Carta para você

Tem Certeza de Que Ele não é Filho do Tony?


— Bom dia, Pestinha! Vamos acordando! – Foi assim que Tony chamou Sophie.

— Não é assim que se acorda uma criança, Tony! Por favor! – Falei. – Ainda mais uma criança com o pé quebrado!

— Creio que esse não será o nosso maior desafio hoje! – Ele me respondeu e me olhou sugestivamente.

— O que você quer dizer? – Não tinha entendido em que ponto ele queria chegar.

— Você passou a noite aqui e dentro do meu quarto, e ela viu! – Ele apontou para a ruivinha que ressonava alto. - Aquilo foi um ronco? - Perguntou alarmado.

Sim, tinha sido um ronco!

— Bem... desconfiada ela já estava. Agora...

— Agora temos que falar com o Chefe, oficialmente.

— É, temos. E com a Diretora. Sei que não é contra a política do NCIS, mas é sempre bom avisar. – Comentei e dei um beijo nele.

— Eu vi isso! – Sophie disse atrás de nós.

— Você não estava dormindo, Pestinha? – Tony fingiu brigar com ela.

— Querem privacidade, vão para outro lugar. – Ela se sentou toda descabelada no colchão, já que ela tinha dormido na sala.

— É o meu apartamento! – Tony chegou perto dela e a ajudou a se levantar.

— E eu sou uma visita bem chata! – Ela retrucou.

— Coloca chata nisso! – Ele brincou. – Vai lá tomar um banho que a sua muda de roupa já está separada. E cuidado para não molhar esse gesso, tem um saquinho e algumas gominhas para você colocar em volta, igual você fez ontem à noite! – Alertou.

Sim, Sophie tinha uma malinha de emergência na casa de cada um. Ideia de Abby para o caso de algo acontecer com um dos pais e termos que ficar de olho nela pela noite. Até a última noite, nunca tínhamos usado o kit reserva, mas veio a calhar, já que tinha além dos objetos de higiene, um pijama, pantufas, um bichinho de pelúcia e algumas peças de roupa, bem como as roupas de baixo e meias.

— Já tô indo! E não vou molhar o gesso! E a propósito, bom dia para vocês dois, pombinhos! – Ela sorriu e correu do jeito que conseguia, para o banheiro para se esconder de Tony.

Enquanto Sophie estava cantarolando no banho, fomos fazer o café.

— Será que o Chefe não ficou muito bravo por termos sequestrado a filha dele por uma noite, não? – Tony perguntou preocupado.

— Se tivesse ficado, teria ligado para levá-la ou teria vindo buscá-la, além do mais, ele já está acostumado com o fato de ela dormir na casa de um de nós de vez em quando. Acho que não ligou, mas não estará com a cara boa, porque vamos chegar atrasados e ela nem ligou para dar boa noite!

— Se você está dizendo, Zee-Vah! – Ele me abraçou.

— A única coisa que me preocupa é... – Escutei o chuveiro ser desligado. – Pedimos ou não para ela não contar nada?

— Ela sabe que não pode falar nada, mas não custa lembrar. – Ele disse e pôs na bancada uma pilha de panquecas com gotas de chocolate.

— Acho que ela comeu chocolate demais nas últimas catorze horas. – Apontei.

— Vamos rezar para que a enxaqueca não ataque, então... ou o Chefe vai cortar as nossas cabeças. – Tony brincou e ouvimos Sophie vir pulando até a cozinha. Ela parou na frente da bancada, escalou o banquinho e ao ver o que tinha para comer apenas disse:

— Isso aqui é o meu suborno para ficar calada? – Ela tinha um sorriso travesso no rosto.

— Você precisa de suborno, Pingo de Gente? – Me sentei do lado dela e peguei uma panqueca.

— Não, não preciso, só gosto de pensar que as pessoas fazem algumas coisas pensando em mim. – Ela deu de ombros e comeu um pedaço. – E podem ficar tranquilos, eu não vou contar nada para ninguém.

— Já sabíamos disso, Pestinha. – Tony passou atrás dela e se sentou do meu lado. – Agora, saiba que eu fiz essas panquecas pensando em você! – Ele piscou para ela.

Sophie abriu um sorriso enorme.

— Verdade verdadeira?

— Sim, Peste Ruiva! Eu geralmente não faço o café da manhã!

E a Pequena deslizou do banco e foi mancando para abraçá-lo, genuinamente feliz pela atenção.

— Muito obrigada, Tony!! – Ela deu um beijo no rosto dele.

Ao ver a cena eu tentei imaginar Tony mimando a própria filha. E consegui ver direitinho.

— Ei! – Protestei. – Eu também ajudei!

E Sophie se virou para mim e me deu um beijo e um abraço.

— Feliz, minha Amada Ninja? – Tony brincou chutando a minha perna.

— Agora estou. – Beijei o alto da cabeça de Sophie e a empurrei para que continuasse com o café da manhã.

Comemos com Tony e Sophie falando dos próximos lançamentos no cinema, que eles ainda não tinham tido tempo de ir ver.

— Então... qual vai ser? Harry Potter e a Orem da Fênix, Ratatouille ou Shrek Terceiro? – Tony perguntou.

— Não sei... – Ela respondeu em dúvida. – Tia Ziva, você escolhe dessa vez!

— Eu?!

— Sim, afinal, todas as outras vezes você assistiu aos que escolhemos, você nunca escolheu por si mesma. – Ela disse séria.

— Tudo bem... mas eu posso pensar? – Perguntei aflita.

— Claro, Zee-vah, ninguém aqui vai te ameaçar para escolher logo, e não vamos no cinema antes da próxima semana, não é, Peste Ruiva?

Sophie concordou com a cabeça.

— Claro. Eu vou escolher com carinho. – Falei, me sentindo tremendamente responsável pela diversão da família.

Depois dessa incumbência acabamos nosso café e rumamos para o Estaleiro, afinal, tinha mais de doze horas que um certo casal não via ou ouvia sobre a filha...

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Quando saímos do “interrogatório” do Comandante Skinner, percebemos duas coisas, o prédio já estava praticamente vazio e nossa filha tinha sumido.

— Talvez na sua sala. – Jethro me disse.

Me deu calafrios de pensar onde ela estaria deitada... eu ia precisar mandar higienizar o sofá o mais rápido possível...

Fui para a minha sala e Jethro para a mesa dele pegar seus pertences. Nem cheguei no meio do caminho e ele me chamou.

— Jen, mistério resolvido. A Ruiva está com a equipe, saíram para comer uma pizza e vão fazer uma sessão de cinema no apartamento do Tony.

— Você acha, Jethro, que eles estavam na sala de observação?

Ele deu de ombros.

— Talvez, mas não acho que eles tenham deixado Sophie assistir alguma coisa.

— Assim espero, não quero ter que me explicar para ela, não por enquanto. – Respirei fundo e continuei meu caminho até a minha sala para pegar minhas coisas e ir para casa. Ainda bem que este dia tinha terminado bem.

Assim que abri a porta encarei o sofá, e como eu previa, não seria nada bom para a minha concentração ficar olhando para aquele ponto em específico da minha sala. Sacudi a cabeça, tentando entender onde eu estava com a cabeça quando deixei aquilo acontecer...

Desliguei meu computador e notei que em cima da minha mesa tinha um bilhetinho de Sophie.

“Mamãe,

O pessoal me levou para comer pizza, se sair antes das 20:00 horas, venha também, vamos ao lugar de sempre. Depois vamos ver um filme na casa do Tony. Se nenhum de vocês aparecerem, vou dormir por lá.

Tenham uma boa-noite e dê um beijo no papai por mim.

Amo vocês!

xoxo

Sophie”

Pelo menos ela teve a consideração de me avisar. Por um breve momento imaginei Sophie dali a alguns anos, com seus 15 ou 16, saindo de casa e deixando só uma mensagem no celular dizendo que iria dormir na casa de uma amiga, ou que ia sair com o namorado...

Não, ela só tem sete anos, nada de namoro, nada de sair escondida de casa. Não é assim que eu a estou criando.

— Jen?! – Jethro me chamou me assustando.

— Ahn.. oi. Só pegando as minhas coisas. – Voltei ao presente.

— O que tem aí? – Claro que a curiosidade falaria mais alto.

— Um bilhetinho de Sophie. – Só por precaução, conferi a hora. Era tarde demais, já passava das dez horas.

Jethro veio para perto de mim e leu o que a filha tinha escrito.

— Acho que perdemos a companhia dela por essa noite. – Ele disse.

— Você acha, Jethro? Porque eu tenho certeza.

— Não vai fazer mal algum a casa só para nós dois, nem que seja por uma noite. – Ele falou e foi me conduzindo para a saída.

— Talvez não vá. – Tive que sorrir ao lançar um olhar para o meu sofá.

E a noite foi tudo o que ele havia prometido, muito melhor do que acontecera na tarde dentro do meu escritório. Era muito bom esquecer as responsabilidades de vez em quando.

Acontece que mesmo depois de toda a atenção que eu recebi e dei também, tinha uma vozinha na minha cabeça que me dizia que faltava algo. Estava deitada com a cabeça no ombro de Jethro e desenhando coisas sem sentido no seu peito quando uma sensação de vazio me atingiu. Ele, que acariciava as minhas costas, logo percebeu a minha mudança de humor.

— O que foi Jen? – Perguntou contra o meu cabelo.

— Nada. – Falei. Era uma coisa boba, estava toda sentimental porque eu não tinha conversado com a minha filha em aproximadamente doze horas.

— Não estou te vendo, mas sei que está mentindo. – Me disse calmamente.

Respirei fundo e fui me deitar no meu travesseiro, de costas para ele.

— Jen, o que foi? – Tentar manter distância de Jethro, mesmo quando se está em uma cama king size, era impossível e ele logo me abraçou pela cintura e tentou me acalmar.

— Não é nada... eu só estou preocupada com a Sophie.

— Ela está bem. Na verdade, eu me preocuparia com Tony e Ziva.

Tentei me concentrar no fato de que ela tinha Tony e Ziva ao lado dela, mas não era isso o que me incomodava.

— Não é só o fato de ela estar longe que te incomoda. – Jethro falou e se apoiou no cotovelo para me observar.

Me virei na sua direção e resolvi ser sincera.

— Não. Eu sei que ela está segura, o que está me comendo por dentro é que... – Céus como era difícil expressar isso em voz alta, parecia tão bobo!

— É que...

— Tem mais de doze horas que eu não falo com ela, Jethro. Eu não me despedi dela no Estaleiro e, também, não dei boa noite, ela, nem sequer, me ligou, e isso me aborrece. É bobo eu sei. É só que eu fiz uma promessa e sinto que a estou quebrando agora.

Para a minha total vergonha, ele riu.

— Não é para rir. É bobo, mas é a verdade. – Disse e ia dando as costas quando ele me impediu.

— Estou rindo porque eu sinto a mesma coisa, Jen. Eu sei onde e como Sophie deve estar, mas eu não posso ter essa certeza sobre Kelly. Ela mal ligou ou mandou um e-mail desde que embarcou.

Kelly era outra que estava me deixando preocupada.

— Recebi só um e-mail de Kelly. Sei que Soph enviou uma carta para ela, mas a resposta ainda não chegou. – Comentei.

— Se demorar mais, é bem capaz da Cabeça Quente começar a se preocupar também. E voltando a falar nela, que promessa você fez? Posso saber?

— Foi no Cairo, eu prometi a mim mesma que, se eu saísse daquele lugar viva e pudesse ver a minha filha de novo, eu jamais iria passar um dia sem dizer que eu a amava ou iria deixar de abraçá-la apertado para ter certeza de que eu tive essa segunda chance. Sei que essa promessa tem data de validade, que Sophie vai virar uma adolescente e não vai querer essas demonstrações de carinho, mas enquanto eu a tiver do meu lado, eu vou saber que ela está bem...

— E hoje você não fez nenhuma das duas coisas.

— Teoricamente foi ontem, e sim, eu não fiz. E estou sentindo falta.

Jethro me puxou novamente para a posição que eu estava antes que essa conversa começasse.

— Ela está bem, Jen. E amanhã vai querer te contar tudo o que aconteceu e você não viu.

Nos contar, Jethro. Não se esqueça disso. Ela jamais te deixaria de fora desse relato.

Ele deu uma risada.

— Admita, você adora a forma como ela conta as coisas.

— É claro que eu gosto. Na verdade, gosto mais das reações e das expressões que ela faz do que da falação em si. Às vezes ela me lembra você, Jen, outras ela me lembra a Kelly. E tem aquelas reações que são tão típicas dela e tão inusitadas que sempre me pegam de surpresa.

Parei para pensar no que será que Sophie se parecia comigo?

— Comigo? Nunca percebi. Com Kelly e até com você já reparei as semelhanças. Mas nunca comigo.

— Porque você não se olha no espelho quando fala sobre algo de que gosta. Vocês duas abrem o mesmo sorriso e ficam com o mesmo brilho no olhar, isso sem falar no sorriso de quem vai aprontar algo, ou quando me supera, nessas horas ela é realmente a sua miniatura. – Ele falou. – E isso me preocupa, como eu não tenho nenhum parâmetro de quando você era adolescente, Jen, tenho medo do que me aguarda daqui a alguns anos.

Quis brincar com a preocupação dele.

— Eu era terrível. Vivia chegando além do horário do toque de recolher e saía escondida no meio da noite... sem contar o namorado que eu esgueirei pela janela do quarto.

Foi nesse momento em que Jethro ficou tenso. Ele podia aguentar a quebra do toque de recolher, sair escondida, mas não a história do namorado.

— E o Coronel deixou ele vivo? – Perguntou praticamente engasgado.

Comecei a rir. Muito. E Jethro não entendeu.

— E você dizendo que sabia quando eu mentia! – Ri ainda mais. – Não fiz nada disso, Jethro. Morei muito pouco tempo e em muitos lugares para poder ter amizades que me fizessem fazer isso. Vontade não faltou, mas sempre respeitei o meu pai... não que ele merecesse isso, sabendo do que seu agora, mas fui criada para respeitá-lo e assim o fiz.

Ele relaxou na mesma hora.

— Você me promete que a Sophie não vai fazer nada disso?

— Depende, eu tinha vontade, nunca fiz, e você? Foi muito rebelde?

E ele ficou calado.

— Vou considerar isso como um sim. - Bem, Jethro... temos um problema... – Dei um tapinha no peito dele... já podemos começar a pensar em um método para que ela não saia de casa escondida...

— Ah... Sophie! Vai me deixar de cabelo branco antes da hora. – Ele murmurou.

Eu quis dizer que era culpa do DNA dele, mas não era a hora.

— Ou não... talvez ela seja tranquila igual a Kelly, vai saber? – Tentei acalmá-lo.

Não fui muito bem sucedida, mas pelo menos ele começou a se apegar nos prós dela ser igual a Kelly no comportamento. Não sei por quanto tempo ele murmurou esse pedido, pois acabei dormindo pouco depois.

Acordei ainda mais assustada depois de sonhar com Sophie, nada de ruim, somente um sonho bobo. E somado ao fato de que hoje eu não teria que praticamente içá-la da cama para que ela pudesse se levantar, fez com que a minha manhã fosse um tanto diferente.

Como sempre, Jethro conseguiu se levantar, se arrumar e eu ainda estava escolhendo a minha roupa. Ah, as facilidades de ser homem e puder repetir roupas com mais frequência do que nós mulheres, assim, quando entrei na cozinha, ele já estava tomando café e lendo o jornal.

— Espero que seja a parte de esportes. – Murmurei quando o vi escondido atrás da folha. – À propósito, bom dia!

— Dia, Jen. – Ele murmurou e empurrou a parte de política na minha direção.

— Conseguiu dormir? – Perguntei só para puxar conversa, enquanto eu passava um olho pelas notícias. Nada de interessante e só dor de cabeça.

Jethro abaixou o jornal e me encarou.

— Só estou sendo educada.

— Não... está tentando preencher o silêncio.

Dei de ombros, era verdade, e voltei a ler o jornal, ou melhor, vi a parte de palavras cruzadas e procurei por uma caneta para fazê-las, e todo esse silêncio, Jethro lendo a sessão de esportes, e eu fazendo as palavras cruzadas me remeteu aos nossos primeiros dias em Marselha. Hora mais do que estranha para se ter um deja vú.

Devo ter ficado muito perdida em meus próprios pensamentos que acabei me esquecendo da hora, foi Jethro quem me trouxe de volta ao presente.

— Não quer ir trabalhar hoje, Madame Diretora? – Me perguntou, de pé ao meu lado, já pronto e com a chave do carro na mão.

— Se eu pudesse, ficava em casa. Mas não posso me dar a esse luxo, Agente Gibbs. – Respondi e joguei o restante do meu café frio na pia, lavando a xícara.

Acabei de me arrumar e logo estávamos a caminho do Estaleiro. A cada segundo, verificava o meu celular, e nenhuma notícia da minha filha.

Como ela pode ter se esquecido assim de mim e tão rápido?

Tentei acessar os meus e-mails, e nada de notícias de Kelly também.

Suspirei frustrada e disse a mim mesma que era melhor eu começar a me preparar psicologicamente para o futuro, pois seria exatamente assim.

Já dentro do elevador, Jethro acionou a parada de emergência e me encarou:

— Posso saber o motivo por trás de tanto silêncio da sua parte, Jen? Você, normalmente, é aquela que fala entre nós dois!

— O motivo não mudou, é o mesmo da nossa conversa da madrugada, Jethro.

Ele colocou as duas mãos nos meus ombros e me fez olhar em sua direção.

— Jen, eu mudo o meu nome se na hora que esse elevador chegar no terceiro andar, Sophie não vier correndo na nossa direção, querendo contar tudo o que aconteceu na noite de ontem, querendo dar detalhes do filme que ela viu e, qualquer outra fofoca que ela tenha escutado. Você pode não ter notado, mas o carro de Tony já estava no estacionamento, o que significa que ela e toda a equipe já estão aqui, então se prepare para recebê-la. Porque ela sentiu tanta falta de você quanto você dela. Vai por mim, eu vi de perto como ela fica quando não fala com você.

— Ainda duvido disso! – Murmurei enquanto o elevador voltava à vida.

As portas nem tinham se aberto direito quando escutei:

— MAMÃE! MAMÃE! PAPAI! PAPAI!! Vocês estão atrasados!! – E uma espoleta ruiva se chocou contra as nossas pernas.

Abri um sorriso e Jethro tinha aquele sorriso convencido nos lábios, como me dizendo: “não te disse que ela faria exatamente isso?”

Desviei minha atenção para a minha filha e me abaixei para abraçá-la.

— Por que a senhora não me ligou ontem? Trabalhou até que horas? Uma da manhã? Eu senti saudades, mamãe! – Ela demandou de uma única vez.

— Sim, eu trabalhei até tarde. E quando tive um tempinho, você, com certeza, já estava dormindo.

Sophie deu um passo para trás e encarou o pai.

— Era para o senhor tomar conta da mamãe e não deixar que ela trabalhasse até tarde! Pelo visto eu tenho que fazer tudo nessa família!

— Minha culpa, Ruiva. Isso não vai mais acontecer. – Jethro disse ao levantá-la no colo.

— Isso é um pedido de desculpas, papai?

Nessa hora, notei que tanto Ziva quanto Tony estavam prestando mais do que atenção no que se desenrolava ali. E vi que os dois estavam ainda mais próximos. Pelo visto, todo o planejamento de Sophie tinha dado resultado e o casal tinha se assumido de vez.

— Não Sophie, isso sou eu prometendo que vou tomar conta da sua mãe.

Sophie não estava lá muito convencida, mas aceitou a palavra do pai.

— Tudo bem... ah! Tem um grupo de escoteiros no prédio hoje! – Ela disse animada.

Tony soltou uma gargalhada. E olhamos na direção dele, Ziva só deu uma cotovelada nas costelas dele para que ele parasse.

— E posso saber o motivo dessas caras? – Perguntei quando chegamos perto dos dois. Sophie, Tony e Ziva, trocaram um olhar.

— É que... – Sophie começou.

Ziva reprimiu uma risada.

— McEscoteiro está vestido à caráter.

— Como é?

— Sim, mamãe... Tim está com o uniforme dos escoteiros.

— Ele disse qualquer coisa sobre você ter dado autorização, Diretora. – Ziva completou.

— Sim, eu dei autorização para que McGee trouxesse um grupo de escoteiros, mas nunca imaginei que ele viria com o uniforme.

— Pois ele está. – Tony não conseguia esconder o deboche.

— Ele ficou fofinho!! – Sophie o defendeu.

— Peste Ruiva, você está sempre defendendo as escolhas de roupas do McSemNoçãoDeModa.

— Mas Tony... O Lorde Elfo do Halloween... a gravata de abacaxis.... o uniforme dos escoteiros... você tem que admitir, ficaram melhores no Tim do que ficariam em você!

E agora eu queria ver DiNozzo sair dessa.

— Eu jamais usaria aquilo! – Ele disse ofendido.

— Mas usou a camisa rosa. E o Tim te encheu a paciência do mesmo jeito.

— Mas ele jamais seria o McRosado.

— Assim como você jamais seria um Escoteiro. – Ela retrucou vitoriosa.

Ziva deu uma risada.

— Tony, admita, essa você perdeu.

— Ah! Peste Ruiva! Eu não te deixo mais dormir no meu sofá! – Ele ameaçou de brincadeira.

Sophie estava prestes a soltar uma pérola, quando Abby veio correndo, dizendo que tínhamos um problema.

— Qual problema, Abbs? – Jethro perguntou.

— Um dos escoteiros que está com o McGee. Eu fui mostrar para a turminha como a Senhora AFIS funcionava e... bem... o garotinho, Carson Matthews, ele está na lista de crianças desaparecidas, desde 1998. – Ela nos estendeu o papel. – Diz que ele foi sequestrado pelo próprio pai.

— Onde estão as crianças?

— Todas no meu laboratório, Jenny. Eu disse que o programa estava com defeito que tinha que conversar com a Diretora para poder chamar uma pessoa para arrumar.

— Claro, fez bem. Vamos mandar as crianças de volta para casa. Carson fica até que investigamos se isso está certo ou não.

— Claro, eu vou falar com o McGee. – Ela deu um rodopio e voltou para o laboratório.

Jethro colocou Ziva e Tony para trabalharem e eu levei Sophie comigo até a minha sala.

— Vamos ter duas crianças dentro do Estaleiro hoje? – Ouvi Ziva perguntar.

— Quero só ver como a Peste Ruiva vai se comportar, ciumenta como ela é... – Tony comentou.

E eu queria saber quem era a verdadeira criança ali.

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Desde o momento em que eu coloquei meus olhos em Carson eu vi uma familiar coincidência, apesar de Gibbs achar que coincidências não existem, era impossível de não se notar.

O garoto tinha o mesmo olhar que Tony tem quando quer saber algo... e Abby experimentou isso em primeira mão quando ela, sem pensar, comentou sobre suas tatuagens.

Depois, ao investigar a casa dele, nos demos conta que.... bem, eu me dei conta de que se Tony tivesse um filho, seria daquele jeito o quarto dele. Com pôsteres de filmes clássicos – para mim eram só filmes velhos mesmo! – revistas masculinas escondidas embaixo da cama e a maior comparação.

— Tony! Olhe! – Apontei para a cama.

— Meu Deus!! É a Ferrari do Magnum! Será que eles fazem dessas em tamanho maior? – Ele perguntou em êxtase, olhando para a cama.

— E isso não te lembra ninguém? – Perguntei, apontando para o quarto como um todo.

Tony girou pelo quarto, olhou os pôsteres, as revistas, a cama – ficou quase dois minutos babando na cama.

— Então?

— Não... quem ele me lembraria?

E como eu quis dar um tapa na cabeça dele!

Voltamos para o estaleiro e a mãe de Carson, a Tenente Taylor, nos pediu que levássemos uma mochila com o que ele fosse precisar, assim que chegamos, entregamos a mochila e o garoto veio comentando.

— Ela mandou os biscoitos... hoje é a noite do terror, nós sempre comemos biscoitos e vemos filmes às sextas. – Ele disse tirando o filme da mochila e mostrando o DVD Portátil que a mãe tinha colocado ali.

— Então você e a sua mãe têm esse ritual? – Tony perguntou.

— Sim. – Carson não estava mais tão animado. – Mas pelo visto hoje não vamos ver. Tony... onde eu vou ficar?

— Bem, sempre têm outras sextas-feiras... – DiNozzo desconversou.

— É... sempre têm. – Carson desviou sua atenção para Gibbs que vinha descendo as escadas.

— DiNozzo, David, quero vocês no parque, procurando pelo pai do Carson. Você, amigo, vem comigo.

Logo atrás, desciam Jenny e Sophie, esta última olhava desconfiada para o garoto que seguia ao lado de Gibbs.

— Agente Gibbs. Meu pai não fez nada de errado. – Carson disse, quando os dois chegaram perto do elevador.

— Eu só quero conversar com ele. Agora, você vai me fazer um favor. Vai se comportar perto daquelas duas ali. – Ele apontou para Jenny e Sophie que estavam paradas um pouco mais atrás.

— E elas são?

Jenny deu um passo à frente e se apresentou.

— Sou Jenny e esta é a Sophie.

— Eu vou ficar em uma casa onde só tem mulheres?! – O garoto disse animado.

Eu segurei a risada. Gibbs deu um tapinha de leve na cabeça de Carson e Sophie olhou dele para DiNozzo e repetiu a olhada.

— Ela é minha filha. – Gibbs avisou.

— Sim, senhor. Mas será que podemos ver o filme que eu ia ver com a minha mãe hoje? Ele tá aqui. E eu tenho até biscoitos! – Carson se empolgou e Jenny só concordou e se encaminhou para o elevador. Era uma noite chuvosa de sexta-feira e ninguém tinha nada para fazer.

Antes que o Pingo de Gente entrasse no elevador atrás da mãe, Gibbs só disse:

— De olho nele para mim, hein, Ruiva?

— No filho do Tony? Fácil! É só dar muita comida, colocar um filme e depois começar a falar a respeito de Magnum P.I. que em um instante fica quieto.

Eu e McGee rimos alto. Gibbs deu um beijo no alto da cabeça da filha e Tony, muito injuriado, falou:

— Ele não é meu filho, Peste Ruiva.

— Então é o seu clone, Tony! – Ela soltou antes que as portas se fechassem.

Eu e Tony fomos atrás do pai de Carson, enquanto Gibbs e McGee estavam rastreando seus passos dentro do MTAC.

Nossa busca levou a noite inteira e não achamos nada... ou alguém estava nos enganando ou tinha algo errado nesse caso!

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Tinha algo de muito estranho nesse tal de Carson. E não era o fato de que a digital dele tinha aparecido no sistema...

Ele era parecido com o Tony.

Parecido até demais.

E só o avoado no Meu Italiano de Araque Preferido não tinha notado isso! Como? Eu não sei. Mas todas as evidências estavam ali. Desde a paixão por filmes até a forma como ele olhou estranho para todo mundo, do mesmo jeito que o Tony olha para a Tia Ziva.

E agora ele ia passar a noite lá em casa. O papai tinha entrado no escritório da mamãe carregando uma pasta. Dizendo que era para ela assinar aquela papelada urgente que ele ia transferir a custódia do Carson para a Assistência Social.

Era uma sexta-feira à noite, chuvosa pra caramba. Não ia ter ninguém trabalhando lá. Papai sabia disso, mamãe também e até eu, que não trabalho ainda, sei. Então mamãe parou e simplesmente disse.

— Eu fico com ele por essa noite, Jethro. Não tem ninguém trabalhando nesse horário. E eu ouvi dizer que a mãe dele mandou até uma mochila com as coisas dele.

Papai deu aquele sorriso de lado que a gente sabe muito bem que ele ouviu o que queria. Enquanto mamãe pegou a papelada e viu que não era nada de troca de custódia.

— Esses papéis não são sobre troca de custódia, Agente Gibbs.

E aí vinha a bagunça, mamãe chamou o papai de Agente Gibbs.

— Devo ter trocado as pastas, Madame Diretora. – Ele disse e piscou na minha direção. Mamãe não gostou disso.

Papai estava mentindo. Do mesmo jeito que mamãe jamais troca um horário de reunião, papai não troca as pastas. O plano dele era deixar o tal do Carson com alguém em que ele confiava e que pudesse tomar conta dele.

E a única pessoa no prédio que tem outra criança em casa é?

Sim, a Diretora. A minha mãe!

Assim, eu fui colocada na conversa.

— Sophie, teremos um hóspede em casa nesta noite, por favor, comporte-se.

Como se eu fosse bagunceira...

— Sim, mamãe. – Eu tive que responder, pois tanto ela quanto papai esperavam por isso.

— E nada de ficar falando sobre os nossos empregos. Carson é curioso e a senhorita adora contar tudo, mas não hoje.

— Tudo bem, papai.

— E nada de dar ataque de ciúmes. – Os dois falaram sérios.

Eu não tinha nada para falar, a não ser balançar a cabeça. Eu tinha dado um ataque de ciúme, só um! E toda vez que tem algo importante sou lembrada disso. Mundo injusto.

Depois dessa, mamãe juntou os pertences dela e nós fomos esperar por Carson na sala do esquadrão. Ele estava com Tony e a Tia Ziva, e parecia infeliz.

Papai parou para conversar com ele perto dos elevadores e quando informou que ele ficaria hospedado lá em casa, ele fez a mesma cara do Tony. Achei estranho no rosto dele, mas ele logo mudou perguntando se poderíamos ver um filme, e ainda completou que tinha uma fornada de biscoitos na mochila.

Eu gosto de filmes e achei uma boa ideia, mamãe concordou e nós entramos no elevador, papai foi conosco até o carro e disse que voltaria para o Estaleiro para tentar finalizar o caso até de manhã.

Carson falou por todo o caminho. Todo o caminho, nem parou para respirar.... e mamãe só concordava com ele, tinha coisa que ele falava que, se fosse eu, ela jamais teria concordado, porém, eu acho que ela estava sendo legal com ele, por conta de toda a situação envolvendo o pai dele.

Assim que chegamos em casa, Noemi se espantou com o convidado inesperado, mas garantiu que o jantar estava pronto e seria o suficiente. Mamãe nos mandou tomar banho, subi para o meu quarto e fiz o que ela falou. Eu sei que eu demoro para tomar banho, mas quando eu desci, a nossa sala de TV tinha virado um enorme cinema, e mamãe disse que assistiria a um filme com Carson e que eu poderia me juntar a eles, logo depois de jantar. E foi o que fizemos, e eu ainda ajudei a Noemi com a cozinha, secando as vasilhas, enquanto mamãe fazia a pipoca.

Voltamos para a sala e Carson já tinha preparado o filme no DVD. Ele deu o play sem nem ao menos dizer qual filme era.

Eu não fiquei na sala por cinco minutos. Como mamãe havia me alertado, eu tinha que ser bem educada, então pedi licença, peguei meu balde de pipoca e corri para o meu quarto.

Carson tinha colocado um filme de terror! DE TERROR!!!

Eu acho que vou ficar sem dormir por um mês! Como alguém gosta de ver aquilo? É medonho. Eu fecho meus olhos e vejo a imagem. Credo.

Me sentei no meu assento de janela e resolvi ler um livro, desejando que fosse o Tony lá embaixo, para que eu pudesse estar vendo qualquer outro filme, como Onze Homens e Um Segredo...

Pensei em quanto tempo um filme de terror durava, não devia ser muito maior do que As Crônicas de Nárnia, mas, mesmo assim, eu não me atrevi a descer, vai que o filme não tinha acabado e eu chegava em uma hora muito apavorante...

Acho que dormi enquanto lia, pois caí do meu assento quando faróis iluminaram a rua e minha janela. Pelo lugar onde parou, só podia ser meu pai!

Desci correndo e o vi entrando, mamãe o olhava espantada.

— Jethro. Já resolveu o caso? – Ela perguntou.

— Não, Carson me ligou.

Desci um pouquinho os degraus e parei na viradinha da escada, vendo o que os dois estavam fazendo.

Agora Carson estava no estúdio da minha mãe e ouvia jazz.

Jazz?! Eu nem sabia que a minha mãe tinha CD de jazz. Mas eu já tinha escutado aquela música no carro do Tony. Lá doeu minha cabeça, aqui também.

Cheguei perto de mamãe que estava na porta do estúdio e parei ali.

Ela me deu um chutinho na canela para chamar a minha atenção, olhei para ela.

— Ficou com muito medo do filme, é? – Ouvi Carson me perguntar quando me viu.

Papai olhou para mim e mamãe também, mas ela sorria.

— Eu não gosto de filme de terror. – Falei a verdade.

— Covarde. – Ele falou.

Eu que não ia discutir com uma pessoa que gosta de filme de terror, então eu só dei boa-noite para todo mundo e ia voltando para o meu quarto, quando mamãe me parou, colocando uma mão no meu ombro.

— Vai ficar duas noites sem me dar um abraço e um beijo?

Com toda essa confusão eu tinha me esquecido que passei a última noite na casa do Tony.

Fiz o que ela me pediu e quando ela deu um passo para trás, perguntei:

— Mamãe, tem certeza de que ele não é filho do Tony?

Mamãe deu uma risada, não muito alta para não chamar a atenção dos dois que estavam no estúdio dela.

— Tenho Sophie, ele não é filho do Tony. Só tem os mesmos gostos que ele.

— Isso é muito bizarro! – Comentei.

Escutamos movimento no estúdio e ouvimos Carson reclamar que ainda era cedo para se deitar. Ele queria ver um programa qualquer na televisão.

Papai não deixou e saiu do cômodo carregando uma caneca, pelo jeito, eu perdi o chocolate quente da noite.

Dei boa noite para ele também, do mesmo jeito que fiz com mamãe, e na mesma hora escutamos um barulho.

Era só o Carson que tinha pegado no sono da poltrona e caído no chão. Papai o levou no colo até o quarto de hóspedes e depois se despediu de mim, voltando para o Estaleiro.

Mamãe me pôs na cama, mas mesmo depois que ela apagou as luzes eu fiquei pensando:

— Se coincidências não existem, como é que uma criança pode ser tão parecida com um adulto sendo que eles não são parentes?

Eu não achei nenhuma resposta, aliás, só achei mais uma pergunta:

— Será que eu tinha um clone por aí?

Que medo!!

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Eu poderia ter declarado que apesar de ter um hóspede em casa, a noite correu bem.

Até certo ponto, sim. Carson dormiu a noite inteira, só acordando quando sentiu o cheiro dos waffles que fiz.

Enquanto nossa visita tinha descansado e já estava falando pelos cotovelos logo pela manhã, o mesmo não poderia ser dito de Sophie. Ela, que só assistiu cinco minutos de um filme bem tosco de terror, teve pesadelos e, no meio da madrugada, correu para a minha cama e se deitou do meu lado. Com ela ali, depois que conversei um pouco para saber se estava tudo bem, logo peguei no sono novamente. E quando acordei pela manhã, a Ruivinha já estava acordada e parecendo um panda, um panda ruivo e cheio de profundas olheiras roxas.

Ela não tinha dormido depois do pesadelo.

— Por que não me acordou, filha?

— A senhora estava tão cansada que fiquei com dó. – Ela disse mordendo o lábio. – Noemi já chegou e o papai vem vindo aí. – Ela apontou para a janela.

Jethro nem tinha bem entrado em casa e já estava me procurando, e só parou a busca quando viu a cara da filha.

— Pesadelos. – Ela respondeu desanimada ao olhar espantado do pai. – E sim, foi o filme, só não conte para o Carson, não quero ser chamada de covarde de novo. – Ela murmurou

— Bom dia para a senhorita também. – Jethro murmurou enquanto a filha descia as escadas para conversar com Noemi.

Depois que Carson acordou e comeu tantos waffles que poderiam alimentar Sophie por uma semana, fomos para o Estaleiro, Sophie ficou em casa, dizendo que ia ajudar Noemi e arrumar o próprio quarto e, quem sabe, o correio não entregava uma carta de Kelly.

Não discuti, não me demoraria no NCIS de qualquer forma.

A vinda de Jethro foi para duas coisas, primeiro nos dar uma carona até o NCIS e, segundo, me informar que que haviam localizado o pai do garoto.

— Como? – Perguntei assim que entramos no prédio e Carson apressou o passo indo direto até a mesa de DiNozzo.

— O celular via satélite dele foi ligado. E a ligação partiu do seu telefone, Jen.

Carson fingiu que não nos escutou, porém acabou nos encarando e pedindo desculpas.

— É porque eu nunca fiquei tanto tempo sem falar com o meu pai antes... e ele não é culpado de nada, Agente Gibbs! – Defendeu o pai. – Eu te falei, vocês dois são muito parecidos. Eu queria contar de você para ele e dizer que eu estava bem.

Peguei meu celular em minha bolsa e vi que realmente haviam feito uma chamada. Não gostei disso, nem Sophie pega as minhas coisas sem permissão.

Carson, ainda cabisbaixo, me seguiu para o meu escritório, enquanto Jethro foi para a sala de interrogatório. Não comentamos que o pai dele estava no prédio.

— Ahn... Jenny. Você me desculpa por ter pegado o seu celular sem te pedir? – Ele me perguntou depois de algum tempo.

— Se você está se desculpando, você sabe que foi errado. Sua mãe e seu pai te ensinaram isso. – Comentei.

Ele abaixou ainda mais a cabeça.

— Sim, me ensinaram.

— Então agora você sabe a lição, sempre alguém vai descobrir quando você fizer algo escondido.

Ele concordou com um menear de cabeça e depois ficou observando o porto. Voltei aos meus relatórios, mas não me concentrei o suficiente, o silêncio e a quietude de Carson me incomodavam, talvez porque Sophie nunca ficasse tão calada e quieta assim.

Contudo, foi meu pensamento voar para a minha filha e Carson me chamou novamente.

— Jenny... eu sei que você está trabalhando e eu sei que eu mereço ficar de castigo, mas não tem nada de interessante para se fazer aqui?

— Bem... se você está esperando videogames ou qualquer jogo de tabuleiro, sinto dizer que só tenho xadrez.

— Sua filha deve gostar bem de xadrez, se aqui tem e lá no seu estúdio também tinha um jogo em andamento.

— Sim, a Sophie gosta bastante. Mas eu estava pensando, você tem um baralho na sua mochila não tem?

— Vamos jogar pôquer?

Dei uma risada.

— Não. Vamos treinar a sua mira, que tal?

Vi que tinha o interesse dele naquele momento.

— Mas como? – Carson abriu um sorriso e veio correndo com o baralho na mão.

Posicionei uma lixeira vazia um tanto distante de nós e me sentei no chão, perto da minha mesa.

— Vamos dividir o baralho ao meio. E tentar acertar a lixeira, aquele que acertar mais vezes, vence.

Ele deu um pulo e depois se sentou do meu lado.

— Minha mira é excelente. – Se vangloriou.

— Boa sorte. Sou uma das melhores atiradoras do NCIS.

— Você tem que ser a melhor, é a Diretora. – Ele comentou.

— Quase lá, só tem uma pessoa que ganha de mim. Mas vamos ao jogo, como eu estou me sentindo muito bondosa hoje, vou te deixar começar.

Ele me deu um sorriso como se tivesse certeza de que ganharia de mim e arremessou a primeira carta. Errou. Logo em seguida mandei a minha, também não acertei. E fomos nos revessando. Até que no momento em que escancaram a minha porta, eu acertei a carta dentro da lixeira.

— Não disse que era melhor do que você! – Brinquei com ele.

— Sim... você conseguiu! – Ele não parecia nem um pouco decepcionado por ter perdido.

Do chão onde estava sentada, encarei Jethro, só ele para entrar na minha sala daquela forma.

— Pois não, Agente Gibbs?

Jethro olhou para a bagunça de cartas que caíram ao redor da lixeira e depois para Carson.

— Seu pai está te esperando, Carson.

O garoto se levantou em um piscar de olhos e saiu correndo.

— Sua mochila e suas coisas, Carson. – Chamei-o de volta.

Apressado ele voltou e me ajudou a juntar as cartas, depois arrumar tudo em sua mochila.

— Meu pai é inocente, não é, Agente Gibbs? – Ele perguntou jogando a mochila nas costas.

— Sim, garoto, ele é. – Jethro confirmou e eu segui os dois até a sala do esquadrão, por onde Carson já voava correndo de encontro aos braços do pai e da mãe.

— Tudo certo? – Perguntei.

— Sim, Jen. Resolvemos todo o mal entendido. Ele vai ficar bem, ao lado da família dele.

Chegamos perto das mesas no mesmo momento em que Carson era levantado do chão pelo pai.

— Já podemos ir? – Ele perguntou animado. – Mamãe, será que podemos ver um filme hoje, porque o que eu vi ontem, longe de você, não valeu.

— Então você viu um filme ontem? – Tenente Taylor perguntou dando um beijo na testa do filho.

— Sim. Com a Jenny. A filha dela teve que sair correndo porque ficou com medo! – Ele disse com uma gargalhada.

A tenente olhou na minha direção como se desculpando pelo medo da minha filha. Dei um aceno de mão como que dizendo que tudo estava bem. E os três rumaram para o elevador, porém, antes que a porta se fechasse, Carson voltou correndo e abraçou Jethro e a mim, agradecendo por termos tomado conta dele.

— E avisa para a Sophie, que se um dia a gente se encontrar de novo, ela pode escolher o filme.

— Creio que você não vai gostar de filmes de princesa, Carson. Tá tudo bem. – Jethro falou – Agora vá ficar com o seu pai.

— Eu vou mesmo. Tchau gente. – Ele se despediu e voltou para os braços do pai.

Assim que elevador fechou as portas, McGee, Ziva e DiNozzo nos encararam.

— Sophie saiu correndo da sala por medo de um filme? – Tony perguntou.

— Sim, Tony, não aguentou cinco minutos, pediu licença e se trancou no quarto. - Falei.

Os três começaram a rir.

— Definitivamente terror não é o gênero preferido dela. – McGee comentou.

— Não, não é. – Confirmei. – E pelo visto ela não queria que isso se espalhasse, já que não quis vir hoje.

Tony e Ziva abriram um sorriso imenso.

— Não, vocês não vão fazer isso com ela!

— Mas Chefe! Descobrimos a fraqueza da Peste Ruiva!

— Filmes de Terror! – Ziva completou.

— Se vocês pensarem em passar algum filme de terror para ela, terão que aturar os pesadelos! – Ameacei.

— Ela teve pesadelos com cinco minutos de filme?!

— Sim, McGee. Não dormiu nada e agora está igual a um panda ruivo em casa.

— Mas mesmo assim... assustá-la no Halloween... que tal com O Brinquedo Assassino?

— Vão tomar conta dela até que os pesadelos passem. – Avisei. – E ela chora alto. Estão avisados. Façam isso e arquem com as consequências.

Os três se encararam.

— Melhor não.

— Boa escolha. – Jethro comentou.

— Bem, Chefe, Diretora, já que o caso está encerrado, vamos dar início ao nosso final de semana. Antes que apareça mais alguma coisa. – DiNozzo falou já jogando a mochila nas costas e indo para o elevador e nesse exato momento o celular de Jethro tocou.

— Não! – Os três gemeram em desespero.

Jethro levantou uma sobrancelha e atendeu a chamada.

Ficou em silêncio enquanto a pessoa do outro lado falava qualquer coisa. Os três agentes estavam até prendendo a respiração, de tão nervosos.

Até que:

— Sim, filha, já terminamos aqui. E não, eles não vão.

Ziva sorriu e saiu para o elevador, se despedindo de nós. Mas Tony teve que ser o criança da turma e soltou alto o bastante para que Sophie ouvisse do outro lado:

— Eu sei que você tem medo de filme de terror, Peste Ruiva.... e eu vou usar isso contra você!!!

Jethro deu um tapa na cabeça do agente sênior e McGee saiu rindo da cara dele.

— Esse doeu, Chefe!

— Ainda bem... pedi que papai te batesse bem forte! – A voz de Sophie preencheu a sala, pois Jethro colocou a chamada no viva-voz.

— Ah, Peste Ruiva, isso vai ter troco.

- É mesmo Tony... cuidado com o que você vai fazer! Eu sei de coisas...— Minha filha deixou a frase no ar.

Vi DiNozzo e Ziva trocando um olhar e depois eles se despediram, sem mexer mais com Sophie.

Com a chamada encerrada e os três agentes longe, Jethro virou para mim e apenas disse:

— O que ela sabe agora?

Dei de ombros. Mas era incrível a capacidade de Sophie em saber de cada coisa que acontecia dentro do Estaleiro.