voltar ao fim da tarde.

Automaticamente, ela tirou a mochila a Joshua e dirigiu-se a Rosette para receber o casaco. No entanto, quando ela esticou a mão, Rosette deu dois passos atrás e embateu com força contra a porta.

- Claire! – gritou Joshua correndo imediatamente para a ajudar.

- Miss, está bem? – perguntou Lisa.

- Ela só está um pouco abalada por causa do tempo que passou no hospital. – explicou Joshua ajudando a irmã a endireitar-se – Podes ir agora, Lisa. Obrigada pela preocupação.

Lisa acenou ligeiramente com a cabeça e saiu rapidamente da sala, deixando os irmãos sozinhos. Ele olhou para Rosette com uma cara estranha e depois cruzou os braços, como se estivesse chateado.

- Fizeste isso de propósito, Claire!? – exclamou Joshua afastando-se de Rosette – Tu sabes que eu gosto dela…

- Tu gostas dela? – interrompeu Rosette, verdadeiramente surpreendida.

- Agora vais dizer que não sabias? – antes que ele tivesse oportunidade de continuar a repreendê-la, ela começou a correr pelas escadas acima – Claire! Ainda não acabamos de falar!

Mesmo não sabendo para onde ia, isso não importava, naquele momento. Precisava de armas. Alguma coisa que pudesse usar para se defender. Aquilo estava tudo errado!

Começou a percorrer os quartos mas chegou ao fim do corredor sem encontrar nada. Voltou para trás a correr, decidida que estava na hora de fazer uma visita à Ordem de Madalena e obter algumas respostas.

O irmão, que ainda estava à espera dela na entrada, abriu a boca quando a viu saltar as escadas todas de uma vez só.

- Estás a gozar comigo? Como é que fizeste isso? – perguntou Joshua – Ficaste com super poderes depois do coma?

- Desculpa, Jason. – pediu Rosette dirigindo-se para a porta – Tenho que ir a um sítio mas volto antes do anoitecer!

- O que é que estás a dizer? – perguntou Joshua, preocupado – O Ty deve estar a chegar.

Rosette olhou para trás antes de sair, já com a porta aberta. – Acho que………agora não é uma boa altura para o ver. Podes-lhe dizer para vir noutro dia?

- Espera! Claire… - ao vê-la fechar a porta, ele suspirou – O que é que se passa com aquela miúda?

Rosette conseguiu apanhar um táxi em cinco minutos mas, ao pedir para a levar para a Ordem de Madalena, o taxista limitou-se a olhar para ela durante alguns segundos.

- Menina, pode repetir? – pediu o taxista.

- Eu disse que queria ir para a Ordem de Madalena. – disse Rosette mais uma vez – Por favor.

- Desculpa menina, mas eu não conheço nenhum lugar chamado “Ordem de Madalena”. – informou o taxista – Nem aqui, nem em lado nenhum.

Rosettte comprimiu os lábios com força até eles ficarem brancos. A verdade é que já tinha passado bastante tempo desde que saíra da Ordem. Podia ter mudado de nome ou já nem existir.

- No entanto… - continuou o taxista – Conheço um “Convento de Madalena”. Acha que pode ser isso?

Rosette decidiu que não fazia nenhum mal experimentar, por isso concordou com o motorista e acabou por ir ter exatamente ao lugar onde antes vivera com Chrno durante bastante tempo.

- Obrigada. – agradeceu Rosette – Pode voltar à casa de onde eu saí? O meu irmão está lá. Ele paga-lhe.

O taxista não ficou muito contente com a solução mas não teve outra opção a não ser deixá-la lá e voltar para a residência.

Depois de ver o táxi a afastar-se, Rosette virou-se e olhou novamente para a antiga Ordem de Madalena. Estava praticamente igual ao que ela se lembrava.

Tinham feito algumas obras, pintado algumas paredes e talvez construídas algumas salas mas o jardim estava igual, tal como a igreja. O portão também não estava muito diferente, apesar de haver algumas modernidades, como câmaras e uma campainha com comunicador incorporado.

Rosette achava que aquilo era demasiada segurança se aquilo fosse apenas um inocente convento.

Naturalmente, como se estivesse a voltar a casa, Rosette tocou à campainha mas assustou-se quando viu a cara de uma freira a aparecer no pequeno ecrã por cima da campainha.

- Sim? – começou a freira com um olhar duro – Posso ajuda-la?

- Ah, desculpe, posso falar com a irmã no comando? – pediu Rosette pensando numa desculpa para que elas a deixassem entrar – Eu queria tornar-me numa freira.

- Não costumamos aceitar meninas da sua idade. – informou a freira mas suspirou e carregou no botão para abrir o portão – Entre. Alguém vai ter consigo.

Rosette começou a andar, devagar, porque sabia que seria considerada alguém suspeita se andasse muito rápido. Ao passar pelo jardim, lentamente, em direção à irmã que a esperava na porta principal, Rosette começou a lembrar-se de tudo o que tinha passado naquelas instalações e isso só a magoou mais.

- Boa tarde. – cumprimentou Rosette – Eu chamo-me Rosette. Prazer em conhecê-la.

- Boa tarde, Rosette. – cumprimentou a freira – Eu sou a irmã Joan. Também é um prazer conhecer-te. – depois das apresentações, ela continuou – Podes seguir-me? Vamos fazer uma visita guiada ao convento e depois a irmã Charlotte está à sua espera.

Rosette assim o fez. Foi atrás da rapariga pelos corredores que conhecia tão bem, enquanto ela lhe apresentava as instalações.

Quando chegaram à igreja, Rosette fez uma pequena vénia em frente às estátuas mesmo antes de Joan o fazer.

- Pareces ser uma devota. – disse a irmã Joan com orgulho – A irmã Charlotte vai gostar de ti.

Depois de acabarem a visita, Joana levou-a ao antigo escritório da irmã Kate e bateu à porta antes de entrar.

A mulher atrás da secretária era robusta, tinha os cabelos grisalhos, devia andar por volta dos 50, 55 anos e o sorriso que lhe direcionava era-lhe tão estranho que fez Rosette arrepiar-se.

- Prazer em conhecê-la. – disse Rosette novamente – Eu chamo-me Rosette.

- Então, Rosette… - começou Charlotte – Pela tua roupa deduzo que sejas uma arrependida…?

- Desculpe? – perguntou Rosette – Arrependida?

- Sim. – disse Joan aproximando-se – Basicamente, uma arrependida é uma freira que já cometeu muito pecados e que agora se quer redimir. No entanto, normalmente referimo-nos ao pecado carnal.

- O quê!? – Rosette corou – Não, não! Eu sempre caminhei pelo caminho do Senhor! – garantiu ela – Quer dizer…eu parti algumas coisas. Mas fazia parte do trabalho.

- Como? – perguntou Charlotte, confusa com a conversa que estavam a ter – Que tipo de trabalho?

- Desculpe, aliás, eu queria falar-lhe sobre uma coisa estranha que me aconteceu há pouco tempo. – disse Rosette – O meu nome é Rosette Christopher e eu devia ter morrido em 19XX.

O sorriso de Charlotte desapareceu tal como sua simpatia. – Por favor, saia. – pediu ela numa voz calma.

- Não está a perceber! – insistiu Rosette – É verdade! Quando eu acordei, hoje…

- Pedi-lhe para sair. – repetiu Charlotte.

- Mas eu sou mesmo a Rosette Christoph…

O estalo de Joan surpreendeu-a e deixou Rosette com a face vermelha e dorida.

- Como se atreve a usar o nome da Santa! – gritou Joan mais irritada do que Rosette estava à espera – Não tem o direito de profanar o nome da irmã Rosette!

Rosette ficou sem palavras porque conseguia ver as lágrimas a marejar os olhos de Joan. Porque é que ela merecia tanto respeito? Tinha feito alguma coisa especial?

- O que é que se passa aqui?

A voz familiar fez Joan e Rosette virarem-se ao mesmo tempo. O homem que se encontrava à porta era alto e loiro e, noutros tempos, tinha sido alvo do amor paternal de Rosette.

Ragminton parecia tão surpreendido quanto Rosette.

- Padre! – disse Joan com as mãos unidas – Esta pessoa usou o nome da irmã Rosette!

- Padre Ragminton…? – murmurou Rosette com vontade de o abraçar. No entanto, se o caso fosse igual ao de Joshua, só ia piorar a situação.

- Não se preocupe, Padre. – disse Charlotte – Ia-mos já escolta-la para fora.

- Tenha calma, irmã. – disse Ragminton com um sorriso sedutor – Porque é que não trato eu disso?

- Tem a certeza, Padre? – perguntou Joan, preocupada.

- Claro. – confirmou ele – Deixem-na comigo.

Rosette seguiu-o obedientemente quando ele abriu a porta e começaram a caminhar silenciosamente pelo corredor.

- Olhe, não sei no que é que estava a pensar quando se vestiu assim e… - Ragminton parou de falar quando olhou para ela e viu as lágrimas a escorrerem-lhe pela cara abaixo. Parou e fê-la parar também – O que é que se passa?

- Eu não sei…o que se passa!? – disse Rosette por entre soluços – Porque é que eu estou aqui?...onde está o Chrno?

- Disseste Chrno? – perguntou Ragminton – Como é que sabes do Chrno? Ninguém sabe do Chrno. – ela olhou para ele e foi aí que ele percebeu – Rosette?