Carta para você

Um Pedido Inesperado


— Foi por muito pouco!! – Jen dizia com alívio enquanto tirava a peruca e os saltos.

Eu ria da cara dela. Aliás, por todo o caminho eu soltava piadas sobre o lugar em que ela havia nos escondido.

— Será que você pode parar de ficar me olhando assim? Eu já disse que não fazia ideia que naquela casa tinha desse tipo de quarto também!! – Ela respondeu zangada, mas o vermelho em suas bochechas ainda não era de raiva.

— Eu ainda acho que você sabia sim. – Passei por ela e sussurrei em seu ouvido.

— Você é a pessoa com a mente mais poluída que eu conheço, Jethro!! É incapaz de tirar a sua cabeça de dentro de um quarto! – Ela falou marchando para a cozinha.

Gargalhei alto da reação exagerada dela. Como se eu fosse único aqui que passava o dia no quarto...

— Como se você nunca quis entrar em um quarto daqueles... – testei o autocontrole dela.

Ela me lançou um olhar raivoso. E, para a minha sorte, eu estava muito longe dela e ela estava sem seus saltos... ou eu receberia um daqueles sapatos de sola vermelha e saltos finos no meio da testa.

— Fale mais uma vez sobre isso, Jethro, e você irá passar o restante dessa missão tomando banho frio e bem longe de mim. Eu consigo me controlar, mas você não!! – Ela me deu uma olhada bem sugestiva quando disse isso!

Resolvi não arriscar, eu sabia muito bem que ela poderia cumprir esse tipo de promessa, na Sérvia ela tinha dito exatamente isso e eu acabei por dormir mais de duas semanas no sofá...

Ela ainda me encarava... e como já sabia me ler como poucos, notou que tinha ganhado a briga.

— Está ficando esperto, Jethro. Já sabe quem é a grande ganhadora, não é? – Seu sorriso vitorioso era imenso em seu rosto. E essa foi a minha vez de deixá-la sozinha, rindo da minha cara.

—---------------------------

Eu adorava virar a mesa contra Jethro. Enquanto ele me enchia a paciência sobre o local que tinha escolhido para nos esconder, eu não tive tantos argumentos... ainda mais quando eu conseguia ficar completamente perdida em seu sorriso, não que ele soubesse disso.

Mas, depois de um tempo, essa brincadeira foi cansando. E me perturbando em um nível absurdo... até que tive uma ideia...

Ele não me deixaria em paz? Ótimo. Resolvi atacá-lo onde ele sentiria mais.... se na Sérvia ele já havia reclamado da distância, imagina se eu o ameaçasse de ficar longe de mim pelo tempo em que essa missão durasse?

Como eu previ, ele não arriscou. Ainda bem, pois seria praticamente impossível de que eu conseguisse ficar longe dele também, mas o recado estava dado. E ele foi recebido muito atentamente.

Quando Jethro viu que tinha perdido mais uma vez para mim, ele fez o que faz costumeiramente, me deixou falando sozinha. Quanta maturidade... não que eu não tivesse feito o mesmo... Mas o drama de um ex-Marine é muito mais engraçado de se ver do que o meu!

Ainda estava rindo da cara dele, quando notei dois envelopes jogados no meio da sala. Certamente que a senhoria deve ter saído distribuindo a correspondência... e como eram dois envelopes idênticos, isso só tinha uma tradução.

Kelly resolveu dar notícias depois de mais de um mês sem falar nada.

Bem... alguém agora sairia da toca.

— Jethro.... temos correspondência... e você sabe muito bem de quem é!! – Disse feliz.

Não demorou trinta segundos e ele estava do meu lado, pegando a carta que lhe era endereçada.

—-----------------------

Alexandria, 15 de dezembro de 1998.

Carta 14

Oi pai!!!!

Olha só quem está viva!! Ou pelo menos virou uma zumbi!! Isso mesmo, euzinha aqui!

Eu juro, juro de coração que tentei escrever há mais tempo, mas desde que eu voltei de Londres e liguei para vocês, parece que eu só pude focar na escola. É trabalho, é ensaio, é prova, é data pra isso, para aquilo... os professores endoidaram de vez e acham que eu sou uma máquina que não como, não durmo, não tenho que tirar um tempo para dar notícias para o meu paizinho lindo que está do outro lado do mundo...

Tudo bem que vocês, sim os dois, vou colocar a Jen nessa roda também, nem se dignaram a me mandar um bilhetinho... nem uma nota dizendo: “Estamos vivos, Kelly. Tome aqui uma foto da Torre Eiffel!!” Saiba que essa que vos escreve é ansiosa pra caramba e também precisa de notícias...

Bem, depois do momento desabafo, eu não sei mais o que dizer... às vezes eu nem acredito que o ano está acabando. Que o Natal e o Ano Novo estão batendo na porta e pedindo para entrar, parece que passou tão rápido! Mas tem horas que me pego pensando que não... que está arrastando... que o senhor se foi no início do ano, para uma missão que pode durar até dois anos, e até agora só se passaram onze meses... que eu posso te ver só daqui a um ano... e isso me dói.

Eu estou com saudades, e essa é a verdade. Muita.

Eu achei que a ida à Londres iria diminuir um pouquinho a saudade, mas não... parece que piorou... e, se antes, eu só sentia falta do senhor, agora eu sinto falta da Jen também.

Legal né? Um pelo preço de dois! Olha a minha sorte!

Ou talvez não tenha a ver com sorte, deve ser a época do ano. Depois do Feriado de Ação de Graças, (que eu passei em Stillwater com o vovô, para constar. E também, conheci um dos seus amigos de infância, um tal de Ed, ele é Xerife por lá, e cá entre nós, eu o odiei de verdade..., não entendi as piadinhas que ele soltou, mas tenho quase certeza que diz respeito ao senhor e à mamãe, eu quis muito retrucar e falar algo que o deixaria sem graça, mas acabei ficando quieta, preferi não ser presa. Eu achei que era todo mundo gente boa, por lá... mas agora entendo porque nem o senhor, nem mamãe quiseram voltar para lá!!); Mas voltando, desde que os dias começaram a ficar ainda mais frios e curtos... o inverno é daqui a poucos dias, e as festas também... e eu vou passar sem o senhor pela primeira vez, eu tenho pensado mais nisso, em passar sozinha... e é ruim, viu?

Eu sei que dizer sozinha é um exagero, porque vovô Jack ligou e diz que, se eu quiser, ele vem para cá. Eu tenho convite para almoçar no dia 25 na casa do Henry, mas não vai ser a mesma coisa de ter o senhor aqui... e eu nem sei se quero para a casa do Henry... acho que é muito cedo para conhecer a família inteira dele! Ainda mais que ele não faz a menor ideia de como o senhor é... só acho que, quando eu for conhecer a família dele, ele tem que conhecer a minha também...

Eu só sei que às vezes o mundo é injusto....

Será que não rola uma passagem de última hora para Paris, para passar o Natal e o Ano-Novo com vocês não? Sabe, o Papai Noel poderia considerar isso, afinal, eu fui uma boa garota durante todo o ano de 1998!!

Se a ideia for boa e isso acontecer... podem me ligar, eu pego meu passaporte e já tô correndo para o aeroporto! Agora, se não rolar, não tem problema... um dia eu conheço Paris e o senhor vai arcar com o valor das compras que eu vou fazer!! (Essa sou eu usando as minhas táticas de intimidação!!)

Agora, falando sério de verdade, pai. Fora a saudade que está muita, eu estou te escrevendo para te desejar um Feliz Natal, um ótimo 1999 (olha que legal, é o último ano do século e do milênio!!! O senhor imaginou viver isso? É muito louco pensar em tudo o que aconteceu em cem anos!!), e que eu estarei aqui, esperando pelas notícias, pelas suas cartas e, principalmente, estarei no aeroporto quando o senhor voltar, para poder te dar um abraço de urso e contar tudo o que eu esqueci de contar, ou que não dá para falar por carta!!

Joyeux Noel et Bonne Année!

Essa sou eu escrevendo em francês! Só não me peça para falar porque eu não faço a menor ideia de como se pronuncia isso!!!

Te vejo em 1.999, pai!!

Te amo.

Kelly.

(Ia fazer a despedida em francês também, para provar que eu estou apta para te fazer uma visita por aí, mas desisti. Vamos manter o inglês mesmo!!)

—-------------------------

Jen mal havia acabado de falar e eu já estava abrindo a carta de Kelly. Na verdade, eu esperava que ela contasse um monte de notícias, mas ela só disse que estava com saudades. Maldita época do ano que sempre a deixa emotiva demais. E eu, daqui não poderia fazer mais nada. A não ser...

— Jenny... – Eu interrompi a leitura dela.

— Sim? – Ela me olhou espantada.

— Deu muito trabalho levar a Kelly até Londres?

— Você quer trazê-la para Paris? Para passar o final do ano com a ... você? – Ela disse, abrindo um sorriso. Eu fingi não notar que ela queria dizer “com a gente”.

— Ela me pediu... – Deixei no ar.

— Tem algo mais além desse pedido, Jethro?

Eu não disse que ela já conseguia me ler muito bem.

— Kelly sempre fica estranha no final do ano, sempre.

— Ela sente falta da mãe, Jethro. Compreensível, não é?

Concordei com a cabeça, Shannon fazia falta nessa época do ano, ela sempre gostou do Natal e de todo esse clima de festa.

— E então, deu trabalho? – Perguntei.

— A passagem foi o mais difícil. Mas como eu tenho um conhecido em uma companhia aérea, pode não ser tanto problema assim... – Ela disse, sua cabeça já bolando uma ideia. – Quer que eu ligue para as pessoas que podem colocá-la em um avião ainda hoje?

— Hoje não... ela ainda está me aula. Provas de final de semestre, mas dia 22 quem sabe.

— Isso é daqui a quatro dias, Jethro! Está em cima da hora de qualquer jeito, mas eu vou ver o que consigo fazer... mas primeiro, eu vou terminar a carta dela!

— Como quiser, Madame.

— Eu já te falei que odeio ser chamada de Madame?? – Ela ralhou.

— Não, mas agora que eu sei, eu não vou me esquecer disso.

— Não, Jethro, agora que você sabe, você só vai me chamar assim!

— Bem, essa é uma forma de me lembrar também...

— Céus!! - Ela bufou e voltou a sua atenção para a carta.

—------------------------

Alexandria, 15 de dezembro de 1998.

Carta 07

Oi Jenny!!!!

Eu sei, eu sei, eu sei... tem quase um século que eu não escrevo, que não dou notícias, nem nada.

Mas a escola não está deixando! E olha que eu achei que esse ano seria mais fácil! Estão acabando comigo!! Sério! Eu não tenho tempo para mais nada a não ser todo o cronograma de trabalhos e apresentações. Eu juro, se eu sobreviver a esse ano, eu sobrevivo a qualquer coisa.

Mas, e então? E vocês, como estão?? Tá tudo indo bem por aí? Nada de ruim aconteceu, né? Você sabe que eu só pergunto para você porque papai não me conta toda a verdade mesmo... E porque VOCÊS DOIS PARARAM DE MANDAR NOTÍCIAS!!!!

Sim, eu estou gritando... não me mandaram nem um post it, um pombo correio, um sinal de fumaça direto de Paris para me informar que estão vivos...

Eu já te disse que eu sofro de ansiedade?? Pois é... eu sofro sim e se continuar assim essa vai ser a causa da minha morte!!

E não comece a rir, eu faço drama sim. E muito!! Você já deveria estar acostumada com isso, com papai quase já não cola mais... mas eu atiro para tudo é quanto é lado para ver se acerto em alguém..

Bem... depois de botar para fora toda a minha frustração com a nossa recente falta de troca de cartas eu vou te contar uma, mas você vai ter que me prometer que vai ficar quietinha, que não vai expressar nenhuma reação perto do meu pai – e eu sei que ele está aí perto de você, porque vocês dois não se desgrudam...

Pronta para a bomba? O rosto está composto em uma perfeita máscara de rainha do pôquer?

Então respire fundo e vamos lá...

EU CONHECI A MINHA SOGRA!!!!!!

SÉRIO!

Eu nem esperava conhecê-la tão cedo. Na verdade, eu nem esperava conhecê-la e ponto final. Acontece que estávamos voltando do cinema, em plena tarde de domingo, praticamente do lado de fora do shopping, quando, BANG! Olha ela ali... eu até hoje não consegui processar o que aconteceu direito. Eu não sei se ela estava atrás do Henry, ou se foi só coincidência mesmo. Mas como eu sei que coincidências não existem graças à bendita regra 39...

Juro, eu nem consegui articular uma palavra coerente. Por quê? Você deve estar se perguntado.

1º - Eu fui pega de surpresa, então eu fiquei nervosa, e quando eu fico MUITO nervosa, eu travo, geral....

2º - Eu não sabia que o Henry era de uma família tão rica. E muito menos que o pai dele é um Congressista. Sim, a família dele TODA é de políticos!! E o lindo não se dignou a me informar isso...

Agora você consegue imaginar o meu desespero quando eu vi aquela mulher, toda trabalhada na elegância, com seus DOIS seguranças, vindo na minha direção? Eu nem tinha roupa para essa ocasião!!!

A única coisa que eu me lembro, depois da pagação de mico geral, foi que ela me convidou para passar o dia 25 de dezembro com toda a família. Ela disse que me achou muito linda e educada e que eu deveria ser apresentada para toda a família o quanto antes...

Eu não sei se eu viajei na maionese, ou essa mulher está achando que nós dois vamos nos casar?? Ou ela acha que eu estou grávida?? Por que a pressa em me apresentar para a família inteira??

E é por conta disso que eu fiz um pedido inusitado para o papai. Certo, eu não quero passar o Natal sem ele, e sem você, é lógico, mas eu também não quero nem pensar em por os pés na casa do Henry...

Sim, eu nunca fui lá... e nem quero ir... Vai ser muito estranho eu ser apresentada para um bando de gente rica e fina, bem no dia de Natal, enquanto o meu pai só sabe o nome do meu namorado (e, eu tenho certeza, deve odiá-lo com todas as forças!!)

Por isso, Jen, eu te peço, faça uma mágica por aí, e tente me colocar em qualquer avião que parta o mais rápido para a França... não me interessa, eu viajo até no trem de pouso... eu só não consigo me imaginar nessa situação de conhecer os pais do meu namorado...

Pelo menos não ainda... quem sabe depois dos vinte anos, né??

ME AJUDA, PELO AMOR DE DEUS!!!

E, caso não tenha jeito, caso vocês dois estejam realmente incomunicáveis, que não possam receber uma visitinha, eu te desejo um excelente 1999. Apesar de que eu tenho certeza que não irei te ver mais, pois eu vou morrer de vergonha na manhã de Natal...

Feliz Natal, Jen!!! E ótimo último ano do milênio!!

Beijos,

Kelly (aquela que está dando um chilique atrás do outro nesse final de ano!!)

P.S.: Eu preciso de outra ajuda, se eu não tiver escapatória, o que eu dou de presente de Natal para a família do Henry?? O que se dá para um bando de gente que tem de tudo??? Eu te juro, não vou ter estômago para fazer isso não....

P.S.2: Eu devia ter seguido o conselho do papai e só ter começado a namorar depois dos 30 anos!! (Mas não diga isso a ele!!)

—-----------------------------

E aqui vamos nós.... como não reagir a essa carta? Como não rir ou se desesperar com as palavras de Kelly?

Praticamente impossível... e eu juro, eu tentei, tentei o máximo não rir, sorrir ou me mexer, pois, como Kelly havia previsto, Jethro estava realmente perto de mim.

Aliás, essa garota é muito mais observadora do que eu poderia contar... ela percebeu que há algo entre nós dois.... Isso está ficando cada dia mais enrolado.

Estava terminando a carta, segurando o riso o quanto pude, até que...

— O que Kelly aprontou agora? – a voz de Jethro, bem do meu lado me pegou de surpresa e eu abaixei a folha de papel para o meu colo.

Estava pronta para dizer nada, mas não teve jeito.

— Ela está apavorada. – Afirmei e ele arregalou os olhos.

— Posso saber o motivo? – Podia jurar que Jethro já estava fazendo as contas sobre a diferença de idade entre ele e um possível neto.

— Ela conheceu a sogra, Jethro. Você se lembra de quando conheceu a sua primeira sogra?? Pois eu me lembro... ela era uma megera.... feia feito a peste...

— Kelly foi até a casa do namorado dela?!

Deveria ter ficado de boca fechada, se eu soubesse que ele iria destorcer as minhas palavras.

— Não, tropeçou com a sogra, no meio do shopping. Estava saindo do cinema com Henry quando os três trombaram... lugar legal de se conhecer a sogra, não é?

Jethro apenas me olhava torto. Ele sabia que tinha mais coisa.

— E? Ela disse mais alguma coisa?

— Sim... e eu acho muito bom você ficar sentado enquanto eu conto essa...

E lá estava a expressão de quem era novo demais para ser avô.

— A família do Henry é toda de políticos. Inclusive o pai dele é um congressista....

— POLITÍCO? A KELLY ESTÁ NAMORANDO UM FILHO DE UM POLÍTCO?? Ela sabe que eu odeio política em todas as suas formas...

— Na defesa dela, ela não sabia do parentesco, muito menos desse detalhe... – Disse, tentando livrar a barra dela.

— O que eu fiz para merecer isso? – Jethro perguntou para ninguém em particular.

— Bem....

— Tem mais?

— Sim... ela acha que ainda está muito cedo para ser apresentada à família de Henry, e me implorou para trazê-la para passar as festas aqui em Paris... Está disposto a ajudá-la a não passar um dia inteiro ao lado da sogra?

Jethro respirou fundo... e eu agradeci aos céus por Kelly estar tão longe dele...

— Eu tenho alternativa?

— Ter, até tem... mas eu sei que você não quer deixá-la lá, sozinha, em Alexandria, seu coração derretido aí, também quer que ela venha...

— Ligue para seus conhecidos, eu vou ligar para a Kelly. – foi o que ele falou. Eu nem esperei que ele saísse da sala, estava dependurada com o pessoal que poderia me arranjar estas passagens em um piscar de olhos.

—-------------------------

Eu estou oficialmente ferrada... tem cinco dias que eu mandei as cartas pedindo pelo amor de Deus que um dos dois tivesse a bondade de me ajudar, se não escapar de Alexandria, pelo menos me ajudar a escolher um presente para um monte de gente rica pra caramba.

Sim, eu andei vendo a árvore genealógica do meu namorado, bem como as notícias sobre a família dele na internet...

E eles são ricos. São poderosos. São tudo o que meu pai detesta...

Eu tô ferrada ao quadrado.

E nem Mer e nem Maddie parecem se importar com isso. Dizem que eu tirei a sorte grande... Ele é lindo, rico e gosta de mim.

E se o meu pai já o odiava só pelo fato dele ser o meu namorado, qual será o tamanho do ódio hoje, que ele sabe que ele é filho de congressista?

Papai deveria ter me mandado para um convento quando teve a chance, assim, nada disso estaria acontecendo e eu estaria aprendendo teologia ao invés de balancear equações químicas (que eu até agora não entendi para que serve e eu tenho prova dentro de dois dias! DOIS!!)

Meu anjo da guarda só pode ter tirado férias... daquelas bem longas!

Dei uma olhada ao redor para ver se eu achava o meu resumo de química quando notei meu celular se acendendo. Tinha deixado aquela coisinha no modo silencioso para evitar de ficar escutando as mensagens de Henry chegar.

Sim, estamos oficialmente brigados. Tudo culpa dele que deveria ter me contado sobre a família dele... tem certas notícias que devem ser dadas de maneira lenta e gradual, não arremessadas como uma bomba atômica!!

Corri para ver o que era... um número completamente desconhecido, com um código de área mais doido que o meu professor de química que fica batendo a cabeça na porta enquanto a gente luta para fazer a tarefa...

Quase não atendi. Vai saber se não é um maluco qualquer ou uma criança que resolveu brincar com o telefone dos pais e discou os números do meu celular ao acaso...

Mas... talvez, só talvez, o meu anjo da guarda não estava de férias e poderia ser....

— Se for o meu pai, pode falar, sou toda ouvidos. Se não for, acabou de ligar errado... – atendi na pressa.

— Acho que devo ficar na linha então.... – Ouvi a voz de papai e sai correndo pelo quarto, feliz da vida!!

— Me diga que vai salvar a minha vida!! Por favor!! – Cada palavra foi acompanhada com o devido pulinho.

— Posso saber o motivo de tamanho desespero? – Ele me perguntou, cortando o clima.

Droga... eu fiz o pedido, mas não tinha contado o motivo.

— Bem... é... – Comecei a enrolar.

— Kelly Gibbs, a senhorita vai me contar o motivo de querer vir passar o final de ano aqui comigo. E saudades não vale... conheço as suas táticas.

— Minha sogra... a família de Henry... – Falei pausadamente, esperando a tempestade que não veio...

E, para a minha total surpresa, ele caiu na gargalhada. Meu pai, Leroy Jethro Gibbs, estava rindo da minha cara...

— Pai.... – Falei com um muxoxo.

E nada dele parar.

— PAI!!! – Gritei. Estava nervosa com esse ataque dele, até que ouvi uma voz.

— Jethro pode parar de rir da cara da sua filha!! Até parece que você se deu bem com as suas sogras!!! – Jen começou a me defender.

— Eu não mandei que ela namorasse agora, Jen. A sogra faz parte do pacote.... – Ele ainda ria...

— Pai.... – Chamei de novo. – Qual é o motivo da ligação.... – Estava começando a achar que ele já sabia o motivo, só testou a minha sinceridade...

— O que você me pediu? – Ele disse depois de um suspense de matar qualquer ansioso...

— Para ir para Paris.... passar o Natal e a Virada do Ano com você.

— E que não se importava de viajar nem no trem de pouso... – A voz de Jenny era divertida.

— Não riem do meu desespero... é a sogra!!! A culpa é da minha sogra... ou até mesmo do Henry que se esqueceu de comentar comigo quem era a família dele!! – Me defendi.

Mas não adiantou, eles riram ainda mais.

— Grande apoio esse de vocês... – falei com tristeza. – Grande apoio...

Jenny ria quando começou a falar:

— Ouvi dizer que você foi uma boa garota durante esse ano. Seu pai discorda disso, porém...

— Agradeça a não sei quem que a Jenny conhece, dia 22 você pega o direto para Paris, às vinte e três horas, Kelly.

— Meu Deus!! Alguém coloca esse ser desconhecido e sem nome em um pedestal... – Eu gritei e comecei a olhar em volta, procurando pela minha mala desaparecida...

— Melhor não... é um ex meu. E ele me trocou pela professora de literatura... mas, me devia um monte de favor, inclusive o fato de que eu salvei a pele dele quando ele roubou o gabarito oficial da prova de final de semestre... – Jenny disse.

— Tudo bem, esquece o agradecimento. Dia 22 eu vou estar aí. E você tem que me contar como foi que você acabou namorando um cara desses!

— Não, dia 23 bem cedo. – Papai me corrigiu.

— Dia 23 então. E vocês me livraram de uma enrascada sem precedentes! – Eu agradeci.

— Só para constar, dessa vez você vai abrir a boca sobre esse seu namoro, Kelly. – Papai me alertou. E dessa vez eu sabia, era sério.

— Tudo bem... a gente conversa sobre isso.

— Ah, sim. Vamos conversar.

— De novo, muito obrigada!! Vou acabar de estudar uma matéria aqui e dar uma adiantada na arrumação da mala. Eu amo muito vocês dois!!! Amo mesmo!!!

— Kelly, você está falando pelos cotovelos... seja mais coerente, por favor.

— Ok, pai. Sendo coerente, eu estou completamente aliviada de não ser obrigada a ir para a casa de um congressista no dia de Natal!! Vocês salvaram a minha pele. Era isso que queria ouvir, Marine?

— Bem melhor, agora.

— Ah, pelo amor de Deus, Jethro!! Pare com isso!! – ouvi Jen chiar ao fundo. – Ela já te adora, não precisa ficar dizendo isso aos quatro ventos!!

Eu ri com o que ela disse. Só Jenny Shepard diria algo assim e sairia viva!

— E Kelly, - ouvi a ruiva gritar. – Te espero no aeroporto. E não se preocupe com A conversa, eu dou um jeito no seu pai!

— Obrigada... mas acho que essa eu mereço. Vejo vocês em três dias!!

— Até lá, Kells.

— Até pai. Até Jen!!

E ele desligou. Aqueles dois tinham acabado de salvar a minha vida!! Eu amo um casal e não é pouco não!!