Chamas e Brisas

Capítulo 2 - Sorriso Radiante


Na ampla recepção da central do Conselho de Fortalium, o ar estava carregado de excitação e expectativa. A atmosfera pulsava com a energia das pessoas que se reuniam ali, ansiosas pela chegada dos líderes de cada país do continente. O local estava decorado com tapeçarias coloridas que retratavam cenas da história da cidade, desde os tempos antigos até os dias atuais, enquanto grandes janelas deixavam entrar a luz do sol, iluminando o espaço com uma luminosidade acolhedora.

No centro da recepção, uma mesa de madeira maciça servia como posto de controle, onde a recepcionista se encontrava imersa em uma montanha de papelada, tentando organizar a documentação relacionada aos visitantes que estavam por vir. Seus olhos se moviam freneticamente de um papel para o outro, enquanto ela tentava decorar os nomes dos líderes e reconhecê-los assim que chegassem.

Um pequeno pigarrear rompeu o burburinho da sala, chamando a atenção da recepcionista. Ela ergueu os olhos e se surpreendeu ao ver um homem parado diante de seu balcão. Seu cabelo loiro e longo estava bagunçado, como se tivesse acabado de sair de uma batalha, mas seu sorriso radiante e seus olhos azuis como o céu brilhavam com uma luz própria, iluminando o ambiente ao redor.

- Oi... Como posso ajudá-lo? - ela perguntou desajeitadamente, seus olhos castanhos encontrando os dele em um instante de conexão fugaz.

- Bom dia, moça. Vim encontrar a líder do conselho, Isabel - ele disse, seu sorriso ainda presente, embora contido. - Por mais que eu a chame de mamãe - suas bochechas coraram levemente, revelando um lado mais afetuoso.

A recepcionista, ainda atordoada, começou a juntar sua papelada, mas antes que pudesse completar a tarefa, as folhas escapuliram de suas mãos e caíram no chão com um ruído abafado.

- Espera! Você é o Aeris?! - ela exclamou, seus olhos arregalados de surpresa. Aeris, conhecido como um viajante do mundo, envolvido em inúmeras aventuras, era o primogênito de Isabel e Natasha.

- Eu sei, não estou exatamente em meu melhor estado. Mas não pude resistir a vir ver a minha mamis. - sua voz ressoou no ar, suave como uma melodia. A recepcionista se desculpou por sua reação surpresa, e Aeris respondeu com um sorriso tranquilizador, dissipando qualquer desconforto que ela pudesse estar sentindo.

- Vou levá-lo até a sala dela. - ela ofereceu, endireitando-se e estendendo a mão para indicar o caminho que seguiriam. Aeris assentiu com um gesto de cabeça, ainda sorridente, pronto para seguir em frente.

Enquanto caminhavam pelos corredores imponentes da instalação do conselho, Aeris e a recepcionista conversavam animadamente sobre suas viagens, compartilhando histórias de lugares distantes e experiências únicas que haviam vivido. As paredes brancas do corredor eram adornadas com uma série de quadros, cada um retratando um país diferente e sua cultura única. Desde paisagens exuberantes até retratos de líderes passados do conselho, os quadros mostravam o orgulho e a diversidade das nações que já haviam passado por ali.

O piso, também branco, contrastava com os quadros coloridos, mas estava coberto de tapetes tecidos com padrões intricados e cores vibrantes, adicionando um toque de calor e conforto ao ambiente austero. À medida que seguiam em frente, Aeris notava a atenção aos detalhes em cada obra de arte e a sensação de reverência que permeava o corredor.

Finalmente, a recepcionista parou diante de duas portas de madeira, cada uma ornada com uma placa de latão polido acima. Em letras elegantes, as placas indicavam: "Isabel Aetheron, Líder do Conselho". Era o fim da linha para a recepcionista, que se despediu com um aceno antes de se virar e partir, deixando Aeris diante das portas que levavam à presença de sua mãe. - Obrigado. – o jovem de olhos azuis diz com um sorriso gentil.

Aeris bate na porta algumas vezes e, ao receber permissão para entrar, abre-a com um sorriso. Seus olhos azuis brilham ao ver sua mãe, Isabel, sentada atrás da mesa, absorta em seus papéis. Isabel tem uma pele de cor ébano, que brilha sob a luz do sol que entra pela janela atrás dela, destacando sua elegância. Seus olhos castanhos claros são penetrantes e expressivos, refletindo sua concentração no trabalho.

Isabel está vestida com um terno impecável, com um blazer de cor azul-marinho que realça sua postura majestosa. Sua roupa transmite autoridade e seriedade, refletindo seu papel como líder do conselho. Um broche de ouro em forma de fênix adorna seu colarinho, simbolizando renascimento e poder.

A sala ao redor de Isabel é aconchegante e acolhedora, apesar da atmosfera formal. Estantes repletas de livros se estendem pelas paredes, mostrando uma variedade de títulos e temas. Alguns livros estão cuidadosamente arrumados nas prateleiras, enquanto outros estão espalhados pelos três sofás reunidos em volta de uma mesa de centro. O ambiente transpira conhecimento e história, refletindo a mente curiosa e erudita de Isabel.

- O filho pródigo retorna. - a voz de Isabel soa animada, carregada de emoção enquanto ela se levanta rapidamente de sua cadeira. Ela se aproxima de Aeris com passos rápidos, os olhos brilhando com alegria.

Aeris não hesita em envolver sua mãe em um abraço caloroso, seus braços envolvendo-a com ternura e força ao mesmo tempo. O tempo parece congelar enquanto mãe e filho se abraçam, sentindo a falta um do outro após tantos anos de separação. Isabel luta contra as lágrimas que ameaçam brotar de seus olhos, contendo as emoções que transbordam dentro dela.

Quando finalmente se separam, Isabel segura os braços de Aeris, sentindo a musculatura firme sob suas mãos. Ela olha para cima, percebendo que seu filho cresceu e agora é mais alto do que ela, fazendo-a parecer pequena ao lado dele. Um riso nostálgico escapa de seus lábios, enquanto ela contempla o homem que Aeris se tornou, ainda vendo nele o mesmo sorriso gentil que ele tinha quando criança. - Você cresceu. – diz para si mesma, ainda segurando as lagrimas.

- Mas está uma bagunça total. - Isabel brinca ao passar a mão pelo cabelo longo de Aeris, depois parando para avaliar o rosto dele, agora com uma barba curta.

Aeris responde com um sorriso carinhoso, seus olhos azuis brilhando com afeto enquanto ele observa sua mãe.

- Eu pretendia me arrumar, mas não consegui resistir à vontade de ver minha mamis.

Isabel levanta uma sobrancelha ao observar as roupas desgastadas de Aeris.

— E essas roupas?

Ele trajava um sobretudo preto surrado, com um capuz em vez de gola, uma camisa branca por baixo adornada com um cinto de couro que sustentava a bainha de sua espada, oculta sob o casaco. Sua calça de lã marrom, embora já tivesse visto dias melhores, combinava com suas botas pretas manchadas de barro.

- Temos que dar um jeito nisso, mas antes! - Isabel puxa seu filho pelo braço, conduzindo-o até a cadeira onde estava sentada, já ocupada por uma pilha de documentos. Os sofás ao redor da mesa estavam repletos de livros e papéis.

Com um sorriso travesso, ela abre uma das gavetas e retira um kit de tesouras e navalhas, colocando-os sobre a mesa, cuidadosamente por cima dos documentos. Em seguida, dirige-se ao banheiro e volta com uma tigela de água fresca.

- Vamos cortar esse cabelo horroroso seu. - diz, num tom brincalhão, relembrando momentos semelhantes da infância de Aeris enquanto ela se prepara para começar o trabalho.

O silêncio paira no ambiente, sendo preenchido apenas pelo suave som das tesouras cortando os fios loiros de Aeris. Esse silêncio traz consigo uma atmosfera de nostalgia, misturada com uma certa apreensão que Isabel sente ao ouvir a pergunta que sabe que está por vir.

Aeris quebra o silêncio com sua fala:

- Não completei minha busca. - as tesouras param por um momento, como se a própria tensão no ar se refletisse no movimento. - Comecei minhas viagens em busca de informações sobre minha origem, mas acabei me deparando com coisas mais interessantes.

— Quais? – pergunta ainda com a mão que segurava a tesoura congelada e a outra se emaranhando nos fios loiros.

A fala de Aeris deixa um breve momento de suspense no ar, enquanto Isabel mantém a tesoura suspensa no ar, sua mão ainda. Sua expressão é uma mistura de curiosidade e apreensão, refletindo o interesse genuíno em ouvir o que seu filho tem a dizer, mas também uma certa ansiedade sobre o que ele descobriu em suas viagens.

- Pessoas. Culturas.

O sorriso tímido de Isabel floresce enquanto ela ouve atentamente as palavras de seu filho. Há uma faísca de orgulho em seus olhos ao perceber o amadurecimento e a profundidade das reflexões de Aeris. Sua pergunta final é carregada de expectativa, pois ela aguarda ansiosamente a resposta dele, como se estivesse torcendo para que ele tenha encontrado o que buscava.

- Entendi não buscava minha origem, mas sim estava tentando descobrir quem sou. – continuou Aeris.

- Descobriu?

Aeris solta uma risada curta, como se um peso tivesse sido retirado de seus ombros ao compartilhar aquelas palavras com sua mãe. Ele sente um certo alívio ao admitir sua incerteza.

- Não. - ele responde, mantendo ainda um sorriso nos lábios, como se estivesse refletindo sobre suas próprias palavras. - É estranho, mas uma coisa eu sei que sou devido a vocês duas.

Isabel inclina levemente a cabeça, um olhar de curiosidade e afeto em seus olhos.

- E o que seria? - ela pergunta suavemente, encorajando-o a compartilhar mais.

— Sou Aeris Aetheron, filho de Isabel e Natasha. As melhores mães que um homem poderia pedir.

Ele sentia a mão de sua mãe tremendo enquanto deslizava entre os fios de cabelo, mas ela se esforçava para manter a compostura enquanto esperava pela resposta de seu filho.

- Então não achou o que buscava? - ela pergunta, sua voz um pouco trêmula, mas cheia de preocupação e curiosidade.

- Pode-se dizer que sim. - ele responde, sua voz calma e ponderada. - Mas pode ter certeza que continuarei buscando. A vida é assim, não é?

Isabel envolve seu filho com um abraço por trás, seus braços se estendendo ao redor dos ombros largos dele. Aeris corresponde ao gesto, segurando o braço da mãe com ternura enquanto se entregam ao abraço reconfortante.

- Tinha essa mesma busca em meu coração. - responde Isabel com um sorriso suave, seus olhos marejados refletindo a profundidade de suas palavras. - Uma busca que só entendi quando vi seus pequenos olhos azuis. Tenho certeza de que você encontrará seu destino.

Ela continua cortando o cabelo dele, agora com uma expressão serena, enquanto Aeris a questiona em tom brincalhão sobre os olhos de sua irmã.

- E os olhos da minha irmã? Não sentiu medo ao ver que ela se tornaria uma pessoa sem coração? - provoca ele, arrancando uma risada de sua mãe.

Isabel sorri, mantendo o controle da tesoura com precisão enquanto escuta as aventuras de seu filho. O tempo passa, e a luz do sol pinta a sala com tons alaranjados enquanto eles compartilham histórias e memórias. Quando finalmente terminam, Aeris está com um novo corte de cabelo, mais jovial e refinado. O corte apresenta uma transição suave e impecável, refletindo a transformação gradual de seu interior. - Vejo que se aventurou ao monte. – fala com um certo orgulho ao ouvir as histórias de seu filho.

Seus olhos castanhos claros repousam sobre a espada, que repousava com imponência na mesa de centro entre os sofás. Cada detalhe dela era uma obra de arte: o cristal incrustado em seu pomo reluzia sob a luz do sol, enquanto os entalhes dourados em seu punho formavam padrões intricados de galhos entrelaçados. A guarda da espada, com seus detalhes em dourado, lembrava a delicadeza da natureza em sua mais pura forma. A lâmina, por sua vez, permanecia envolta em sua bainha de couro negro, adornada com entalhes tribais que ecoavam as tradições da tribo de sua esposa Natasha.

Ao perceber para onde os olhos de sua mãe se dirigiam, Aeris logo indaga:

- Um presente da tribo da mãe. Ou melhor dizendo, uma conquista. - ele corrige, retirando seu sobretudo e o colocando sobre o sofá.

Aeris arregaça a manga direita, exibindo com orgulho uma tatuagem tribal em seu antebraço. Os padrões intrincados da tatuagem contam a história de uma vitória em batalha, com símbolos que representam coragem e honra.

- Pretendia contar essa história quando a mãe estivesse presente, mas... - ele começa, mas é interrompido por Isabel.

- Vejo que meu querido filho bobo, se tornou mesmo um homem. Mas ainda não me contou o motivo de ter voltado. - ela complementa, pegando Aeris de surpresa.

- Bem, pelo mesmo motivo que estou vendo o dirigível da nação Soleria chegando. - ele aponta para a janela, onde um grande dirigível da família real se aproximava no horizonte. - E também pelos navios da frota de Atlantis.

- Alguns vieram para saber se vai ter guerra. E você, espera uma guerra?

— Estive em Solumia. Está ocorrendo uma guerra civil lá desde que o antigo rei faleceu, seus filhos disputam territórios. Alguns países adjacentes estão entrando na disputa, pois eles estão sendo forçados a escolher um lado. Não possuem mais a bandeira do antigo Rei da Terra.

- Está sendo uma época conturbada, mas o maior problema não é apenas eles. – ela diz ao puxar um documento sobre a mesa, olhando de canto para o mesmo.

- Eu sei. A Rainha Dragão. Pelo menos é assim que é chamada nas tabernas. Ela tem conquistado países adjacentes na guerra civil dos príncipes da terra, erguendo a bandeira seu Império, que ainda não sei o nome.

- Sagacia.

A voz rouca da Rainha do Fogo surpreende ambos, preenchendo a sala com uma aura de autoridade suave. Solara Ardorius entra na sala de Isabel com um sorriso calmo, seu olhar dourado refletindo a determinação de uma líder. Atrás dela, Lyra permanece parada perto da porta, sua postura exalando confiança e firmeza.

Lyra veste o uniforme preto e vermelho da família real, destacando-se com uma armadura de metal negro que abraça seu peito e ombros, projetada para resistir a qualquer desafio que ela possa enfrentar. Uma braçadeira adorna seu braço, deixando suas mãos livres para manipular o fogo à vontade. Suas botas, feitas do mesmo metal resistente, completam a aparência imponente da guerreira. Uma capa vermelha esvoaçante, presa em sua ombreira, acrescenta um toque de majestade ao seu traje.

A Rainha Solara, por sua vez, veste uma armadura semelhante, com pequenos detalhes dourados que adornam seu peitoral e ombros. Sua capa vermelha, iniciando-se em uma gola de pelagem branca, adiciona uma pitada de elegância à sua figura imponente. Em seu tecido vermelho, o brasão da Família Ardorius brilha com orgulho, representando a linhagem real e o legado de sua nação.

- Rainha Solara? – Isabel levanta surpresa. – Não recebemos nenhum aviso que a senhora estava a caminho.

- Não se preocupe minha querida. Vim apenas dar meus comprimentos, achei que encontraria Natasha por aqui, já que a recepcionista disse que estava com uma visita e estava conversando por horas. – solta uma risada de avó.

Solara repousa seus olhos cor de ouro sobre o jovem loiro, parado perto dos sofás. Seu olhar percorre as feições familiares, reconhecendo instantaneamente a tatuagem tribal no antebraço direito, uma marca que Natasha também carrega com orgulho. Os olhos azulados do jovem, como o céu em um dia claro, confirmam sua identidade antes mesmo que ele possa se apresentar.

- Aeris Aetheron, tivemos muitos relatos de suas aventuras em Soleria. Mesmo que usasse esse sobretudo, não conseguiria esconder suas habilidades na dobra do ar e na bondade de seus atos. – diz ao apontar para o sobretudo desgastado sob o sofá, perto da espada que chama a atenção da rainha.

- Obrigado senhora.

Solara deixa escapar uma risada calorosa, consciente do impacto que sua imponente armadura poderia causar. Por mais que fosse um símbolo de poder e tradição de sua nação, ela sabia como quebrar a rigidez com uma dose de humor. Observa discretamente Lyra recuar para o corredor, optando pela discrição, algo que Aeris não conseguiria fazer com tanta facilidade.

- Muito bem! Vejo que as senhoras vão conversar sobre algo que não posso ouvir, então irei me retirar. - Aeris argumenta enquanto recolhe sua espada e casaco.

- Te vejo em casa, filho - diz Isabel após receber um beijo na bochecha, enquanto Aeris assente com um sorriso e segue em direção ao corredor.

Solara se acomoda no sofá, agora livre de livros, e Isabel se senta na poltrona ao lado, pronta para discutir alguns assuntos antes da reunião do conselho. O ambiente, outrora animado com as histórias de Aeris, agora se transforma em um local de trabalho, onde as preocupações e responsabilidades da liderança tomam o centro das atenções.