Os dois resolveram praticar esporte. Fazer uma atividade física, outra qualquer que não fosse dentro do quarto. A ideia partiu de Niko. Um dia, sentados à beira da piscina e usando somente sungas de banho, tiveram uma conversa definitiva sobre o assunto.

– Preciso entrar em forma, Félix. - Niko dizia enquanto apertava a própria barriga.

– Você já está em forma, Carneirinho.

– Jura? Você acha?

– Sim. Em forma de bola, uma bola de forma bem redonda.

Félix riu, abraçou e beijou Niko, repetindo que era "brincadeirinha", como sempre fazia depois que o provocava com piadas desse tipo. Mas, até por causa de piadas desse tipo, o Carneirinho se convenceu que precisava, realmente, praticar uma atividade física regular. E não somente ele.

– Félix, uma academia até que ia te fazer bem.

– Sim, com certeza. Se você fosse para uma academia malhar, ia me fazer um bem enorme!

– Olha aqui, parou tá? Estou falando do senhor, não de mim. Eu não falo por causa de beleza ou aparência, falo de saúde. Outro dia você perdeu o fôlego correndo atrás do Fabricio na areia, um dia você vai perder o fôlego quando estiver... estiver me... eu estiver... enfim... você entendeu.

Félix ouvia calado. Se há uma coisa que ele não é, é burro. Félix não é burro nem bobo. O que Niko falava fazia todo sentido. O Carneirinho continuou:

– A idade está chegando e você nunca praticou nenhuma atividade física, Félix! Ao contrário de mim. Eu já tive sim um corpo bem sarado, como o daquele lá... aquele de asas. E antes que você faça qualquer outra piada - Niko se aproximou de Félix e o segurou pela cintura apertando bem as laterais - Isso aqui tem nome e se chama pneu. Não sou o único dono de borracharia aqui em casa. Pronto falei!

Niko se afastou e mergulhou na água, deixando o companheiro pensativo. Agora era Félix quem apertava a própria barriga. Discretamente ele apalpou os braços e as coxas. Niko o observava sorrindo e piscou. Bastou isso e Félix decidiu que o esforço valeria a pena. Ele mergulhou e foi até onde o Carneirinho estava.

– Vamos os dois malhar. Deal?

– Deal.

– Vamos começar agora lá no quarto?

– Félix... você não tem jeito.

– Olha, falando sério agora. Vou ficar todo dolorido, moído, com minhas canelas em chamas, mas... pelas contas do Rosário, nós vamos entrar em forma!

Daí que, pouco tempo depois, entraram na rotina de praticar esporte. Três vezes por semana, após a saída das crianças para a escola, e a chegada da enfermeira de César, eles se encaminhavam para um clube perto de casa, cerca de dez minutos de distância.

Eles iam e voltavam de carro. Devido à proximidade, Niko sempre sugeria que fossem pedalando. Félix se arrepiava com a ideia..

– Nós vamos pedalando até aquele clube? OK! Aí chegamos lá e fazemos caminhada, jogamos, malhamos, pulamos... Daí então você chama uma ambulância, tá? Pra me trazer de volta...

Então iam de carro mesmo, levando as bicicletas no bagageiro. Algumas vezes Niko insistia e ele, mesmo sozinho, ia pedalando. Quando era assim, Félix o seguia de carro.

Um dia, depois de uma caminhada na trilha e uma partida de tênis...

– Você que disse que uma academia ia me fazer bem! Porque interrompeu o jogo, Carneirinho?

– Eu disse, e está te fazendo muito bem. Mas o sol está quente, acho melhor você sair dessa quadra.

– Sei... Niko, você não engana ninguem! Você está com ciúmes do professor.

– Félix, você pensa que eu não vejo a meneira como ele sorri que nem bobo quando te ensina a pegar na raquete? Se eu não marcar em cima, qualquer dia, ao invés de raquete, ele vai querer que você pegue em outra coisa...

– Tá Niko, tá. Mas também não precisa... enfim... é...

Félix tentava se fingir de brabo mas no fundo adorava que Niko ficasse tão ciumento . Ele também morria de ciúmes do salva-vidas da piscina que, segundo ele, olhava mais do que devia para o traseiro de Niko. Félix repetia mil vezes que tinham piscina em casa e que Niko não precisava fazer natação no clube.

Mas o sol estava realmente quente e já era hora de retornar à casa.

– É... Niko, vamos embora?

– Eu vou pedalando...

– Pedalando? Já chega Niko. Já jogamos tênis, já fizemos caminhada, Agora vamos embora de carro e no ar condicionado!

– Não. Não vou. Não quero ninguem mais me chamando de gordo

– Aff

– Vai você no seu ar-condicionado, eu ainda tenho um pneu de caminhão, sabe... pra eliminar.

– Para com isso criatura! Está nervoso ainda por causa do professor saradão., né?

Niko deixou Félix rindo, deu de ombros e foi pegar a bicicleta. Menos de dois minutos depois, ele voltou até onde Félix estava já com todo o equipamento de tênis guardado, pronto para ir embora.

– Tchau Félix. A gente se vê em casa.

– Você vai insistir nisso?

– Vou.

– Você vai mesmo de bicicleta?

– Vou Félix!

– Tá bom. Carneiro genioso! Olha, quando você empaca... não tem jeito. Então tá, eu vou seguindo você de carro

– Não precisa

– Precisa sim.

– Eu sei me cuidar.

– Sabe não.

– Sei sim. Eu sei distinguir quando uma rua é perigosa ou nao

– Não sabe

– Sei distinguir quando um carro vem na minha direção ou não...

– Não Niko... você não sabe...

– Sei distinguir quando...

– Chega Niko! Eu vou te seguindo e ponto final! Eu vim te seguindo, vou embora te seguindo.

– Tá bom, só não vai bater o carro.

– Eu? Bater o carro... há há há!

– Pensa que eu não percebi, no caminho até aqui você quase saiu da estrada duas vezes.

– Mas claro! Como dirigir olhando você nessa bicicleta. na minha frente de bunda pra cima? Enfim... sinceramente Niko, isso tira a minha atenção, pelas conta do Rosário!

– Melhor eu ir de carro então. Vou colocar a bicicleta no bagageiro.

– Não senhor, agora sou eu quem quer que você vá pedalando.

– Félix...

– Vai, vai pedalando e eu vou te olhando. Você vai ficar todo suado... quando a gente chegar em casa... já sabe. Estou até sem ar já...

– Félix...

– Anda Niko, anda... agora eu tenho pressa... Até porque... vamos falar a verdade? Eu não tenho talento nenhum para jogar tênis, mas lá na nossa cama, eu mando bem com as bolas, confessa.

– FÉ...

Antes que Niko dissesse qualquer coisa, Félix o agarrou e o beijou ali mesmo. Claro que eles perceberam que o professor de tênis estava olhando, bem como o salva-vidas da piscina. Para que ninguém tivesse mais nenhuma dúvida, o beijo foi profundo e demorado. Niko deixou a bicicleta cair no chão e só aí eles pararam.

– Vai meu carneirinho. Monta nessa bike logo, porque tem coisa mehor pra você montar quando chegar em casa.

– Você vem atrás de mim de carro?

– Sempre, Niko. Sempre atrás de você tomando conta.

E voltaram pra casa.

Fim da cena.--