Cenas Inéditas Feliko

Me conta um segredo?



Era mais um jantar em casa de Mamy Poderosa. Após a sobremesa, alguns continuaram bebendo um licor aqui, um conhaque ali...
Jonathan levou Jayminho para jogar videogame em seu quarto. Fabrício dividia o berço com Júnior no quarto de Pilar.
Félix e Niko ficaram em uma das salas conversando. E já que o Carneirinho ia mesmo dormir lá aquela noite, que mal tinha tomar um drink à mais...
– Só mais uma taça!
– Melhor não, Félix.
– Só mais um pouquinho, vai.
– Eu sou fraco pra bebida...
– Pode beber à vontade você está com Félix Khoury. Eu te protejo.
– Me protege do que?
– De você mesmo! Félix ria com a garrafa na mão. - É, eu cuido de você. Não vou deixar você subir nas mesas nem fazer strip tease.
– Mas e as crianças, Félix... melhor ir vê-las.
– Criatura, elas estão ótimas! Fabrício já deve estar no décimo sono e Jayminho entretido lá com o Jonathan.
– Eles se dão tão bem... o Jonathan é um ótimo rapaz.
– Puxou ao pai! Mas hein... me dá sua taça Niko, tou adorando ficar aqui com você conversando e tomando esse vinho maravilhoso... Bebe mais uma comigo?
– Ta bom... só mais uma então.
Félix serviu mais uma taça à Niko, percebendo que o Carneirinho já estava meio alto.
– Félix cuidado, se eu ficar bêbado posso te surpreender.
– Me surpreender? Adooroooo.
– Estou falando sério. Não quero dar vexame na sua casa. Eu sei que não posso beber muito.
– Criatura, você bêbado à ponto de dar vexame... é dificil acreditar...
– Justamente! Raramente bebo muito. Mas se eu beber...
Félix percebeu que, de fato, a bebida começava a fazer seu efeito em Niko, que ficava mais descontraído e menos tímido. Então decidiu arriscar uma pergunta, pois havia ficado intrigado:
– Niko, me conta um segredo então?
– Segredo?
– É. Me conta uma coisa sobre você que eu não saiba. Me surpreenda!
– Ah, Félix... eu não tenho segredos... Não me lembro de nada pra te contar.
Félix olhou para ele por alguns segundos. E insistiu.
– Carneirinho, eu aposto que você nunca foi dado à loucuras, então se aprontou alguma... pode ter sido porque tenha bebido mais da conta.
– Não... imagina Félix...nunca aprontei... nada...
– Niko, stop! Você mesmo acabou de dizer que se ficasse bêbado ia me surpreender.
– É mas...
– Sinal de que você já aprontou alguma porque bebeu demais!
– Tá Félix... mas é que...
– Então anda. Me conta! Eu duvido que você me surpreenda... no máximo você subiu em uma mesa de bar. Não, nem na mesa, você subiu em uma cadeira! E cantou uma música da Noviça Rebelde.
Félix começou a rir. Ao mesmo tempo que tentava arrancar algo de Niko, ele não acreditava que seria algo surpreendente. O Carneirinho, que parecia ser todo certinho desde sempre, não devia ter muitos segredos desse tipo à contar. Mas, se ele tivesse algum, Félix queria saber.
Niko se sentiu desafiado. Félix o estava provocando. Niko confessaria que nunca participou de noitadas de bebedeiras com amigos e, portanto, nunca aprontou nenhuma transgressão nem deu vexame por causa de álcool. Ou confessaria além da conta, além do que gostaria, afinal quem não tem um ou outro segredinho que não deseja compartilhar...
Com a bebida já fazendo efeito e Félix em sua frente repetindo que ele era certinho demais, e nada que dissesse iria espantar qualquer pessoa, Niko tomou um gole grande do vinho em sua taça e disparou:
– Uma vez eu fiquei bêbado em uma festa e transei com um cara que nem vi o rosto direito, nem o nome eu soube e nunca mais o vi.
Por essa Félix não esperava. Ele parou de rir e arregalou os olhos. Niko prosseguiu:
– De manhã acordei com uma ressaca horrível, ainda tonto sabe, de tanta bebida. Conforme o efeito foi passando eu fui esquecendo de tudo. Esse cara podia passar na minha frente hoje e falar comigo eu não o reconheceria.
Enquanto ouvia o Carneirinho, Félix colocou sua taça de vinho na mesinha e levou a mão ao rosto, parecia assustado. Niko concluiu fazendo uma revelação bombástica:
– Tomei todas e transei com esse desconhecido... assim foi minha primeira vez.
Félix não se conteve e explodiu em uma sonora gargalhada, provavelmente foi escutado pelas outras pessoas nos outros cômodos da casa.
– Você está rindo, Félix?
– Ai Niko... não sabia que você tinha esse talento pra contar piada! Isso sim, me surpreendeu.
– Não é piada, é verdade.
– Tá bom...
– Eu falei que sou fraco pra bebida.
– Pelos véus de Salomé, criatura, você acha que eu vou acreditar nisso? Niko, você tem todo o jeitinho de quem queria perder a virgindade com um namoradinho, em uma noite especial com champagne e à luz de velas!
– Mas foi especial. Quem disse que não foi?
– Especial? Com um estranho?
– Bom... é que... foi bom. Alias, foi muito bom.
– Como assim bom? Foi... foi melhor do que... melhor do que comigo? Se é que foi verdade!
– Bem... tinha algo especial nesse homem, confesso. Foi isso que não me deixou resistir e, quando dei por mim, já estávamos...
– Chega, Niko, chega! Não fala mais nada... sinceramente...
Naquele momento, enquanto Félix parecia incomodado, se remexendo no sofá alisando a sobrancelha com o dedo mínimo, foi Niko quem soltou uma gostosa gargalhada.
– Está com ciúmes Félix? Então você não duvida que isso aconteceu, você acreditou.
– Não senhor! E duvido sim. É mais fácil acreditar que eu namorei várias meninas na escola!
– Você namorou?
– Niko! Claro que não, criatura!
– Sei lá Félix...
– Sinceramente Carneirinho, eu te peço pra me contar um segredo, algo bombástico do seu passado, qualquer coisa... uma transgressão ou um mico que você pagou devido ao excesso de álcool... precisava inventar uma história cabeluda dessas?
– Bom Félix... eu não inventei...
– Time out! Time out! Pode parar. Eu devo ter pichado o Muro das Lamentações, viu... porque a culpa foi minha. Onde já se viu imaginar que você teria algo desse tipo pra contar...
– Bem...
– Carneirinho, você é daqueles que nunca aprontaram nada.
– Na verdade...
– Na verdade você deve ter, no máximo, pisado na grama algumas vezes. Estava la escrito "proibido pisar na grama" e você pisou, essa deve ter sido sua maior e única transgressão na vida.
– Sabe Félix...
– Sei. Sei sim! Se, por um acaso, algum dia você tomou todas em alguma ocasião deve ter é passado mal... ou ferrado no sono. Nicolas Corona aprontando... só rindo mesmo... há, há, há!
Niko desistiu de tentar fazer Félix acreditar na história que ele contava. Félix parecia duvidar totalmente ou, quem sabe, não queria mesmo ouvir. Fosse uma coisa ou outra, Niko apenas sorriu candidamente, abaixou a cabeça e decidiu acatar o que Félix dizia, terminando ali qualquer polêmica sobre ele ter ou não bebido à tal ponto.
– É Félix... você está certo.
– Mas a piada foi boa, viu? Como é mesmo? Você encheu a cara e perdeu a virgindade com um desconhecido. Ok... tá bom..
Ainda rindo, Félix levantou do sofá, deu a mão pro Carneirinho e o chamou para subir. Já era tarde. Foram se certificar de que os meninos dormiam bem e rumaram para o quarto de Félix, onde passariam a noite. A conversa continuou lá.
– Carneirinho, não quer me contar sobre a sua primeira vez? Mas sem viagens, criatura! Quero a mais pura verdade.
– Um dia Félix... um dia eu te conto...nós vamos até lá e eu te conto, ta?
– Até lá onde?
– É que não foi aqui na capital, nem na minha cidade... foi em outro lugar. Nós vamos até lá e eu te conto tudo, pode ser?
– Claro Carneirinho, como você quiser...
– Foi realmente ...digamos... diferente. E eu quero que você saiba.
– Tá bom. Mas só digo uma coisa. Já não gosto desse homem, seja lá quem for.
– Que homem?
– Esse homem, que foi seu primeiro... eu já estou com ciúmes dele...
– Não seja bobo, Félix...
– Tenho ciúmes, sim. Pronto falei.
– Mas não precisa. Vou te provar.
– Vai é? Posso saber como, senhor Corona?
– Tranca a porta, senhor Khoury. Tranca a porta, deita nessa cama e verás! Aproveita que ainda estou sob efeito de todo esse vinho que o senhor me fez beber...
– Adooorooo!
Félix trancou a porta do seu quarto e a cena terminou.